Fisco
paulista reduzirá multas e juros para inadimplentes do
ICMS
O
Governo do Estado de São Paulo estuda implantar um
Programa Especial de Pagamento de Débitos Fiscais (PEP)
do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS), em que a redução do valor dos juros e das
multas podem chegar em até 100%, sobre débitos do
ICM/ICMS, inscritos ou não na dívida ativa e que foram
apurados até 31 de dezembro de 2005. O programa ficaria
a cargo da Secretaria da Fazenda e da Procuradoria Geral
do Estado.
A
medida tem amparo no Convênio ICMS 50/06, aprovado pelo
Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), em
julho deste ano, que autorizou os estados a dispensar do
pagamento de juros e multas os débitos do ICMS. Em
agosto, o Estado de São Paulo aderiu a esse convênio,
por meio do Convênio 73/06, assim como outros estados
da Federação.
Com
base em experiências anteriores, a Secretaria da
Fazenda estimou arrecadação adicional de
aproximadamente R$ 500 milhões com a implementação do
programa. Desse montante, cerca de R$ 125 milhões serão
destinados aos municípios, como prevê a legislação
relativa à repartição de receitas derivadas da
arrecadação do ICMS.
A
proposta, encaminhada à Assembléia Legislativa sob a
forma do Projeto de Lei 501/2006, atende a uma série de
solicitações de entidades representativas dos
contribuintes e destes isoladamente, além de
iniciativas no âmbito do Poder Legislativo, no sentido
de criar condições para reduzir a inadimplência e
estimular o cumprimento das obrigações tributárias em
atraso, podendo inclusive, abranger as decorrentes da
fruição de benefícios fiscais irregulares, como os da
chamada guerra fiscal. Além disso, irão propiciar a
redução das disputas judiciais que envolvem a cobrança
de impostos em atraso, por meio do recolhimento com
descontos e desistência de ações ou recursos por
parte dos contribuintes.
O
programa prevê vários prazos para o recolhimento
integral do imposto, atualizado nos termos da legislação
vigente, com variação da redução do valor das multas
e dos juros. Entre as opções, aqueles que optarem pelo
parcelamento até 30 de setembro deste ano, terá redução
de 100% do valor das multas e de 50% do valor dos juros.
Ao que
entrarem no programa até 31 de outubro, é oferecida
redução de 90% do valor das multas e de 50% do valor
dos juros. Já quem procurar a Fazenda até 30 de
novembro, terá redução de 80% do valor das multas e
de 50% do valor dos juros e, finalmente, os que optarem
pelo parcelamento até 22 de dezembro, usufrirão de
redução de 70% do valor das multas e de 50% do valor
dos juros. Em todos os casos, tanto multas como juros
serão calculados até a data do recolhimento.
Além
dos benefícios, o projeto estabelece a aplicação
dessas normas a parcelamentos celebrados e em andamento
na data da publicação da lei, apurando-se os saldos
devedores sem o acréscimo financeiro que incidiria nas
parcelas vincendas.
As
regras e procedimentos para a adesão ao Programa
Especial de Pagamento de Débitos serão estabelecidas
por resoluções do Secretário da Fazenda e do
Procurador Geral do Estado, após a aprovação do
projeto de lei, esperado para em breve.
Fonte:
DCI
Órgão
de abastecimento de água deverá abrir inscrição
estadual
Órgãos
municipais de captação, tratamento e distribuição de
água natural canalizada para domicílios devem
inscrever-se no cadastro de contribuintes do ICMS a
partir desta segunda-feira, 14 de agosto. A determinação
está na Portaria CAT 56, de 11/08/2006, publicada no
DOE de 12 último.
A
portaria do fisco paulista disciplina também as demais
obrigações acessórias a que ficarão sujeitos esses
órgãos, sejam da administração centralizada ou
autarquias. Assim, são definidos os livros fiscais de
escrituração obrigatória, o momento de emissão de
documento fiscal e o preenchimento da Gia mensal, para
informação do movimento econômico do período ao
fisco. A isenção para o fornecimento de água natural
para redes domiciliares, contudo, continua em vigor.
Segundo
o coordenador da CAT, Henrique Shiguemi Nakagaki, a
alteração visa melhorar a posição dos municípios
que dispõem de órgão próprio de abastecimento de água
no Índice de Participação dos Municípios, usado no cálculo da cota parte municipal na arrecadação do ICMS.
Isso porque o movimento econômico dessas companhias,
declarado em Gia, é um dos componentes considerados no
cálculo do Índice. Nakagaki informa que a Sabesp já
declara o seu movimento econômico.
“A
iniciativa pretende apenas aperfeiçoar o cálculo do índice,
fazendo com que sejam considerados os movimentos econômicos
de todos os órgãos de abastecimento de água. Dessa
forma, beneficiaremos dezenas de municípios com o
aumento de sua cota-parte do ICMS”, comenta o
coordenador do fisco paulista.
