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Out
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Comunicado: resultado do concurso de promoção (condições existentes em 31/12/2012) dos níveis I para II; III para IV; IV para V

 

Extrato da Ata da 36ª Sessão Ordinária-Biênio 2013/2014

Data da Realização: 11-10-2013

 

Clique aqui para o anexo I

Clique aqui para o anexo II

 

Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 12/10/2013

 

 

 

PEC 82: ANAPE intensifica contato com parlamentares

 

A direção da ANAPE manteve na quarta-feira (09/10) contato com as bancadas na Câmara dos Deputados visando à indicação dos parlamentares pelos partidos para que até o dia 22 de outubro possa ser instalada a Comissão Especial que trata da PEC 82/2007. A proposta de emenda trata da autonomia administrativa, orçamentária e funcional para a Advocacia Pública nos três níveis da federação. Além da bancada do PT que ainda não formalizou a indicação dos deputados que integrarão a comissão, a ANAPE se reuniu com o PMDB e com o Deputado Lelo Coimbra, provável relator da PEC. Na liderança do PSDB, o chefe de gabinete assegurou o envio das indicações ainda durante esta semana A instalação da CE que irá discutir a PEC 82 foi aprovada pelo Presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves, (PMDB-RN), no dia 03 de setembro, durante ato público promovido pelas entidades da Advocacia Pública.

 

Fonte: site da Anape, de 12/10/2013

 

 

 

ANAPE se reúne com o relator do Novo CPC

 

O Deputado Paulo Teixeira (PT-SP) recebeu na quarta-feira (09/10), a diretoria da ANAPE em seu gabinete para discutir o Projeto de Lei nº 6.025/2005 (Projeto do Novo Código de Processo Civil). No encontro foi discutido, entre outros temas, a redação dada à questão dos honorários para os Advogados Públicos. A expectativa do parlamentar é de que o Projeto de Lei nº 6.025/2005 seja votado pelo Plenário da Câmara dos Deputados, na próxima semana. Teixeira observou que a intenção da proposta não é assegurar maiores poderes ao Judiciário, muito menos, engessar o processo de apreciação das ações. Participaram da reunião, o Presidente Marcello Terto, os Vice-Presidentes Telmo Lemos Filho e Jaime Nápoles Vilella, a Presidente do Conselho Deliberativo, Santuzza da Costa Pereira e o Diretor Legislativo, Carlos Valenza.

 

Fonte: site da Anape, de 12/10/2013

 

 

 

Câmara pode votar novo Código de Processo Civil nesta semana

 

A votação do novo Código de Processo Civil (CPC) e da mudança no índice de correção das dívidas municipais e estaduais são os destaques do Plenário da Câmara na próxima semana. Também pode ser votada a minirreforma eleitoral.

 

Na terça-feira (15/10), os deputados participam ainda de sessão conjunta do Congresso Nacional destinada a analisar vetos da presidente Dilma Rousseff a projetos aprovados recentemente.

 

O novo CPC (PL 8.046/10, apensado ao PL 6.025/05) está previsto para ir a voto na quarta-feira (16/10), em sessão extraordinária. O texto do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), aprovado na comissão especial, cria um procedimento que vai permitir a aplicação de decisão única a várias ações individuais sobre o mesmo tema, o chamado incidente de resolução de demandas repetitivas.

 

Isso vai permitir, por exemplo, uma análise mais rápida de ações sobre planos econômicos, sobre direito previdenciário e daquelas que questionem os contratos com empresas de telefonia, água e esgoto, os chamados contratos de adesão.

 

Em sessão ordinária, na terça-feira, a Câmara pode votar propostas em regime de urgência, como o Projeto de Lei Complementar 238/13, do Executivo, que muda o índice usado para corrigir as dívidas de municípios e estados com a União.

 

Atualmente, as dívidas são corrigidas pelo índice de inflação IGP-DI mais 6%, 7,5% ou 9%, mas prefeitos e governadores reclamam que o governo federal capta recursos remunerados pela taxa Selic (atualmente em 9,5%) e cobra correções maiores dessas dívidas.

 

Na semana passada, o líder do PMDB e relator do projeto, deputado Eduardo Cunha (RJ), conseguiu fechar um acordo com o Tesouro Nacional. Um substitutivo sobre a matéria já foi aprovado pela Comissão de Finanças e Tributação. De acordo com o texto, as dívidas serão corrigidas por taxa Selic ou índice de inflação IPCAmais 4% ao ano, o que for menor. A mudança valerá para correção do débito desde janeiro de 2013.

