Dos 180 milhões de
brasileiros, 38 milhões são atendidos por algum plano de
saúde. São pessoas consideradas privilegiadas por terem
conseguido uma brecha no orçamento doméstico que lhes
permita arcar com os cada vez mais altos custos dos planos e
seguros. Assunto resolvido, agora é só cuidar da
saúde? Não, bem ao contrário. Apesar de livres das
longas filas de espera dos abarrotados pronto-socorros e
hospitais públicos, que desesperam a grande maioria dos
brasileiros, os proprietários de um plano de saúde
complementar estão longe de permanecer tranqüilos em
relação à qualidade do atendimento que encontrarão quando
necessitarem do serviço previamente pago. E isso faz das
empresas de saúde um dos principais alvos de reclamações
– revezando com os serviços de telefonia e os bancos –
junto às entidades de defesa do consumidor. No Idec
(Instituto de Defesa do Consumidor), só no ano passado foram
prestadas 2.870 consultas referentes ao tema. Neste ano, até
o mês de julho, já somam 3.827.
Foi nesse contexto
que, em 1998, o Governo Federal decidiu regulamentar o setor
de saúde complementar. Apesar disso e de importantes
avanços, sobrevivem muitos problemas. Recentemente a imprensa
relatou os exorbitantes aumentos impostos por algumas empresas
de seguro saúde que reajustaram seus preços em até 80%, sob
a alegação de adaptar contratos antigos às exigências da
legislação.
Dificuldades
- Na tentativa de preservar seus associados de todo esse
imbróglio, a Apesp mantém, há 11 anos, convênio com a
Interclínicas. O objetivo sempre foi administrar da melhor
maneira possível essa relação saúde/empresa, de forma que
os procuradores possam ser resguardados dos principais
problemas que afligem os brasileiros quando o assunto é
saúde. "Acredito que temos sido bem sucedidos, ou
vínhamos sendo", avalia a diretora de Previdência e
Convênios da Apesp, Tânia Lotto.
Quando tomou posse, em
2002, a diretoria realizou uma pesquisa para medir o grau de
satisfação dos associados com os serviços oferecidos pela
Interclínicas, bem como para decidir sobre a adaptação do
plano à nova legislação. À época, a Associação
deparou-se com algumas questões que hoje voltam a preocupar,
de maneira agravada: o atendimento prestado pela
Interclínicas tem deixado muito a desejar, com
suspensão e descredenciamento dos recursos sem prévio aviso.
Faixas e panfletos em hospitais e laboratórios informam que
não mais atendem beneficiários deste plano, fazendo o
usuário sentir-se "persona non grata" no
mercado de saúde, apesar de saldar religiosamente os
compromissos financeiros com a empresa. Assim, quem sempre
pagou mais caro para ter direito a internações no Sírio
Libanês e no Albert Einstein, por exemplo, continua
desembolsando o mesmo valor sem lograr o mesmo padrão de
atendimento. Os contatos com a empresa – para
esclarecimentos e reclamações – nem sempre são
respondidos de maneira satisfatória.
Afora isso, há
notícias cada vez mais freqüentes sobre dificuldades
financeiras que estariam levando a Interclínicas a deteriorar
a qualidade dos serviços que vinha prestando. Que
providências tomar em um mercado tão conturbado?
Negociações
- Diante desse quadro, a direção da Apesp – no caso as
diretoras Tânia Lotto, Marcia Zanotti e a diretora assistente
Ana Maria Piraino, às quais posteriormente se reuniu uma
comissão voluntariamente formada pelos procuradores Cíntia
Byczkowski, Mário Romano, Pedro Giberti, Francisco Gastão
Luppi de Castro, Sarah Barbosa e José Lafayette – decidiu
buscar outras opções no mercado de planos de saúde. No
entanto, a falta de interesse dessas empresas pelo quadro de
associados continua sendo justificada por antigas alegações:
a alta faixa etária (aproximadamente 600, dos 1.445
participantes, estão acima dos 59 anos); elevado número de
agregados, que hoje são 416; além do alto índice de
sinistralidade, ou seja, de utilização dos serviços. Esse
conjunto de fatores torna os preços apresentados por algumas
empresas proibitivos.
Os critérios de
negociação das empresas de saúde configuram uma visão
injusta do problema, mas não ilegal. A advogada Maíra
Feltrin, do Idec, afirma que a legislação aplicável aos
contratos de assistência privada à saúde prevê a
possibilidade de aumento em razão da mudança de faixa
etária – entre a primeira e a última, não pode haver
diferença superior a 500%. "Entretanto, não indica como
se dará a distribuição entre as faixas etárias. Isto
permite às operadoras a pactuação dos reajustes de acordo
com as faixas etárias propostas." O que de fato ocorre,
no entanto, é a elevação dos percentuais nas faixas de
idade maior. "No nosso entendimento, esse tipo de
situação pode levar à exclusão dos conveniados mais
idosos, caracterizando verdadeira conduta discriminatória e
contrária à lei."
"E, com certeza,
a APESP não pactuará com essa exclusão", salienta a
diretora Tânia Lotto. Quanto à questão dos agregados,
a advogada do Idec informa que não há nenhum tipo de
obrigatoriedade. "Trata-se de um acordo entre as partes,
que é contemplado pelo contrato". Só que hoje, lembra
Tânia Lotto, "as empresas mais conceituadas do mercado
não contemplam essa categoria entre seus assistidos, o que
dificulta nossas negociações".
Soluções
- A direção da Apesp e a comissão de procuradores não
esmoreceram diante das dificuldades. Foram a campo e
descobriram que a Interclínicas estabeleceu parceria com a
Gama Saúde – que vem administrando o plano de saúde do
Ministério Público –, o que deve melhorar a qualidade de
atendimento. Espera-se, ainda, que com a parceria, os
prestadores de serviços que haviam suspendido o
atendimento, voltem aos quadros. Aliás, Interclínicas e Gama
informaram que vão somar seus recursos médicos, hospitalares
e laboratoriais, no atendimento de seus usuários.
O fato é que o
serviço prestado aos associados da Apesp dificilmente será
proporcionado por uma nova empresa nos mesmos moldes do que
vinha sendo feito pela Interclínicas e nos mesmos valores. A
própria Interclínicas reclama da falta de renovação do
quadro – o que talvez possa ser melhorado com o recente
ingresso dos novos procuradores – e do alto número de
agregados – que não pretende aceitar em futuras
negociações.
Os procuradores
continuarão sendo informados sobre o andamento das
negociações por meio de correspondência própria ou pelo Apesp
em Movimento. "Estamos selecionando as propostas mais
adequadas", afirma Tânia Lotto. "Nossa prioridade
é manter o atendimento médico ao associado e seus
dependentes, sem deixar de lado a questão dos agregados. Só
que é uma tarefa difícil, diante da conjuntura econômica e
da forma como os planos e seguros saúde vêm atuando, mas
não vamos desistir até encontrar uma boa alternativa para
todos os procuradores, pois não há saída ideal."