Fonte:
Secretaria da Fazenda
STF
julga Cofins de sociedades
O
Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar hoje a
constitucionalidade da cobrança da Cofins das
sociedades de profissionais liberais. O processo está
previsto para entrar na pauta de hoje da segunda turma
da corte. Apesar de já ter sido adiado duas vezes, a
expectativa de advogados e da Fazenda Nacional é que o
julgamento do processo seja pelo menos iniciado. A análise
desse processo é aguardada com ansiedade pelos
contribuintes em razão de um precedente da primeira
turma do Supremo.
Em maio
deste ano, a primeira turma declarou a competência do
Supremo para julgar o tema. Até então, a questão era
pacífica no Superior Tribunal de Justiça (STJ), cuja Súmula
nº 276 é favorável ao contribuinte declarando que a
contribuição não é devida pelas sociedades. Por
isso, todas as vezes que algum processo de sociedades -
que atinge todos os tipos de profissionais liberais,
como advogados, médicos e contadores - chegava ao STJ,
a questão estava praticamente ganha pelo contribuinte.
O panorama, porém, começou a mudar quando a Fazenda
conseguiu levar o tema para o Supremo, sob o argumento
de que se tratava de assunto constitucional que somente
pode ser julgado pela corte. Além de reconhecer que se
trata de assunto constitucional em um voto do ministro
Sepúlveda Pertence, no mérito a primeira turma deu
ganho à Fazenda.
O
coordenador-geral da representação judicial da
Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), Fabrício
Da Soller, afirma que o processo que vai ser julgado é
um recurso do contribuinte e que, portanto, a questão
da competência não deve ser abordada na discussão.
Mas, segundo ele, com o julgamento pela segunda turma, a
questão se fecha no Supremo.
O conteúdo
do voto do ministro Sepúlveda Pertence, contudo, ainda
gera dúvidas entre advogados tributaristas. Muitos
defendem que o voto não entrou no mérito, mas apenas
esclareceu o problema processual da admissão do
recurso. Na prática, segundo advogados, o que tem
ocorrido é uma troca de processos entre STJ e Supremo.
Segundo o advogado Savio de Faria Caram Zuquim, do
escritório Caram Zuquim e Espírito Santo, muitos
recursos sobre o assunto que chegam ao STJ são
remetidos ao Supremo sem análise. E o contrário: o
Supremo remete para o STJ analisar os pontos
infraconstitucionais questionados no processo. "A
questão está bem confusa", diz o advogado Rogério
Aleixo. Para ele, a decisão da primeira turma não
deixa claro se a decisão do STJ foi cassada ou não.
A
seccional de Goiás da Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB-GO), por exemplo, já tinha ganho no STJ uma ação
que liberava os escritórios de advocacia do Estado de
pagar a Cofins. A Fazenda recorreu e o Supremo julgou
que a matéria é de cunho constitucional. Segundo a
Fazenda, o Supremo devolveu os autos ao STJ para que a
corte se manifeste apenas sobre as questões
infraconstitucionais do processo. Em razão disso,
temporariamente a não-exigibilidade da Cofins fica
suspensa. A OAB informou que já entrou com agravo
regimental no Supremo para discutir a decisão, pois,
segundo a entidade, o tema não tem natureza
constitucional.
Fonte:
Valor Econômico, de 15/08/2006
DECRETO
Nº 51.053, DE 14 DE AGOSTO DE 2006
Ratifica
convênios celebrados nos termos da Lei Complementar
federal n° 24, de 7 de janeiro de 1975, e aprova
protocolo
CLÁUDIO
LEMBO, Governador do Estado de São Paulo, no uso de
suas atribuições legais e tendo em vista o disposto no
artigo 4° da Lei Complementar federal n° 24, de 7 de
janeiro de 1975, Decreta:
Artigo
1° - Ficam ratificados os Convênios ICMS- 72/06, 73/06
e 74/06, celebrados em Brasília, DF, no dia 3 de agosto
de 2006, publicados na Seção I, páginas 41 e 42, do
Diário Oficial da União de 7 de agosto de 2006.
Artigo
2° - Fica aprovado o Protocolo ICMS-26/06, celebrado em
Brasília, DF, no dia 3 de agosto de 2006, publicado na
Seção I, página 14, do Diário Oficial da União de
10 de agosto de 2006.
Artigo
3° - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação
Palácio
dos Bandeirantes, 14 de agosto de 2006
CLÁUDIO
LEMBO
Luiz
Tacca Junior
Secretário da Fazenda
Rubens Lara
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado na Casa Civil, aos 14 de agosto de 2006.
Fonte:
D.O.E. Executivo I, publicado em Atos do Governador
STF é tribunal do cidadão, diz professor Peter Häberle
“As
grandes decisões, a exemplar revalorização do direito
processual constitucional, os votos de alto nível de
ministros, o manejo das petições do amicus curiae:
tudo isto torna o Supremo Tribunal Federal (também graças
ao controle concreto de constitucionalidade) um
‘tribunal do cidadão’ par excellence.” A
constatação é do professor alemão Peter Häberle, um
dos grandes nomes internacionais do Direito, ao relatar
suas impressões sobre o Brasil.