 

Outro projeto que pode ser votado é o da minirreforma eleitoral (PL 6397/13, do Senado), que diminui custos de campanha e muda procedimentos de prestação de contas dos candidatos e partidos.

 

Não há consenso sobre o mérito do projeto, que também limita o poder de auditoria da Justiça Eleitoral e altera normas para a propaganda eleitoral na TV e na internet.

 

O PMDB defende a votação do texto, mesmo que as regras não valham integralmente para as eleições de 2014. Há uma expectativa de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) considere válidas algumas das mudanças já para o próximo ano por não interferirem na campanha.

 

Na terça-feira à noite, após a sessão ordinária, os parlamentares realizam sessão do Congresso para votar vetos a projetos de lei e à Medida Provisória 613/13 (Lei 12.859/13), que concede incentivos tributários aos produtores de etanol e à indústria química por meio de crédito presumido e redução de alíquota do PIS/Pasep e da Cofins.

 

Um dos vetos barra o pagamento retroativo, previsto no PL 4264/12, da indenização a policiais federais e a servidores de outras carreiras que atuem em áreas de fronteira. A retroatividade seria a 1º de janeiro de 2013.

 

Na sessão do Congresso, os parlamentares podem votar ainda projetos de resolução e de crédito orçamentário, além de um projeto que muda a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO 2013) para retirar a obrigação do governo federal de compensar a não realização do resultado primário previsto para estados, Distrito Federal e municípios.

 

Fonte: Agência Brasil, de 13/10/2013

 

 

 

Fazenda não é obrigada a aceitar precatório em lugar de bem

 

A Fazenda Pública pode rejeitar pedido de substituição da penhora por precatório. Isso porque a penhora deve seguir a ordem legal dos bens elencados no artigo 11 da Lei de Execução Fiscal. Assim decidiu a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. No caso, uma mineradora pediu ao estado do Paraná para trocar a penhora de dinheiro por crédito de precatório.

 

Segundo o relator, ministro Herman Benjamin, o executado deve nomear bens à penhora observando a ordem prevista na lei. Cabe ao executado comprovar a "imperiosa" necessidade de afastar a ordem legal dos bens. Para tanto, a "mera invocação genérica do artigo 620 do Código de Processo Civil é insuficiente para que ocorra a troca. A disposição determina que quando houver vários meios de o credor promover a execução, deve ser escolhido o menos gravoso para o devedor.

 

Em primeira instância, a Justiça entendeu que não foram apresentados motivos que justificassem a mudança na ordem de preferência dos artigos 11 da LEF e 655 do CPC. Além disso, a Paraná Mineração, empresa que teve os bens penhorados, não alegou a impossibilidade de constrição de outros bens. A mineradora interpôs Agravo de Instrumento no STJ alegando que não há lei que autorize a Fazenda a recusar a nomeação de precatório à penhora.

 

Diferentes turmas do STJ já entenderam válida a possibilidade de a Fazenda Pública recusar a substituição do bem penhorado por precatório. Elas se fundamentam na necessidade de se preservar a ordem legal estabelecida pela Lei de Execuções Fiscais e no CPC.

 

A jurisprudência do tribunal, segundo o ministro Herman Benjamin, não autoriza a inversão da ordem legal, mesmo quando o crédito penhorável consiste em precatório judicial, sem apresentar circunstâncias que justifiquem a prevalência do princípio da menor onerosidade sobre o que prescreve que a Execução deve ser feita no interesse do credor.

 

O ministro lembrou que, apesar disso, muitos Recursos Especiais e Agravos em Recursos Especiais continuam sendo admitidos na origem, sob o fundamento de que a substituição dos bens penhoráveis encontra disciplina específica no artigo 15 de LEF — que determina que o juiz pode deferir que a Fazenda substitua os bens penhorados por outros, independentemente da ordem. Por isso, ele afetou o caso ao rito dos recursos repetitivos — artigo 543-C do CPC.

 

Sendo ele, a Fazenda Pública pode recusar o oferecimento de precatório à penhora, além de afirmar a inexistência de preponderância do princípio da menor onerosidade para o devedor sobre o da efetividade da tutela executiva. Tal entendimento é baseado na Súmula 406 do STJ, que permite a recusa por parte da Fazenda.

