8/4/2021

STF tem maioria para obrigar União a fornecer leitos

O Supremo Tribunal Federal formou maioria ontem para validar liminar da ministra Rosa Weber que obriga a União a restabelecer leitos de UTI para covid-19 nos Estados de Maranhão, São Paulo, Bahia, Piauí e Rio Grande do Sul. No caso de São Paulo, o Estado alega que em janeiro havia 7.017 leitos de UTI financiados pelo Ministério da Saúde. Em fevereiro, porém, o número foi reduzido para 3.187. A Advocacia-geral da União (AGU) alega que os procedimentos de habilitação de leitos dependiam de solicitações feitas pelos governos estaduais e eventuais desmobilizações ocorreram mediante ‘ausência de pedido’.

 

Fonte: Estado de S. Paulo, de 8/4/2021

 

 

STF confirma ordens de restituição de leitos de UTI em cinco estados

Por José Higídio

Por constatar omissão estatal, o Plenário do Supremo Tribunal Federal manteve liminares da ministra Rosa Weber que ordenavam o restabelecimento de leitos de UTI para tratamento da Covid-19 custeados pela União em cinco estados.

Entre o final de fevereiro e o início de março, a relatora havia ordenado a reativação nos estados do Maranhão, São Paulo, Bahia, Piauí e Rio Grande do Sul. Nos seus votos, manteve o entendimento adotado nas decisões.

Segundo ela, a diminuição de leitos de UTI em um momento de aumento das mortes e internações não seria lógica, coerente ou defensável. Para Rosa, qualquer retrocesso nas políticas públicas de saúde não é constitucionalmente aceitável.

"O discurso negacionista é um desserviço para a tutela da saúde pública nacional. A omissão e a negligência com a saúde coletiva dos brasileiros têm como consequências esperadas, além das mortes que poderiam ser evitadas, o comprometimento, muitas vezes crônico, das capacidades físicas dos sobreviventes, que são significativamente subtraídos em suas esferas de liberdades", fundamenta a ministra.

Ela foi acompanhada por todos os demais membros da corte, mas o ministro Nunes Marques apresentou ressalvas. Ele apontou que o Ministério da Saúde recentemente autorizou a abertura de mais leitos de UTI e assim vem investindo na ampliação uniforme dos leitos pelo país.

Para o magistrado, o governo vem priorizando a gravidade local e a necessidade da população como um todo, e não as demandas próprias de determinadas regiões. Segundo ele, o "desequilíbrio poderá acarretar a falta de leitos de UTI a pacientes que demandem tal cuidado em outros estados da federação".

ACO 3.473
ACO 3.474
ACO 3.475
ACO 3.478
ACO 3.483

 

Fonte: Conjur, de 7/4/2021

 

 

PGE e a ADPF 811

A Procuradoria Geral do Estado vem acompanhando diretamente as medidas jurídicas relacionadas ao enfrentamento da Covid-19, dentre as quais a recente discussão travada na ADPF 811, junto ao STF, envolvendo a realização presencial de cultos religiosos, prática temporariamente suspensa pelo Decreto nº 65653/2021, que implementou restrições mais severas para o combate à pandemia, tendo em vista a escalada de casos, internações e óbitos no país.

Nesta tarde (07/04), a Procuradoria Geral do Estado defendeu na tribuna do Pleno do Supremo Tribunal Federal a constitucionalidade de tal vedação, em sustentação oral realizada pelo Dr. Rodrigo Menicucci, da Procuradoria do Estado de São Paulo em Brasília (PESPB).

A questão assumiu relevância nacional e internacional, tendo em vista o atual estágio epidemiológico do Brasil, e vem sendo acompanhada por meio de atuação conjunta do Gabinete do Procurador Geral do Estado, da Assessoria Jurídica do Gabinete (AJG) e da Procuradoria do Estado de São Paulo em Brasília.

O julgamento da ADPF 811 será retomado amanhã (08/04).

