17/9/2020

STF conclui julgamento sobre retenção de bens importados para pagamento de diferença fiscal

Em julgamento no plenário virtual, os ministros do STF, por unanimidade, concluíram julgamento sobre retenção de bens importados para pagamento de diferença fiscal. Seguindo voto do relator, ministro Marco Aurélio, foi fixada a seguinte tese:

"É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal."

A União interpôs o RE contra acórdão do TRF da 4ª região que entendeu incabível condicionar o desembaraço aduaneiro de bens importados ao pagamento de diferenças apuradas por arbitramento da autoridade fiscal.

No caso, a Receita Federal promoveu a retenção das mercadorias importadas sob alegação de houve subfaturamento (declaração de menor preço da mercadoria para pagamento a menor do tributo) e condicionou sua liberação ao pagamento de multa e tributos complementares ou mediante o depósito de caução (garantia) correspondente.

O TRF-4 entendeu, entre outros pontos, que a Súmula 323 do Supremo proíbe a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Assinalou ainda que o não recolhimento da multa e da diferença de tributos oriundos da imposição de reclassificação fiscal não tem a capacidade de obstruir o desembaraço aduaneiro, pois a liberação das mercadorias não impede o prosseguimento do Fisco na autuação e na futura cobrança das diferenças de tributos e multas apuradas, se for o caso.

De acordo com o Tribunal, é necessário que o subfaturamento tenha sido perpetrado por outros meios de fraude (como a falsidade material), não abrangendo as hipóteses em que o subfaturamento configure apenas a falsidade ideológica, pois há norma específica tipificando essa conduta como infração administrativa apenada com multa de 100% sobre a diferença dos preços.

No RE, a União argumentou que não há semelhança entre o precedente que originou a Súmula 323 e a situação retratada no processo, pois, naquela ocasião, discutiu-se se configurava sanção política a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Já nesse caso, é preciso definir se consiste em penalidade política a retenção de bem objeto de despacho aduaneiro de importação até o recolhimento da diferença decorrente de arbitramento fiscal.

Relator

O relator, ministro Marco Aurélio, observou que o pagamento de tributo e multa constitui elemento essencial ao desembaraço aduaneiro. Para S. Exa., o inadimplemento da obrigação fiscal torna inviável a conclusão do procedimento, afastando a possibilidade de internalização da mercadoria.

Marco Aurélio destacou que não se tem coação indireta objetivando a quitação tributária, mas regra segundo a qual o recolhimento das diferenças fiscais é condição a ser satisfeita na introdução do bem no território nacional, sem o qual não se aperfeiçoa a importação, destacando doutrina nesse sentido:

"Não há que se confundir a apreensão - que ocorre quando verificada irregularidade que enseje a aplicação da pena de perdimento - com a simples retenção do produto até que cumpridas condições para a conclusão do desembaraço e liberação, como a apresentação de documentação e o pagamento de tributos devidos."

O ministro ressaltou que foi editado o verbete vinculante 48 do STF com a redação: "Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro", e que a sistemática revela opção política do legislador, direcionada a elidir a sonegação fiscal e proteger a indústria nacional, em consonância com o previsto no artigo 237 da CF.

Diante disso, conheceu do recurso e o proveu para, reformando o acórdão impugnado, assentar compatível, com a Lei Maior, o condicionamento do desembaraço aduaneiro de mercadoria importada ao pagamento de diferença de tributo e multa decorrente de arbitramento implementado pela autoridade fiscal.

O entendimento do relator foi seguido por unanimidade. O ministro Celso de Mello está afastado por licença médica.

 

Fonte: Migalhas, de 16/9/2020

 

 

STJ analisa honorários de advogados em causas contra a Fazenda Nacional

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar na tarde desta quarta-feira (16/9) como devem ser fixados os honorários pagos pela Fazenda ao advogado de uma sócia que foi excluída de execução fiscal contra a empresa. A posição dos 15 ministros mais antigos do STJ no REsp 1.644.077 afeta dois recursos repetitivos em tramitação no tribunal superior – em um deles, discute-se a fixação de honorários em situação mais geral de derrota da Fazenda.

O relator do caso, ministro Herman Benjamin, votou de forma favorável à União para negar provimento ao recurso da sócia. Em seguida pediu vista a ministra Nancy Andrighi. Não há data prevista para retomada do julgamento.

Usando máscaras para se proteger da Covid-19, o advogado-geral da União (AGU), José Levi do Amaral, e o procurador-geral da Fazenda Nacional (PGFN), Ricardo Soriano, compareceram pessoalmente ao STJ para fazer as sustentações orais.