 

O relator afirmou que, pela Lei 11.382/2006, após a vigência dos artigos 655 e 655-A do CPC, a penhora de ativos financeiros é válida, e para tanto, não é necessário o esgotamento da busca de patrimônio do devedor. Além disso, já foi consolidado o entendimento de que o credor não precisa mais provar o exaurimento de vias extrajudiciais na busca de bens a serem penhorados.

 

No caso, a decisão que deferiu o pedido de penhora dos ativos financeiros foi publicada depois do início da vigência da Lei 11.382/2006. E, por isso, segundo o relator, tal entendimento deve prevalecer. O ministro manteve a decisão que impediu a nomeação de título à penhora e manteve pedido da Fazenda pela penhora de dinheiro.

 

Menor onerosidade

O advogado Luiz Gustavo Bichara, sócio do escritório Bichara, Barata & Costa Advogados, critica a decisão. Para ele, o princípio da menor onerosidade da Execução em face do devedor sofreu absoluta mitigação pela jurisprudência do STJ, que vem definindo as formas de garantia da maneira mais conveniente às Fazendas públicas, o que acaba resultando em dificuldade operacional e de fluxo de caixa das empresas devedoras do Fisco.

 

"Além disso, depois que o STJ pacificou a orientação de que a carta de fiança bancária não se equipara a dinheiro, as Fazendas públicas passaram a empreender novas buscas no patrimônio dos contribuintes, especialmente empresas de grande porte", diz. Por esse motivo, segundo ele, há inúmeros pedidos de reforço ou substituição de penhora por dinheiro.

 

"Ocorre hoje o erro de se generalizar todo o devedor da Fazenda Pública como fraudulento e sonegador, em detrimento da sociedade e, por isso, promover a execução mais agressiva."

 

Segundo Brichara, a jurisprudência tem desconsiderado a regra do artigo 620 do CPC, que prevê que a execução deve se dar da forma menos gravosa para o devedor. "O precatório pode ser polêmico, mas, quando ele é expedido pelo mesmo ente que está executando o contribuinte, esta garantia não pode ser recusada". De acordo com o advogado, se ambas as partes são credor e devedor em relações jurídicas distintas, não há porque isolá-las.

 

Bichara compara a situação com uma piada do jogo de poker. "Numa semana, um sujeito vai ao jogo, perde, e paga um com cheque. No dia seguinte, o ganhador descobre que o cheque não tinha fundos. Na semana seguinte, o emissor do borrachudo vai ao jogo novamente, e dessa vez ganha. Ao fim do jogo, na hora das contas, ele grita 'cheque meu eu não aceito'".

 

Fonte: Conjur, de 12/10/2013

 

 

 

Suíça revela 800 mil euros na conta de investigado do caso Alstom

 

Documentos enviados pela Suíça há cerca de um mês a autoridades brasileiras revelam que um ex-diretor da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) recebeu 800 mil euros em conta de uma instituição financeira daquele país europeu. O dinheiro foi depositado parceladamente, entre 1997 e 1998, segundo indicam os extratos bancários agora anexados ao inquérito do caso Alstom – multinacional francesa que teria integrado cartel, na época, para obtenção de contratos milionários nas áreas de energia e transportes públicos do Estado.

 

Os investigadores se dizem convencidos de que o dinheiro na conta do antigo executivo da CPTM tem origem em corrupção. Ele teria sido contemplado com propina para favorecer o cartel em um contrato de reforma de trens da companhia, durante o primeiro mandato de  Mário Covas, governador paulista entre 1995 e 1998. A nova leva de documentos recém chegados de Genebra está de posse de procuradores e promotores que também investigam o emblemático caso Siemens, multinacional alemã que fechou acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).

 

O acordo de leniência prevê a revelação de detalhes do cartel que teria operado em São Paulo e no Distrito Federal entre 1998 e 2008. Uma força tarefa que reúne integrantes do Ministério Público Estadual e do Ministério Público Federal obteve os extratos bancários da Suíça a partir do MLAT – Acordo de Cooperação Mútua Internacional que pode ser aplicado na investigação, independentemente dos valores envolvidos, e dispensa a expedição de carta rogatória entre os países. O MLAT agiliza a comunicação entre o Brasil e países que detêm informações sobre cidadãos brasileiros que movimentam recursos ilícitos em paraísos fiscais.

