16/2/2024

Ente federado pode cobrar do plano de saúde despesa realizada com segurado por ordem judicial

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a Lei 9.656/1998 permite que os entes federados, ao cumprirem diretamente ordem judicial para prestar atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), possam requerer na Justiça o ressarcimento das despesas pela operadora do plano de saúde privado do qual o paciente seja segurado.

Com esse entendimento, o colegiado determinou que uma operadora ressarcisse o Estado do Rio Grande do Sul pela cirurgia bariátrica de uma segurada, realizada em cumprimento de decisão judicial. Segundo o processo, após verificar que a paciente possuía plano de saúde, o ente público procurou a operadora para reaver o valor do procedimento. Sem êxito nessa tentativa, ajuizou ação de cobrança.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), contudo, ao examinar o artigo 32 da Lei 9.656/1998, compreendeu que somente poderiam ser objeto de reembolso os serviços prestados voluntariamente no âmbito do SUS, e não aqueles realizados por força de ordem judicial. A corte também decidiu que o ente federado não poderia ser considerado credor, mas apenas o Fundo Nacional de Saúde (FNS).

Lei não faz ressalva quanto ao cumprimento de ordem judicial

O relator do caso no STJ, ministro Gurgel de Faria, lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já declarou a constitucionalidade do artigo 32 da Lei 9.656/1998, no julgamento do Tema 345. "Verifica-se que não há na fonte normativa nenhuma ressalva quanto ao ressarcimento nas hipóteses em que os serviços do SUS sejam realizados em cumprimento a ordem judicial", disse.

Na sua avaliação, o artigo admitiu, de maneira ampla, a possibilidade de ressarcimento do serviço prestado em instituição integrante do SUS, independentemente de execução voluntária ou de determinação judicial.

Ente pode cobrar valor diretamente de operadora de saúde

O relator considerou possível o Estado do Rio Grande do Sul ajuizar a ação para cobrar diretamente o valor da cirurgia, não dependendo de procedimento administrativo na Agência Nacional de Saúde (ANS) – rito previsto na lei para os casos em que o paciente, segurado de plano privado, por razões de urgência ou emergência, usufrui de serviço do SUS.

Nesses casos, explicou, cabe à Agência Nacional de Saúde (ANS) – na via administrativa, seguindo as normas infralegais que disciplinam a matéria – definir o acertamento do serviço prestado, calcular o valor devido, cobrar o ressarcimento da operadora de saúde, recolher os valores ao FNS e, posteriormente, compensar o ente público que arcou com os custos.

Segundo Gurgel de Faria, quando o procedimento decorre de determinação da Justiça, não faz sentido seguir o rito administrativo por via da ANS, pois a própria ordem judicial para prestação do serviço do SUS já traz implicitamente os elementos necessários ao ressarcimento em favor do ente público que a cumpriu.

"O procedimento administrativo (protagonizado pela ANS e com destinação final ao FNS) é uma das vias de ressarcimento – a prioritária, que atende os casos ordinários –, mas não é o único meio de cobrança. Ele não exclui a possibilidade de que o ente federado, demandado diretamente pela via judicial, depois se valha da mesma via para cobrar os valores que foi obrigado diretamente a custear", concluiu.

 

Fonte: site do STJ, de 16/2/2024

 

 

STF invalida lei do TO que criou cobrança sobre operações destinadas a outros estados e ao exterior

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucionais dispositivos de lei tocantinense que impunham aos produtores do estado o pagamento de um adicional sobre o imposto de operações envolvendo a saída de produtos de origem vegetal, mineral ou animal ao exterior ou a outros estados. A decisão unânime foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6365, em sessão virtual encerrada em 9/2.

A Lei estadual 3.617/2019 previa que os produtores locais pagassem 0,2% sobre o valor das operações de saídas interestaduais ou com destino a exportação desses produtos para compor o Fundo Estadual de Transporte (FET). A Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), autora da ação, argumentou, entre outros pontos, que o estado teria instituído um “adicional camuflado” do ICMS com receita vinculada, violando princípios como a vedação da vinculação de receitas de impostos, a imunidade tributária das operações de exportação, a isonomia tributária e as determinações constitucionais a respeito da política agrícola, por elevar o custo da produção.

Em informação prestada nos autos, o governo do estado alegou que a cobrança não configuraria tributo, mas preço público cobrado em razão do uso de rodovias estaduais.

