TJ-SP derruba liminarmente tributação maior de aposentados e pensionistas
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu a aplicação de tributação maior de aposentados e pensionistas, derrubando trecho da reforma previdenciária aprovada neste ano pelo governo do Estado e atendendo ação apresentada pela Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP) e outras entidades que integram o Fórum Permanente das Carreiras de Estado - São Paulo (FOCAE-SP).
Os desembargadores acompanharam o voto proferido pelo relator do processo, Francisco Casconi, que acolheu na íntegra o pedido liminar constante na Representação de Inconstitucionalidade ajuizada pelas entidades contra a incidência da contribuição previdenciária de aposentados e pensionistas sobre a parcela dos proventos que ultrapassam o salário mínimo (R$ 1.045,00) - hoje tal tributo recai somente sobre o montante que supera o teto do Regime Geral de Previdência Social (R$ 6.101,06).
Na ação também se impugnou a supressão do direito de aposentados e pensionistas portadores de doença incapacitante à imunidade da contribuição previdenciária sobre o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do RGPS.
As entidades solicitaram a declaração de inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos: "a) artigo 9º, § 2º, da Lei Complementar 1.012, de 5 de julho de 2007, incluído pelo artigo 31 da Lei Complementar Estadual 1.354, de 6 de março de 2020; b) artigos 1º a 4º do Decreto do Estado de São Paulo 65.021, de 19 de junho de 2020, por arrastamento; e c) artigo 126, § 21, da Constituição do Estado de São Paulo, com a redação fornecida pelo artigo 1º da Emenda Constitucional 49, de 6 de março de 2020".
O voto foi acompanhado pelos demais desembargadores de forma unânime.
COM A PALAVRA, FABRIZIO PIERONI, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO
"Trata-se de uma vitória expressiva, concedida de forma unânime pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. É o primeiro grande revés da Reforma da Previdência estadual aprovada na Assembleia Legislativa de São Paulo em março. A Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo estava atenta e agiu prontamente para defender os direitos de seus associados aposentados e pensionistas".
Fonte: Correio Popular - Campinas, de 11/7/2020
Associações dos Procuradores dos 27 estados do país se unem à ANAPE em apoio ao procurador de Rondônia
A Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal – ANAPE e todas as Associações de Procuradores dos Estados e do Distrito Federal vêm a público externar sua mais absoluta perplexidade, indignação e repúdio ao diálogo divulgado pela Folha de S. Paulo, na última quinta-feira (09/07), em que o deputado estadual de Rondônia Jean Oliveira e o pecuarista Alexsandro Zarelli cogitam atentar contra a carreira e a própria vida do Procurador do Estado de Rondônia Matheus Carvalho Dantas.
É absolutamente repugnante que um agente de Estado sofra retaliações em razão de sua atuação firme e independente na defesa do interesse público. Causa ainda mais indignação a notícia de que os ataques ao agente público foram cogitados por um parlamentar estadual, que, por sua função, deveria ser defensor do Estado Democrático de Direto e das instituições republicanas, dentre elas a Advocacia Pública.
Os Procuradores de Estado e do Distrito Federal exercem suas funções de forma rigorosamente técnica, pautados pela impessoalidade e pela defesa dos interesses do Ente Federado que integram. Não há espaço, na atuação do Procurador do Estado, para sucumbir a pressões ou interesses não republicanos.
Fatos como este que ora se repudia não intimidam os Procuradores do Estado, cientes que são da relevância e essencialidade das funções por eles desempenhadas.
A ANAPE acompanhará com atenção o desenrolar das investigações e requererá às autoridades competentes o mais absoluto rigor na apuração da responsabilidade criminal do parlamentar e demais indivíduos citados na reportagem.
Vicente Martins Prata Braga
Presidente da ANAPE
Frederico Martins
Diretor Jurídico e de Prerrogativas da ANAPE
- Acesse AQUI a nota diretamente no site da ANAPE
Fonte: site da ANAPE, de 11/7/2020
Ação sobre nomeação de pediatras não compete à Câmara Especial do TJ-SP
Matéria de infância e juventude é contemplada no artigo 148 do Estatuto da Criança e Adolescente, que deve ser interpretado à luz do artigo 98 do mesmo diploma legal. Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou procedente um conflito de competência e definiu que ações sobre a nomeação de pediatras para a rede pública de saúde devem ser apreciadas por Câmaras de Direito Público e não pela Câmara Especial.