Os investigadores estão convencidos de que os novos documentos comprovam a atuação do cartel na área dos transportes públicos em São Paulo, nos anos 90.

 

A primeira fase da apuração do caso Alstom, em curso desde 2009, trata da ação do cartel formado por multinacionais para o setor de energia. A força tarefa busca pretende cotejar as informações contidas nos novos documentos bancário com dados fiscais e a evolução patrimonial dos investigados. Os promotores e procuradores estão promovendo frequentes contatos com o Ministério Público da Alemanha, onde a Siemens também é alvo de uma devassa.

 

Além da Suíça e Alemanha, a força tarefa do Ministério Público Estadual e do Ministério Público Federal planeja estender a investigação para outros países onde teria transitado dinheiro da corrupção. A CPTM informou que o governo do Estado “é o maior interessado em esclarecer denúncias de formação de cartel por parte de empresas contra a população de São Paulo”.

 

A CPTM assinala que a Corregedoria Geral da Administração (CGA) imediatamente abriu investigações para apurar os contratos citados no acordo de leniência da Siemens com o CADE e exigir ressarcimento aos cofres públicos. “A CGA também punirá com rigor o eventual envolvimento de servidores públicos em qualquer irregularidade.” Seguindo recomendação da CGA, o Metrô e a CPTM já instauraram processos administrativos para declarar inidôneas a Siemens e demais empresas suspeitas de formação de cartel, em conformidade com a Lei das Licitações (Lei 8.666).

 

“Em paralelo, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) ingressou com ação judicial de indenização contra a Siemens, para exigir ressarcimento em relação às licitações de contratos que a empresa, no mesmo acordo de leniência, confessou ter praticado cartel”, ressalta a CPTM.

A Alstom informa que está colaborando com as investigações das autoridades brasileiras.

 

Fonte: Blog do Fausto Macedo, de 14/10/2013

 

 

 

"Todo conservador quer uma Constituição enxuta"

 

"Um dos maiores juristas do Brasil." Essa é a definição mais comum de se encontrar em menções a José Afonso da Silva. Seja qual for a filiação teórica, operadores do Direito reverenciam a obra do jurista mineiro de 88 anos, nascido em Pompéu. Não por acaso. Formulador de influente parte da doutrina sobre Direito Constitucional no país, ele testemunhou e atuou no processo que culminou com a promulgação da Constituição em 1988, que comemora um quarto de século.

 

Ao lado de representantes de diferentes áreas do conhecimento e setores da sociedade, José Afonso da Silva fez parte do time de notáveis na Comissão Afonso Arinos que, entre 1985 e 1986, elaborou o anteprojeto de Constituição. O texto acabou não sendo enviado pelo presidente Sarney à Assembleia Nacional Constituinte, instalada em 1987, mas o trabalho não foi em vão e acabou sendo aproveitado conforme relata. "Ele não tinha como ser ignorado", relembra. Seu trabalho prosseguiu na assembleia, dessa vez como assessor do então senador pelo PMDB Mário Covas. Principal teórico e formulador dos Direitos Sociais garantidos pela Constituição, José Afonso da Silva pode ser considerado um constituinte de fato.

 

Tal qual no texto constitucional, não se separa a dimensão política da interpretação teórica que o professor aposentado da Universidade de São Paulo faz do processo Constituinte e de como ele se desdobrou. "O atual sistema eleitoral prejudica a governabilidade", avalia, além de apontar os defeitos do sistema judiciário que perduraram com a Constituição. Apesar dos novos direitos que foram garantidos, o "Poder Judiciário ficou praticamente intacto", diz.

 

Crítico do conservadorismo, reconhece o caráter progressista que o texto final da Constituição assumiu e está atento às tentativas de se reduzir os direitos sociais que marcam a Constituição. Entretanto, o jurista não se aflige com a falta de regulamentação dos vários dispositivos constitucionais — "não existe democracia acabada" — nem acha que a Carta perdeu sua essência — "os direitos fundamentais constituem um núcleo importante na Constituição. É aí que está a vantagem".

