27/1/2022

Primeira Turma decide que não incide ICMS sobre serviço de provimento de capacidade de satélite

Por entender que o serviço de provimento de capacidade de satélite não configura uma atividade de telecomunicação, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não incide ICMS nesta operação. De forma unânime, o colegiado negou provimento a dois recursos da Fazenda estadual do Rio de Janeiro que buscavam a classificação desse serviço como atividade tributável.

A Fazenda destacou que a Lei Geral de Telecomunicações prevê que o ICMS incide sobre as prestações onerosas de serviços de comunicação, e que o serviço de provimento de capacidade de satélites para outras empresas se enquadraria nesse conceito.

Segundo o relator dos processos, o ministro Benedito Gonçalves, a atividade em questão não é um serviço de comunicação, mas sim um suplemento deste.

"Os satélites disponibilizados não passam de meios para que seja prestado o serviço de comunicação, sendo irrelevante para a subsunção tributária que se argumente no sentido que há retransmissão ou ampliação dos sinais enviados", explicou o ministro.

Na origem, a Fazenda estadual tentou a cobrança de mais de R$ 500 milhões em ICMS que seria devido pela Claro S.A pela disponibilização dos satélites Star One para o uso de outras empresas de telecomunicações.

O pedido foi rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sob o argumento de que os satélites são meros meios disponibilizados para que outras empresas efetuem serviços de telecomunicação.

Serviço suplementar ou atividade meio

Ao analisar o recurso especial da Fazenda, o ministro Benedito Gonçalves ressaltou que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em seus diversos regramentos, não considera o provimento de capacidade de satélite como um serviço de telecomunicações.

Ele disse que a jurisprudência do STJ é clara no sentido de que serviços suplementares e atividades meio não sofrem incidência do ICMS. No caso dos satélites, explicou, estes apenas espelham as ondas radioelétricas que sobre eles incidem além de não participarem do tratamento das informações emitidas nestas ondas.

"Conforme adverte a doutrina, o terceiro que se limita a fornecer, ainda que a título oneroso, os meios necessários à fruição dos serviços de comunicação já terão cumprido seu dever jurídico com a simples disponibilização de tais meios", comentou o ministro ao citar o professor Roque Antonio Carraza.

Benedito Gonçalves mencionou entendimento do STJ no Tema 427 dos recursos repetitivos, segundo o qual o ICMS somente incide sobre o serviço de telecomunicação propriamente dito, e não sobre as atividades-meio e serviços suplementares.

 

Fonte: site do STJ, de 27/1/2022

 

 

Magistrados de SP querem novo bônus no salário por alegado excesso de trabalho

A criação de um novo auxílio financeiro para magistrados vinculados ao Tribunal de Justiça de São Paulo, desta vez voltado para compensar uma alegada sobrecarga de trabalho, ganha força dentro da corte.

Para 2022, por exemplo, o órgão triplicou o limite do reembolso pago a título de auxílio-saúde, que subiu de 3% para 10% do valor dos salários.

Além desse benefício, membros do Judiciário paulista devem analisar a criação de outro adicional, o auxílio-acervo, voltado a magistrados que acumulam serviço, como duas varas distintas, com valor correspondente a um terço do salário para cada 30 dias.

Um adicional nesses moldes já é pago em outras cortes do país.

Os desembargadores ganham R$ 35.462,22, mas com os chamados penduricalhos esse valor pode subir para R$ 56 mil, sem contar os descontos. Já os menores salários, de juízes substitutos, são de R$ 28.883.

O tema foi levantado neste ano pelo vice-presidente do TJ, desembargador Guilherme Gonçalves Strenger, e tem apoio de entidade que representa os magistrados paulistas. O assunto, porém, ainda precisa do aval da presidência do órgão.

Em discurso de posse no início deste ano, Strenger defendeu a medida diante da sobrecarga dos magistrados que, para ele, chega a "limites insuportáveis".

