17/2021

Relator recomenda aprovação da reforma administrativa na CCJ

O relator da reforma administrativa (PEC 32/20) na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara, deputado Darci de Matos (PSD-SC), protocolou nesta semana parecer em que defende a admissibilidade da proposta, com a exclusão de dois itens. Ele propõe a retirada da parte que proíbe que servidores ocupantes de cargos típicos de Estado possam exercer qualquer outra atividade remunerada.

A leitura do parecer de Darci de Matos, pela admissibilidade da proposta, será nesta segunda-feira (17).

Segundo o parecer de Matos, o trecho “impede, a título de exemplificação, que determinado ocupante de cargo típico de Estado possa exercer uma atividade remunerada de músico, mesmo que essa atividade não comprometa sua jornada e suas atividades no cargo público”, o que feriria a previsão constitucional do livre exercício de qualquer trabalho.

O outro ponto que Darci de Matos sugere seja retirado estabelece que o presidente da República possa extinguir entidades da administração pública autárquica e fundacional. Para o relator, o trecho não pode ser admitido do ponto de vista constitucional, pois as “entidades desempenham atividades administrativas de forma descentralizada; elas são vinculadas — e não subordinadas — aos ministérios, e possuem personalidade jurídica própria”.

Darci de Matos afirma, ainda, que “a possibilidade de extinção dessas entidades por decreto do chefe do Poder Executivo acarretaria grave alteração no sistema de pesos e contrapesos, característico do modelo de separação de poderes”. Debate

Na oitava e última audiência da série de debates que a CCJ promoveu sobre a reforma administrativa, representantes dos servidores voltaram a criticar a proposta do governo. Defensores da reforma afirmaram que o objetivo é garantir mais racionalidade e eficiência ao serviço público.

A proposta restringe a estabilidade no serviço público e cria cinco tipos de vínculos com o Estado. O texto estabelece que leis complementares tratarão de temas como política de remuneração, ocupação de cargos de liderança e assessoramento, progressão e promoção funcionais e definição dos cargos típicos de Estado.

Conheça a proposta do governo para a reforma administrativa

Na audiência pública, a diretora jurídica da Federação Nacional de Sindicatos de Guardas Municipais do Brasil, Rejane Soldani Sobreiro, afirmou que a proposta faz com que o serviço público atue na “sobra do mercado” e pode entregar a segurança pública a entes privados. “A PEC 32 prevê um risco iminente de terceirização e extinção das guardas municipais em todo o País", alertou.

Ela lamenta que a proposta preveja terceirização quase total de toda a atividade do Estado e citou trecho do relatório apresentado por Darci de Matos para reforçar sua preocupação: "O dispositivo autoriza a contratação de empresas privadas, ONGs, entre outros, para realizar o trabalho que hoje é realizado somente por servidores públicos", ressaltou.

O relator, Darci de Matos, contestou, afirmando que seu relatório não permite que trabalhadores privados exerçam atividades que são restritas a servidores de carreiras típicas de Estado. "Em momento algum, isso não procede. É só ler com atenção a PEC. E muito menos na área da segurança pública, que é a área dos guardas municipais", esclareceu.

Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a proposta tem impactos negativos inclusive para os trabalhadores que já estão no serviço público. Ela acredita que, ao acabar com a estabilidade, a reforma vai levar à extinção de cargos. “Ao se extinguir cargos, quem está aposentado com paridade não tem mais referência para elevar seu salário. Suas aposentadorias ficam congeladas. Além disso, no regime de previdência, você deixa de ter a contribuição dos novos servidores para o regime atual”, afirmou.

Doutor em Direito Administrativo, Guilherme Carvalho, por outro lado, defendeu que, de modo geral, os impactos da proposta são positivos. “Justamente porque racionaliza, efetiva e concede sobretudo uma maior eficiência, clamada pela sociedade, em relação à prestação do serviço público”, disse.

A CCJ não avalia o mérito, ou seja, o conteúdo da proposta, e sim outros aspectos, como, por exemplo, se o texto está de acordo com a Constituição Federal. Depois de passar pelo colegiado, a reforma administrativa ainda precisa ser analisada por uma comissão especial e pelo Plenário, em dois turnos de votação.

