28/6/2021

PGE-SP homologa seu primeiro acordo de não persecução cível

Por Rafa Santos

No último dia 18 foi publicada a homologação do primeiro acordo de não persecução cível celebrado pela Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo. O trato encerrou uma ação de improbidade administrativa ajuizada pelo estado contra uma servidora pública acusada de enriquecimento ilícito.

A ConJur teve acesso ao acordo. Pelos termos firmados, a servidora se comprometeu a devolver aos cofres públicos pouco mais de R$ 15 mil, o que inclui os valores relativos à acusação de enriquecimento ilícito e uma multa.

O acordo de não persecução cível passou a ter previsão expressa com a promulgação do chamado pacote "anticrime", que autorizou a adoção do instrumento para solução de demandas dessa natureza. No âmbito da PGE-SP, após ter sido feito um estudo, o tema foi regulamentado internamente pela Resolução PGE-SP nº 20/2020.

Segundo o órgão, a expectativa é que novos acordos nesses moldes sejam firmados em breve, isso se a iniciativa não for coibida pela nova Lei de Improbidade Administrativa. Segundo Fabrizio Pieroni, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (Apesp), o texto do PL 10887/18 "retira do ente público lesado, ou seja, da vítima do ato ilegal o direito de buscar a reparação do dano e a punição dos atos ímprobos".

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou no último dia 16 a proposta que revisa a Lei de Improbidade Administrativa (PL 10.887/18). A proposta segue agora para o Senado.

Os críticos da legislação atual afirmam que as regras deixam uma ampla margem de interpretação sobre o que é um ato de improbidade. Já os contrários ao PL argumentam que a alteração permitirá a impunidade.

Especialistas ouvidos pela ConJur argumentaram que os políticos que já são investigados ou processados podem ser beneficiados pela alteração da legislação.

 

Fonte: Conjur, de 26/6/2021

 

 

STF derruba lei paulista que regulava atividade de chaveiros e instaladores de sistema de segurança

Em decisão unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional uma lei do Estado de São Paulo que obriga o cadastramento de chaveiros e instaladores de sistemas de segurança que atuam no estado. Na sessão virtual concluída em 18/6, o Plenário julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3924, ajuizada pelo governo paulista.

Processo legislativo

Além do cadastramento obrigatório, a Lei estadual 11.066/2002 trata do controle e da fiscalização das atividades exercidas por esses profissionais e de cursos de formação e treinamento.

Em seu voto, a relatora, ministra Rosa Weber, verificou que norma, de iniciativa parlamentar, ampliou o rol de atribuições administrativas da Secretaria de Segurança Pública, conferindo-lhe as funções de cadastrar os chaveiros e instaladores e os cursos de treinamento, formação e habilitação, de expedir certificado de idoneidade moral, de elaborar documentos de identificação e de realizar controle e fiscalização das atividades desses profissionais. Em seu entendimento, a lei desrespeitou a prerrogativa do governador do estado para iniciar o processo legislativo em matéria de organização e funcionamento da administração pública estadual.

Competência da União

A relatora constatou, também, que a legislação estadual estabeleceu disciplina rigorosa para o exercício das atividades em questão. Ocorre que a Constituição Federal consagrou a competência privativa da União para legislar sobre condições para o exercício de profissões (artigo 22, inciso XVI) e previu que somente por delegação de lei complementar os estados ou o Distrito Federal podem legislar sobre questões específicas relacionadas a essa matéria.

Ela lembrou que o STF, em sucessivos julgamentos, tem reconhecido a usurpação da competência legislativa privativa da União em relação a leis estaduais e distritais que, sob o pretexto de criarem normas administrativas de interesse local, regulamentam o exercício de atividades profissionais.

Atividades de baixo risco

Por fim, Rosa Weber apontou que as restrições impostas pela lei estadual transgridem as regras e os princípios da Declaração dos Direitos de Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019), de caráter nacional, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e dispensa qualquer tipo de licença do poder público. A Resolução 51/2019 do Ministério da Economia, por sua vez, classifica, nessa categoria, os serviços de chaveiro e de instalador de sistemas de segurança.