Ele citou que, sem magistrados para assumir as varas durante férias e licenças, "o acúmulo de trabalho e formação de acervo torna-se praticamente inevitável".

"Também por essa razão, penso ser premente a implementação do auxílio por assunção de acervo em valor correspondente a 1/3 dos subsídios, a fim de retribuir o trabalho do magistrado que suporta a distribuição anual de processos superior ao que lhe seria exigível, conforme recomendado pelo CNJ [Conselho Nacional de Justiça]", disse o vice-presidente do TJ.

Assim como o auxílio-saúde, o CNJ recomenda o adicional por excesso de trabalho desde 2020. No entanto os tribunais não são obrigados a adotar as medidas.

Segundo a recomendação do conselho, somado ao auxílio de um terço do subsídio, o salário não pode ultrapassar o teto, referente aos vencimentos dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), que é de R$ 39.293.

Questionado sobre o assunto pela Folha, o vice-presidente do TJ disse que na gestão anterior ele já havia feito o requerimento para criar o auxílio-acervo na corte para retribuir a distribuição de processos superior ao que seria exigível aos magistrados.

Ele citou que magistrados dos TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) e TRFs (Tribunais Regionais Federais) são contemplados pelo auxílio. "E, ao que consta, na esfera estadual, somente o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo não implementou a aludida gratificação", disse, em nota.

Segundo ele, a análise do pedido deve passar pela presidência do TJ-SP e pelo Órgão Especial. Procurada, a corte afirmou não emitir opinião sobre o que seus integrantes dizem e que a proposta ainda não foi analisada pela presidência.

A Apamagis (Associação Paulista de Magistrados), entidade que representa a categoria, demonstrou apoio ao auxílio.

De acordo com a juíza Vanessa Mateus, presidente da associação, é recomendável que o estado crie outra vara quando ela atinja determinado número de processos distribuídos –que balizaria a criação de cargos de juízes e servidores.

"Não havendo a criação de outra vara, o mesmo juiz exerce a função que seria de dois juízes. Dessa forma, esse auxílio por assunção de acervo se destina a compensar a vara que não foi criada, com muito menos ônus ao Estado", disse, em nota.

"Ao invés de disponibilizar vencimentos para dois juízes, o Estado concederá apenas um acréscimo a um juiz e não arcará com despesas com salários de servidores, com cartório e com estrutura", acrescenta ela.

Entre os dados que basearam a recomendação do CNJ está um levantamento que mostra que, de 2010 a 2019, o número de magistrados no Brasil cresceu 7,2% (de 16.883 para 18.091), enquanto os casos novos no Poder Judiciário avançaram 26%, passando de 24 milhões a 30,2 milhões por ano.

O TJ-SP quer ainda quer criar mais um cargo, do quinto assistente para os gabinetes.

No início do mês, a corte aumentou a possibilidade de reembolso mensal de auxílio-saúde dos magistrados, de 3% para até 10% do valor dos salários.

Com isso, os limites mensais para os desembargadores, que chegavam a pouco mais de R$ 1.000, podem saltar para mais de R$ 3.500. O pagamento do auxílio é um reembolso que depende da comprovação da despesa pelo magistrado.

Os magistrados têm direito a auxílio-alimentação, férias anuais, licença-prêmio e dias de compensação por cumulação de funções.

Além disso, recebem retroativos, compostos principalmente de equiparações salariais, que são corrigidos pela inflação. Após os salários, essas são as maiores despesas pagas pelo tribunal aos seus integrantes.

A mudança no auxílio-saúde consta de portaria publicada no dia 10 e assinada pelo novo presidente do TJ, Ricardo Mair Anafe. Ele tomou posse para comandar o maior Tribunal de Justiça do país no biênio 2022-2023 e tinha esse aumento do benefício aos magistrados como promessa de campanha.

O magistrado assumiu o posto com a corte em situação financeira mais confortável que nas gestões de antecessores.

Antes dele, presidentes enfrentaram restrições devido a uma mudança de cálculo do TCE (Tribunal de Contas do Estado) que pôs a corte sob risco de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal.