 

Fonte: Agência Câmara de Notícias, de 17/5/2021

 

 

Prazo de dez anos para anulação de atos administrativos no Estado de São Paulo é inconstitucional

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou dispositivo da lei paulista que estabelece o prazo de dez anos para anulação de atos administrativos declarados inválidos pela administração pública estadual. Na sessão virtual encerrada em 12/4, o colegiado julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6019, ajuizada pela Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) e, na sessão finalizada na terça-feira (11/5), o Tribunal modulou os efeitos da decisão.

Princípio da igualdade

Prevaleceu, no julgamento, o voto do ministro Luís Roberto Barroso, segundo o qual o prazo decenal previsto na Lei estadual 10.177/1998, que regula o processo administrativo no âmbito da administração pública paulista, afronta o princípio da igualdade. Barroso explicou que o prazo de cinco anos se consolidou como marco temporal geral nas relações entre o poder público e particulares, e o STF somente admite exceções ao princípio da isonomia quando houver necessidade de remediar um desequilíbrio específico entre as partes.

O ministro destacou que os demais estados aplicam, indistintamente, o prazo de cinco anos para anulação de atos administrativos com efeitos favoráveis aos administrados, por previsão em lei própria ou por aplicação analógica do artigo 54 da Lei 9.784/1999, que rege o processo administrativo no âmbito federal. "Não há fundamento constitucional que justifique a situação excepcional do Estado de São Paulo, justamente o mais rico e, certamente, um dos mais eficientes da federação”, assinalou.

Seguiram esse entendimento os ministros Nunes Marques, Edson Fachin, Gilmar Mendes e Luiz Fux (presidente) e as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia.

Efeitos

A modulação dos efeitos também seguiu o voto do ministro Barroso, no sentido de manter as anulações já realizadas até a publicação da ata do julgamento de mérito (23/4), desde que tenham observado o prazo de dez anos. O prazo de dez anos será aplicado aos casos em que, em 23/4, já tenha transcorrido mais da metade do tempo fixado na lei declarada inconstitucional (aplicação, por analogia, do artigo 2.028 do Código Civil). Para os demais atos administrativos já praticados, o prazo decadencial de cinco anos deve ser contado a partir da publicação da ata do julgamento de mérito.

Ao propor a modulação, Barroso destacou que a ADI foi ajuizada duas décadas após a entrada em vigor do dispositivo questionado, que vem sendo aplicado desde então pela administração estadual. A declaração de nulidade, com efeitos retroativos, acarretaria enorme insegurança jurídica e poderia resultar no refazimento de milhares de atos administrativos cuja anulação já se consolidou no tempo, “em ampla e indesejável litigiosidade nas instâncias ordinárias e em provável impacto econômico em momento de grave crise financeira no país”.

Vencidos

O relator da ADI, ministro Marco Aurélio, também votou pela procedência da ação, mas ficou parcialmente vencido. Ele entende que a regra trata de Direito Civil, matéria de competência privativa da União, e fere o princípio da razoabilidade. Já os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli ficaram integralmente vencidos, ao votarem pela improcedência do pedido.

Na modulação, ficou vencido o ministro Marco Aurélio. O ministro Nunes Marques acompanhou o ministro Barroso com ressalvas.

 

Fonte: site do STF, de 14/5/2021

 

 

Procuradorias dos estados podem prevenir esquemas de corrupção, diz líder da Anape

Com procuradorias fortes, os estados podem prevenir esquemas de superfaturamento e desvio de dinheiro público, uma vez que os advogados estatais avaliam os contratos antes de eles serem celebrados. E o trabalho preventivo é mais eficaz do que o repressivo na luta contra a corrupção. Essa é a opinião de Vicente Braga, presidente da Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape).

Braga afirma que as procuradorias têm exclusividade na concessão de consultoria jurídica aos estados. Assim, ele critica as tentativas de governadores de atribuir tal função jurídica a outros órgãos. A seu ver, a medida facilitaria o caminho para políticos mal-intencionados promoverem desvios de recursos públicos.

Porém, o presidente da Anape critica a responsabilização de procuradores por pareceres jurídicos. Os advogados estatais só devem responder em caso de dolo ou fraude, opina.

Em entrevista à ConJur, Vicente Braga também defendeu a possibilidade de procuradores exercerem a advocacia privada e ressaltou a importância da autonomia e da unicidade para a categoria.