Häberle
esteve no país por duas semanas em setembro de 2005. Na
ocasião, o professor recebeu o título de doutor honoris
causa pela Universidade Nacional de Brasília, mais
um na sua imensa lista. Härbele é doutor honoris
causa em diversos países.
Em
entrevista concedida a Ingo Wolfgang Sarlet e Pedro
Scherer de Mello Aleixo, ele falou da vida acadêmica no
país e da “rica vida constitucional do Brasil” que,
segundo ele, o motivaram a “desenvolver a idéia, já
há cerca de quatro anos proposta, de um direito
constitucional comum americano”.
Leia
a entrevista, traduzida por Virgínia Coelho Felippe dos
Santos.
O
senhor poderia compartilhar suas impressões da recente
visita ao Brasil, mencionando a distinção com o título
de doutor honoris causa pela UnB — Universidade
Nacional de Brasília, no dia 16 de setembro de 2005?
Peter
Häberle —
É uma honra e alegria poder realizar esta entrevista
científica com ambos, pois a diversidade cultural e o nível
científico do Brasil me impressionaram — para não
dizer “seduziram” — profundamente [H.-U. Gumbrecht
refere-se ao Brasil como “Nação do mito do exótico
e do erótico”, Frankfurter Allgemeine Zeitung,
de 26.10.2005, p.44].
Estive
por 14 dias em seu fascinante país e é com muito
prazer que participo desta entrevista científica. Nos
países de influência romana, sobretudo Itália e
Espanha, já de há muito as entrevistas científicas
representam um gênero literário autônomo e um frutífero
fórum de discussões. Elas oferecem determinadas
possibilidades que não encontram espaço nas rigorosas
formas das monografias ou artigos científicos. O
formato dialogado permite maior abertura e
flexibilidade, graças à imediatez dos jogos de
perguntas e respostas no lugar da “palavra escrita
unilateral“. Tatear em busca da verdade na acepção
dos diálogos da Antigüidade, também os limites do
reconhecimento do conhecimento podem ser ultrapassados
de modo a se alcançar a esfera de uma confissão.
O
momento pessoal e auto-biográfico (me reporto ao volume
de meus Kleinen Schriften [Pequenos Escritos],
Berlim, 2004, organizado por Wolfgang Graf Vitzthum, no
qual constam minhas entrevistas até agora realizadas
com parceiros de diversos países), se permite ser mais
forte do que na ciência, e a nossa entrevista deve também
refletir a inesquecível experiência de minha
sobremaneira alegre (ainda que fatigante) viagem ao
Brasil em setembro de 2005, como um ponto alto de minha
existência científica, acadêmica e pessoal para
terceiros, em especial a rica comunidade científica da
Nação cultural brasileira.
Partamos
agora para a sua pergunta inicial acerca de minha
impressão geral sobre seu país, descoberto em 1500,
cujas dimensões representam duas vezes o tamanho da
Europa. Inicio com as impressões positivas: se podem
reconhecer de imediato os surpreendentemente elevados níveis
de tolerância e abertura culturais, a ausência de
conflitos raciais acentuados, a despeito do
multiculturalismo (considerando-se a “herança
africana”) e o otimismo da nova geração,
precisamente a dos juristas, como pude depreender das
intensas discussões nas Universidades de Brasília e
Fortaleza.
Ter
encontrado um monumento a Goethe em Porto Alegre
alegrou-me tanto quanto a tropical Florianópolis. A
hospitalidade a mim dispensada pode ser comparada com a
que experimentei no México e no Peru, o que é um
grande elogio.
Graças
a seus talentos organizatórios, o professor Ingo Sarlet
preparou de maneira ideal esta viagem. Ele já havia me
visitado previamente em Bayreuth, de modo que pude
reconhecer com qual intensidade ele trabalhava por uma
ponte entre a comunidade de professores publicistas da
Alemanha e do Brasil. Ele é sobremaneira versado nos
escritos alemães e sua amabilidade o torna um
representante do Brasil. Alegro-me de poder ter construído
um relacionamento amigável com ele e seu aluno Pedro
Scherer de Mello Aleixo.
Não
se deve ignorar que a agitada, “incomensurável“ e
“imponente” São Paulo (cf. Frankfurter
Allgemeine Zeitung de 2/4/05, p.3, “A crítica
multidão de São Paulo não pode ser reprimida”)
teria me subjugado, não fosse o prazer intelectual de
um seminário (conduzido pelos professores Marcelo Neves
e Virgílio Afonso da Silva) realizado na famosa
Universidade de São Paulo, em um magnífico auditório
comparável com praticamente qualquer palácio italiano.