O caso que suscitou o conflito de competência envolve uma ação civil pública em que o Ministério Público pede que a Prefeitura de São Paulo seja obrigada a nomear mais pediatras para a rede pública. A 2ª Câmara de Direito Público defendeu a competência da Câmara Especial pois, embora a discussão gire em torno da contratação de médicos, a ação teria por objetivo a defesa dos interesses de crianças e adolescentes.
Já a Câmara Especial declinou da competência para apreciar o caso. Assim, o conflito chegou ao Órgão Especial, onde houve divergência. Relator sorteado, o desembargador Alex Zilenovski ficou vencido. Prevaleceu o entendimento do desembargador Campos Mello de que a ação deve ser julgada pela 2ª Câmara de Direito Público.
Para Campos Mello, a ação não se enquadra na hipótese descrita nos artigos 148, inciso IV, c.c. artigo 98, inciso I, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente, que visa a resguardar os direitos das crianças e dos adolescentes quando há omissão do Estado em relação a um de seus direitos fundamentais, como acesso à saúde e à educação.
“Nesse contexto, o que se constata é que a pretensão de contratação de médicos pediatras, embora traduza benefício indireto a todas as crianças, não diz respeito a ações e serviços de saúde, previstos no artigo 208, VII, ECA. Em razão disso, não há competência da Câmara Especial, à vista da inexistência de situação de risco, a atrair a incidência do artigo 148 do Estatuto da Criança e do Adolescente”, disse.
Segundo o desembargador, ação civil pública busca apenas que o Poder Público providencie a edição de atos administrativos, que garantam a contratação de pediatras. “Cuida-se de questão que envolve política pública, com evidente impacto no orçamento municipal, a ser apreciada Câmara de Direito Público”, completou.
Ele concluiu que, na ação em questão, o interesse das crianças e adolescentes é “meramente reflexo”. Além disso, afirmou que a competência recursal da Câmara Especial não abarca toda e qualquer situação em que haja interesse de alguma criança ou adolescente, mas apenas aquelas em que a matéria em exame seja realmente de competência de Vara de Infância e Juventude.
Processo 0011304-98.2020.8.26.0000
Fonte: Conjur, de 11/7/2020
Em meio à pandemia, STF pressiona contra redução salarial e corte de penduricalhos
Em meio à crise econômica desencadeada pelo novo coronavírus, o STF (Supremo Tribunal Federal) tem pressionado o Congresso para preservar o próprio salário e evitar a aprovação da redução de vencimentos e de jornada de trabalho de servidores públicos.
A corte, inclusive, fez questão de declarar, no final de junho, a inconstitucionalidade de artigo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que permitia a diminuição de vencimentos do funcionalismo como alternativa para enfrentar problemas financeiros.
Além do lobby em favor da própria remuneração, o Supremo também dá demonstrações de que não quer mexer nos chamados penduricalhos da magistratura, os benefícios que engordam o salários dos juízes.
No último dia 23 de março, quando a pandemia já havia sido decretada, a corte retirou de pauta o julgamento que discute se juízes têm direito a licença-prêmio.
O benefício prevê recesso remunerado de três meses a quem prestar cinco anos de serviço. Em alguns casos, servidores que não tiram a licença podem recebê-la em dinheiro ao se aposentar.
A análise do caso havia sido incluída, em 19 de março, na sessão virtual da corte que começaria em 3 de abril. Quatro dias depois, no entanto, o relator da matéria, ministro Alexandre de Moraes, retirou o recurso de pauta.
Há anos o excesso de penduricalhos e os supersalários são criticados, inclusive, por ministros do Supremo. A corte, no entanto, hesita em julgar casos que mexam nos vencimentos dos juízes.
A decisão liminar (provisória) do ministro Luiz Fux que estendeu o auxílio-moradia a todos os magistrados do Brasil, por exemplo, durou quatro anos e sequer foi julgada pelo plenário.
O próprio ministro revogou o benefício, mas sem deixar que a medida afetasse o bolso da categoria: a revogação só ocorreu após o então presidente Michel Temer garantir o reajuste de 16,32% no teto salarial, que é usado como base para calcular a remuneração dos juízes.
A redução salarial discutida no Congresso neste ano também preocupava o STF porque mirava os salários mais altos. A articulação de deputados com o governo era prever um corte maior em categorias que têm remunerações elevadas.
O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, porém, já deixou claro aos presidente da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, respectivamente, que a corte discorda da medida.
E, neste caso, o Ministério Público, que muitas vezes diverge do Judiciário, está unido com o STF. O procurador-geral da República, Augusto Aras, inclusive, fez movimento similar ao de Toffoli e também avisou aos chefes do Congresso que a proposta enfrenta resistência na categoria.