Imposto

Em seu voto pela procedência do pedido, o ministro Luiz Fux (relator) observou que a cobrança apresenta características de imposto, pois incide compulsoriamente sobre os contribuintes e não se vincula a qualquer atividade estatal. Ele explicou que o tributo em questão possui fato gerador (operações de saída de produtos de origem vegetal, mineral ou animal) e base de cálculo (valor destacado no documento fiscal) idênticos aos do ICMS. E, de acordo com o artigo 155 da Constituição Federal, cabe a resolução do Senado Federal estabelecer as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação. "Não podem os estados-membros criar adicionais sobre as alíquotas interestaduais do ICMS", afirmou.

O ministro ressaltou, ainda, que a Constituição Federal veda a vinculação da receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, salvo nas hipóteses expressamente nela previstas. Além disso, a base de cálculo não guarda relação com eventuais custos de manutenção das rodovias estaduais utilizadas para o escoamento da produção. Por fim, Fux explicou que o adicional incide inclusive a saída de mercadorias com destino à exportação, situação que afronta regra constitucional que estabelece imunidade em relação ao ICMS para as operações que destinem mercadorias ao exterior.

 

Fonte: site do STF, de 16/2/2024

 

 

Aumento do limite para RPV permite complementar valores cobrados, decide STJ

A elevação do limite previsto em lei para pagamento de requisição de pequeno valor (RPV) permite que o credor faça a complementação da cobrança.

Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a um recurso para permitir que um credor do governo do Distrito Federal altere cobrança feita por meio de RPV.

As requisições de pequeno valor são uma espécie de pedido de pagamento feito a um ente público que foi condenado por meio de uma ação judicial — no caso, o governo do DF.

Esse pagamento pode ser feito por meio de precatórios, que entram em uma lista cronológica para pagamento, ou de RPV, desde que os valores se enquadrem em um limite estabelecido pelo próprio governo.

No DF, esse limite era de dez salários mínimos, de acordo com a Lei Distrital 3.624/2005. O autor da ação expediu a RPV levando em consideração esse montante.

Posteriormente, a Assembleia Legislativa do DF aprovou a Lei Distrital 6.618/2020, aumentando o limite para 20 salários mínimos. Foi então que o credor pediu a complementação da RPV.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) negou o pedido por entender que a lei de 2020 era inconstitucional. Segundo a corte, esse tema relativo às finanças públicas era de competência exclusiva do chefe do Poder Executivo — o governador do Distrito Federal.

No STJ, a 1ª Turma reverteu a decisão do TJ-DF. O colegiado considerou a lei distrital constitucional, pois apenas alterou o limite para expedição de RPV, sem mexer em temas da prerrogativa do governador.

E, ao julgar o mérito do pedido, entendeu lícito o pedido de complementação da RPV, tendo em conta o novo limite de 20 salários mínimos, conforme a jurisprudência do próprio STJ.

Complementação possível

Relatora da matéria, a ministra Regina Helena Costa explicou que o veto à complementação criaria uma situação injusta, em que pessoas titulares de quantias equivalentes seriam tratadas de maneiras distintas apenas de acordo com o momento em que expediram a RPV.

Quem fez o pedido antes da lei de 2020 precisaria aguardar maior tempo para receber os valores, disse a ministra, enquanto os mais recentes estariam sujeitos a forma mais célere de satisfação da dívida.

A magistrada também explicou que não se aplica ao caso o precedente do Supremo Tribunal Federal no Tema 792 da repercussão geral, em que ficou decidido que a lei que diminui teto de RPV não pode retroagir.

“Tal entendimento não incide quanto à Lei Distrital 6.618/2020 a qual ampliou o referido patamar no âmbito do Distrito Federal, legislação imediatamente aplicável para efeito de complementação dos valores dos créditos alimentícios”, concluiu ela.

RMS 71.141

 

Fonte: Conjur, de 16/2/2024

 

 

SP quer controle de qualidade com punições na tarifa após venda da Sabesp

 

O contrato de concessão dos serviços de saneamento dos municípios paulistas com a Sabesp sob administração privada terá mecanismos de controle de qualidade que afetarão as tarifas pagas pelo consumidor, anunciou o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) nesta quinta-feira (15).

Além disso, o governo propõe um modelo em que os investimentos necessários só serão incorporados às contas dos consumidores após sua conclusão.