"A legislação estadual impugnada, além de usurpar a competência privativa da União para legislar sobre condições para o exercício de profissões, contrapõe-se, ainda, aos princípios e às diretrizes estabelecidos pela União em diploma legislativo de caráter nacional", concluiu.

 

Fonte: site do STF, de 25/6/2021

 

 

Por apoio político, Doria troca quadros técnicos e expande interlocução com prefeitos

Por José Marques e Carolina Linhares

Agora com dois pré-candidatos dividindo um projeto para 2022 no Palácio dos Bandeirantes, o Governo de São Paulo passou por mudanças políticas para impulsionar as chances de João Doria (PSDB) na corrida pela Presidência e de seu vice, Rodrigo Garcia (PSDB), na sucessão estadual.

Para amenizar resistências e conquistar aliados, Doria alterou a composição do governo com o objetivo de destravar a articulação política e acelerar entregas às prefeituras. A atual formatação dá mais espaço para políticos de peso e para siglas aliadas —às custas da saída de nomes considerados técnicos.

Doria levou o deputado estadual Itamar Borges (MDB) para a Secretaria de Agricultura, no lugar do empresário Gustavo Junqueira, que passou a presidir a InvestSP, como mostrou a Folha.

Indicou o deputado estadual Vinicius Camarinha (PSB) como líder de governo na Assembleia Legislativa e preencheu o vácuo da Casa Civil com o tucano Cauê Macris, ex-presidente da Casa.

Até então, a Casa Civil era uma espécie de órgão fantasma loteado para Gilberto Kassab (PSD).

Ele chegou a ser nomeado para a função, mas imediatamente pediu licença não remunerada devido a suspeitas de corrupção, que ele nega. O cargo ficou vazio até dezembro de 2020, quando Kassab saiu do governo.

Por outro lado, o novo modelo de administração mais político e mais atento a demandas por verba se tornou ambiente hostil para Mauro Ricardo Costa, que deixou a Secretaria de Projetos, Orçamento e Gestão no mês passado.

Mauro Ricardo é conhecido por ter ocupado secretarias estaduais e municipais para promover ajustes fiscais. Esteve na gestão dos ex-governadores José Serra (PSDB), em São Paulo, e Beto Richa (PSDB), no Paraná, e também na dos ex-prefeitos Gilberto Kassab, na capital paulista, e ACM Neto (DEM), em Salvador.

As mudanças vêm no momento em que Doria e Garcia se voltam com mais afinco para a agenda eleitoral, ampliando viagens ao interior e inaugurações —o esforço é o de fazer a agenda positiva se sobrepor ao desgaste causado com as restrições de circulação e comércio na pandemia, apesar do trunfo da vacina.

O governo intensificou a entrega de vitrines para 2022, e o esforço de articulação política possibilitou a autorização da Assembleia, em votação na quarta-feira (24), para que Doria obtenha empréstimos de quase R$ 9 bilhões para financiar obras e projetos.

O projeto não encontrou grandes entraves na Assembleia. Apenas a oposição à direita e o Novo votaram contra —houve 53 votos a favor, inclusive do PT após inclusão de emendas por mais transparência, e 20 contrários. O PSOL declarou obstrução.

A verba será usada para obras em rodovias e vicinais, inclusive a Rodovia dos Tamoios; obras da linha-6 (laranja) do metrô; investimentos da Sabesp, como o Novo Rio Pinheiros; construção de delegacias, escolas e unidades habitacionais; obras contra enchentes; recuperação ambiental da Baixada Santista; e digitalização da administração pública.

O governador paulista declarou à Folha, em 15 de junho, que é pré-candidato ao Planalto e irá concorrer nas prévias do PSDB.

Para vencer a eleição interna, Doria tem como obstáculo a imagem de empresário e a série de erros políticos cometidos —para ficar nos últimos, a ida ao Rio de folga e o enfrentamento à opinião de Fernando Henrique Cardoso sobre as prévias.

Além disso, o tucano precisa ter o voto de prefeitos, vereadores e deputados, que têm peso maior do que os militantes na eleição interna do PSDB.

O reforço no time da articulação visa superar os entraves, assim como a abertura de espaço na agenda para rodadas de reuniões de grupos de prefeitos organizados por partidos.