Em relação à licença-prêmio, o processo chegou ao STF em maio de 2017 e, em outubro daquele ano, os ministros decidiram dar repercussão geral ao julgamento. Em outras palavras, o Supremo determinou que a decisão valerá para todos os processos do país que tratam do tema.
Assim, caso o STF derrube a previsão do benefício para a magistratura, juízes de primeira e segunda instância que recebem a verba em razão de lei estadual aprovada nesse sentido também podem ser impactados.
Se a decisão for favorável, o caso tem potencial para beneficiar os 16 mil magistrados brasileiros, uma vez que, com a decisão do STF, todos poderão requerer a licença-prêmio na Justiça e terão o direito assegurado.
Apesar da análise prévia sobre o alcance do julgamento, o plenário nunca se debruçou sobre o tema para tomar uma decisão definitiva a respeito.
O argumento dos magistrados é que integrantes do Ministério Público têm direito ao benefício e a Constituição prevê a simetria entre as duas carreiras. Ou seja, se promotores e procuradores têm direito, juízes também deveriam ter.
Em alguns estados, o funcionário do MP que não usa a licença-prêmio passa a ter direito de recebê-la em dinheiro. Assim, se o servidor estiver no topo da carreira e receber o teto do funcionalismo, o que não é raro na magistratura, o funcionário tem direito a receber cerca de R$ 117,6 mil a mais a cada cinco anos.
A retirada de pauta é mais um movimento da magistratura para não perder salários e benefícios em meio à pandemia.
E o julgamento que fixou a repercussão geral ao caso, que ocorreu no plenário virtual, deu um indicativo de que não haverá unanimidade nem a favor nem contra a concessão do benefício.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, votou para reconhecer a repercussão geral e reafirmar a jurisprudência da corte no sentido de que juízes não têm direito ao benefício.
Para Moraes, deveria ser aplicada à discussão a súmula vinculante do STF que proíbe o Poder Judiciário de “aumentar vencimentos de servidores sob o fundamento da isonomia” por não ter função legislativa.
Moraes sugeriu que fosse fixada a seguinte tese a ser aplicada aos processos do país que discutem se juízes têm direito ao benefício:
“É ilegítima a concessão de licença-prêmio aos membros do Poder Judiciário, bem como a indenização por sua não-fruição, com fundamento na isonomia em relação aos membros do Ministério Público, haja vista afrontar o disposto na Súmula vinculante 37”.
Os ministros concordaram por unanimidade dar repercussão geral ao caso, mas houve divergência em relação à tese proposta por Moraes.
No mérito, porém, a maioria divergiu do ministro e afirmou que não há jurisprudência consolidada da corte sobre o tema.
Fonte: Folha de S. Paulo, de 12/7/2020
Reflexos da recuperação judicial na cobrança do crédito tributário
POR THIAGO OLIVEIRA DE MATOS E CASSIANO LUIZ SOUZA MOREIRA
A Lei 11.101/2005, fruto de projeto apresentado no ano de 1993, incorporou ao Direito brasileiro procedimento, judicial e extrajudicial, de recuperação de empresários e sociedades empresárias, objetivando dar tratamento mais moderno e adequado à situação do estabelecimento em crise econômico-financeira, mostrando-se sensível o legislador às novas estruturas econômicas do mercado. Para isso a lei revigorou velhos institutos, aos quais associou novos instrumentos tendentes à preservação da empresa.
A Lei de Recuperação e Falência (LRF), para garantir a superação da crise econômico-financeira[1] do estabelecimento, tentou conciliar os interesses eminentemente privados do devedor com os de seus credores, dentre eles o Fisco, sob o fundamento da indiscutível relevância socioeconômica de manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores, de se preservar o interesse dos credores em relação às dívidas pendentes, “resguardando-se a função social da empresa e o estímulo à atividade econômica”. Este é o cerne do artigo 47 da LRF, que traduz o chamado princípio da preservação ou da continuidade da empresa.
Apesar dos legítimos objetivos norteadores da legislação, dois questionamentos costumam despontar quando analisado o universo dos processos de recuperação judicial em curso: toda empresa deve ser recuperada? A recuperação judicial tem sido utilizada para a finalidade prevista em lei?
Sobre a primeira indagação, lembramos a afirmação do professor Fábio Ulhoa Coelho, para quem “nem toda empresa merece ou deve ser recuperada”[2]. No âmbito dessa conclusão, deve-se considerar, dentre outros fatores, o custo social da recuperação do estabelecimento empresarial, que exige, dentre outros esforços, a perda/cessão de créditos em favor do devedor em crise.