Fonte: site da PGE-SP, de 7/4/2021

 

 

Balança

A epidemia de covid-19 dominou as discussões nas altas cortes do TJ-SP, tema que foi o terceiro mais julgado pelo Órgão Especial em 2020. Em 145 processos contra fechamentos de estabelecimentos na quarentena, a Justiça decidiu mais a favor do Estado, como mostra balanço do Anuário da Justiça São Paulo. No caso de restaurantes à beira de rodovias, a maioria dos desembargadores votou pela reabertura, por considerar um serviço essencial. Concessionárias e clubes de golfe tiveram os pedidos negados. Para marcar o lançamento do ranking, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Geraldo Pinheiro Franco, presidente do TJSP debatem A Responsabilidade do Judiciário nas Políticas de Enfrentamento da Covid, na TV Conjur, amanhã.


Fonte: Estado de S. Paulo, Coluna Direto da Fonte, por Sonia Racy, de 8/4/2021

 

 

Partido questiona decretos estaduais sobre lockdown e toque de recolher

O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6788, com pedido de medida liminar, contra decretos estaduais que estabelecem lockdowns e toques de recolher como forma de combater a pandemia da Covid-19.

A legenda alega que as normas violam os direitos constitucionais de ir e vir, do trabalho e de reunião. Aponta que o fechamento das atividades econômicas resulta na perda de empregos em massa e na quebra de empresas.

Para a sigla, grande parte dos decretos não apresenta nenhuma comprovação científica e justificativa que demonstre a necessidade da adoção de medidas extremas que possam implicar a restrição inconstitucional de direitos fundamentais dos indivíduos.

O PTB argumenta que a Constituição Federal autoriza a restrição ao direito de ir e vir apenas no caso de vigência de estado de sítio, que poderá ser decretado apenas pelo presidente da República em situações gravíssimas que não podem ser combatidas de forma eficiente pela decretação de estado de defesa ou em caso de guerra ou agressão armada estrangeira.

Segundo o partido, na Lei 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da pandemia, não há previsão de restrição ao direito de liberdade de locomoção intramunicipal como vem sendo implementada em alguns estados.

A legenda já havia ajuizado a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 806 contra a decretação de lockdown e toque de recolher por governadores e prefeitos de todo o país. O relator, ministro Marco Aurélio, rejeitou o trâmite da ação, pois as situações descritas no processo deveriam ser impugnadas por outras vias processuais.


Fonte: site do STF, de 7/4/2021

 

 

Procurador, um conceito a ser repensado

Por Pablo Bezerra Luciano

Quem são e o que fazem os procuradores? São os membros do Ministério Público? São os membros da advocacia pública? O que é preciso para ser procurador? Para perguntas como essas não existem respostas unívocas no Brasil, porque o Direito Público nem sempre busca depurar sua linguagem, optando pelo uso inercial de palavras derivadas da tradição contratualista do Direito Romano como "procurador" e "procuração".

Contudo, é assente em Direito Administrativo que as relações funcionais entre o Estado e seus agentes ocupantes de cargos de provimento efetivo não se originam de contratos. Contratos são negócios jurídicos bilaterais "que se formam a partir de declarações coincidentes de vontade de mais de um indivíduo" [1]. O contrato é uma "composição consensual de interesses e substancia uma ‘transfusão de vontades", sendo firmado "para atendimento de conveniências recíprocas das partes" [2]. A autonomia da vontade de extração romanística/civilista é a ideia ao redor da qual gravita a teoria dos contratos, ao passo que o Direito Administrativo, que informa as relações entre o Estado e seus agentes, desenvolve-se como um grande esforço de livrar o ambiente público do império da vontade.

A assunção de funções públicas não decorre de acordos de vontades, mas do preenchimento de certas condições estabelecidas pela lei, como a aprovação em concurso público, a nomeação e a posse. Diz-se, assim, que as relações de servidores com a Administração são "estatutárias", em referência ao estatuto legal para provimento e exercício de cargos públicos, em contraposição ao regime de trabalho de fundo contratual prevalecente na iniciativa privada. Uma vez aprovado em concurso público dentro das vagas oferecidas no edital, o candidato tem direito à nomeação, independentemente da vontade da autoridade com competência para nomeá-lo e, uma vez empossado, deve desempenhar atividades previstas na lei.

Segue-se que é imprecisão terminológica dizer "o candidato a servidor aprovado em concurso foi contratado" (em vez de "o candidato a servidor aprovado em concurso tomou posse") ou "a Administração contratou servidores" (em vez de "a Administração nomeou ou deu posse a candidato a servidor").