Não
se deve ignorar, todavia, a típica e saliente diferença
entre pobres e ricos, a qual pode ser ilustrada, em
parte, com base na diferença entre o norte e o sul de
seu “continente”. Para mim, mostra-se dificilmente
compreensível o fato de Brasília, no centro do país,
ser, desde 1960, a capital federal. Foi prima facie
bem construída, praticamente de forma “mágica“
(cf., novamente, Frankfurter Allgemeine Zeitung
de 19/10/05, p.34, que se utiliza de expressões como
“utopia construída” e “cidade retorta”). Brasília
segue como uma “capital sem povo“, ainda que
gradualmente lá se estabeleça uma nova geração própria,
que aos poucos cresce nesta fascinante cidade-arte de
Oscar Niemeyer.
Seguramente
nota-se que a teoria política transformou-se
diretamente em arquitetura (“Praça dos Três
Poderes”). Impressionei-me, também, com a
hospitalidade da Universidade de Brasília e do Supremo
Tribunal Federal, o que se deve à excelente condução
por parte do ministro Gilmar Ferreira Mendes (autor da
conhecida obra Jurisdição constitucional,
5.ed., 2005).
O
recebimento do título de doutor honoris causa
pela Universidade Nacional de Brasília comoveu-me
profundamente e encheu-me de enorme gratidão: escutar a
execução do hino alemão em homenagem a um mero acadêmico,
e não de um político, a honrosa laudatio por
parte do ministro Gilmar Ferreira Mendes, a magnificente
acolhida por parte do reitor, e a própria programação
musical com obras de Richard Strauss, Johann Sebastian
Bach e Heitor Villa Lobos (1887-1959) — justamente na
época do falecimento do alemão-brasileiro Hans-Joachim
Koellreutter, ao qual o universo musical brasileiro
muito tem de agradecer (Cláudio Santoro e Antônio
Carlos Jobim foram seus alunos).
Quais
seriam, na perspectiva de sua Teoria da Constituição
como Ciência da Cultura, os elementos constitutivos da
identidade cultural brasileira?
Peter
Häberle —
A pergunta acerca dos elementos de identidade cultural
de um país tão grande quanto o Brasil mostra-se
central para a minha teoria constitucional jurídico-comparativa
concebida de modo científico-cultural. O que mantém
unido, “no íntimo“, este país tão repleto de tensões?
O que dá origem à grande auto-consciência e coerência
inerentes ao Brasil? A sua sociedade aberta deve ser,
sim, culturalmente fundada, de modo não apenas a
permitir a manutenção da estabilidade de sua grandeza,
a despeito de sua quase inacreditável diversidade e
abertura, como também a possibilitar o desenvolvimento
de uma identidade própria.
No
Direito Constitucional europeu, a “identidade
nacional“ já é, a partir do direito positivado, um sólido
conceito. Mas o que significa uma “identidade
nacional“ especialmente no e para o Brasil? Os
seguintes elementos de identidade cultural de seu país
tornaram-se por mim conhecidos: primeiramente a língua,
especificamente o “musical” português-brasileiro;
seu som musical corresponde à amabilidade dos
brasileiros (o Rio de Janeiro, todavia, não conheço).
Em segundo lugar e imediatamente em seguida, a Igreja
Católica, muito vital e marcante, não apenas na
Catedral em Brasília. E, finalmente, em terceiro lugar,
mesmo que, a bem da verdade, não por meu entusiasmo
pessoal: o futebol.
Me
é particularmente difícil reconhecer o futebol como
elemento de identidade cultural ou mesmo “constitutivo
da cultura” de um Estado constitucional, mas o fato de
um pequeno país como a Croácia vencer uma partida de
futebol contra uma grande nação como a Alemanha, por
exemplo, dá-nos uma grande lição de ser a ele
inerente um momento de integração. Além disso, o
esporte, já desde há muito, constitui um tema
constitucional contemplado também pelo direito
comparado. Embora possa a comercialização do futebol
assustar os “europeus esclarecidos“, também o fazem
certas formas de manifestação, que o tornam
praticamente uma “religião substituta” com
procedimentos ritualísticos quase-litúrgicos (cf.,
recentemente, H. Küng em artigo no Frankfurter
Allgemeine Zeitung de dezembro de 2005). As regras
de lealdade e a força pedagógica que se manifestam no
jogo de futebol nos obrigam, também como juristas
constitucionais, a levá-lo a sério.
O
último — e quarto — elemento de identidade, mas
para mim, naturalmente, o “primeiro” é a música. O
Brasil possui grande tradição e cultura musical própria,
não apenas como “alta cultura” (Heitor Villa
Lobos), como também “cultura popular” (antigas
formas de danças dos escravos, por exemplo) ou
“cultura alternativa” (o carnaval). Desta forma, estão
presentes as três formas de “cultura“ — cultura
é uma palavra de Cícero (“cultivar, colher”) —,
“alta cultura” (“dos verdadeiros, bons e
belos”), “cultura popular” e “cultura do
dia-a-dia” no sentido de “cultura(s)
alternativa(s)”.