Leia a entrevista:

ConJur — Quais são as principais preocupações das procuradorias e da Anapee no momento?
Vicente Braga — Há duas, três grandes preocupações. Podemos citar a questão da unicidade, que é um princípio que o Supremo vem reconhecendo a sua existência no artigo 132 da Constituição Federal, reconhecendo a competência exclusiva para procuradores de Estado exercerem a representação judicial e consultoria jurídica dos seus respectivos estados. Então esse é um dos principais temas nossos, porque com ele nós conseguimos avançar em subtemas. Um deles é a questão do combate à corrupção. A partir do momento que se tem a procuradoria de Estado sendo refeita, a assessoria jurídica dos estados sendo feita por procuradores aprovados em concurso público, rígido, sério, é possível verdadeiramente ter uma advocacia de Estado, e não advocacia de governo. E isso permite que os procuradores tenham condições de, por exemplo, apresentar pareceres em processos licitatórios sem interferência política, sem interferência de gestores que não são bem intencionados com a coisa pública. Acaba sendo a primeira trincheira no combate à corrupção.

A autonomia também é uma bandeira muito importante. A partir do momento que se tem um procurador do estado com autonomia técnica garantida, com a procuradoria com autonomia financeira, autonomia de gestão, acaba se tendo uma maior segurança para a sociedade, uma melhor correição da aplicação da efetivação das políticas públicas. Procurador do estado não escolhe políticas públicas, ele ajuda na sua implementação, mas ele pode muito bem fazer um parecer, dar a sua opinião jurídica e falar para o gestor que tal política pública está equivocada, que não será tão boa para a sociedade.

ConJur — Como as procuradorias vêm atuando na epidemia do coronavírus?
Braga — Em alguns estados, vêm ocorrendo operações da Policia Federal. Por coincidência ou não, nesses estados a procuradoria tem tido uma atuação mínima nos procedimentos de dispensa de licitação para a contratação de serviços, compras de equipamentos e aí em diante. Temos estado em que o primeiro ato de um procedimento administrativo foi o ato de compra do aparelho, o ato de compra. Isso não existe. Tivemos estados, como já é público e notório no Rio de Janeiro, em que houve compra de cestas básicas durante a pandemia para atender à população mais carente em que foi constatado superfaturamento, desvio de recursos. E esse processo não passou pela procuradoria do estado, quando deveria ter passado. Na maioria dos estados que estão enfrentando problemas, os processos correram frouxos, sem supervisão técnico-jurídica, sem o olho de um procurador do estado buscando dar uma maior qualidade para a contratação. Mas infelizmente nós acabamos tendo memória curta para isso. A "lava jato" não tem dez anos; 2014 foi quando ela começou a estourar, e muitos já não se lembram dela. A pandemia pode muito bem cair no esquecimento. O legado que ela vai deixar pode não ser um legado de aprendizado, mas um legado de destruição do patrimônio público, destruição de uma economia por uma má gestão da coisa pública.

ConJur — Em casos de improbidade administrativa, muitas vezes o procurador que deu o parecer é condenado junto com os gestores públicos. Como evitar que os procuradores sejam responsabilizados por isso? E em que situações eles podem ser responsabilizados por suas opiniões jurídicas?
Braga — Há as hipóteses legais em que procurador pode ser responsabilizado por sua opinião jurídica. Na visão da Anape, as hipóteses são bem claras: dolo ou fraude. Ocorrendo uma conduta dolosa de um colega procurador na emissão de um parecer, ele deve si ser responsabilizado. Ocorrendo uma fraude, ele deve, sim, ser responsabilizado. O que nos preocupa é querer colocar o erro grosseiro como uma hipótese também. Porque o erro grosseiro é muito subjetivo. O que é erro grosseiro para um não é para outro. Então nos preocupa uma má interpretação do conceito de erro grosseiro, de o que seria erro grosseiro. Porque todos têm o direito a ter uma opinião jurídica. O que hoje não é um erro grosseiro amanhã pode vir a ser, e um colega que deu uma opinião jurídica baseada em um suposto entendimento pode vir a ser prejudicado e ter medo de dar opinião para não ser responsabilizado. Os magistrados e integrantes do Ministério Público respondem por atitudes cometidas com dolo ou fraude, mas não respondem por atitudes cometidas por erro grosseiro. Então os procuradores também não devem responder, pois também exercem funções essenciais à justiça.

