ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO


 


Paridade

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Temos mesmo uma "sistemática" remuneratória? 

 
Imprevisibilidade, insegurança, incerteza. Todo ano, ter de convencer uma pequena multidão de interlocutores, desde técnicos da Secretaria da Fazenda até o governador. Todo ano, durante o primeiro semestre inteiro, nossa carreira ansiosa, temerosa, trespassada por suspeita e dúvida. Poderá ainda ser isso chamado de "sistemática" remuneratória?

Melhor das hipóteses para o momento em que este jornal estiver sendo lido: que o governador já tenha acolhido, ou que venha em breve a acolher, a proposta do procurador- geral de restituir a paridade remuneratória para os níveis I a IV, deixando o nível V em degrau 5% abaixo dessa paridade.

Só para argumentar, tomemos isso como fato consumado ou a consumar-se em breve. Resta, então, este grito contundente a machucar os ouvidos, esta indagação irrespondida e pendente na atmosfera, esta pergunta tornada essencial: temos mesmo alguma "sistemática" remuneratória, algum mecanismo realmente assegurado de revalorização periódica de nossa verba honorária? Se temos, então por que precisamos, todos os anos, varar meses e meses nessas fastidiosas tratativas "técnicas" com técnicos da Secretaria da Fazenda, por que precisamos, todos os anos, ter de convencer o secretário-adjunto da Fazenda, depois o próprio titular dessa poderosa 

pasta, depois, ainda, convencer os demais integrantes da Comissão Estadual de Política Salarial, em seguida convencer o secretário da Casa Civil e, por fim, convencer novamente o próprio governador – exatamente o personagem com quem o procurador-geral "combinou" em fins de 2001 essa supostamente sólida "sistemática" ? 

O drama do "se" – E se, nessa longa correia de transmissão, nesse repetitivo, tenso e atormentado peregrinar, algum burocrata acomodado ou político impaciente resolvesse dizer um peremptório "não" ou optar por um condicional "talvez"? E se, nessa hamletiana aventura anualmente recorrente, os argumentos do procurador-geral eventualmente não forem, digamos, "convincentes" para algum personagem daqueles escalões? E se a Apesp, suponhamos, viesse a ser capturada por alguma diretoria sem caráter ou fibra (nunca ocorreu, mas não é hipótese descartável), que travasse a mobilização de nossa carreira, que não pressionasse, não exigisse, não incomodasse? Ou, no matemático e simétrico contrário, se fosse uma diretoria sectária e politicamente míope, inapetente ao diálogo com quem quer que fosse necessário? Pensem nisto: e se o procurador-geral não se empenhasse, ou não fosse afeito às técnicas de persuasão? E se/quando o Palácio dos Bandeirantes receber outro morador? Até 31 de março próximo, Alckmin se desincompatibilizará de seu cargo atual para candidatar-se a presidente da República ou a senador, alguém duvida? Começar de novo todo o processo de convencimento com o vice, ou com quem vier a assumir em seu lugar?

Convenhamos: uma "sistemática" tão dependente de tantos "se", pode ainda continuar a ser chamada de... sistemática? Para dizer o mínimo, ela é extenuante para nossa carreira, desmotivante, gera insegurança, força-nos todos os anos a desperdício de energias e tempo, estressa quem já vive estressado pela maré montante de trabalho, mantém-nos em perpétuo pé-de-guerra. E – last, but not least – está pendurada em acordo meramente verbal, portanto, inevitavelmente sujeita ao cumprimento da palavra empenhada.

Adianta defendermos brilhantemente o Estado em juízo, combatermos com bravura e eficiência pelos direitos dos mais pobres, prestarmos competentíssimo aconselhamento legal a todos os escalões e autoridades da Administração? Adianta fazermos e refazermos incansavelmente tudo isso, cumprindo nossos deveres até em fins de semana e feriados, com honradez, responsabilidade e diligência, apesar de suporte insuficiente e com freqüente prejuízo de nossa própria saúde? Adianta desbravarmos selvas jurídicas novas, envolvermo-nos todos os dias em lutas de morte pelo interesse público, pelo patrimônio da sociedade, pelo bem dos necessitados? Adianta aumentarmos e aumentarmos a arrecadação da dívida ativa e da verba honorária? Se alguma dessas coisas adianta, se o Governo realmente nos respeita e valoriza, se sabe que somos indispensáveis, que somos muitíssimo competentes e muitíssimo dedicados a nossos misteres, por que então sermos punidos todos os anos com esse suspense, essa delonga, esse desgaste, por que sermos todos os anos empurrados quase à beira do pânico?

Buscar outro norte – Não dá mais: após experimentarmos essa sistemática por mais de três anos, ela mostrou-se, na prática, insatisfatória – novamente, para dela dizermos o mínimo. Nossa carreira não a suporta mais. Alguns dirão: ruim com ela, pior sem ela. Será mesmo? Não custa conferir. Ainda neste semestre, tão logo se encerre o atual capítulo de nossa questão remuneratória, a Apesp norteará o debate para esta outra "gaveta": da sistemática que temos para a sistemática de que precisamos. Buscaremos o talento, a imaginação e os saberes de nossa própria carreira para organizar essa construção necessária, inadiável. Com temperança, certamente. E também com perseverança e ousadia.

Quem sabe venhamos a descobrir que essa "gaveta" de nossa carreira guarda mapas e bússola, ou as ferramentas para construirmos nós mesmos esses preciosos instrumentos para nossa navegação mais segura.

Jose Damião de Lima Trindade, presidente
Márcia Zanotti, secretária-geral
Marcos Nusdeo, diretor financeiro

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