Participando do julgamento por videoconferência, o representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado Coêlho, disse que ele próprio e o presidente da entidade, Felipe Santa Cruz, só não fariam as sustentações orais presencialmente no STJ por suspeita de infecção pelo coronavírus.

O presidente do STJ, ministro Humberto Martins, estava no plenário da Corte Especial e conduziu a sessão também usando máscara. Os demais ministros participaram do julgamento remotamente e a sessão por videoconferência foi transmitida no canal do tribunal superior no YouTube.

Honorários: isonomia entre advogado público e privado

A posição da Corte Especial do STJ afetará recursos repetitivos pendentes de julgamento na 1ª Seção (REsp 1.358.837) e na 2ª Seção (REsp 1.812.301) do tribunal superior. De maneira geral, a Corte Especial definirá como deve ser interpretado o artigo 85 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015.

A principal divergência tem como base o parágrafo terceiro do dispositivo, no qual são detalhados critérios para a fixação de honorários em causas que têm como parte a Fazenda. Em processos com valores em disputa acima de cem mil salários mínimos – cerca de R$ 104,5 milhões – o CPC determina o pagamento de honorários entre 1% e 3% sobre o valor da condenação.

Porém, o parágrafo oitavo do mesmo artigo faz uma ressalva para causas em que o proveito econômico for “inestimável ou irrisório”. Nestes casos, o CPC define que “o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa”.

Nesse sentido, o advogado-geral da União (AGU) e ex-procurador-geral da Fazenda Nacional (PGFN), José Levi do Amaral, argumentou que o Judiciário deve combinar os dois parágrafos ao avaliar a quantia que a Fazenda terá de pagar ao advogado do contribuinte. Levi ressaltou que apesar de a sócia ter sido excluída a execução fiscal contra a empresa continuou.

É disso que se trata. Reconhecer de maneira proporcional o trabalho de quem ganhou a exceção de pré-executividade com a exclusão de sócia do polo passivo, mas tomando em consideração que a execução fiscal prossegue com todas as possibilidades que existem, inclusive com ganho de causa por parte da Fazenda.

O atual PGFN, Ricardo Soriano, defendeu em seguida que o termo “inestimável” é aplicável neste dispositivo para significar “de enorme valor”.

“O legislador optou por tratar da questão de proveito econômico que não se pode estimar no parágrafo segundo, usando a expressão ‘não sendo possível mensurá-lo’. Não haveria lógica ou boa técnica legislativa se houvesse mera reprise da mesma hipótese do parágrafo segundo no parágrafo oitavo”, afirmou.

Já o representante da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, argumentou que o próprio CPC define os critérios de equidade no parágrafo terceiro, ao fazer o escalonamento dos honorários em percentuais distintos de acordo com o valor da demanda. Assim, para a OAB devem ser respeitados os percentuais definidos na lei.

Ainda, Furtado Coêlho criticou a disparidade de remuneração entre o advogado privado – que defende o contribuinte – e o advogado público – que defende a Fazenda.

Basta que a Fazenda ingresse com uma ação de execução e os honorários são fixados em favor do advogado público em 10%. Mas, se o advogado privado for vencedor da demanda, não quer a União que o advogado receba sequer 1% do valor pleiteado

O relator do caso, ministro Herman Benjamin, votou para negar provimento ao recurso da sócia.

Considerando que haveria pedido de vista logo na sequência, Benjamin não entrou em detalhes sobre o voto e apenas adiantou que afastaria “uma interpretação exclusivamente literal e que não leva em consideração o microssistema como um todo de honorários e critérios de razoabilidade e de Justiça, que são inerentes ao ordenamento jurídico como um todo”.

“Não estamos discutindo favorecer A ou B. O que se quer é efetivamente criar uma solução justa para esta matéria”, afirmou. O julgamento foi suspenso por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi.

 

Fonte: JOTA, de 17/9/2020

 

 

AFPESP: Reforma administrativa é injusta e aprofunda desigualdades

Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP), que tem 246 mil associados, frisa que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 32/2020), que institui novo marco legal para a administração pública, agrava diferenças salariais, privilégios e assimetria de direitos, afetando somente quem ganha menos

O presidente da AFPESP, Álvaro Gradim, salienta que “a proposta do governo encaminhada ao Congresso Nacional é injusta com os servidores que ganham menos, que, de acordo com o texto, serão os que deverão pagar a conta futura da histórica irresponsabilidade fiscal”. Para ele, é incompreensível e inexplicável que as chamadas carreiras de Estado, nas quais se concentram os maiores salários e privilégios, bem como os militares, sigam inatingíveis.

