ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO



 

Artigo

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Avaliar sem distorcer, avaliar para aperfeiçoar


Os procuradores não temem a avaliação de seu trabalho, mas
qualquer avaliação precisa considerar a complexidade e diversidade
de fatores envolvidos, sob pena de distorção de resultados

Por Jivago Petrucci

 

A Procuradoria Geral do Estado de São Paulo é uma grande instituição, tanto se analisarmos a qualidade dos serviços por ela prestados, quanto se vista pelo ângulo de sua estrutura. E o segundo desses aspectos é particularmente afeto a nós, procuradores do Estado, que em nosso dia-a-dia somos diretamente atingidos pelas conseqüências de participarmos de uma organização tão portentosa.

Em um universo tão complexo, não é difícil detectarmos realidades radicalmente diversas nas várias unidades da PGE. Para alguns, desempenhar suas atividades profissionais passa a ser um exercício cotidiano de sobrevivência, enquanto que para outros essas mesmas atividades são executadas em condições bem mais adequadas.

Em recente comunicado à carreira, divulgou-se uma análise do desempenho da PGE na cobrança da dívida ativa no ano de 2004, adotando-se como referência o percentual que cada unidade recuperou do total de débitos que está sob sua cobrança.

Como toda avaliação de desempenho, essa também gerou acirradas polêmicas. E realmente o critério que serviu de base à análise não atentou para diversos dados fundamentais para avaliar-se o aproveitamento de cada órgão, tratando de forma igual unidades com realidades completamente diversas. 

Critério inadequado – O critério utilizado desprezou, por exemplo, um dado fundamental para qualquer avaliação de desempenho: a carga de trabalho de cada procurador. E há distorções monstruosas no número de feitos atribuídos individualmente a cada procurador dentro da PGE.

Se dividíssemos o número de execuções fiscais de cada unidade pelo número de procuradores atuantes em cada uma delas no Contencioso Fiscal, teríamos uma quase completa inversão no ranking original. A Procuradoria Fiscal e a Procuradoria Regional de Campinas, por exemplo, apresentam médias superiores a quatro mil feitos por procurador, o que significa uma carga até 482% maior do que a presente em outras unidades.

É digno de nota que, se considerássemos para avaliar o desempenho a relação entre o valor arrecadado e o número de procuradores de cada unidade, constataríamos que a Procuradoria Fiscal – uma das unidades cujo desempenho foi considerado menos expressivo – arrecadou mais de R$ 3 mi per capta no ano de 2004. Da mesma forma a PR-1 e a PR-5, que arrecadaram em média R$1,9 mi e R$1,4 mi per capta, e não obtiveram boa colocação na análise em foco.

Por outro lado, o critério adotado não levou em consideração que o perfil dos devedores de cada banca é bem diverso. Em muitas bancas, grande parte dos valores colocados em cobrança é devida, por exemplo, por empresas falidas, cujas execuções não podem ter o curso suspenso pelo artigo 40 da LEF se há penhora no rosto dos autos falimentares. Esse foi um dos pontos já modificados em razão do debate gerado pela avaliação, conforme as recém-anunciadas alterações de critério.

Também não se atentou para as peculiaridades de cada localidade, que independem da conduta do procurador mas influem diretamente no desempenho da cobrança: a velocidade do Judiciário, o relacionamento entre juiz/cartorários/procurador, a existência de arrematantes "profissionais", a distância entre as comarcas etc.

Como exemplo disso, podemos verificar que, enquanto a Comarca de Ribeirão Preto, com dois Anexos Fiscais, tem cerca de 60 mil execuções fiscais, a Comarca de Campinas, com os mesmos dois Anexos Fiscais, tem quase 168 mil (280% a mais). E não ficam aí as distorções: Presidente Prudente, em seu anexo fiscal, tem 21 mil execuções; só a Comarca de Atibaia - pertencente à Seccional de Bragança da Regional de Campinas - tem 33 mil execuções. Como se pode cobrar um desempenho de arrecadação semelhante com condições tão díspares?

O critério utilizado também não ponderou que em diversas localidades, o procurador possui uma banca formada pelos mais variados tipos de demandas, do Contencioso Fiscal, Imobiliário e Judicial, além das execuções fiscais. Isso representa uma enorme sobrecarga de trabalho, que não foi levada em conta nos números adotados.

A diversidade de estrutura – material e humana – é outro dado que foi desprezado pelo critério adotado. Em um universo onde há órgãos com status de unidade orçamentária – e com a estrutura daí decorrente –, que possuem um universo de valores em cobrança menor até mesmo do que o estoque individual de um procurador lotado em uma unidade de grande porte, não há como não atentarmos para tal discrepância. 

Insucessos aparentes – E não podemos deixar de consignar um dado psicológico relevante: o critério adotado para a elaboração do "ranking" privilegia um virtual insucesso a um real sucesso: apenas dá a dimensão do que as diversas unidades deixaram de arrecadar, e não do que efetivamente arrecadaram, e tudo isso em função de um dado destituído de confiabilidade, pois dentre o imenso bolo de valores em cobrança, uma parcela nada desprezível é composta de débitos irregularmente inscritos ou com valores absolutamente irreais.

Das unidades que tiveram "resultados menos expressivos", três são as maiores arrecadadoras do Estado: juntas cobraram mais de 258 milhões de reais, ou seja, 71,18% do total arrecadado pela PGE em 2004.

A análise que presidiu a elaboração do "ranking", portanto, não levou em consideração fatores fundamentais para a avaliação de desempenho dos procuradores atuantes no contencioso fiscal, e certamente foi recebida, especialmente por aqueles que estão lotados nas unidades tidas como "menos eficientes", como um fator de enorme desestímulo.

Não há dúvida de que a cobrança de dívida ativa necessita de uma oxigenação; de que métodos inovadores devem passar a ser utilizados; de que a acomodação dos que se habituaram a requerer sucessivos leilões de sucatas deve ser superada. Mas isso não se alcançará se partirmos de bases infundadas, de números que desprezam dados fundamentais para avaliação de desempenho e, sobretudo, se continuarmos a esconder uma verdade irrefutável: a falta de estrutura da PGE – humana e material – e o número excessivo de feitos atribuídos aos procuradores do Estado.

Jivago Petrucci ingressou na PGE em 1993, atuou na Procuradoria Judicial, foi chefe da 2ª Subprocuradoria de Campinas (área do Contencioso) até março de 2005, e hoje milita na seccional de Bragança Paulista. Cumpre mandato como conselheiro da PGE, eleito para o biênio 2005/2006

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