A venda da companhia paulista de saneamento é considerada uma das grandes bandeiras da agenda de privatização do governador, e, para vencer a resistência de prefeitos e legislativos municipais, o Bandeirantes aposta na ampliação do serviço e em uma possível redução tarifária —sem detalhar qual será ela. Segundo o governo, a redução tarifária deve começar a partir do segundo semestre deste ano.

A concessão prevê investimentos na ordem dos R$ 68 bilhões em saneamento básico nos próximos cinco anos, dentre os R$ 260 bilhões previstos até 2060, segundo a gestão Tarcísio. A data base de referência dos valores é dezembro de 2022, diz o governo.

O montante seria necessário para a universalização do saneamento básico até 2029, com um mínimo de 99% da população com acesso a água potável e 90% a coleta e tratamento de esgoto, como prevê o Novo Marco do Saneamento.

Desses valores, a capital paulista deve receber investimentos de R$ 19 bilhões até 2029 e R$ 84 bilhões até 2060, segundo Natália Resende, secretária estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, em nota do governo.

O investimento nos próximos anos estará definido, mas as aplicações até 2060 são referenciais, segundo a secretária, pois é preciso ter o "cuidado de não amarrar tecnologias que podem mudar ao longo do tempo". De acordo com o governo, serão definidas de 5 em 5 anos.

O governo paulista detém hoje 50,3% das ações da companhia e pretende diluir essa participação mantendo a chamada "golden share", ação preferencial com poder de veto em algumas decisões do conselho da empresa.

Até agora, porém, não detalhou qual percentual de participação deve manter, impedindo que se saiba quanto pretende arrecadar. A definição da precificação e da oferta de ações deve ocorrer até a metade do ano, segundo o plano apresentado pela gestão Tarcísio.

Nesta quinta, abriu consulta pública para contribuição dos municípios e anunciou oito audiências públicas, uma virtual e sete presenciais, na capital e em cidades do interior.

A primeira delas, em São Paulo, ocorrerá na próxima sexta-feira (23).

Entre os documentos divulgados com a abertura da consulta pública está o contrato de concessão do serviço de saneamento dos municípios, que o governo quer assinar em bloco, com 375 anexos que detalham investimentos particulares em cada cidade.

Isso porque há municípios mais resistentes, em diferentes esferas de poder, caso da Câmara Municipal de SP ou do prefeito de Botucatu, Mário Pardini (PSD).

Na capital, vereadores chegam a falar em criar uma nova companhia para operar o saneamento local, o que reduziria a carteira de clientes da Sabesp para quase a metade.

Nesta quinta, Tarcísio afirmou que houve uma "virada de chave, de uma situação de resistência a gente começou a trabalhar em estreita colaboração". Segundo ele, havia preocupações comuns dos dois lados, como a preservação de mananciais, que foram tratadas em conjunto.

Para incentivar a adesão, a minuta do contrato de concessão apresentada nesta quinta-feira estabelece metas anuais para a universalização do saneamento que podem afetar as tarifas dos consumidores.

Além dos índices de cobertura, com o percentual da população de cada cidade com acesso a água tratada, um índice de qualidade medirá a qualidade em si da água distribuída, perdas na rede, vazamentos e reclamações de consumidores.

O governo também incluiu nesse ponto a qualidade do asfaltamento das vias refeitas após obras de manutenção ou de expansão da rede, que medirá tempo de reposição do asfalto e qualidade do recapeamento. Haverá ainda um indicador de qualidade de esgoto, que não é aferida pelo estado hoje, diz o governo.

Se os indicadores ficarem abaixo das metas, diz o governo, a tarifa será reduzida.

Essas metas serão aferidas por um verificador independente, não vinculado à Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos de SP), diz o governo.

Além disso, a concessão estabelece que investimentos só serão incorporados na tarifa dos consumidores após serem concluídos. Ou seja, se a Sabesp expandir a rede ou construir uma nova estação de tratamento, só após a conclusão da obra é que seu custo vai para a conta da população.

Hoje, esse custo é cobrado antes, segundo as previsões de investimento. Isso implica revisões anuais na tarifa, não mais quadrianuais, de acordo com os documentos apresentados nesta quinta.

O recurso para as obras feitas antes do aumento da tarifa viria do dinheiro arrecadado com a venda de ações, espera o governo.

"Estamos invertendo a lógica e propondo que a empresa só tenha o valor dos investimentos incorporado na tarifa após realizá-los. Além disso, caso não os faça, será penalizada com abatimento na tarifa. É o que chamamos de regulação por incentivos", diz Natália Resende.