Já Garcia, que trocou o DEM pelo PSDB em maio, e, posteriormente, assumiu a pré-candidatura ao Governo de São Paulo, está dedicado ao mesmo esforço de conquistar prefeitos e deputados e de viajar pelo interior.

O vice acumula o cargo de secretário de Governo e, com a Casa Civil esvaziada, acabava tratando da gestão de obras e privatizações, mas também da articulação política. Na avaliação do líder do governo, Camarinha, a ida de Macris deixou o time completo e desafogou as atribuições de cada um.

Aliados de Doria ouvidos pela Folha admitem que faltava ao tucano azeitar as costuras políticas em todos os setores da administração, sobretudo na relação com a Assembleia e com os prefeitos.

A Casa Civil não tinha, dizem, o peso político necessário em um estado importante como São Paulo e dirigido por alguém que já chegou ao cargo estadual mirando a Presidência.

Macris assumiu a função com a difícil tarefa de diminui a rejeição de Doria no mundo político e começou instigando o governador a receber os prefeitos pessoalmente para ouvir queixas e tentar explicar o porquê das medidas de restrição na pandemia, tidas como vilãs da economia.

Auxiliares de Doria acreditam ser possível recuperar a imagem do governador e viabilizá-lo eleitoralmente, apesar de a última pesquisa Datafolha ter detectado apenas 3% de intenções de votos.

Outra mudança recente, a saída de Mauro Ricardo aconteceu após desgastes e, segundo relatos internos do governo, Garcia tentou demovê-lo da ideia de deixar a gestão. No fim, a troca acabou ampliando o espaço do vice: ele indicou para o cargo Nelson Baeta, seu número dois na Secretaria de Governo.

Nos bastidores, a avaliação é a de que Mauro Ricardo criou uma série de problemas entre Doria e sua base aliada, sobretudo com o ajuste fiscal, que custou a ser aprovado na Assembleia. Mauro Ricardo é descrito como competente, mas sem sensibilidade política e contrário à liberação de verba –moeda de troca nas relações entre eleitos.

Pouco depois da demissão, Doria anunciou liberação de verbas à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de SP) ao lado da secretária Patricia Ellen (Desenvolvimento Econômico). Procurado pela reportagem, Mauro Ricardo não se manifestou.

Para agradar o MDB, Doria assumiu o desgaste de nomear para a Agricultura Itamar Borges, que era líder do partido na Assembleia Legislativa e é condenado criminalmente em segunda instância por desvios de verbas da educação. O deputado, porém, é influente na região de São José do Rio Preto. Ele recorre aos tribunais superiores.

Já a escolha de Camarinha para a liderança do governo, quebrando a tradição de colocar tucanos nesse posto, foi vista como um aceno para os demais partidos e justificada pelo trânsito do deputado com colegas de todas as alas. Como Camarinha declara campanha por Garcia e Doria, acabou suspenso do PSB e deve mudar de sigla.

O PSB em São Paulo é presidido por Márcio França, rival de Doria e também pré-candidato ao governo do estado. "O governo teve a boa sabedoria de não pensar só partidariamente, mas aumentar o leque de relações políticas na Casa, isso agradou o Parlamento", diz Camarinha.

Para o líder, os ajustes no governo trouxeram "entrosamento" no trânsito político. "Isso vai dar resultados políticos não só partidários, mas para a população. Uma coisa puxa a outra. E também resultados eleitorais. Quando a coisa funciona, você entrega a obra, as pessoas ficam felizes e o reconhecimento político vem."

Político experiente da Assembleia, Barros Munhoz (PSB), que já presidiu a Casa e já foi líder de governo, avalia que a gestão Doria entrou no prumo, embora aponte que umas poucas áreas ainda precisem de melhorias. Para ele, a avaliação do tucano subirá a ponto de causar surpresa em alguns meses.

Munhoz aponta que Doria, agora, conseguiu resolver problemas de lentidão e de caixa. "Doria fez medidas duras, austeras e preparou o estado para chegar ao ponto que chegou. Até pela experiência de administrador [no setor privado], ele entendeu isso e se organizou para isso", diz.

"As coisas estavam andando de forma morosa, gerando um problema político na Assembleia. O ritmo do governo aumentou muito. Está se criando um estado de ânimo. É outro clima, estamos esperançosos, é o estado de espírito que sinto em deputados, prefeitos, vereadores e começo a sentir no povo com as obras", completa.