 

José Afonso da Silva trabalhou em roça de milho, feijão e arroz, foi padeiro, garimpeiro de cristal e alfaiate. Em 1947, mudou-se aos 22 anos para São Paulo, onde concluiu o curso Madureza, uma espécie de supletivo à época. Aos 32, formou-se na Faculdade de Direito da USP, onde foi professor livre-docente em Direito do Estado, Direito Financeiro e Processo Civil. Também foi livre-docente em Direito Constitucional da Universidade Federal de Minas Gerais. No poder público, foi procurador do estado de São Paulo, chefe de gabinete da Secretaria da Justiça do estado, secretário de negócios jurídicos da capital e secretário da Segurança Pública.

 

Hoje aposentado, já não advoga ou dá parecer. Se dedica a manter sua obra atualizada, da qual se destacam Curso de Direito Constitucional Positivo, que está em sua 36ª edição, e Aplicabilidade das Normas Constitucionais, esta na 8ª edição. Foi em seu escritório, em São Paulo, que José Afonso da Silva recebeu a reportagem da ConJur para dois encontros nos dias 2 e 3 de outubro — no dia 1º, havia sido homenageado pela Ordem dos Advogados do Brasil por sua participação na elaboração do texto constitucional. Na conversa, o jurista relembrou momentos marcantes da Comissão Afonso Arinos e da Constituinte, avaliou o Judiciário brasileiro e fez um balanço desses 25 anos.

 

Leia os principais trechos da entrevista:

 

ConJur — O senhor participou da Comissão Afonso Arinos, que elaborou um projeto de Constituição e acabou não sendo enviado pelo então presidente Sarney à Assembleia Constituinte. O que aconteceu?

José Afonso da Silva — Ele não mandou o projeto da Afonso Arinos para a Constituinte porque era parlamentarista e socialmente avançado. Deu a desculpa de que não quis interferir, mas foi por isso que ele não mandou.

 

ConJur — Houve frustração pelo fato de o texto não ter sido enviado ou se sabia que aquele texto não tinha como ser ignorado?

José Afonso da Silva — Não tinha como ser ignorado, ele foi muito debatido. Ali não eram só juristas. Tinha muita gente de outras áreas do conhecimento. Como o presidente José Sarney não mandou o projeto à Assembleia, mas mandou publicar no Diário Oficial, os constituintes pegaram aquilo e começaram a tirar partes e apresentar. Então houve uma influência muito grande em praticamente tudo.

 

ConJur — Qual foi sua importância?

José Afonso da Silva — Se não houvesse a comissão Afonso Arinos talvez não teria havido a Constituinte. Foi só naquele momento que se discutiu Constituição e Constituinte, com muita repercussão na imprensa. A comissão Afonso Arinos acabou servindo de modelo para a estrutura da Constituinte.

 

ConJur — Pode citar exemplos dessa influência?

José Afonso da Silva — Um tema muito debatido atualmente é o da união estável. Surgiu na Afonso Arinos por proposta de um padre que participava da comissão. Nós estávamos procurando um meio de amparar a mulher que vivia amasiada há muitos anos com alguém e quando esse alguém morresse ela acabava ficando desamparada. A união estável surgiu exatamente por isso: para amparar a mulher que vivia nessa situação não casada, mas vivendo em uma família de fato. Nós estávamos debatendo aí o padre falou ‘por que a gente não põe união estável?’. Ele se chamava Fernando Ávila, era da corrente progressista da igreja. O controle do capital estrangeiro, por exemplo, nasceu na comissão por proposta do Barbosa Lima Sobrinho. Isso foi introduzido na Constituição, mas depois veio a Emenda 6, de agosto de 1995, e tirou. O Habeas Data foi proposto por mim e também foi para a Constituição.

 

ConJur — E teve alguma coisa que não foi aproveitada?

José Afonso da Silva — A Constituição da Comissão Afonso Arinos era parlamentarista e isso não foi aproveitado. A proposta prosseguiu até um certo ponto na Constituinte e depois caiu com a pressão do Sarney, oferecendo vantagens, e de outros presidencialistas. Você tinha também um sistema eleitoral misto, aproximadamente um tipo alemão, e não foi aproveitado. Se adotou na Constituição um sistema puramente proporcional. Em geral, a organização dos direitos fundamentais no anteprojeto da comissão Afonso Arinos era melhor, mas a Constituição ampliou.

 

ConJur — Como eram os trabalhos na Constituinte? Havia diálogo entre as comissões?