As
progressivamente protegidas culturas das culturas indígenas
latino-americanas (cf. Neue Zürcher Zeitung de
26/4/05, p.6 “Lula diz sim a uma reserva indígena”)
pertencem, ao meu ver, às três categorias
simultaneamente. “Observação compassiva“ de minha
parte, não por profundo conhecimento, o qual poderia
ser conquistado em anos, me levam a essa asserção no
que tange aos elementos da (multicultural) “identidade
nacional” brasileira, pela qual a consciência para
uma totalidade latino-americana (palavra-chave:
“direito constitucional comum latino-americano”?)
seria aceita. Nas meritórias informações a respeito
de países estrangeiros da Fundação Konrad Adenauer
consta precisamente acerca do Brasil “de Lula”:
“Meio-tempo com luz e sombra” (Fundação Konrad
Adenauer, 4/05, p.4 ss.).
Qual
sua avaliação da Constituição Federal brasileira de
1988?
Peter
Häberle —
Previamente, conhecia apenas a sua Constituição de
5/10/88, rica de inovações em inúmeros pontos, os
quais foram já cedo publicados em meu Jahrbuch [des
öffentlichen Rechts] (JöR 38, 1987, p.462 ss. —
já ainda mais cedo escreviam José Galvão de Sousa
assim como Christian Guy Caubet sobre o desenvolvimento
constitucional no Brasil: JöR 7, 1958, p. 353 ss. assim
como 38, 1987, p. 447 ss.). Refiro apenas textos como
seu impressionante preâmbulo, o qual contém uma
indispensável porção de utopia (“uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social”).
Cito
a bela expressão “a casa é asilo inviolável do
indivíduo” (art. 5, XI), a cláusula de proteção do
patrimônio cultural do artigo 5º, LXXIII, assim como a
iniciativa popular do parágrafo 4º do artigo 27. Também
merecedor de atenção é o artigo 193, com o
pioneirismo da expressão “primado do trabalho”. O
artigo 215, no que diz respeito à cultura, assim como o
artigo 182, no que tange à política urbana, constituem
elevados patamares textuais no âmbito do direito
comparado. Após ter estado por duas oportunidades no México
— graças a Diego Valades — e por uma vez ter
visitado o Peru — graças a García Belaunde assim
como César Landa —, já era hora de vir ao Brasil.
A
rica vida constitucional do Brasil me instigou a
desenvolver a idéia, já há cerca de quatro anos
proposta, de um “direito constitucional comum
americano” — analogamente à categoria de um
“direito constitucional comum europeu” (1983/91)
—, muito anterior a um “direito constitucional comum
asiático”, talvez possível em cerca de 100 anos (JöR
45, 1997, p.555, 576ss.), sem que isto se permita
vincular com um nivelamento da diversidade das culturas
jurídicas nacionais, que, graças a vossa estrutura
federativa (com 26 estados) e sua doutrina
constitucional plural, cresce tão exemplarmente (o
artigo 18, parágrafo 3º, é pioneiro, com a abertura
para a organização dos estados federados).
Palavras-chaves
seriam, por exemplo, a idéia do desenvolvimento de um
“direito processual-constitucional comum americano”,
ao menos na América Latina, no qual estaria abrangida a
Corte Interamericana de Direitos Humanos na Costa Rica,
e minha antiga doutrina (1976) de um “direito
processual-constitucional” como “direito
constitucional concretizado” e de sua autonomia frente
a outras regulamentações como os regimentos dos
tribunais e outras regulamentações processuais —
doutrina esta que poderia ser uma proposta de discussão.
Deve-se
ressaltar, ainda, que atualmente, na Europa, a
prosperidade econômica do Brasil vem sendo descrita
como “história de sucesso” (Frankfurter
Allgemeine Zeitung, de 19/4/05, p.11).
Como
o senhor percebe a práxis jurídico-constitucional
brasileira?
Peter
Häberle —
No que toca à palavra-chave “ciência viva do direito
constitucional” e à vívida práxis constitucional no
Brasil, fui de muitas formas positivamente surpreendido.
Em todos os planos de uma Constituição viva, em todos
os âmbitos de uma sociedade aberta dos intérpretes
constitucionais pude realizar, no Brasil, apenas observações
positivas. Comecemos com o Supremo Tribunal Federal, em
Brasília.
Personalidades
judiciais como Gilmar Mendes me possibilitaram uma
profunda visão de seu trabalho e de sua incontestada e
extraordinária autoridade. As grandes decisões, a
exemplar revalorização do direito processual
constitucional, os votos de alto nível de ministros, o
manejo das petições do amicus curiae: tudo isto
torna o Supremo Tribunal Federal (também graças ao
controle concreto de constitucionalidade) um “tribunal
dos cidadãos” par excellence.
O
tribunal é, ainda, apoiado por uma viva e muito
profissional comunidade científica: na geração mais
antiga avulta como representativo o decano Paulo
Bonavides (o qual, juntamente com Gilmar Mendes e Ingo
Sarlet, me encorajou à aventura desta viagem [ao
Brasil]); na geração emergente pude estudar as obras
de Gilmar Mendes, Ingo Sarlet, Ruy Espíndola, Martonio
Barreto, Gilberto Bercovici, Virgílio Afonso da Silva,
Luiz Magno e da professora Cristiane Peter da Silva (Hermenêutica
de direitos fundamentais, 2005).