Gradim salienta que o fim da estabilidade nos cargos para novos funcionários concursados é nocivo para o exercício democrático do poder público. “O princípio da estabilidade para numerosas carreiras é exatamente voltado a evitar que cada governo altere o quadro de servidores e instrumentalize a prestação de serviços à população. Há numerosas atividades do Estado que são absolutamente técnicas e não suscetíveis a tendências e influências ideológicas e político-partidárias”.

A reforma administrativa, como está proposta, quebra esse princípio, pondera o presidente da AFPESP. “Para que os governos dos municípios, estados e federal possam contratar, em seus mandatos, profissionais de sua confiança e de notória capacidade técnica para determinadas funções, existem os cargos em comissão, para os quais já não há estabilidade. O que é necessário é muito critério nesse processo, que parece sempre exagerado na administração pública, pois invariavelmente se contrata muito mais gente do que o necessário e com salários mais elevados do que a média do funcionalismo”.

Gradim enfatiza que uma reestruturação salarial, mesmo que para os novos ingressantes, nas chamadas carreiras de Estado e para os cargos em comissão, fim de privilégios, inclusive de parlamentares, redução do número de viagens e outros gastos supérfluos “seriam muito mais eficazes para reduzir o rombo fiscal do que punir literalmente o contingente de servidores que ganha menos e que, no enfrentamento da Covid-19, demonstra com imensa clareza e esforço de superação tudo o que pode fazer para a sociedade”.

Os servidores que serão mais prejudicados são os médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos e todo o pessoal administrativo de hospitais e unidades de atendimento do SUS, que, desde o início da pandemia, estão cuidando dos milhões de brasileiros infectados, salvando vidas e se colocando em risco, pois são sempre grandes suas possibilidades de contágio, como mostram as estatísticas. Outro exemplo são os pesquisadores e cientistas das universidades públicas, muitos inclusive com as bolsas cortadas ou reduzidas por recentes medidas de contenção de gastos, que estão se desdobrando em estudos para desenvolver protocolos de tratamento e medidas de combate ao novo coronavírus.

“São esses, dentre outros, os que arcarão com o rombo fiscal, embora ganhem menos e não tenham os mesmos privilégios daqueles que estão sendo poupados pela proposta de reforma administrativa, um projeto injusto e infrutífero quanto aos objetivos de contribuir para o equilíbrio fiscal”, conclui o presidente da AFPESP.

Fonte: Blog do Servidor, Correio Braziliense, de 16/9/2020

 

 

Poder público como controlador de dados: providências para mitigação de riscos

POR LUCAS COSTA DA FONSECA GOMES E JULIO ROGERIO DE ALMEIDA SOUZA


Lidar com os chamados incidentes de dados (“data breaches”) será, certamente, um dos maiores desafios que os gestores públicos enfrentarão a partir do início da vigência da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD).

Casos recentes[1] revelam que a responsabilização decorrente de falhas de segurança envolvendo dados pessoais são mais frequentes do que se possa imaginar, e suas consequências, além de prejudiciais para os titulares dos dados indevidamente expostos, podem ensejar o pagamento de expressivas indenizações[2].

E, nesse contexto, é bastante delicada a situação da Administração Pública, que tem sob sua responsabilidade inúmeras bases contendo informações pessoais e pessoais sensíveis, obtidas, muitas vezes, de forma compulsória, a exemplo dos dados biométricos coletados para a emissão de documentos ou das informações coligidas com o monitoramento de movimentações financeiras.

Por essas razões, compete aos advogados públicos alertar os gestores para os riscos jurídicos a que estarão cada vez mais expostos, caso não busquem implementar medidas de adaptação às novas regras de proteção de dados.

Assim, uma série de providências tecnológicas, administrativas e jurídicas deverão ser rapidamente adotadas. Medidas como mapeamento de dados (“data mapping”), designação de encarregados pelo tratamento de dados (art. 41 da LGPD) e capacitação dos agentes da cadeia de tratamento são essenciais para o início desse processo de adequação. Também a instituição de boas práticas de gestão e de governança de dados serão essenciais para garantir que os programas, projetos e ações conduzidos pelo Poder Público estejam efetivamente em conformidade com o novo marco regulatório.

Nesta ordem de providências iniciais inclui-se também a necessidade de adequações dos instrumentos que respaldam o tratamento de dados pessoais por terceiros, como importante medida destinada a mitigar riscos.