ConJur — Procuradores têm exclusividade na consultoria jurídica dos estados?
Braga — A exclusividade diz respeito apenas às procuradorias de Estado. E tem só no papel, na prática não tem. Quase todos os estados brasileiros tentam usurpar as atribuições dos procuradores. E quase todas as procuradorias já acionaram o Supremo Tribunal Federal para coibir essa prática, que traz um prejuízo imenso para a sociedade. Porque muitas vezes esses cargos são utilizados como cabide de emprego, para beneficiar quadros políticos que têm interesse na manutenção dessa estrutura. Essa é a grande verdade. O Supremo Tribunal Federal já decidiu esse tema mais de dez vezes, reconhecendo a competência exclusiva dos procuradores para representação judicial e consultoria jurídica dos estados. Mas as decisões seguem sendo desrespeitadas.

ConJur — Qual é a intenção por trás dessas iniciativas para atribuir a outros órgãos o poder de dar consultoria jurídica?
Braga — Para o político mal-intencionado, a intenção é esvaziar as atribuições da procuradoria para que ele não tenha um comando jurídico efetivo e diligente. Para o gestor que não tem compromisso com a coisa pública, que quer praticar atos não republicanos, é muito mais fácil não ter uma procuradoria estruturada, bem aparelhada, que busque coibir de forma preventiva os atos que são praticados por gestores mal-intencionados. E muitas vezes eles querem esses cargos de assessoria para colocar de cabide de emprego, para troca de favor político. Esse também é um dos motivos.

O Tribunal de Contas da União tem estudos que mostram que, de cada R$ 10 de patrimônio público desviado, R$ 0,10 conseguem ser recuperados. E o custo da recuperação desses valores é superior aos R$ 0,10. A Anape vem buscando mostrar que o trabalho repressivo é útil para tentar criar um medo no gestor público, mas a “lava jato” está mostrando que os gestores não aprenderam esse ensinamento. E nós temos mostrado que um trabalho preventivo é muito mais efetivo. Ele traz um índice de retorno para as sociedades muito maior que o repressivo. Ele é muito mais barato, porque evita que o dinheiro saia dos cofres públicos, e depois que sai, para resgatá-lo ou recuperá-lo é difícil demais, se não for impossível. Então o trabalho preventivo é muito mais eficiente, muito mais barato, e tem um retorno muito maior para a sociedade. E esse trabalho preventivo é feito pelas consultorias jurídicas, que devem ser feitas por procuradores do estado.

ConJur — Em diversos estados, procuradores também podem advogar. O senhor é a favor de advogado público também poder atuar na área privada? Ou isso compromete a sua atuação como procurador?
Braga — Nós chamamos isso de “advocacia plena”. Nós somos advogados antes de qualquer coisa e nos submetemos a um concurso público rigoroso, dificílimo, para podermos também exercer a advocacia em favor do estado. A partir do momento que temos a aprovação, nós temos uma garantia do estado que a gente vai poder ter uma advocacia plena. Não sendo apenas advogados exclusivos do estado, podemos exercer a advocacia em favor de particulares. E isso é uma prerrogativa que é dada por alguns estados para que eles possam segurar bons advogados dentro dos seus quadros. O que seria da advocacia pública sem o ministro do STF Luís Roberto Barroso como procurador do estado do Rio de Janeiro, sem o professor Diogo Figueiredo de Moreira Neto como procurador do estado do Rio de Janeiro, sem os professores José Afonso da Silva e Maria Silva Zanella de Pietro, procuradores do estado de São Paulo na época em que os ocupantes do cargo podiam advogar — hoje não é permitido? Há excelentes quadros na advocacia pública que lá ficaram por terem essa prerrogativa. Caso contrário, não tenha dúvida que eles teriam ido para outras carreiras. Então a Anape defende a advocacia plena como uma forma de se ter bons quadros dentro das carreiras, permitir que um advogado bem sucedido no estado do Ceará queira permanecer como advogado público também e não queira migrar para uma carreira de magistratura pública federal, Ministério Público Federal ou apenas para a advocacia privada.

E não há conflito de interesses, porque há uma vedação expressa de advogar contra o ente que te remunera. Se isso é proibido, o procurador não tem como usar essas informações a seu favor. E se for o caso de o procurador usar essas informações para fins privados, deverá ser investigado pela corregedoria e, se for o caso, demitido.