O tradicional costume de chamar "procuradores" ora os membros do Ministério Público, ora os membros da advocacia pública, deriva do costume de contrabandear para o Direito Administrativo institutos do Direito Privado. É um postura metodológica anacrônica, que dificulta o desenvolvimento da autonomia do Direito Administrativo, a partir da suposição de que precisaríamos sempre recorrer a institutos dos romanos para explicar funções públicas estabelecidas ao longo dos últimos séculos, e que ainda se encontram em processo de amadurecimento.

Nem todos os membros do Ministério Público são "procuradores". Não existe uniformidade de nomenclatura dos cargos. No âmbito dos variados ramos dessa função essencial à Justiça, a maior parte dos cargos são de "procurador", "procurador regional", "subprocurador-geral" ou "procurador-geral", com as seguintes exceções: promotor de Justiça (que atua perante a Justiça estadual), promotor da Justiça Militar (com atuação perante a Justiça Militar), promotor de Justiça adjunto e promotor de Justiça (esses dois últimos com atuação perante a Justiça do Distrito Federal e Territórios).

Entre a advocacia pública também não há uniformidade. Nem todos são "procuradores", destacando-se como exceção o cargo de "advogado da União". Os demais utilizam-se do termo "procurador", quais sejam: procurador da Fazenda Nacional, procurador federal, procurador do Banco Central do Brasil, procurador do Estado, procurador do Distrito Federal e procurador do município.

É tradição que remonta às tentativas de sistematização do Direito romano — nem sempre indenes de críticas — a compreensão de que o termo "procuração" remonta ao nome que se dava ao "instrumento do contrato de mandato". Como explica Estevan Lo Ré Pousada em tese de doutoramento, a acepção usual da palavra "procuração" exsurge "de um lado, adequadamente comprometida com a promessa formal de assunção (pelo principal) dos efeitos dos atos de gestão praticados pelo representante; de outra banda, todavia, indevidamente vinculada à ideia de 'instrumento do mandato' — tal qual difundida, aliás, entre diversas legislações modernas (dentre as quais a nacional)" [3].

Com efeito, na legislação brasileira, "procuração" é o nome que se dá ao instrumento do contrato privado de mandato, nos termos do artigo 653 do Código Civil (CC). E mandatário ou procurador é quem exerce poderes de representação de interesses alheios por força de um contrato de mandato (CC, artigo 653).

Para firmar contratos de mandato ou para "dar procuração", basta ser uma pessoa capaz e subscrever um instrumento particular ou público (CC, artigos 654 e 655). O mandatário ou procurador, por sua vez, deve obedecer as instruções do mandante (CC, artigo 679), ficando obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual na execução do mandato (CC, artigo 667), não se lhe exigindo nenhuma formação técnica ou profissional determinada.

O Código Civil não chega a dispor sobre o "mandato judicial", que é visto como aquele conferido a favor de advogados, estipulando que ficará "subordinado às normas que lhe dizem respeito, constantes da legislação processual, e, supletivamente, às estabelecidas neste Código". Dispondo a respeito do tema, o Código de Processo Civil (CPC) especifica que é também uma "procuração" que habilita o advogado a praticar os atos do processo (artigo 105). Porém, em boa verdade, não é um acordo de vontades que determina os contornos da atividade advocatícia em juízo.

Normas legais de Direito Público constantes do CPC e da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, consubstanciam o estatuto da advocacia, os poderes e a ética dos advogados, estabelecendo um regime jurídico diferente daquele engendrado por um contrato convencional/privado de mandato [4]. Basta considerar que mesmo "em seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social", constituindo seus atos "múnus público" (§§1º e 2º do artigo 2º da Lei nº 8.906, de 1994). Além disso, diferentemente do que ocorre entre a generalidade dos mandantes e mandatários, o cliente não dá ordens a seu advogado, conforme se nota do artigo 11 do Código de Ética da Advocacia: "O advogado, no exercício do mandato, atua como patrono da parte, cumprindo-lhe, por isso, imprimir à causa orientação que lhe pareça mais adequada, sem se subordinar a intenções contrarias do cliente, mas, antes, procurando esclarecê-lo quanto à estratégia traçada".