Com efeito, à exceção de alguns poucos tratamentos que são realizados diretamente por agentes públicos (como as análises feitas por agentes fiscais de renda, por exemplo), a maior parte das operações com dados digitais costuma ser delegada a pessoas privadas, por meio de contratos administrativos ou outros instrumentos congêneres (convênios, contratos de concessão e outras formas de parcerias).

E nada há de errado com essas descentralizações negociais, que estão expressamente autorizadas pelos incisos I e IV do §1º do art. 26 da LGPD[3], dispondo a própria lei que o terceiro contratado, na condição de operador (pessoa que realiza o tratamento de dados pessoais em nome do controlador), responderá solidariamente pelos danos que sua atividade causar quando descumprir as obrigações da legislação de proteção de dados ou quando não tiver seguido as instruções lícitas do controlador (pessoa a quem competem as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais).

Não obstante, nestas relações, os riscos de responsabilização recairão com maior intensidade sobre o Poder Público, pois o tratamento será realizado em seu nome e conforme suas instruções (art. 39 da LGPD), razão pela qual devem ser instituídos vínculos jurídico-obrigacionais capazes de compelir o operador a reforçar cautelas para não violar a legislação de proteção de dados (art. 43, II).

Desse modo, os instrumentos jurídicos que legitimem o acesso, transferência ou compartilhamento desses dados a terceiros devem detalhar as finalidades e os limites do tratamento autorizados; e as responsabilidades do contratado em caso de incidentes de segurança, a partir de matrizes de risco específicas.

Como decorrência, as cláusulas obrigacionais deverão contemplar regras que estabeleçam vedações à utilização dos dados para finalidades diversas, necessidade de eliminação dos dados após o término da execução contratual, adoção de planos de resposta a incidentes e remediação, responsabilidade por prejuízos causados ao contratante etc.

Considerando também o disposto nos arts. 46 e 47 da LGPD, o Poder Público deverá zelar para que seu operador adote medidas de segurança, técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou qualquer forma de tratamento inadequado ou ilícito, observados os padrões técnicos mínimos dispostos pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD, mesmo após seu tratamento.

Para tanto, os contratos ou demais instrumentos cuja execução envolva transferência de dados pessoais deverão descrever os “padrões técnicos” mínimos exigidos para a segurança dos sistemas onde as informações serão processadas e armazenadas, e, enquanto a ANPD não dispuser melhor a respeito (conforme previsto no §1º do art. 46 da LGPD), deverão ao menos espelhar as configurações técnicas mais utilizadas no mercado especializado.

Caso necessário, será também possível exigir que o futuro contratado apresente, para a execução do objeto, certificados de qualidade e segurança de suas técnicas e sistemas[4], valendo mencionar que o mercado já trabalha com certificações de qualidade voltadas especificamente para Sistema de Gerenciamento de Informações de Privacidade (Privacy Information Management System – PIMS), a exemplo da ISO/IEC 27701:2019 (Security techniques — Extension to ISO/IEC 27001 and ISO/IEC 27002 for privacy information management — Requirements and guidelines).

Nas futuras contratações que tenham por objeto o desenvolvimento de soluções tecnológicas e que envolvam coleta e tratamento de dados pessoais (ferramentas, softwares, aplicativos etc.), deve a Administração também zelar para que o produto inclua técnicas de proteção à privacidade desde sua concepção (“privacy by design”), contemplando, sempre que possível, processos de anonimização e mecanismos de configuração que permitam que o tratamento de dados se dê com total respeito aos princípios descritos no artigo 6º da LGPD.

Ademais, pode se mostrar conveniente exigir, na fase de habilitação das licitações envolvendo serviços de Tecnologia da Informação, que os licitantes declarem, sob as penas da lei, que adotam políticas de boas práticas e de governança de dados (art. 50 da LGPD) e se encontram integralmente adequados às regras da LGPD.

A depender, ainda, da sensibilidade dos dados tratados, será recomendável que o controlador elabore o relatório de impacto à proteção de dados pessoais, definido pela LGPD como “documentação do controlador que contém a descrição dos processos de tratamento de dados pessoais que podem gerar riscos às liberdades civis e aos direitos fundamentais, bem como medidas, salvaguardas e mecanismos de mitigação de risco” (art. 5º, XVII).

Outra importante providência que decorre diretamente do disposto no §2º do artigo 26 da LGPD é a de informar à ANPD os contratos, convênios, parcerias e outros ajustes existentes que envolvam a transferência a entidades privadas, com ou sem fins lucrativos, dados pessoais constantes de bases de sua responsabilidade.

Essas providências aqui inicialmente sugeridas certamente serão complementadas à medida em que os programas de governança em privacidade forem implantados pelos entes e entidades integrantes da Administração Pública, em seus respectivos âmbitos de atuação[5], observada também as normas complementares a serem editadas pela ANPD.