No ano passado, o TCE flexibilizou um acordo que havia feito com o TJ para que o órgão da Justiça reduzisse progressivamente o percentual de suas despesas com pessoal até 2021. O prazo para que esse ajuste chegue ao fim passou para 2023.

Apesar dos problemas financeiros, o órgão frequentemente chama a atenção pelos gastos. Algumas vezes, após repercussão negativa, acaba recuando.

Por exemplo, a Folha mostrou que até o ano passado o tribunal usava uma verba reservada a situações urgentes e imprevisíveis para comprar petiscos e outras regalias aos seus 360 desembargadores.

A chamada "verba de adiantamento" vinha sendo usada pelo tribunal para fazer compras que incluíam produtos como queijo maasdam holandês (R$ 67,90 o quilo) e salame hamburguês Di Callani (R$ 60,25 o quilo), além de frutas como kiwi gold (R$ 59,99 o quilo).

Após reprimenda do TCE, no entanto, a corte informou internamente que deixaria de fornecer lanches a gabinetes de desembargadores por meio desta verba.

Em 2019, a construção de um prédio bilionário para abrigar gabinetes de desembargadores acabou suspensa após a repercussão negativa.

No ano seguinte, o órgão anunciou que daria prêmio de até R$ 100 mil para desembargadores julgarem processos durante a crise. Após a divulgação, o CNJ foi acionado e o órgão decidiu suspender a medida.

 

Fonte: Folha de S. Paulo, de 27/1/2022

 

 

Comunicado do Centro de Estudos I

O Procurador do Estado Chefe do Centro de Estudos - Escola Superior da PGE COMUNICA que foram recebidas 02 (duas) inscrições na modalidade presencial e 03 (três) na modalidade streaming para participarem do curso de extensão em “Atividade Administrativa e Controle da Administração Pública”, promovido pela Escola Superior da PGE, a ser realizado no período de 01 de fevereiro a 21 de junho de 2022, às terças-feiras, das 8h às 12h15, na Rua Pamplona, 227 – 2º andar, Bela Vista, São Paulo/SP, nos termos do comunicado publicado no DOE de 08-01-2022.

Clique aqui para o anexo

 

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 27/1/2022

 

 

Comunicado do Centro de Estudos II

O Procurador do Estado Chefe do Centro de Estudos - Escola Superior da PGE COMUNICA que foram recebidas 07 (sete) inscrições na modalidade streaming para participarem do curso de extensão em “Políticas Públicas”, promovido pela Escola Superior da PGE, a ser realizado no período de 04 de fevereiro a 29 de abril de 2022, às sextas-feiras, das 8h às 12h15, na Rua Pamplona, 227 – 2º andar, Bela Vista, São Paulo/SP, nos termos do comunicado publicado no DOE de 08-01-2022.

Clique aqui para o anexo

 

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 27/1/2022

 

 

Observatório do TIT: Conceito de ‘uso e consumo’ nos créditos de pneus

Por Mauricio Barros

Dando seguimento à segunda fase do projeto Observatório do TIT-SP, em que são analisadas decisões recentes da Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), o objetivo deste texto é avaliar o tema central do acórdão resultante do julgamento do recurso especial interposto nos autos do processo DRT 15 4.117.801-4, publicado em 3 de dezembro de 2021, de relatoria do Juiz Ítalo Simonato.

Segundo o relato da decisão, trata-se de acusação de creditamento indevido de ICMS relativo à aquisição de material qualificado pelas autoridades ficais como de “uso e consumo do estabelecimento”, correspondente a pneus utilizados pelo contribuinte na prestação de serviço de transporte.

A autuação havia sido mantida no julgamento em primeira instância e parcialmente cancelada no julgamento da 10ª Câmara, em decisão da lavra do juiz Raphael Zulli, justamente no ponto que será analisado neste artigo – créditos de pneus. O AIIM comportava outros itens, que não chegaram a ser analisados pela Câmara Superior, eis que o recurso fazendário somente atacou o ponto desfavorável ao estado na decisão da 10ª Câmara.