A ideia é atender 10 milhões de pessoas que não têm alguns dos serviços oferecidos pela Sabesp hoje e trazer 1 milhão de pessoas que hoje estão completamente desassistidas, segundo Tarcísio.

O contrato estabelece ainda que 4% da receita obtida em cada município será repassada para o fundo municipal de saneamento da respectiva cidade para projetos ambientais e de esgoto e água, outra demanda dos municípios, que pedem o pagamento de outorgas para a companhia operar o serviço.

As cidades precisam regulamentar esses fundos por lei municipal, diz o governo, que promete apoio técnico às prefeituras no processo. Segundo Tarcísio, a ideia é ampliar esse instrumento, uma vez que apenas 58 cidades têm um fundo municipal de saneamento negociado com a Sabesp hoje.

A exceção será a capital, São Paulo, que já recebe 7,5% e terá o percentual mantido no novo acordo.

 

Fonte: Folha de S. Paulo, de 16/2/2024

 

 

A responsabilidade dos entes federados no fornecimento de medicamentos

Por Natália Kalil Chad Sombra

A litigância em torno do fornecimento de medicamentos não é algo recente. Se por um lado temos cidadãos em busca de seu direito à saúde previsto constitucionalmente e o avanço constante da medicina e da indústria farmacêutica, por outro, temos o Estado (compreendendo-se neste termo todas as esferas de governo – União, estados, Distrito Federal e municípios) com seus respectivos orçamentos e políticas sociais e econômicas, que devem ser otimizados para melhor qualidade e eficiência do seu uso.

Para tanto, o Sistema Único de Saúde (SUS), referência mundial de assistência básica e garantia de acesso à saúde e medicamentos essenciais, sempre é (e deve ser) o norteador da repartição das responsabilidades quanto ao tema.

Medicamentos aprovados pela Anvisa e padronizados pelo SUS são em regra fornecidos por meio de programas de assistência farmacêutica, respeitados os parâmetros e requisitos por eles estabelecidos. Quando judicializados, há em regra solidariedade entre os entes da federação, mas o Juízo oficiante deve respeitar a repartição das competências aferidas pelo SUS. Foi este o entendimento adotado no julgamento do tema 793[1] sob o rito de Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal (STF), conforme a seguinte tese: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.

De outra feita, também entendeu o Supremo Tribunal Federal, no tema 500[2] de Repercussão Geral, que os entes governamentais, em regra, não podem ser compelidos judicialmente a fornecer medicamentos não registrados pela Anvisa, tampouco medicamentos experimentais. O devido registro visa proteger a saúde pública de experimentos ineficientes, evitar gastos orçamentários com fármacos sem comprovação científica, bem como o controle de preços.

Por seu turno, o Plenário da Corte Constitucional também foi instado a decidir no Tema 1.161[3] da Repercussão Geral sobre a responsabilidade do Estado no fornecimento de fármaco que, embora não possua registro na Anvisa, tem sua importação autorizada pela mesma agência. Neste caso, foi fixada a tese de que excepcionalmente o Estado pode ser compelido a fornecer o medicamento, desde que haja comprovação dos seguintes requisitos:

- Incapacidade econômica do paciente, - Imprescindibilidade clínica do tratamento, e; - Impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.

Do mesmo modo, ainda está pendente de julgamento o Tema 6[4] da Repercussão Geral, em que se discute a obrigação de o Estado no fornecimento de medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo.

O grande problema surge quanto aos medicamentos aprovados pela Anvisa, mas não incorporados aos SUS. Nestes casos, a despeito da discricionariedade dos entes federados na utilização do seu orçamento e no fomento de suas políticas públicas, os Tribunais Superiores têm tido papel primordial para fixação de diretrizes quanto à competência no seu fornecimento, tanto aos cidadãos, quanto às esferas de governo.