José Afonso da Silva — Não tinha muito porque conversar. Cada uma tocava o seu problema e a conversa seria feita na comissão de sistematização. Aí é que surgiu um problema mais delicado. Enquanto havia as subcomissões e as comissões, todos os constituintes estavam trabalhando. Quando foi para a comissão de sistematização havia um limite de membros. Ela não comportava todo mundo e a maioria dos constituintes ficou sem ter o que fazer. Não votavam, não discutiam e aquilo ficou reduzido a pouco mais de 100 membros. Então começou a haver reuniões paralelas. Foi também a partir disso que surgiu o Centrão. Os constituintes ficaram um pouco sem ter o que fazer, então começaram a se reunir, a reclamar e formaram grupos paralelos e daí acabaram... no Centrão.

 

ConJur — Como se deu isso?

José Afonso da Silva — Quando estava na comissão de sistematização, os mais conservadores perceberam que, se mantivessem as coisas andando como estavam, não teriam condições de implementar suas ideias e daí geraram o Centrão. O próprio PMDB, que era liderado pelo Mário Covas, se dividiu. Boa parte passou a não atender a liderança e se uniu às lideranças do Centrão. Os outros partidos de esquerda se uniram ao Covas.

 

ConJur — Ficou tudo fragmentado.

José Afonso da Silva — Nenhum deles tinha condições de obter maioria. Mesmo o Centrão não conseguia reunir sua maioria para aprovar as coisas como eles desejavam, aí se começou a fazer negociação. Quando não chegavam a um consenso, a proposta ia para o voto do plenário e ganhava quem tivesse maioria naquela oportunidade.

 

ConJur — Qual o efeito disso tudo no texto final?

José Afonso da Silva — Foi um fenômeno curioso porque a maioria conservadora acabou produzindo uma Constituição razoavelmente progressista. Isso se deve à atuação do senador Mário Covas, que era o líder do PMDB, que tinha maioria absoluta da Assembleia Constituinte. Em cada subcomissão, ele apresentou relatores ou presidentes que tivessem uma orientação mais progressista e montou um xadrez de tal ordem que, apesar de a maioria da Assembleia ser conservadora, conseguiu decisões mais progressistas.

 

ConJur — O senhor se recorda de algum ponto que foi para o voto e acabou vencendo a pauta mais conservadora?

José Afonso da Silva — A reforma agrária foi um deles. Houve algumas concessões, mas os conservadores acabaram introduzindo elementos que asseguravam mais os interesses deles. Por incrível que pareça, o Estatuto da Terra era mais avançado do que o que ficou na Constituição.

 

ConJur — O senhor se candidatou a deputado constituinte, mas não se elegeu. O que motivou o senhor a se candidatar?

José Afonso da Silva — Eu vinha trabalhando com Direito Constitucional, especialmente em uma visão voltada para os direitos fundamentais. Senti-me na obrigação de tentar participar. É claro que eu não tinha condições de ser eleito, porque eu não tinha dinheiro. Um grande empresário me ofereceu dinheiro e eu recusei. Ele disse: ‘Você não fica devendo nada’. ‘Não, eu fico. Se você me der o dinheiro, um dia eu estou lá, você vai precisar de alguma coisa e eu vou ter problemas. Então para quê?’. Até costumo dizer que eu tive praticamente a mesma votação do Mário Covas, só que a dele foi multiplicada por mil. Mário Covas teve 7,5 milhões e eu tive 7,5 mil.

 

ConJur — O senhor acabou participando como assessor do Mário Covas. Conseguiu dar as mesmas contribuições que o senhor pretendia como deputado?

José Afonso da Silva — Como deputado, eu teria muito mais possibilidade de contribuir. Como assessor eu não podia me intrometer nas coisas, ficava mais dependente de indagações. Muitas vezes eu senti não ser parlamentar para interferir nas discussões e votações de temas que me pareciam com encaminhamento adequado.

 

ConJur — O senhor se ressente de algum ponto que tenha entrado na Constituição, mas não da forma que o senhor gostaria?

José Afonso da Silva — Em geral não, porque a parte que mais me interessava era a parte dos direitos fundamentais e essa foi bem implementada. Eu tinha uma visão diferente da organização do poder. Eu propunha um Poder Executivo menos personalista, que eu chamava de Poder Executivo de gabinete. Isso não passou, era difícil de passar. Entre ter um presidencialismo hegemônico — como nós temos, chamado hoje presidencialismo de coalizão — eu preferia o parlamentarismo na forma que estava sendo previsto na comissão Afonso Arinos — e chegou até a comissão de sistematização, na Constituinte.