Fonte: Folha de S. Paulo, de 28/6/2021

 

 

TJ-SP nega pedido de sindicato contra revogação de isenção de ICMS de remédios

Por Tábata Viapiana

A suspensão da eficácia de atos normativos é medida excepcional, e somente um exame aprofundado do mérito demonstrará se as normas impugnadas violaram dispositivos constitucionais.

Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo negou liminar para suspender o artigo 22, inciso II e § 1º, da Lei Estadual 17.293/2020, que revogou benefícios fiscais relativos ao ICMS para produtos e serviços com carga tributária inferior a 18%.

A decisão se deu em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma). Na ação, o sindicato disse que a norma implicaria em aumento real de até 21,985% no preço de medicamentos essenciais.

Segundo o Sindusfarma, não haveria amparo legal para a revogação da isenção do ICMS sobre medicamentos genéricos e usados para tratamento de câncer, AIDS, doenças raras, H1N1, nem para operações com produtos médico-hospitalares.

Em decisão monocrática, o relator, desembargador Moacir Peres, já havia negado a liminar. O Órgão Especial, por unanimidade, manteve a decisão. Segundo Peres, em uma análise preliminar, não estão presentes os requisitos para concessão da liminar.

"Considerando a existência de lei estadual definidora dos parâmetros para a revogação dos benefícios fiscais em tela e a ausência de comprovação de que os decretos impugnados tenham extrapolado os critérios fixados por referida lei, não vislumbro, em uma análise perfunctória, evidente vício de constitucionalidade nos dispositivos normativos questionados", afirmou.

O relator citou decisões recentes do presidente da Corte, desembargador Geraldo Pinheiro Franco, em ações que também questionaram a revogação da isenção do ICMS. Pinheiro Franco vislumbrou potencial de risco à ordem e à segurança administrativas em caso de suspensão da eficácia da Lei Estadual 17.293/2020.

"Em momento de recrudescimento da crise econômica geral, impulsionado pelo agravamento de crise sanitária sem precedentes, a decisão de primeiro grau, geradora de drástica redução na arrecadação do Estado, era capaz de comprometer a gestão dos recursos públicos e a condução segura da administração estadual", diz o presidente.

Assim, considerando a ausência de fatos e argumentos novos, aptos a alterar o entendimento firmado anteriormente, "além da reconhecida potencialidade lesiva aos cofres públicos de eventual deferimento da liminar suspensiva das normas impugnadas", Moacir Peres rejeitou o pedido do sindicato.

2283328-09.2020.8.26.0000/50000


Fonte: Conjur, de 26/6/2021

 

 

Qual a importância das advocacias públicas na defesa da probidade?

Por Carolina Yumi de Souza

Foi aprovado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 10.887, de 2018, que substitui a atual Lei de Improbidade Administrativa (LIA) e que acabou por desconfigurar o sistema sancionador anticorrupção ao definir a exclusividade do Ministério Público para a propositura de ações de improbidade, afastando as advocacias públicas e, assim, o próprio Estado, da defesa do interesse público.

A configuração institucional do Estado tem efeito direto na implementação de suas políticas e na defesa do interesse público. Em um contexto de pleno funcionamento das instituições democráticas, a desconcentração de poder favorece ao mesmo tempo a eficiência e o controle sobre a gestão.

Especialmente no tema da corrupção, que influencia a percepção acerca da capacidade do Estado de assegurar o desenvolvimento político, econômico e social, a multiplicidade de órgãos envolvidos tem sido pressuposto do arranjo institucional delineado pela Constituição.

A LIA compõe o sistema brasileiro sancionador anticorrupção e é um dos instrumentos mais importantes de que dispõe o Estado para defender seu patrimônio e seus princípios fundadores. Por muito tempo, até o advento da Lei Anticorrupção (LAC), foi o único instrumento de que o Estado dispunha para responsabilizar pessoas jurídicas por atos de corrupção, dando cumprimento, assim, aos tratados internacionais assinados pelo Brasil na matéria.