É claro que a adequação de todas as bases existentes não ocorrerá de forma imediata, tendo a própria LGPD, em seu art. 63, delegado à ANPD a expedição de normas sobre a adequação progressiva de bancos de dados constituídos até a data da entrada em vigor da lei.

Sem prejuízo, quanto mais rapidamente forem adotadas medidas para proteger os direitos dos cidadãos que confiaram seus dados à Administração Pública, mais chances ela terá de ver ilidida ou atenuada sua responsabilidade pelos incidentes que ocorrerão sob a égide da LGPD.

[1] Segundo levantamentos do escritório de advocacia DLA Piper, desde que a GDPR entrou em vigor, até 27 janeiro de 2020, a autoridade supervisora de proteção de dados europeia já havia recebido mais de 160 mil notificações de incidentes envolvendo dados pessoais (cf. https://www.dlapiper.com/en/uk/insights/publications/2020/01/gdpr-data-breach-survey-2020/).

[2] A exemplo do caso da agência de crédito privada Equifax, que em razão de um ataque cibernético que expôs informações pessoais de aproximadamente 150 milhões de cidadãos americanos, fechou um acordo coletivo que lhe custará 1,38 bilhões de dólares (cf. https://www.equifaxbreachsettlement.com/admin/services/connectedapps.cms.extensions/1.0.0.0/1be77f52-dd4f-410e-8128-b3d636e66486_1033_Amended_Final_Approval_Order_(3.17.2020).pdf). Outro caso emblemático recente foi o que envolveu dados de 88 mil pacientes do hospital americano Grays Harbor Community Hospital, resultando em acordo para pagamento de 185 milhões de dólares à título de compensação às vítimas (cf. https://ghchsettlement.com/wp-content/uploads/2020/08/Proposed-Final-Order-and-Judgement.pdf). No Brasil, onde a cultura de proteção de dados ainda é incipiente, a Netshoes assinou um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público do Distrito Federal, em janeiro de 2019, se comprometendo a pagar 500 mil reais, a título de indenização por danos morais coletivos em razão de um incidente de segurança que comprometeu dados pessoais de quase 2 milhões de clientes (cf. https://www.mpdft.mp.br/portal/pdf/tacs/espec/TAC_Espec_2019_001.pdf).

[3] Dispõe o §1º do art. 26 da LGPD ser vedado ao Poder Público transferir a entidades privadas dados pessoais constantes de bases de dados a que tenha acesso, exceto em casos de execução descentralizada de atividade pública que exija a transferência, exclusivamente para esse fim específico e determinado, ou “quando a transferência for respaldada em contratos, convênios ou instrumentos congêneres”.

[4] As Cortes de Contas, via de regra, apenas não aceitam que essas certificações sejam exigidas como requisito de habilitação ou critério para a qualificação de propostas em licitações, a exemplo das decisões tomadas nos Acórdãos 1085/2011 e 539/2015, ambos do plenário do TCU.

[5] O Decreto Federal nº 10.046, de 9 de outubro de 2019, regulamentou a governança no compartilhamento de dados no âmbito da administração pública federal e instituiu o Cadastro Base do Cidadão e o Comitê Central de Governança de Dados. Já no Estado de São Paulo, o Decreto nº 64.790, de 13 de fevereiro de 2020, instituiu a Central de Dados do Estado de São Paulo – CDESP, a Plataforma Única de Acesso – PUA e o Comitê Gestor de Governança de Dados e Informações do Estado de São Paulo.

LUCAS COSTA DA FONSECA GOMES – Procurador do Estado de São Paulo

JULIO ROGERIO DE ALMEIDA SOUZA – Procurador do Estado de São Paulo. Chefe da Consultoria Jurídica da Secretaria da Segurança Pública. Pós-graduado em Direito do Estado, pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, e em Direito Privado, pela Universidade Cândido Mentes.

 

Fonte: JOTA, de 17/9/2020

 

 

Comunicado do Centro de Estudos

O Procurador Chefe do Centro de Estudos - Escola Superior da Procuradoria-Geral do Estado comunica que estão abertas as inscrições para participação na Aula 03: A ansiedade na quarentena. Como controlar o tempo no teletrabalho? do Módulo I do Programa de Formação Continuada e Aperfeiçoamento dos Servidores da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo sobre “Os desafios trazidos pela crise do novo coronavírus”, promovido pelo Centro de Estudos da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo.

Clique aqui para o anexo

 

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 17/9/2020

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