Seja como for, como o ministério privado de advogados em juízo depende de um prévio acordo de vontades, não é de tão descabido ou absurdo falar em "mandato judicial" ou, por extensão, chamar advogados em juízo de "procuradores". Mas mesmo essa assimilação no meio judicial entre "procuradores" e "advogados" causa dificuldades, valendo lembrar, por exemplo, que o Código de Processo Penal (CPP) permite que o ofendido exerça direito de representação pessoalmente ou por "procurador" com poderes especiais, não se exigindo que esse seja advogado.

Além disso, a assimilação de "advogado" e "procurador" envolve metonímia que desconsidera que nem toda atividade advocatícia origina-se do que se entende por "procuração". O chamado "procuratório" judicial é apenas uma das atividades desempenhadas por advogados. Para além de postular perante o Poder Judiciário, são privativas da advocacia "as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas", nos termos do inciso II do artigo 1º da Lei nº 8.906, de 1994. Advogados que prestam consultoria, assessoria e direção jurídicas não firmam nenhum contrato semelhante ao mandato, não recebem "procuração", e não atuam em nome de ninguém, de modo que não faz nenhum sentido chamá-los "procuradores".

Se no âmbito do ministério privado da advocacia a confusão entre "advogado" e "procurador" não é livre de muitas críticas, nas esferas do Ministério Público e da advocacia pública o termo "procurador" faz menos sentido ainda. Nenhum membro do Ministério Público ou da advocacia pública atua como mandatário de outrem, nem tem uma procuração para apresentar, muito embora muitos de seus titulares ocupem cargos de "procurador". Na esteira dessa grave contradição, não nos causa espanto a prática de serventias judiciais exigirem de advogados públicos a apresentação de procuração, bem como matérias jornalísticas que confundem cargos do Ministério Público com cargos da advocacia pública e vice-versa.

Mas não é só. Especialmente na advocacia pública, por força do constante uso do termo "procurador", surgem a crenças descabidas em torno de suposta submissão dos advogados públicos às ordens e instruções de gestores públicos, ou que existiria entre eles algo parecido com um "pacto de confiança" ou um "acordo de vontades", noção essa que é própria ao contrato civilista de mandato e do instrumento que o corporifica.

Em meio à advocacia pública, em defesa do tradicional termo "procurador", diz-se que os advogados públicos contariam com mandato ex lege e citam a esse propósito os termos do artigo 9º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997: "(A) Representação judicial das autarquias e fundações públicas por seus procuradores ou advogados, ocupantes de cargos efetivos dos respectivos quadros, independe da apresentação do instrumento de mandato". Supõem erradamente que poderes de representação aludidos na lei só existiriam em decorrência do contrato de mandato (daí o recurso ao mandato ex lege), desconsiderando, por exemplo, que pais, tutores e curadores exercem representação de filhos, pupilos e curatelados independentemente da "apresentação do instrumento de mandato". Porém nada há nos termos do artigo 9º da Lei nº 9.469, de 1997, que indique que a atividade de representação decorreria de um mandato derivado da lei — ex lege. Ao estipular que a representação independe da apresentação do instrumento de mandato, a lei nada mais expressa do que a óbvia noção de impossibilidade de apresentação de algo que não tem existência. Mesmo se o artigo 9º da Lei nº 9.469, de 1997, não existisse, jamais os advogados públicos poderiam ser compelidos a fazer o impossível: apresentar procuração.

Curiosamente, o apego à tradição do termo "procurador", apesar de todas as dificuldades técnicas de atribuí-lo à atividade advocatícia moderna, foi determinante em dezembro de 2015 para que 55% dos membros da Advocacia-Geral da União tenham escolhido o nome "procurador da União" para designar a futura carreira resultante da unificação das 4 (quatro) carreiras atuais no campo federal [5].