Datada de 1992, foi precursora de muitos melhoramentos feitos ao sistema anticorrupção, que incluíram reformas legislativas (como a lei anticorrupção) e fortalecimento de diversas instituições de Estado, incluída aí a Advocacia-Geral da União (AGU).

No entanto, muitas das medidas implementadas levaram a um agigantamento do poder punitivo estatal e ao desvirtuamento de muitos dos institutos e instituições criados e fortalecidos. A própria LIA foi sendo aplicada e interpretada de maneira muito mais ampla do que sua concepção inicial e, quase 3 décadas depois de sua entrada em vigor, merecia alterações.

Com esse fim, foi apresentado o Projeto de Lei 10.887, de 2018, do deputado Roberto de Lucena. Encaminhado a uma comissão especial na Câmara, o PL teve como relator o deputado federal Carlos Zarattini, que conduziu audiências públicas sobre o tema. Ainda que nesse processo houvesse discordâncias de diversos atores, o debate de que uma modificação desse porte necessita estava em curso.

Entretanto, em 16/06/2021, foi apresentado requerimento de urgência e o relatório final do projeto, tornado público poucas horas antes, foi levado à votação no Plenário da Câmara já no dia seguinte.

Claro, com isso, que diversas especulações sobre o projeto surgiram e não se deu o devido tempo e atenção aos debates. Com essa apresentação do texto de maneira tão atabalhoada, ao invés das discussões técnicas, vimos somente discussões inflamadas sobre o tema, que levaram a extremos as posições apresentadas, sem análise minimamente adequada dos méritos e deméritos do projeto.

Sim. O projeto possui pontos positivos, como exigir a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado para a configuração do ato de improbidade. Mas também há diversos pontos que tornarão a aplicação da lei bastante difícil e que são subversões de princípios consagrados no nosso sistema, como a completa vinculação ao resultado obtido na esfera penal.

Infelizmente, além de extremada, a discussão ficou circunscrita a chavões normalmente utilizados e que representam velhas (e que já deveriam há muito estar ultrapassadas) aparentes dicotomias reproduzidas em diversos discursos: impunidade x abuso de poder, eficiência do Estado x garantias individuais, criminalização da política x defesa do patrimônio público.

A maioria dos discursos em Plenário resumiu-se a “todos têm medo de ser gestor hoje no país, há criminalização da política” ou “esse projeto vai levar à impunidade” e foram poucos os momentos de debate do texto.

Partindo desse desabafo, apesar de todos os temas merecerem maior reflexão, tendo em vista o objetivo desse espaço, vou centrar-me em um apenas: o PL retirou a legitimidade das advocacias públicas para a propositura das ações de improbidade administrativa, atribuindo-a de maneira exclusiva ao Ministério Público.

Se à primeira vista esse parece um tema corporativista, de manutenção de atribuições, merece ele uma análise mais detida, porque expõe, no fim, a configuração mais adequada do sistema sancionador anticorrupção e a escolha do modelo de advocacia pública que entendemos a mais correta.

Atendo-me à esfera federal, a Advocacia-Geral da União foi criada pela Constituição Federal para desempenhar as atribuições de representar a União, judicial e extrajudicialmente, além da consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo (art. 131), papel que anteriormente era conferido ao Ministério Público.

Junto com a criação da AGU, a Constituição consagrou a utilização da expressão improbidade administrativa. As Constituições anteriores não utilizavam essa expressão e traziam formas da defesa da probidade que implicavam menos consequências, tratando especificamente de atos que resultavam enriquecimento ilícito e dano ao erário.

Para afirmar ainda a importância da defesa da probidade, previu que o cometimento de ato de improbidade configura uma das poucas hipóteses em que se pode suspender os direitos políticos (art. 15, VI) e ainda a imprescritibilidade das ações de ressarcimento (art. 37, §5º).

Para complementar o sistema, posicionou a responsabilização por improbidade como mais uma das esferas sancionadoras do Estado, ao lado da esfera penal, e dotou diversos órgãos de atribuição para atuar nesse espaço, não só na punição de ilícitos, mas como na sua detecção e prevenção. Essa multiplicidade de instâncias e de órgãos demonstra uma opção do legislador constituinte pela implementação de uma atuação em rede como estratégia de defesa do próprio Estado, da qual a AGU faz parte.