 

ConJur — Como era sua proposta?

José Afonso da Silva — Haveria o presidente da República e também um conselho de ministros com competência própria. Embora os ministros fossem de confiança do presidente, o conselho seria independente para o exercício de sua competência. Isso quebraria um pouco a hegemonia personalista do presidencialismo.

 

ConJur — E qual é o problema desse presidencialismo de coalizão?

José Afonso da Silva — O sistema partidário do Brasil é muito fragmentado e indisciplinado. Na maior parte das vezes, o presidente tem que fazer negociações individuais e muitas concessões, que levam à corrupção. No Brasil, ou na América Latina em geral, tem que se fazer coalizão porque o partido do presidente nunca é capaz de fazer a maioria e as negociações muitas vezes não são institucionais.

 

ConJur — E a Constituição legitima isso?

José Afonso da Silva — Como ela permite a criação de muitos partidos, de certo modo ela facilita muito. É por isso que está se buscando uma reforma partidária que tente reorganizar isso. O sistema favorece a mediocridade, a formação de políticos não muito comprometidos com o interesse público. Eles não votam uma reforma política que coíba essas práticas porque será cortar na própria carne.

 

ConJur — Concorda com quem diz que a Constituição ficou sendo híbrida por adotar o presidencialismo em cima de um texto parlamentarista?

José Afonso da Silva — Não. Só a medida provisória, que seria um instituto mais adequado para o sistema parlamentarista, mas de resto não tem nada de híbrido. Pode-se até achar que a estrutura de poder ficou mal organizada talvez porque, na última hora, sob pressão do Sarney, puseram as normas do presidencialismo no lugar onde estavam normas do parlamentarismo.

 

ConJur — E ela deixaria o país ingovernável como ele chegou a afirmar?

José Afonso da Silva — A gente está vendo que não prejudicou nada. O que prejudica a governabilidade é exatamente o atual sistema eleitoral de representação proporcional e a fragmentação partidária. A multiplicidade de partidos é que gera a necessidade de coligações de vários partidos para formar a base governista. Essa indisciplina partidária que faz com que cada um faça o que quer sem muito compromisso com a orientação partidária... Isso é que realmente complica a governabilidade.

 

ConJur — A Constituição carrega traumas do período militar?

José Afonso da Silva — Em alguns aspectos carrega, embora menos do que a Constituição de 1946, em grande parte aprovada contra a ditadura do Getúlio Vargas. Por isso a doutrina fala que ela nasceu de costas para o futuro porque estava preocupada com o passado. A Constituição de 1988 se voltou mais para o futuro. Mas há um dispositivo (artigo 5º, inciso XLIV), por exemplo, que considera crime inafiançável a ação de grupos armados contra a ordem constitucional. Há também a norma sobre a cassação do mandato, exatamente para não ocorrer como no regime militar, em que o presidente ou outro poder cassava o parlamentar. Agora só a Casa respectiva pode cassar o mandato. Esse talvez seja o tema mais diretamente contrário ao que aconteceu na ditadura.

 

ConJur — Diante dessa perspectiva de agora, com as instituições mais consolidadas, o senhor acha que a Constituição fez certo?

José Afonso da Silva — Eu acho que fez pelo seguinte: o mandato é popular. Ou se dá essa possibilidade ao povo através do recall — o que é complicado em um país tão grande como o Brasil — ou se dá o poder de cassar à Casa a que pertence o congressista.

 

ConJur — Mesmo com a condenação?

José Afonso da Silva — Mesmo com a condenação. Isso se fundamenta na autonomia dos poderes. No caso do parlamentar, se outro poder cassa seu mandato há uma interferência. A casa respectiva tem que cumprir seu dever porque a condenação seria apenas pressuposto para a instauração do processo na Câmara.

 

ConJur — É um preço que a gente tem que pagar...

José Afonso da Silva — Pela democracia. Veja bem: nós sabemos que as instituições parlamentares no Brasil são muito ruins hoje. Eu não costumo generalizar, porque ainda há muita gente boa lá dentro. Mas é ruim porque essa foi uma das coisas ruins que herdamos do regime militar. A ditadura liquidou com as lideranças no país. A renovação disso é muito longa e muito difícil. Por isso ainda estamos vivendo este resquício doloroso.