O uso assistemático e tumultuário do termo "procurador" para designar cargos no Ministério Público e na advocacia pública, para além de não se afinar com Direito Administrativo e seus esforços de limitação do arbítrio, não atende a postulados de uma linguagem cidadã. Parece até que a aposta na algaravia conceitual é estratégia de que se valem essas instituições para se distinguirem e se distanciarem do vulgo em termos de honra e prestígio. Com a repetição do misterioso termo, mais se confunde e se deforma, revelando grande lapso de empatia de todo o sistema jurídico com relação à sociedade e ao cidadão em geral, que não têm a menor ideia de que "procurador federal" e "procurador da República" sejam cargos diferentes, integrantes de instituições distintas e, por vezes, com atuações antagônicas no campo judicial.

Fundamentalmente, "procurador" é um conceito a ser repensado. Para o bem da transparência e da ciência jurídica, deveríamos reservar o termo "procurador" para designar o outorgado do contrato privado de mandato. O Direito Público não precisa de "procuradores". Poderíamos passar a empregar no âmbito do Ministério Público exclusivamente "promotor de Justiça" e derivações como "promotor regional" ou "subpromotor-geral" e "promotor-geral". E, entre a advocacia pública, poderíamos nos limitar à expressividade das expressões "advogado público federal", "advogado público estadual" e "advogado público municipal". Ganharíamos em simplicidade e melhoraríamos a comunicação do meio jurídico com a sociedade se a advocacia pública e o Ministério Público concordassem que não precisam emular institutos tradicionais romanos para revelar a excelência e a importância de suas funções.

[1] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial. 2 ed. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 502.

[2] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Grandes Temas de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 19.

[3] POUSADA, Estevan Lo Ré. Aspectos de uma Tradição Jurídica Romano-Peninsular: delineamentos sobre a história do Mandato no Direito Luso-Brasileiro. Tese (Doutorado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo. 2010, p. 90. Referido autor, tendo em vista a desnecessidade de constar do "instrumento do mandato" a assinatura do outorgado, considera que seria mais adequado conceber a "procuração" como um instrumento de um negócio jurídico unilateral próximo ao do contrato de mandato (que reclama bilateralidade). De todo modo, o autor admite que tradicionalmente a procuração vem sendo entendida como o instrumento do contrato de mandato como destacado no texto.

[4] Em linha semelhante, Estevan Lo Ré Pousada, discorrendo sobre o direito castelhano, minimiza o papel da "confiança" na definição dos contornos da advocacia, ao indicar que "o exercício da advocacia não se confundia com a ‘procuratio’ (‘personeria’). Enquanto o procurador é o homem de confiança do principal, encarregado da gestão de seus negócios – ainda que desprovido de certos conhecimentos técnicos e específicos – o advogado é o simples perito em direito, apto a (bem) articular em juízo" (Ibidem, p. 176). Para o autor, a insistência em confundir o papel de advogado com o de procurador "tumultua a compreensão dos conceitos jurídicos mais elementares – ao mesmo tempo em que forja uma relação de confiança completamente artificial entre um sujeito e seu advogado, constituído na calada da noite, por exemplo, para a apresentação de uma defesa processual sujeita a prazo peremptório" (Ibidem, p. 176).

[5] Disponível em https://www.conjur.com.br/2015-dez-04/unificacao-carreiras-agu-apoiada-72-membros. Acesso em 1º de abril de 2021. A expressão "procurador da União", para além de vir carregada de todas as inconveniências do termo "procurador", caso venha a ser consagrada algum dia, ocasionará dificuldades concretas, na medida em que passará a ideia de que os titulares dos cargos não teriam poderes para atuar em nome de autarquias e fundações federais, que são pessoas jurídicas de Direito Público diferentes da União.

Pablo Bezerra Luciano é procurador do Banco Central do Brasil, foi presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Banco Central do Brasil (APBC) e membro suplente do Conselho Superior da Advocacia-Geral da União (CSAGU).


Fonte: Conjur, de 7/4/2021

 

 

Observatório do TIT: O Crédito do ICMS na aquisição de mercadorias

GRUPO DE PESQUISA SOBRE JURISPRUDÊNCIA DO TIT DO NEF/FGV DIREITO SP

Com a promulgação da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 foram estabelecidas disposições relativas ao crédito de ICMS decorrente da entrada de bens e mercadorias no estabelecimento destinadas ao ativo permanente havendo, inclusive, a previsão de direito ao crédito referente à entrada de mercadoria destinada a uso e consumo a partir de 1998, que foi sucessivamente prorrogado para 2000, 2003, 2007, 2020 e atualmente 2033 – (Artigos 20 e 33 da LC 87/96).