Todos
eles conferem à doutrina constitucional brasileira um
perfil próprio, também para além da natural influência
portuguesa, onde se pode reconhecer e abertamente
discutir influências alemãs. Esta ciência criou para
si diversos fóruns e desenvolveu múltiplos gêneros
literários: ocorreram, em função de minha presença,
calorosos seminários, círculos de trabalho, encontros
e frutíferas conversas em pequenos círculos.
A
riqueza dos gêneros literários é sobressalente: de
grandes manuais (por exemplo, André Ramos Tavares et.
al. [Org.], Lições de direito constitucional em
homenagem ao jurista Celso Bastos, 2005; Luís
Roberto Barroso, Interpretação e aplicação da
Constituição, 5.ed., 2003), assim como artigos
basilares (Gilberto Bercovici, Die dirigierende
Verfassung und die Krise der Verfassungslehre am
Beispiel Brasilien, VRÜ 2004, p.286 ss.), passando
pelas monografias (como, por exemplo, Ingo Sarlet, A
eficácia dos direitos fundamentais, 6.ed., 2006; Rafael
Caiado Amaral, Peter Häberle e a hermenêutica
constitucional, 2004), até enriquecedoras coletâneas
(por exemplo, acerca de dignidade da pessoa humana, Ingo
Sarlet [Org.], Dimensões da dignidade, Porto
Alegre, 2005, com contribuições de autores europeus,
cujas obras cada vez mais concorrem com as
norte-americanas) e até mesmo escritos em homenagem de
determinados autores (como no caso do professor Paulo
Bonavides, Belo Horizonte, 2005). Deve-se referir,
ainda, à Revista Latino-Americana de Estudos
Constitucionais de Paulo Bonavides, conduzida em
alto nível.
Duas
instituições que dizem respeito à práxis judiciária
devem ser expressamente citadas: a seccional da Ordem
dos Advogados do Brasil em Florianópolis, perante a
qual pude palestrar (meu paradigma da “sociedade
aberta” foi, inclusive, aceito em uma votação com
apenas duas abstenções), e a Associação dos
Magistrados Catarinenses (igualmente em Florianópolis,
com seu maravilhoso ambiente ilhéu). Lá, pude
experienciar, junto aos demais conferencistas, do mais
alto quilate (o professor Jonas Machado, de Coimbra,
dentre outros, proferiu uma primorosa palestra), o quão
culta e interessada é a magistratura brasileira.
A
magistratura, como podem atestar meus anfitriões,
juntamente com a classe dos advogados e a imprensa,
assim como alguns publicistas, afirmou-se inclusive
durante o período de ditadura (os artigos 133 e
seguintes de sua Constituição criaram impressionantes
normas para o exercício da advocacia). Peter Naumann
foi um primoroso tradutor também em Florianópolis.
Como
o senhor sintetizaria o resultado de sua viagem ao
Brasil?
Peter
Häberle —
Uma palavra final sintetizadora enquanto olhar
retrospectivo e prospectivo: o resultado a longo prazo
de minha viagem [ao Brasil] poderei mensurar
completamente talvez em um maior interstício temporal.
Que desde hoje seja manifestado o meu permanente
sentimento de gratidão.
Dois
vultos já clássicos serviram-me como “condutores
intelectuais”: Alexander von Humboldt, o qual
celebrava Simón Bolívar como o “verdadeiro
descobridor da América”, e Stefan Zweig, o qual
falava do Brasil já em 1941 como “um país do
futuro” (TB 1994) (também digno de leitura W.L.
Bernecker et. al., Eine kleine Geschichte Brasiliens,
2000). Agora mesmo foram publicadas as suas Cartas
selecionadas [Ausgewählten Briefe] (1932 – 1942,
S. Fischer Verlag, 2005), nas quais se encontram
palavras, por exemplo, acerca da “amabilidade das
classes simples, que não conhecem nem organização,
nem inveja”.
Caso
eu proceda à realização de um escrito “Cartas pedagógicas
a um jovem jurista constitucional”, como planejo para
mais tarde (tenho em conta especialmente o jovem e
promissor professor Miguel Azpitarte, de Granada, que pôde
me acompanhar energicamente por estes inesquecíveis 14
dias), à cultura constitucional do Brasil será
certamente conferido um lugar especial. A impressionante
rica vida acadêmica no Brasil, o fato de as instituições
estarem basicamente funcionando, a ”agitação” dos
jovens estudantes das ciências jurídicas, a suavidade
nas relações pessoais dos brasileiros fazem com que
este país seja também aos meus olhos um “país do
futuro” (Stefan Zweig).
O
Brasil presta já hoje um grande serviço ao Estado
constitucional como tipo, em todos os déficits, carências
(como, por exemplo, os casos de corrupção e a acumulação
de cargos e funções) e omissões (cf. Claude Lévi
Strauss, Traurige Tropen, 1978). Uma doutrina
constitucional com propósitos cosmopolitas, no sentido
de Immanuel Kant não se permite delinear sem referência
às contribuições brasileiras. Em mais de um aspecto,
poderia caber a este país maravilhoso uma função de
modelo em relação a toda América Latina.