Segundo a decisão em análise, não haveria dúvidas de que os pneus “são empregados na atividade de prestação de serviço de transporte rodoviário e, por óbvio, são consumidos/desgastados na prestação do serviço, cujo desgaste é diretamente proporcional ao volume de serviço de transporte prestado pela recorrida. Entretanto, o indiscutível desgaste sofrido pelos pneus não se dá imediatamente — ou, aos menos ortodoxos, em curtíssimo espaço de tempo —, tendo durabilidade variável, mas certamente perdurando por, no mínimo, dezenas de milhares de quilômetros rodados. Tal desgaste — não imediato, mas gradual, reforce-se — contraria a jurisprudência prevalecente desta Câmara Superior, no sentido de que o direito ao crédito de materiais condiciona-se ao seu consumo integral e imediato”.

Na opinião do autor, o simples fato de serem “empregados na atividade de prestação de serviço de transporte” já seria suficiente para permitir o creditamento, sempre que o serviço seja tributado ou, acaso não o seja, haja previsão de manutenção dos créditos correspondentes. Esse era o meu entendimento nos tempos em que tive a honra de pertencer aos quadros do E. Tribunal e continua sendo o atual. Entretanto, o objetivo desse artigo não é o de contrapor o acórdão nesse ponto, mas focar em outro aspecto da bem fundamentada decisão em análise: a premissa de que a permissão para o crédito de ICMS sobre a aquisição de pneus, sendo o seu desgaste não imediato, “contraria a jurisprudência prevalecente desta Câmara Superior”.

De fato, o tema não é inédito na Câmara Superior e as decisões anteriores são, realmente, contrárias aos contribuintes. Conforme pesquisa com os termos “ICMS crédito pneus transporte” na página eletrônica do tribunal, existem quatro decisões em recursos especiais sobre o tema, das quais em três houve conhecimento do recurso e julgamento de mérito no ponto objeto deste texto. Além da decisão em comento, foram proferidas mais duas decisões: AIIM 2133666-0, publicada em 5 de fevereiro de 2015, e AIIM 4056201-3, publicada em 13 de dezembro de 2017.

A primeira decisão (AIIM 2133666-0), de relatoria do Juiz Celso Barbosa Julian, foi unânime ao negar o direito ao crédito. Ao entender que “os pneus utilizados pela recorrida para reposição em sua frota de caminhões não se consomem imediatamente durante a prestação do serviço de transporte”, a decisão foi a de que não haveria a possibilidade de creditamento, tendo citado tanto o paradigma levado pelo recurso especial fazendário (DRT-15-682185-2010) quanto a decisão das Câmaras Reunidas no processo DRT-06-714150-05 como fundamentos.

Ocorre que as duas decisões citadas na decisão do AIIM 2133666-0 não enfrentam diretamente a matéria.

No caso da primeira (DRT-15-682185-2010), a construção da fundamentação para a negativa ao crédito sobre os pneus se inicia com a afirmação de que “o contribuinte somente tem como compensar o imposto cobrado nas operações anteriores, se houver uma etapa posterior de comercialização de mercadorias sujeitas ao ICMS, por isto que não se admite o credito de material de uso e consumo”. Prossegue a decisão pontuando que “corrobora esse pensamento o texto da Decisão Normativa mencionada pela Representação Fiscal, CAT-01/2001, pois, para fazer jus ao crédito, deverá o contribuinte demonstrar que o consumo se deu nas atividades da empresa alcançadas pelo tributo estadual.”

A decisão segue com a afirmação de que “a matéria já foi submetida ao crivo do Poder Judiciário, considerando-se constitucionais as restrições trazidas pela LC-102/00, que disciplina o regime de compensação do imposto estadual”, e que “em síntese, os argumentos da Recorrente são pela defesa da tese do crédito financeiro, em oposição ao crédito físico do ICMS. Este dissenso de opiniões é antigo e também já foi submetido à apreciação do STF”, finalizando com a citação da ementa do julgamento do RE 447470 AgR / PR.