Quanto ao tema, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o mérito do Incidente de Assunção de Competência 14[5] no Conflito de Competência 187.276/RS, fixou as seguintes teses vinculantes quanto à competência para interposição de ações judiciais nessas hipóteses:

- Fixou a competência do juízo de acordo com os entes contra os quais a parte autora elegeu demandar;

- Não permitiu que magistrados invoquem as regras de repartição de competência administrativas do SUS para fins de alteração ou ampliação do polo passivo indicado pela parte no momento da propositura ação, mas tão somente para fins de redirecionar o cumprimento da sentença ou determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente,

- Consignou que o conflito de competência não é a via adequada para discutir a legitimidade ad causam, à luz da Lei n. 8.080/1990, ou a nulidade das decisões proferidas pelo Juízo estadual ou federal, questões que devem ser analisada no bojo da ação principal; e, por fim,

- Definiu que não cabe ao Juízo estadual, ao receber os autos que lhe foram restituídos em vista da exclusão do ente federal do feito, suscitar conflito de competência (Súmula 254 do STJ).

O Supremo Tribunal Federal afetou o tema sob o rito de Repercussão Geral, no Tema 1.234[6], a fim de definir do ponto de vista constitucional a legitimidade passiva nas ações judiciais de fornecimento de medicamentos registrados na Anvisa, mas não incorporados ao SUS.

O Plenário Virtual do STF referendou a liminar concedida na tutela provisória incidental[7] requerida no âmbito do Tema n. 1.234 do STF a fim de fixar parâmetros para a atuação do Poder Judiciário até o julgamento definitivo do Tema 1.234 da Repercussão Geral.

Com isso, afirmou que em demandas judiciais cujo objeto envolver medicamentos ou tratamentos padronizados, o polo passivo deve observar a repartição de competências estruturada no SUS, mesmo que isso acarrete o deslocamento de competência, sem prejuízo da concessão de tutelas cautelares de urgência ainda que anteriores ao deslocamento, se assim o caso exigir. Já nas ações judiciais que envolvam medicamentos não incorporados ao SUS, a competência deve ser do Juízo, estadual ou federal, indicados pelo cidadão, vedando-se, até o julgamento definitivo do Tema 1.234 da Repercussão Geral, a declinação da competência ou inclusão da União no polo passivo.

A fim de se evitar insegurança jurídica, foram impostos limites para aplicabilidade desses parâmetros: os processos não podem ter sentença prolatada e aqueles com sentença prolatada até a data da decisão (17 de abril de 2023) devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução. No mais, foram mantidas as determinações de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário.

Com isso, o Superior Tribunal de Justiça determinou nos autos do Conflito de Competência 187.276/RS o sobrestamento do Recurso Extraordinário até o julgamento definitivo do Tema 1.234.

Por se tratar de tema complexo, o STF, paralelamente, criou uma comissão especial sobre a estrutura de financiamento de medicamentos pelo SUS e a judicialização do tema, a fim de promover uma discussão entre os entes da federação e a sociedade, formada por representantes da União, membros indicados pelo Fundo Nacional de Saúde, pelo Conselho Nacional de Saúde, pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (Conitec) e pela Anvisa, além de representantes dos estados e dos municípios.

Espera-se encontrar uma solução consensual sobre a questão, especial e principalmente por ser de relevante interesse público e social. E, não só a população, mas também as políticas sociais e econômicas na área da saúde e os respectivos orçamentos públicos serão mais bem atendidos e geridos com a definição desses parâmetros.

O Supremo Tribunal federal deve reafirmar a jurisprudência para, a despeito da solidariedade dos entes federados na promoção da saúde, atender à repartição de competências e descentralização constitucionalmente previstas, por se mostrar o melhor caminho ao interesse da sociedade.

Não obstante, deve se atentar à atribuição do Ministério da Saúde e, consequentemente, da União, no que concerne a novos medicamentos incorporados ao SUS. Até a solução definitiva do tema, os precedentes citados e a tutela provisória concedida nortearão a Administração Pública e os órgãos judicantes nas respectivas ações judiciais.

[1] RE nº 855.178 ED, Rel. Min. Luiz Fux, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, DJe 16.04.2020.

[2] RE nº 657.718, Rel. Min Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe 09.11.2020.

[3] RE n.º 1.165.959, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, DJe 22.10.2021.

[4]RE nº 566.471 RG, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 07.12.2007.

[5] IAC no CC nº 187.276/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, Dje 18.04.2023.

[6] RE nº1.366.243 RG, Rel. Min. Presidente Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe 13.09.2022.

[7] RE nº 1.366.243 TPI-Ref, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 25.04.2023.

NATÁLIA KALIL CHAD SOMBRA – Bacharela em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Procuradora do Estado de São Paulo em Brasília, com atuação perante dos Tribunais Superiores (STF, STJ e TST)

 

Fonte: JOTA, seção "Elas no JOTA", de 15/2/2024

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