Questão relevante refere-se ao direito ao crédito de ICMS nas entradas de mercadorias que não forem empregadas para integração no produto ou para consumo no respectivo processo de industrialização, que na acepção do artigo 66, inciso V, do RICMS/2000 são consideradas de uso e consumo, cujo crédito é vedado.

Tal fato tem originado decisões divergentes nas Câmaras integrantes do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT).

A respeito do assunto, a Consultoria Tributária tem exarado entendimento no sentido de que tais mercadorias não geram direito a crédito de ICMS.[1]

O objetivo do presente é analisar o AIIM nº 4.090.184-1 lavrado em virtude do contribuinte ter-se creditado indevidamente do ICMS decorrente de escrituração nos livros registros de entradas de mercadorias não utilizadas diretamente no processo produtivo, tendo sido mantido em decisão de primeira instância.

Contudo, na apreciação do Recurso Ordinário interposto pelo contribuinte, a Oitava Câmara Julgadora deu provimento parcial ao recurso, cujo trecho do voto da Juíza Relatora Dra. Rose Sobral destaco:

“22) Do confronto entre os produtos constantes na citada decisão normativa e os produtos objeto da acusação, listados no Demonstrativo I, fls. 14 e seguintes, alguns deles são indicados expressamente na decisão normativa como passíveis de creditamento, ou seja, eletrodos, acetileno e oxigênio. De outro giro, demais gases e argônio podem ser aceitos por similaridade. Neste passo, tais materiais devem ser excluídos da acusação, frisando-se que os mesmos foram especificados pelo interessado em fls. 4464 de seu Recurso Ordinário, correspondendo aos “nºs 1 a 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24 a 47, 48 a 52, 54 a 68, 70 a 73, 75, 76, 78, 79, 81, 82, 87, 88,93a100,108,110,113,114,121, 122, 124 a 128, 135, 138, 141 a 147, 157, 161, 164a166,179a181,184a188,203,207, 208, 213, 216 a 218, 223, 224, 226, 228 a 235, 237 a 250, totalizando 152 itens…”.

23) Sobre tais itens, mantenho a posição que adotei quando do julgamento do AIIM 3.146.484, envolvendo o mesmo contribuinte. Analisando as acusações vertidas nos itens 3 e 4 daquele auto de infração, exclui das exigências eletrodos e oxigênio, mantendo, no mais, as práticas infracionais.”

Desse modo, a decisão assegurou ao contribuinte o direito ao crédito dos demais gases e argônio por similaridade àqueles considerados passíveis de crédito, com base no item 3.1 – insumos da Decisão Normativa CAT 01/2001.

Cabe ressaltar que a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ) é no sentido de que as mercadorias (ex. telas, mantas e feltros) são adquiridas pelo contribuinte para serem integralmente consumidos no processo de industrialização do papel, viabilizando, assim, a sua atividade fim[2].

Assim, no entendimento do STJ verifica-se que tais materiais não se enquadram como de uso ou de consumo do estabelecimento, mas, como produtos intermediários imprescindíveis ao processo de fabricação e por isso, o creditamento correspondente a essas entradas não está sujeito à postergação de que trata o art. 33, I, da LC 87/96.

Em 19/01/2021, na apreciação do Recurso Especial interposto pela Fazenda Pública face ao provimento parcial do Recurso Ordinário interposto pelo contribuinte referente ao AIIM nº 4.090.184-1 em comento, a Colenda Câmara Superior do TIT deu provimento ao recurso da Fazenda Pública para restabelecer a exigência fiscal como posta na exordial.