Como adiantado, a fundamentação adotada, com a máxima vênia, não enfrenta diretamente a questão dos créditos dos pneus. Isso porque, primeiramente, a DN CAT 1/2001 apenas trata de créditos de combustíveis ao tratar da possibilidade de créditos no contexto de serviços de transporte e faz considerações genéricas sobre bens de uso e consumo, sendo que nada é dito, nesse particular, quanto aos pneus ou mesmo à necessidade de desgaste/consumo imediato para que possa haver o creditamento. Além disso, ao fazer digressões sobre a impossibilidade de aproveitamento de créditos financeiros, a decisão não pontua exatamente como seria a aplicação desse critério no contexto de uma atividade de prestação de serviços, totalmente distinta das atividades de industrialização e comercialização, e usa como paradigma uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que trata de empresa fabricante de bebidas (ou seja, não guarda qualquer relação com os serviços de transporte de cargas).

Já a segunda decisão citada (DRT-06-714150-05) tratou de caso de pneus e câmaras de ar utilizados em frota própria para entrega dos produtos comercializados aos seus clientes, em julgamento de caso de outra empresa fabricante de bebidas, o que também é matéria totalmente distinta e não deveria ter sido adotada automaticamente como fundamento do julgado.

Por sua vez, a segunda decisão da Câmara Superior sobre o tema, relatada pelo juiz Gianpaulo Camilo Dringoli, vai na mesma linha, ao entender que “por se tratar de peça ou parte do ativo imobilizado, não há como admitir o crédito relativo aos pneus adquiridos, ainda que sejam utilizados na prestação do serviço”, bem como que “essa matéria é antiga, e a jurisprudência desta Corte tem sido consistente no sentido de que a substituição de peças ou partes relativas a ativo imobilizado não permite o aproveitamento do crédito do imposto destacado na nota fiscal de aquisição”. Além disso, a referida decisão, ao contrapor as teses que defendem “crédito financeiro” e “crédito físico” para fins de creditamento do ICMS, aponta se filiar à segunda corrente, pois essa teria sido a adotada pela Lei Complementar (LC) 87/96 e pelo STF no julgamento do RE 195.894-0/RS.

Com relação aos pontos dessa decisão, primeiramente há que se ponderar se os pneus, realmente, poderiam ser classificados como “partes ou peças de ativo imobilizado”, por se tratar de produtos consumíveis (tanto quanto combustíveis, óleos lubrificantes etc.). Por essa razão, parece ser inaplicável, aos pneus, o mesmo raciocínio utilizado nos julgamentos do TIT-SP que tratam de partes e peças de ativo imobilizado, além do fato de — novamente — ser questionável sua aplicação à atividade de serviços de transporte sem as necessárias razões para essa aplicação.

Ademais, a decisão do STF citada (RE 195.894-0/RS) é de caso concreto referente a uma indústria fabricante de tintas e solventes, que tem como matéria fatos geradores ocorridos antes da publicação da LC 87/96, foi proferido pela Segunda Turma (não pelo Pleno) e não conheceu do recurso extraordinário interposto (ou seja, não houve julgamento de mérito). Logo, essa decisão é totalmente inadequada para servir de parâmetro à solução de um caso concreto de créditos de pneus na atividade de transporte já na vigência da LC 87/96, sobretudo quando não são apontadas, de maneira clara e direta, as razões pelas quais as diferenças nas circunstâncias concretas de cada caso podem ser superadas.

Nesse julgamento, seis votos foram desfavoráveis à posição prevalecente, conforme o voto condutor do juiz Carlos Americo Domeneghetti Badia, que sustenta que “a matéria foi inicialmente disciplinada pelo Convênio ICMS 66/88, que com força de lei complementar adotou postura restritiva, asseverando (artigo 31, inciso III), que não ensejaria direito a crédito ICMS decorrente da ‘entrada de mercadorias ou produtos que, utilizados no processo industrial, não sejam nele consumidos ou não integrem o produto final na condição de elemento indispensável a sua composição’”.

