ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO

 


 

Editorial _________________________________________________________________

O verdadeiro "golpe das elites"

Estas ameaças poderão retornar em breve: equiparação da mulher ao homem no tempo de serviço e na idade para aposentadoria; aumento para 40 anos do tempo de contribuição obrigatória para ambos os sexos; elevação para 65 anos, para todos, na idade mínima de aposentadoria; fim da paridade de reajustes entre ativos e inativos; eliminação de subtetos diferenciados; desvinculação dos reajustes dos aposentados pelo regime geral da Previdência dos reajustes do salário mínimo; redução de benefícios sociais; prevalência do "negociado" sobre o "legislado" nas relações de trabalho; encolhimento do princípio de que a saúde é "direito de todos e dever do Estado"; "flexibilização" de direitos, em favor da "livre" negociação etc. Em suma, "recolhimento" do Estado aos papéis de legislar, policiar e julgar, com mínimas exceções, tais como controle de epidemias, escola primária para os pobres e ajuda em casos de calamidade pública.

Esse receituário de barbárie social, acalentado pela plutocracia econômica mais retrógrada desde a década de 80, poderá retornar à "pauta" do Congresso Nacional. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou no dia 10 de agosto a PEC nº 157/03, criando a "Assembléia de Revisão Constitucional", que outorga poderes constituintes aos senadores e deputados a serem eleitos em 2006. A proposta poderá ir ao plenário da Câmara ainda neste ano.

Pelas normas da atual Constituição, uma emenda precisa, para ser aprovada, de 3/5 dos votos da Câmara e mais 3/5 dos votos do Senado, em dois turnos de votação em cada Casa. Pela proposta aprovada na CCJ da Câmara, tudo seria "facilitado": na "revisão" constituinte, bastaria a maioria absoluta (50% + 1) dos votos de cada uma daquelas casas legislativas. Ou seja: o que as forças socialmente regressivas não conseguiram mediante emendas constitucionais (devido ao "quorum" qualificado), poderão conseguir por meio dessa "revisão" de "quorum" simplificado. Aproveitando-se da atual crise política, que coloca em questão a idoneidade do Executivo e do Legislativo, tentarão colocar em questão o que não está em questão, ou seja, a Constituição Federal – para conseguirem o que vêm tentando há 15 anos: eliminar os resíduos do Estado de bem-estar social e de soberania popular e nacional. Ou alguém supõe que uma revisão constituinte, na atual conjuntura e na atual correlação de forças, seria para ampliar direitos e garantias, para aumentar a soberania popular?

Para adocicar um pouco a pílula venenosa, foram incluídas na emenda dois torrõezinhos de açúçar: manutenção das cláusulas "pétreas" e dos direitos sociais (artigos 6° a 11 da Constituição). Cláusulas "pétreas", conforme o artigo 60, § 4° da Constituição, são a federação, voto popular, separação dos poderes e os direitos e garantias individuais.

O grande poder econômico e seus associados/prepostos já vinham tentando desfigurar, pedaço a pedaço, as conquistas inseridas na Constituição, mediante sucessivas emendas, todas elas de caráter socialmente regressivo. Mas isso sempre demandou muito "esforço" (inclusive, "esforço" financeiro, sabe-se hoje). Agora, parece que tentarão levar a cabo esse serviço de uma só vez.

Não nos enganemos: essa revisão poderá ser o verdadeiro "golpe das elites" contra a classe média e os assalariados, contra os servidores públicos e contra o Estado brasileiro. Poderá ser a "grande" saída conservadora para a atual crise política. Mais cedo do que se pensava, poderemos ter de voltar ao campo de batalha.

José Damião de Lima Trindade
Presidente da Apesp

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