Em voto vista, o Juiz Marco Teixeira, após apontar que a Decisão Normativa CAT 01/2001 exige que “os seguintes insumos que se desintegram totalmente no processo produtivo…”, “o que faz que tal norma tenha aplicabilidade diferente em função do ramo de atividade”, fundamentou sua decisão com base na jurisprudência pacificada pelo STF, conforme julgamento do RE 689001/RS, Relator Ministro Dias Toffoli, em 22 de junho de 2017, cujo trecho destaco:

“09. A questão de se poder creditar de materiais que não se consomem integralmente no processo produtivo já está pacificada pelo STF, conforme julgamento do RE 689001/RS, Relator Ministro Dias Toffoli, em 22 de junho de 2017, a seguir transcrito:

“(…) Como se vê, de acordo com as balizas fixadas no acórdão recorrido, não pende controvérsia acerca da classificação dos bens intermediários que gerariam o direito ao crédito. O Tribunal de origem com base diretamente no art. 155, § 2º, I, da Constituição Federal, concluiu que gera direito a crédito de ICMS a aquisição de bens intermediários que, sem se integrarem ao produto final, são utilizados ou consumidos no processo de industrialização. Verifica-se que o entendimento da Corte a quo destoa da orientação do Supremo Tribunal Federal. (…)

Acerca dos produtos intermediários, sujeitos ao crédito físico, também é firme a jurisprudência da Corte no sentido de que somente aqueles que integram fisicamente o produto final é que gera o direito ao crédito, o que não ocorre no caso concreto, conforme assentado no Tribunal de origem.”

Pelo exposto, verifica-se que a jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal é contrária ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não conferindo direito ao crédito aos materiais que não integram ou não são consumidos no processo produtivo[3].

Nesse sentido, a recente decisão da Câmara Superior do TIT, prolatada por maioria de votos, consigna que “somente o crédito físico é que pode ser admitido”, seguindo a orientação majoritária dos acórdãos publicados no período de 1º de agosto de 2009 a 31 de maio de 2017, que foram objeto da pesquisa realizada no âmbito da primeira fase do Observatório do TIT, sob o título Direito ao Crédito de ICMS.

Em pesquisa sobre o tema destacamos ainda os seguintes processos administrativos:

Processo DRT-04-262540/2009 – AIIM nº 3.111.479-9 – Acusação de Crédito indevido referente a material de uso e consumo (Item I.3). Recurso Especial da Fazenda Pública conhecido e provido pela Câmara Superior para o fim de restabelecer na íntegra as acusações descritas nos itens 1.3 e I.4 do AlIM.

Processo/Número AIIM 4.097.553-8 – Acusação: crédito indevido referente a material que não se consome no processo produtivo. Recurso Ordinário Conhecido e Não Provido. Recurso Especial interposto pelo contribuinte pendente de julgamento pela Câmara Superior.

Conforme se verifica, as Câmaras Julgadoras têm proferido decisões conflitantes sobre o direito ou não ao crédito na entrada de mercadorias que não forem empregadas para integração no produto ou para consumo no respectivo processo de industrialização.

Assim, torna-se relevante a pacificação desse entendimento pela Câmara Superior, de modo a tornar os julgamentos mais céleres pelas Câmaras Julgadoras do Egrégio Tribunal de Impostos e Taxas.

Autoria:

Odilo Sossoloti

Coordenação:

Eurico Marcos Diniz de Santi

Eduardo Perez Salusse

Lina Santin

Dolina Sol Pedroso de Toledo

Kalinka Bravo

[1] RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 22524/2020, de 06 de janeiro de 2021 – disponibilizada no site da SEFAZ em 07/01/2021.

Ementa

“ICMS – Crédito – Fresas, pastilhas, machos, brocas, alargadores e brunidores utilizados como ferramentas no processo produtivo.

Os materiais trazidos à análise não devem ser considerados insumos de produção da espécie “produto intermediário” nem da espécie “material secundário”, e sim material de uso e consumo do estabelecimento.”

[2] (REsp 1366437/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/10/2013, DJe 10/10/2013).

[3] AI nº 418.729/SP-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 4/3/05; RE nº 540.588/MG-AgR, Primeira Turma, Relator Ministro Dias Toffoli, DJe de 21/3/13; ARE nº 970.323/DF, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 15/2/17; ARE nº 725.544/MG-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Marco Aurélio, DJe de 4/9/13.

GRUPO DE PESQUISA SOBRE JURISPRUDÊNCIA DO TIT DO NEF/FGV DIREITO SP


Fonte: JOTA, de 8/4/2021

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