ConJur — Há quem pense que procurador de estado não deveria poder exercer cargos políticos. O que o senhor pensa sobre esse assunto?
Braga — Os cargos políticos devem ser exercidos por todo e qualquer cidadão. Nós temos o direito de votar e ser votados. Não seria justo fechar a porta para uma pessoa que tem compromisso com a coisa pública e tem interesse de seguir uma carreira política no sentido de tentar ser eleito para um mandato eletivo. Por que o médico que atua em um hospital público pode ser candidato, um professor de escola pública pode ser candidato e um procurador não poderia vir a ser? Não há motivo para uma vedação.

ConJur — O novo Código de Processo Civil dá bastante ênfase à conciliação e à mediação. Os procuradores dos estados têm autonomia para negociar em cima de dinheiro público?
Braga — Isso vai variar de estado para estado, de município para município. Via de regra, os estados que estão permitindo, que estão criando as câmaras de conciliação e mediação e até mesmo de arbitragem nas respectivas procuradorias têm editado lei colocando margens de negociação. Se a pessoa ou empresa deve X mil ao estado, a negociação pode ser feita dentro de uma certa margem legal; se deve Y, a margem é outra. Esse é o futuro. Os métodos autocompositivos de solução de conflitos são o futuro. O Judiciário não consegue dar conta dos inúmeros e inúmeros conflitos que surgem diariamente na sociedade.

ConJur — Há quem aponte que as execuções fiscais são as grandes vilãs da morosidade do Judiciário. Tais críticos argumentam que como as execuções fiscais não possuem mais litígio, elas deveriam poder ser resolvidas extrajudicialmente. O que o senhor pensa dessa análise?
Braga — Eu concordo, desde que essa cobrança extrajudicial seja feita por meio de um procurador do estado, que é quem tem competência para representar o ente na cobrança da dívida ativa. A execução fiscal realmente é um gargalo muito grande na justiça. O índice de congestionamento de execução fiscal é um absurdo. Nos estados, quase 95% das dívidas inscritas na dívida ativa são representadas por ICMS, e quase todas são dívidas irrecuperáveis. Mas é preciso executar. Se não executar, pode ter problema com o Tribunal de Contas. Então acaba abarrotando o Judiciário com dívidas que sabidamente não serão recuperadas. Se você tiver uma melhor gestão de dívida ativa, saber os créditos que podem ser recuperados, é possível conseguir recuperar melhor.

ConJur — Há quem diga que períodos de crise fiscal, como o que o país vem atravessando, fragilizam a defesa de contribuintes, porque os estados buscam arrecadar a qualquer custo. O que o senhor pensa dessa avaliação?
Braga — Não é dessa forma. A busca em arrecadar o tributo se dá quando se tem a ocorrência de um fato gerador. A partir do momento que se tem um fato gerador, por exemplo, de ICMS, que é a compra e venda de uma mercadoria, o Estado tem o direito de cobrar o tributo, e o contribuinte tem o dever de pagar o tributo. Não existem apenas direitos fundamentais, mas também deveres fundamentais. O cidadão tem que contribuir para que o Estado consiga fazer uma sociedade cada vez mais fortalecida. Então, mesmo em um momento de pandemia, se há fragilidade de um setor econômico, o Estado tem a obrigação, se não for um Estado liberal, se não for um Estado mínimo, se for um Estado social, de socorrer essas empresas, de dar uma ajuda, dar um fôlego para que elas possam passar por um momento de crise e, voltar à sua normalidade, elas possam se recuperar. Ao enforcar ainda mais aquele que já está morrendo, não se consegue nada e acaba matando a empresa, matando o contribuinte financeiramente, e o Estado deixa de arrecadar. É muito melhor dar um fôlego para o contribuinte, para que ele possa se recuperar e depois o Estado possa resolver os tributos que ficaram em aberto. O governo não está ali para sufocar ninguém. O governo está ali para ajudar no que for preciso.

ConJur — O senhor é a favor da PEC da Autonomia, que reconhece a autonomia técnica, administrativa, orçamentária e financeira das carreiras da advocacia pública?
Braga — Sou 100% favorável. Isso para é fundamental para que nós possamos fazer a defesa da sociedade e da democracia como devemos fazer. A autonomia é uma prerrogativa inerente ao servidor, ao procurador do estado. Não queremos autonomia para dar aumento salarial para procurador. Queremos autonomia para podermos exercer as nossas atribuições de acordo com as nossas consciências, de acordo com o que a legislação determina. Não queremos autonomia para termos privilégios. Queremos autonomia para termos uma prerrogativa de defender a sociedade sem qualquer interferência política externa.