Dentro da AGU, ainda que as atenções sempre tenham se voltado ao desempenho de suas funções exercidas no pólo passivo de ações judiciais em face da União, aos poucos se institucionalizou o que se chamou de atuação proativa.

Esse grupo especializado, com foco no combate à corrupção e à recuperação de ativos, foi instituído por meio da Portaria PGU nº 15, de 25 de setembro de 2008 (Grupo Permanente de Atuação Proativa) e alterou definitivamente o papel da AGU no sistema anticorrupção, ao lado do trabalho já há muito realizado pelas consultorias jurídicas. Introduziu-se, assim, um novo perfil de atuação na advocacia pública.

Após contínua evolução de sua atuação, o papel da AGU ficou sedimentado com a LAC, onde passou a atuar conjuntamente com a CGU nos acordos de leniência (em grande parte em virtude de seu desempenho nas ações de improbidade). Essa atuação conjunta já resultou na assinatura de 14 (quatorze) acordos com empresas investigadas pela prática de atos lesivos previstos na LAC, na Lei de Licitações e na LIA, com previsão de retorno de recursos aos cofres públicos na marca de R$ 14,48 bilhões.

Esse papel se coaduna perfeitamente com o sistema anticorrupção desenhado, composto por diversos órgãos e esferas que, atuando organizadamente em seus papéis conferem completude ao sistema, influenciando ainda na manutenção da legalidade da ação estatal e na busca da legitimidade, funcionando como sistemas formais e informais de proteção da juridicidade.

A interrelação desses sistemas, inclusive, faz com que haja previsão em diversas normas de encaminhamento de informações à AGU e ao MP, concomitantemente, para promoverem a responsabilidade pela prática de ilícitos, como na lei de funcionamento das Comissões Parlamentares de Inquérito.

Assim, alijar a advocacia pública de seu papel na defesa da probidade, concentrando a o poder punitivo estatal em um só órgão, além de impedir que o poder público possa defender seus próprios interesses, limita o bom funcionamento do sistema e a própria noção de controle que a multiplicidade de órgãos trabalhando coordenadamente em atribuições complementares traz.

E isso consegue, ao mesmo tempo, se encaixar nos discursos aparentemente opostos acima mencionados: fragiliza a atuação estatal e o controle sobre o cometimento de abusos.

Devo dizer que, depois de toda a seriedade do trabalho desenvolvido, foi um momento bastante triste ouvir as justificativas dadas em Plenário, de que essa retirada da legitimidade das advocacias públicas se devia a sua atuação política, que podia conduzir à perseguição de opositores.

Mais triste ainda, o projeto conferiu às advocacias públicas o papel de defensoras de condutas ilícitas, impondo a defesa dos agentes públicos em virtude da atividade de consultoria (como se as representações já não fossem hoje tema suficientemente controverso).

Assim, além de fragilizar o sistema anticorrupção e controle da atividade estatal, o projeto, nesses pontos, desvirtua a natureza da própria AGU, tratando-a como instituição voltada à defesa de interesses de políticos (sim, esse “de” está corretamente colocado) e não como órgão de defesa de interesses públicos.

Reconhecer avanços e corrigir desvios caberá agora ao Senado.

CAROLINA YUMI DE SOUZA – Doutora em Direito pela USP. Advogada da União, trabalhou na Secretaria Nacional de Justiça e foi chefe de gabinete da Presidência do STF. Atua com ajuizamentos decorrentes de Acordos de Leniência na Procuradoria-Geral da União.


Fonte: JOTA, de 28/6/2021

 

 

Comunicado do Centro de Estudos

O Procurador Chefe do Centro de Estudos - Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado comunica que no dia 25-06-2021 foi encerrado o prazo de inscrições para participar na “Reunião Aberta - Núcleo Temático de Estudos e Pesquisas Empíricas para Racionalização de Estratégias de Litigância”, que ocorrerá no dia 29-06-2021, das 17h às 18h30, na plataforma Microsoft-Teams. Nos termos do comunicado publicado no D.O. de 22-06-2021, foram recebidas e deferidas 11 inscrições abaixo relacionadas. Ficam ainda convocados os membros abaixo relacionados.

Clique aqui para o anexo

 

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 26/6/2021

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