ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO



 

Artigo

_________________________________________________________________


Números e sentimentos

Questões inadiáveis: a Procuradoria é uma instituição em crescimento? A carreira de procurador é uma carreira de futuro?

Carlos josé de Toledo 





Essas são as perguntas que muitos de nós fazemos, especialmente aqueles que se encontram em uma fase de aquisição de novas responsabilidades – como a constituição e formação de uma família, o amparo dos pais na velhice – bem como aqueles que têm ainda um longo tempo a prestar antes do desejado/temido advento da aposentadoria.

Não existe uma resposta absolutamente objetiva a essas indagações, pois variam as condições pessoais de cada um, das experiências vividas no percurso profissional, da situação de equilíbrio material que já alcançaram e da posição atualmente ocupada na instituição.

Porém, há indicativos materiais e numéricos que podem servir de balizas para a formulação de uma resposta mais próxima da racionalidade que desejamos ter em nossas expectativas e opiniões.

Algumas dessas informações são acessíveis a nós, pela leitura dos vários documentos estatísticos produzidos pela própria PGE e pelos órgãos governamentais. De posse desses dados, fizemos algumas comparações, de maneira a checar o espaço ocupado pela PGE na estrutura administrativa do Estado.1 

A PGE encolheu

Da leitura desses dados, é possível observar, por exemplo, que a participação da PGE nas despesas da Administração Direta do Estado caiu de 3,56% (1998) para 1,94% (2003). Mesmo se não considerarmos o valor dos precatórios – que acaba entrando na "fatia" da PGE – teremos uma redução da participação da PGE no "bolo" da despesa pública estadual: de 1,73% (1998) para 1,11% (2003).

Assim, ainda que consideremos que a Administração como um todo tenha "encolhido" nesse período, pelas contingências econômicas, é certo que a PGE encolheu mais do que o restante dos órgãos do Estado.

Dentro das despesas da PGE, certamente as de pessoal são as que mais nos interessam, visto que sendo um órgão tipicamente prestador de serviços, a valorização do pessoal é um índice essencial para o conhecimento de sua evolução institucional. Aqui também não há motivos para comemoração: em 1998, a PGE respondia por 1,28% da despesa de pessoal da Administração Direta. Em 2003, gastamos 1,27%. Essa "constância" indica claramente que não houve nenhum "tratamento privilegiado" à Instituição no período em questão. Mesmo com a chegada de novos procuradores e com a readequação (parcial) do repasse da verba honorária em 2002 e 2003, nossa "fatia" continuou a mesma – a variação no período foi de centésimos.

Não custa lembrar que a PGE (ainda) acumula as funções típicas de advocacia do Estado com a função de defensoria pública. O que permite uma comparação com a folha do Ministério Público Estadual, ex-adverso da PAJ nos feitos criminais: aquela instituição gastava, em 1998, 3,05% do orçamento estadual. Em 2003, sua despesa de pessoal elevou-se para 3,56%.

Por fim, no que tange ao preenchimento do seu quadro, a Procuradoria tem hoje, entre cargos e funções, 3.576 postos de trabalhos. Menos da metade desses postos estão preenchidos: 1660 – sem deduzir desse número os afastamentos. Portanto, há na PGE 1.916 cargos e funções sem ocupante. 

A PGE desbotou, sem perder o vinco

Tal como o antigo comercial de jeans, podemos dizer que a leitura dos números nos faz concluir pelo "desbotamento" de nossa instituição, que está pálida, anêmica em diversos aspectos.

Não se põem em dúvida as vitórias jurídicas de que ela ainda é capaz, pelo talento de todos os seus integrantes, bem como a inegável importância de seus serviços para a Administração Estadual. Cabe agora perguntar se os tentos por ela marcados têm resultado no seu fortalecimento institucional. Nossa percepção nos diz que não. Se há engrandecimento, é da carga de serviço suportada pelos procuradores do Estado.

O Contencioso da PGE, segundo dados fornecidos pela própria Subprocuradoria do setor, em matéria jornalística,2  atua em quase um milhão de processos. Para isso, conta com 390 procuradores do Estado.

Quando iniciei minha carreira de procurador, numa banca da Fazenda-ré da Procuradoria Fiscal, contava com menos de 200 processos. Hoje, numa banca da Fazenda-ré da Procuradoria Judicial, tenho mais de 900 processos a meu cargo. Esse acréscimo vem sendo sentido em todas as atividades da PGE, em decorrência do aumento da litigiosidade judicial, inclusive a decorrente da própria atuação estatal.

O Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário3  aponta que no Estado de São Paulo, de 1993 a 2003, houve um acréscimo de 253% no número de novas ações no Judiciário Paulista – sendo que boa parte, quiçá a maior parte desse aumento, deságua sobre a mesa de procuradores do Estado.

Vê-se por esses números, que nossa Instituição, embora desbotada, não perdeu o "vinco", isto é, a capacidade de enfrentar desafios cada vez mais crescentes, cumprindo o seu papel constitucional. Isso, repita-se, em razão da fibra e do esforço de seus integrantes, todos eles.

Porém, cabe perguntar até quando seremos capazes de "manter o vinco", à custa de nosso sacrifício pessoal, familiar e patrimonial? 

Além dos números, sentimentos

Todos esses números vêm a propósito, já que os argumentos numéricos estão na ordem do dia. Porém, a todos esses aspectos, digamos, "concretos" de nossa vida institucional, devem-se acrescer os sentimentos que palpitam por detrás de cada mesa, escrivaninha (ou nas modernas estações de trabalho). Sobre isso, não é possível falar ou escrever ou calcular: quem tiver sentidos, sinta.

Os procuradores do Estado e funcionários da PGE não são números lançados na coluna dos "custos". Mesmo a expressão "recursos humanos" trai uma índole calculista, incapaz de perceber que "cuidar de gente" é algo que se aplica também às pessoas que estão detrás do balcão.

Essas reflexões nos levam à necessidade de uma revalorização da PGE para todos os seus integrantes, visto que a valorização de uma minoria encastelada não conduz necessariamente à valorização da instituição como um todo. Ao contrário, enfraquece-a, torna-a sem viço e sem a capacidade de unir-se no enfrentamento dos desafios que são específicos de uma Instituição de natureza permanente e essencial à Administração e à própria satisfação do interesse público. 

1 Utilizamos nessa comparação, os números constantes do site da Secretaria da Fazenda (www.fazenda.sp.gov.br), relativos à execução orçamentária – isto é, o que efetivamente foi arrecadado e gasto em cada ano – dos anos de 1998 a 2003.

 2 www.valor.com.br, de 28/6/2004.

 3 www.stf.gov.br/bndpj/justicacomum/JComum7B.asp

Carlos José de Toledo ingressou na carreira de procurador do Estado em 1993. É mestre em Direito Urbanístico pela Universidade de São Paulo e professor de direito administrativo na Uninove. Atuou na Procuradoria Fiscal até 2000 e atualmente está lotado na Procuradoria Judicial, onde milita numa banca da Fazenda-ré

 

E

[1] [2] [3] [4/5] [6/7] [8]

F