Não se pode ignorar, ainda, que a situação de colapso financeiro pode resultar de causas diversas, que vão desde um cenário econômico adverso (como o ora vivenciado em razão da crise sanitária mundial causada pela Covid-19), de oscilações inesperadas no mercado, bem como da má gestão do negócio, marcada pela mera inabilidade ou qualificada por ilegalidades de ordem fiscal, concorrencial, ambiental, por exemplo, geradoras de passivo que integram, muitas vezes de forma preponderante, o montante de dívidas da recuperanda.
Assim, não pode o princípio da recuperação da empresa ser levado, inadvertidamente, às últimas consequências, como se traduzisse um fim em si mesmo, sob pena de ser banalizado o instituto.
E como se conclui da análise de não poucos processos recuperacionais, por vezes é a recuperação judicial mero subterfúgio processual para a manutenção de atividades que o próprio interesse social reclama sejam paralisadas, ou ao menos readequadas à conveniência da coletividade, porque mais custosas do que geradoras das esperadas benesses decorrentes de sua função social.
Quanto ao segundo questionamento, a experiência dos órgãos públicos que atuam no combate à inadimplência ilícita de tributos tem apontado, já há muito, a utilização da recuperação judicial como instrumento desvirtuado de seu escopo normativo, condicionada aos interesses de beneficiários da pessoa jurídica devedora – e não da atividade econômica em si considerada – que da recuperação se valem para a perpetuação da predação fiscal, por exemplo.
Não raro, a recuperação judicial permite a perpetuação da inadimplência do tributo corrente, criando, paralelamente, um campo de proteção contra a constrição executiva de bens passíveis de garantirem os débitos acumulados ao longo do tempo.
E isso é possível porque, em razão da pendência de julgamento da tese objeto do Tema 987 do STJ[3], os credores fiscais muito pouco ou nada podem fazer com vistas à satisfação de seus créditos em face do empresário em recuperação, mesmo se já em curso execução fiscal quando do advento do processo recuperacional, especialmente se os atos de constrição forem requeridos depois do deferimento da recuperação pelo Juízo competente.
Sob o fundamento, de regra formulado genericamente, de que os atos de constrição patrimonial, caracterizadores da execução fiscal, prejudicariam/inviabilizariam o plano de recuperação – e não obstante a regra do artigo 6º, § 7, da Lei 11.101/2005 – , os credores públicos se veem impedidos de recuperarem dívidas milionária e em exponencial crescimento ao longo do próprio processo recuperacional.
Muitas dessas dívidas são o resultado de longos períodos de omissão ilegal e preordenada de tributos, diante das quais e uma vez vislumbrada pelo devedor a proximidade de êxito de medidas estatais – como a intensificação da atividade fiscalizatória, a inauguração de procedimentos investigatórios pelo Ministério Público, ou o ajuizamento de medidas cautelares fiscais –, é desencadeado o pedido de recuperação judicial de atividade que, por vezes, sequer subsistiria sem as vantagens fiscais ilicitamente obtidas, buscando-se com a recuperação exclusivamente: (i) a preservação dos bens identificados em nome do devedor, (ii) o deslocamento das questões patrimoniais para o Juízo recuperacional (em especial quando nas instâncias próprias não tenham obtido sucesso as objeções à atuação estatal), e também (iii) o desvio do foco das condutas fiscais ilícitas para a alegada condição de penúria econômico-financeira[4], deliberadamente provocada nestas situações.
Em tais casos, o escopo não é a manutenção da atividade empresária em consideração ao interesse coletivo de preservação da atividade econômica, mas a preservação de vantagens pessoais de beneficiários de empresa que, se operasse nos limites da legalidade, não se sustentaria economicamente ou, ao menos, não apresentaria a mesma performance, pois se utiliza da inadimplência ilícita contumaz para o aumento arbitrário de lucros e para a redução, ou mesmo aniquilação, da concorrência.
Soma-se a esse quadro o fato de o legislador ter retirado dos credores públicos o direito de manifestação sobre o plano de recuperação, bem como o entendimento jurisprudencial que afasta a exigência, constante da LRF[5][6], de apresentação de certidões de regularidade fiscal pelo empresário em recuperação judicial.
Nesse contexto, é quase igual a zero a chance de serem satisfeitos os créditos fiscais nascidos antes de iniciada a recuperação judicial, cujo prazo médio de duração é de cerca de 10 anos.