Quando
Paulo Bonavides, em minha despedida, disse-me, meio
motivador, meio vaticinante e esperançoso, ser eu “um
amigo do Brasil”, concordei com gratidão. Amizades
científicas no que tange ao Estado constitucional, por
fronteiras e continentes afora (no sentido de uma “república
erudita global”), são mais importantes do que nunca
(particularmente porquanto o direito internacional há
de ser desenvolvido como “direito da humanidade”).
Elas alegram aqueles que com isto consentem.
Porque
haveria de ter-se felicidade apenas na arte e entre
homens individualmente? Há também felicidade na ciência
de uma doutrina de direito constitucional comparado,
contanto que a ela estejam vinculados aqueles momentos
pessoais, como os que pude experienciar em tão larga
medida em duas semanas no Brasil. Surgiram amizades,
algo que pelo visto é um talento específico dos
brasileiros. Prefiro, certamente, não comentar a
orgulhosa frase “Deus é brasileiro”!
A
Constituição da África do Sul constitui exemplo de
institucionalização da idéia pelo senhor sugerida do
jus-comparativismo como quinto método de interpretação.
Como o senhor avalia o papel dessa noção para o século
XXI?
Peter
Häberle —
Esta tese foi por mim primeiramente em 1989
desenvolvida. Vinculada aos quatro clássicos cânones
de Savigny, esta proposta teórica tem sido na
atualidade discutida quase que globalmente. O Tribunal
Constitucional de Lichtenstein já há alguns anos
invocava expressamente minha doutrina. Muitos outros
Tribunais Constitucionais da Europa também se utilizam
do direito comparado em suas decisões. Até o presente
momento, contudo, não se optou por sua canonização
como quinto método. Desta forma, deve-se aludir somente
à elevada categoria, e não a uma determinada ordem dos
quatro cânones interpretativos.
Como
vocês sabem, não há até o presente momento uma
hierarquia segura relativa aos quatro métodos de
interpretação. Os tribunais a criam provavelmente
partindo da sua capacidade de aplicação jurídica, ou
seja, de seu controle de justiça. Assim pode realmente
acontecer que o método histórico de interpretação não
constitua o início, mas que seja, dentro do contexto do
pluralismo dos métodos de interpretação, acrescentado
no final, a título de corroboração.
Além
disso, suponho que o método primário de interpretação
é o teleológico, sendo os demais métodos apenas
complementarmente adicionados.
Por
fim, minha sugestão é mencionada no Handbuch für
Schweizerisches Verfassungsrecht, de 2001: uma
interpretação orientada ao contexto. Isto significa
interpretação através de um “acrescentar de outras
idéias”.
Não
poucos elementos da cultura jurídica européia possuem
uma pretensão universal (cf. seu recente artigo Der
europäische Jurist vor den Aufgaben unserer gemeinsamen
Verfassungs-Zukunft, Jahrbuch des öffentlichen Rechts
53, 2005, p.478). Daí o senhor falar de uma irradiação
das idéias jurídicas européias além-mar (Ausstrahlung
der europäischen Rechtsideen nach Übersee), sempre
frisando que os processos de europeização não devem
ser tomados como formas ocultas de novas colonizações.
Quais os limites da cultura jurídica européia em suas
intenções universais, sobretudo diante do
fundamentalismo islâmico?
Peter
Häberle —
De fato, existem vários elementos da cultura jurídica
européia com pretensão de universalidade. A estes
pertencem a dignidade da pessoa humana, no sentido de
Immanuel Kant, o princípio do Estado de Direito e
alguns direitos fundamentais, assim como a máxima da
justiça na concepção de Aristóteles a John Rawls.
O
“coração“ dos Estados constitucionais europeus é,
não por último, o princípio constitucional da tolerância,
ao qual chegou a Europa apenas após muitos séculos de
longas guerras religiosas. Um texto clássico a este
respeito é a parábola do anel, de Lessing, que também
abrange os muçulmanos. Eu muito advirto para os
processos de recepção e produção no que tange ao
Estado constitucional: deve-se também respeitar o
particular e o específico das outras culturas. Neste
sentido, o auxílio de meu princípio científico-cultural:
Constituição como cultura.
A
compreensão de família na África ou em Estados Islâmicos,
por exemplo, difere de sua compreensão na Europa. O
modo como os Estados constitucionais europeus devem se
comportar perante o fundamentalismo islâmico resta
ainda inexplicado. Há anos, proponho, seguindo outros
autores, lutar por um “Euro-Islã”. Certamente só
pode haver tolerância na reciprocidade. É de se supor
que precisamos, para esta enorme tarefa, de um novo Hugo
Grotius no direito internacional e de um novo John Locke
no direito constitucional. Afinal, somos apenas “anões
sobre os ombros de gigantes”.