ConJur — Como o senhor avalia a reforma administrativa que está em discussão?
Braga — A Anape não é contra a reforma administrativa por ser contra. A Anape é contra a reforma administrativa que foi apresentada pelo governo federal, que é injusta em vários pontos. Não se pode precarizar o serviço público, não se pode sucatear o serviço público. Não se pode deixar o serviço público tão desinteressante que ele vai ser exercido apenas por burocratas. Nós temos que ter um serviço público com pessoas qualificadas, interessadas e comprometidas com a coisa pública. Para ter isso, é preciso que o serviço público seja atraente. Se não for, as pessoas vão migrar para o setor privado, não vão ter interesse de ocupar uma função pública, por todos os ônus que ela carrega. Então a Anapee trabalha por uma reforma administrativa justa, que não tire prerrogativas, que não promova retrocessos. As prerrogativas não são do procurador, não são do servidor, são da sociedade acima de qualquer coisa. Nós precisamos de prerrogativas para desempenhar nossas funções sem medo de interferência externa, sem medo de interferência política. Nós acreditamos que o Congresso Nacional, no momento adequado, irá aprimorar essa reforma administrativa, torná-la justa e evitar que o serviço público seja precarizado, seja sucateado.

Fonte: Conjur, de 15/5/2021

 

 

Estado não pode dificultar acesso a medicamentos de alto custo, diz TJ-SP

Por Tábata Viapiana

O artigo 196 da Constituição Federal estabelece como dever do Estado a prestação de assistência à saúde e garante o acesso universal e igualitário do cidadão aos serviços e ações para sua promoção, proteção e recuperação. O direito à saúde, como está assegurado na Carta, não deve sofrer embaraços impostos por autoridades administrativas, no sentido de reduzi-lo ou de dificultar o acesso a ele.

O entendimento é da 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo ao manter sentença de primeiro grau que determinou ao estado de São Paulo o fornecimento de três medicamentos de alto custo a uma paciente com hepatite C crônica.

No recurso, o governo de São Paulo alegou que a responsabilidade pela compra dos remédios solicitados seria da União, cabendo aos estados apenas a distribuição. No entanto, o relator, desembargador Ricardo Dip, citou entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a responsabilidade solidária dos entes federados na prestação de tratamento médico.

"Versando a espécie caso de medicações tidas por de urgente ministração, o ingresso de outros entes políticos na demanda com remessa dos autos à Justiça Federal não pode ensejar o atraso da solução da lide, em risco de prejuízo irreparável para a impetrante. Isso tanto mais se há de considerar quanto se tenha em vista que a solidariedade de devedores é benefício do credor, a quem incumbe escolher contra quem demandar", afirmou.

De acordo com o relator, trata-se de uma responsabilidade do próprio Estado por inteiro. Ele também afirmou que, futuramente, o Estado de São Paulo poderá, se assim desejar, pleitear o ressarcimento dos gastos com os remédios da autora da ação.

"A separação de poderes ou funções da soberania política não afastam do Judiciário a competência para a apreciação de possível lesão de direito individual, objeto da espécie. Não há maltrato, neste âmbito, do princípio da conformidade funcional com a incidência normativa em pauta. Não é de admitir que, no aventável confronto entre o bem jurídico vida e os interesses político- administrativos, prevaleçam estes àquele", completou.

I Diritti della personalità

Dip também embasou a decisão em relatório médico anexado aos autos que comprova o diagnóstico e os medicamentos indicados para o tratamento da paciente. Ele destacou ainda que o Estado não contestou os documentos e, por isso, considerou haver prova suficiente, quanto à matéria de fato, para escorar o ajuizamento da demanda.

"Adriano de Cupis, no merecidamente clássico I Diritti della personalità, lecionou que a tutela complementar da vida, da integridade física e da saúde reclama a garantia dos meios econômicos e financeiros idôneos a prover os cuidados necessários à preservação ou reintegração desses bens da personalidade, e observou que o Estado se obriga a assegurar o fornecimento desses meios para tornar possível a gratuidade da cura dos necessitados", concluiu. A decisão foi unânime.

1060052-53.2018.8.26.0053


Fonte: Conjur, de 14/5/2021

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