Prossegue o voto aduzindo que “a partir deste contexto normativo a jurisprudência fixou premissa na linha de que somente as mercadorias ou produtos — ou, por outras palavras, insumos — que atendessem tais premissas (consumo ou integração no produto final) é que ensejariam creditamento. Mas o Convênio ICMS 66/88 foi revogado e a Lei Complementar nº 87/96 ampliou a possibilidade de tomada de créditos (artigo 20, parágrafo 1º), fazendo referência tão somente à necessidade de vinculação dos insumos à atividade própria do contribuinte, abolindo a necessidade de sua integração ao produto final”.

Além disso, o voto aponta que essa inovação legislativa já foi reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), tendo citado a ementa do Recurso Especial nº 1175166/MG, para concluir que “a evolução era necessária e teve sua razão de ser, pois a anterior premissa de que cuidou o Convênio ICMS nº 66, de necessidade de consumo ou integração ao produto final, decorria de conceito ultrapassado e que fazia sentido apenas quando aplicado às atividades comerciais/industriais puras e descabido diante do novo ICMS, que a partir da CF de 1988 passou a incidir também sobre prestação de certos serviços”.

A mesma linha argumentativa foi adotada pelo voto vista do juiz Edison Aurélio Corazza no julgamento mais recente do AIIM 4.117.801-4 (objeto central deste texto), que foi concluído pelo mesmo placar de 10 a 6 a favor do estado.

Por tudo isso, além de não contar com uma unanimidade nos dois julgamentos de mérito mais recentes, embora seja certo que a Câmara Superior adote a linha de que são indevidos os créditos de ICMS sobre as aquisições de pneus, aparentemente os fundamentos adotados nas decisões anteriores às do processo DRT 15 4.117.801-4 não enfrentam diretamente a matéria, ao apontar precedentes distantes da situação concreta, sobretudo pela transposição automática de decisões aplicadas a contribuintes industriais a casos de prestadores de serviços sem justificar essa transposição entre situações tão díspares.

E mesmo a decisão objeto central desse artigo (4.117.801-4), embora adote seus próprios fundamentos, cita precedentes aplicáveis a outras atividades para justificar a exigência de “consumo imediato” para que os pneus sejam creditáveis. E o faz de forma absolutamente consciente, ao apontar que “embora a jurisprudência verse, via de regra, sobre os materiais utilizados em processos produtivos, penso que mesmo entendimento aplica-se aos materiais empregados na atividade de prestação de serviços. Nesse sentido, o excerto da decisão paradigma (DRT-15-294988-02), dispondo que ‘os pneus utilizados pela recorrida para reposição em sua frota de caminhões não se consomem imediatamente durante a prestação do serviço de transporte, o que lhe retira a possibilidade de creditamento’ (fls. 467)”.

Desse apanhado de precedentes, restam algumas dúvidas quanto à posição do tribunal quanto ao caso concreto: como aplicar a dicotomia “crédito físico X crédito financeiro” se a prestação de serviços é algo imaterial, ou seja, se não ocorre a saída física ou a entrega de algo tangível ao consumidor/contratante? A não cumulatividade a ser considerada na prestação de serviços não deveria ser interpretada por uma ótica diferente daquela pensada na saída de mercadorias?

Nessa linha, faz sentido exigir “consumo integral e imediato” para que o crédito seja possível, mesmo sabendo que essa postura praticamente esvazia as possibilidades de creditamento na atividade das transportadoras e, assim, ameaça a própria não cumulatividade do ICMS?

MAURICIO BARROS – membro da Associação Brasileira de Direito Financeiro e Tributário – ABDF, sócio de Gaia Silva Gaede Advogados, Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo – USP, Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP, Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP e ex-juiz do TIT/SP

 

Fonte: JOTA, de 27/1/2022

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