O
senhor sustenta existir, tanto na arte como na ciência,
um contrato cultural de gerações entre professores e
estudantes, entre mestres e alunos, do qual a ciência
do direito constitucional aufere vitalidade. O senhor
poderia tecer algumas considerações sobre a importância
do seu relacionamento científico com seu professor
Konrad Hesse e discorrer sobre a importância de Rudolf
Smend, seu “avô-científico”, na perspectiva da
sempre pelo senhor lembrada metáfora do “anão sobre
os ombros de gigantes”?
Peter
Häberle —
A idéia de um contrato científico entre gerações
foi, há alguns anos, por mim tomada de empréstimo da
arte, onde já existe há séculos um contrato cultural
de gerações entre mestres e alunos. Pense-se na
Renascença italiana. No âmbito do direito
constitucional, falo com prazer acerca dos clássicos
weimarianos. Não me refiro apenas a grandes textos,
juridicamente relevantes, de Goethe e Schiller, mas também
mestres como Hermann Heller, Rudolf Smend, Carl Schmitt
e Hans Kelsen.
Enquanto
na América Latina reverencia-se especialmente Hans
Kelsen, na Espanha Hermann Heller, ao qual sinto-me
quase mais ligado do que a meu próprio “avô” científico,
Rudolf Smend. Devo muito, senão tudo aos seminários de
Konrad Hesse. O livro Grundzüge des Verfassungrechts
der Bundesrepublik Deutschland [Elementos de direito
constitucional da República Federal da Alemanha],
de Hesse, marcou não apenas a mim, mas a toda uma geração
de juristas alemães. A isto pertence não apenas a arte
da estruturação e a sensível consciência do
problema, mas também a capacidade de se questionar as
pré-compreensões e de se buscar as condições prévias
do pensamento. Uma idéia fundamental não só pedagógica,
como científica é o princípio da “concordância prática”.
A
geração de meus atuais colegas considera
verdadeiramente que eles mesmos sejam gigantes. Sou,
todavia, da opinião de que até hoje não realizamos
algo que se possa comparar com os clássicos weimarianos.
Isto é, contudo, controverso.
O
senhor enxerga a música como linguagem universal. Em
que medida o papel por ela exercido em sua formação
pessoal influenciou o alinhamento jurídico-comparativamente
aberto, interdisciplinar, humanista e, sobretudo, a
sensibilidade científico-cultural caracterizadores de
sua teorização doutrinária?
Peter
Häberle —
A música é, talvez, a língua mais universal, não
apenas quando se pensa no eterno Johann Sebastian Bach e
no divino Wolfgang Amadeus Mozart. Agradeço pela sua
amigável suposição de que haveria uma influência
musical em minha obra científica. Assim o é de fato.
Vocês referiram a palavra-chave decisiva. Acrescento,
ainda, um elemento estilístico: concebo muitas
palestras praticamente como uma “composição”.
Tenho prazer em trabalhar com elementos rítmicos e com
o método dos contrapontos. Não posso lhe conceder uma
visão mais ampla de minha pequena “oficina” [Werkstatt].
Em
minha viagem ao Brasil, aprendi muito da grande música
de seu país, como, por exemplo, de Villa Lobos.
Finalizemos
com uma pergunta envolvendo uma verdadeira “paixão
nacional“ brasileira, nomeadamente, o futebol. O
senhor afirma, em seu recente ensaio Der europäische
Jurist vor den Aufgaben unserer gemeinsamen
Verfassungs-Zukunft, que também os campeonatos
europeus de futebol auxiliam a consolidação da esfera
pública européia. Lembremos que 2006 foi ano de Copa
do Mundo, com realização na Alemanha. Poderia esta sua
idéia a respeito do futebol ser estendida para o plano
mundial, mais especificamente no que toca ao futebol
como elemento consubstanciador da identidade cultural
dos povos?
Peter
Häberle —
O futebol é certamente um elemento da identidade
cultural brasileira, ainda que me seja difícil reconhecê-lo
como tal.
Nele,
são apreendidos lealdade e competitividade, ambos
igualmente necessários nas disputas no âmbito da
comunidade estatal. Os campeonatos europeus de futebol
constituem um pedaço da esfera pública européia,
pertencendo à nossa identidade. Certamente não
desconheço a proeminência comercial do mundo futebolístico.
Também é desconcertante que muitos jogadores de uma
seleção nacional não venham daquele respectivo país.
Quanto
à sua pergunta acerca da Copa do Mundo de futebol,
apenas isto: aqui se forma uma parcela da esfera pública
mundial de nosso único, azul, planeta Terra. Posso
apenas esperar que ela se torne uma nobre competição
de nações. Uma vez que muitos homens atribuem
significado relevante ao futebol, devemos, como juristas
constitucionais, fazer de tudo para que não pensemos de
maneira elitista sobre este tema. Democracia é, também,
uma forma de vida.
Agradeço-lhes
cordialmente: suas perguntas foram melhores do que
minhas respostas!
Fonte:
Conjur