Não bastasse a barreira imposta ao Estado para a satisfação dos créditos tributários anteriores à recuperação judicial, frisa-se que o processo recuperacional, numa evidente contradição a seu propósito de equalização de passivo da empresa em crise, tem se apresentado, em alguns casos, como ambiente livre de tributação corrente.
Não obstante muitos juízes – especialmente na capital paulista – já tenham identificado o problema e venham condicionado o curso regular da recuperação à comprovação do recolhimento dos tributos incidentes sobre os negócios realizados no curso do processo, em muitos feitos não se observa tal preocupação, o que desencadeia prejuízos consideráveis aos cofres públicos, permite a manutenção, e mesmo intensificação, da concorrência desnivelada entre os atores econômicos do segmento – muitas vezes até incentivando pedidos de recuperação judicial de concorrentes para garantirem uma “paridade” de condições tributárias, por mais absurdo que isso possa parecer – e, ainda, admite fator de autofagia da recuperação, pois se o passivo do devedor aumenta durante procedimento judicial voltado à sua equalização, o crescimento dos débitos fiscais é causa de evidente frustração da recuperação quando se objetiva efetivamente recuperar atividade econômica que se mostre verdadeiramente viável.
Identifica-se, em tais casos, o prenúncio de insucesso de um processo instaurado e mantido às custas dos esforços dos credores, da sociedade e do próprio Poder Judiciário.
É preciso repensar o modelo de recuperação judicial e seus reais objetivos. Os tribunais começam a reconhecer e coibir os abusos perpetrados nos feitos recuperacionais, mas é preciso ir além.
Mudanças na legislação são imperiosas[7], mas enquanto não ocorrem, os órgãos de fiscalização e combate às práticas fiscais e concorrenciais abusivas precisam voltar suas atenções, de forma mais acurada, para tais comportamentos, inclusive fornecendo subsídios aos órgãos judicial e ministerial oficiantes.
Além disso, os tribunais não podem se furtar à análise aprofundada, para além da formalidade normativa, acerca das medidas adotadas no curso da recuperação judicial, pois, como visto, muitas delas rompem os limites do cumprimento, ou não, do plano recuperacional, funcionado como meios de perpetuação de práticas substancialmente ilegais, em prejuízo dos interesses que a Lei 11.101/2005 pretendeu preservar.
[1] Como ensina NEGRÃO: “A expressão econômico-financeira abrange tanto os males que impedem o empresário de perseguir o objeto de sua empresa como também a insuficiência de recursos para o pagamento de obrigações assumidas. Fatores externos à atividade empresarial podem acarretar a crise econômica na atividade que, entretanto, não poucas vezes, deriva de causas internas, resultando da má gestão na administração. Crises econômicas podem acarretar crises financeiras, que se resumem na insuficiência – momentânea ou sistemática – de recursos financeiros para o pagamento dos credores e cumprimento de todas as obrigações assumidas”. (NEGRÃO, Ricardo. Direito empresarial – estudo unificado. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2015, P. 269).
[2] COELHO, Fábio Ulhoa. Direito de empresa. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 373.
[3] Que versa sobre a “possibilidade da prática de atos constritivos em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal”.
[4] A Recuperação judicial, quando utilizada com fins diversos daquele em que se fundou o instituto, é ambiente em que tantas práticas irregularidades podem ganhar corpo, como a experiência tem demonstrado, o que será objeto de abordagem oportuna.
[5] Art. 57. Após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembléia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.
[6] O PL 10220/2018 corrige muitas das omissões legislativas acerca da participação das Fazendas Públicas no processo de recuperação judicial, inclusive espancando a dúvida de sua legitimidade para a formulação de pedidos de falência.
THIAGO OLIVEIRA DE MATOS – Especialista em Direito Constitucional e Administrativo pela Escola Paulista de Direito. Mestrando em Direito Tributário (FGV/SP). Procurador do Estado de São Paulo.
CASSIANO LUIZ SOUZA MOREIRA – Mestrando em Direito Tributário pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP). Procurador do Estado de São Paulo.
Fonte: site JOTA, de 10/7/2020
DECRETO Nº 65.056, DE 10 DE JULHO DE 2020
Estende a medida de quarentena de que trata o Decreto nº 64.881, de 22 de março de 2020
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Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção Decretos, de 11/7/2020
Portaria SUBGCTF - 10, de 10-7-2020
Disciplina a atuação em processos físicos durante a vigência do teletrabalho imposto pelo Decreto 64.881/2020
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Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção Decretos, de 11/7/2020
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