 

ConJur — O texto constitucional absorveu aspectos do Direito alemão, da Constituição americana ou portuguesa. Tem algum aspecto genuinamente brasileiro?

José Afonso da Silva — Teve influência de vários países. A Medida Provisória é de influência italiana. A inconstitucionalidade por omissão veio da Constituição portuguesa. Da Alemanha tem a organização do poder, especialmente da distribuição do Poder Legislativo, competências comuns e complementares entre União, estados e municípios. Na formação dos direitos fundamentais há influência das convenções internacionais e declarações sobre direitos humanos. No restante é mais problema nosso. Houve avanços imensos nos direitos sociais. As lutas por saúde, educação e transporte de qualidade se devem à nossa Constituição. Há também o sistema de seguridade social que não se encontra em outros países. Há alguma coisa em Portugal e na Espanha, mas aqui foi desenvolvida amplamente. O fortalecimento do Ministério Público e a autonomia do Poder Judiciário são coisas nossas. Isso tudo forjado pela Constituinte e em boa parte também na Comissão Afonso Arinos.

 

ConJur — Fala-se muito da vontade do legislador, principalmente em temas polêmicos — como foi o da união estável homossexual recentemente, por exemplo. É possível definir essa vontade?

José Afonso da Silva — Esse é um tipo de interpretação absolutamente inadequada. Todo jurista sabe que a intenção do legislador não tem nenhum valor, até porque não se sabe como é que se apura essa intenção. O parlamento não tem vontade. Esse é um tipo de interpretação muito querido pelos conservadores. Nos EUA, toda vez que a Suprema Corte dá uma decisão mais progressista, surge um movimento dizendo “não é isso que os founding fathers queriam”. Então você também pode dizer: 'bom, mas essa intenção dele é a intenção sua, você é que está querendo vencer'. Essa é uma posição subjetiva. No Brasil, nenhum jurista aceita este tipo de interpretação. Quando se volta para um texto constitucional, essa interpretação se insere em um contexto formal e que vai adquirir sentido em face também dos demais dispositivos e da realidade histórica.

 

ConJur — O senhor concorda com a afirmação de que a nossa Constituição é muito prolixa?

José Afonso da Silva — Ela nasceu de uma negociação muito difícil. Cada um queria por alguma coisa do seu interesse. Não se pode decidir de antemão se a Constituição vai ser enxuta ou não. O processo histórico é que vai decidir o que ela vai acolher. Em uma Constituição que teve uma participação popular muito grande, é muito razoável que ela tenha acolhido muitas dessas reivindicações. Certamente existem muitas regras que poderiam ser reguladas pela legislação ordinária, mas foram inseridas na Constituição porque ela lhes garante certa estabilidade.

 

ConJur — Então o senhor não vê isso como um defeito?

José Afonso da Silva — Todo conservador fala isso. Eles querem que saiam de lá os direitos sociais, não querem que saia o direito de propriedade. Querem que saiam o direito à saúde, o direito do índio, o direito ao meio ambiente... Sim, se você tirar tudo isso ela fica muito enxuta. Mas aí o povo fica absolutamente desamparado. Todo conservador quer uma Constituição enxuta que garanta apenas seu direito, o direito da elite.

 

ConJur — Ainda é possível afirmar que existe a Constituição de 88? Ela perdeu muito de sua essência?

José Afonso da Silva — No essencial, não, porque o núcleo fundamental da Constituição são os direitos fundamentais. Esses não foram atingidos.

 

ConJur — Qual é o alicerce que a mantém assim?

José Afonso da Silva — Logo no início, os direitos fundamentais constituem um núcleo importante na Constituição. É aí que está a vantagem. Há muitas emendas, às vezes muito tolas, para mudar apenas um sinônimo ou as disposições transitórias. Mas não há emendas que atinjam o núcleo importante da Constituição.

 

ConJur — A Constituição reconheceu e garantiu novos direitos. Isso saturou a Justiça?

José Afonso da Silva — Com certeza. O acesso à Justiça foi melhorado, criaram-se as defensorias públicas. O povo descobriu que tem direitos e a Justiça para satisfazê-los. Mas um dos problemas da Constituição foi este: o Poder Judiciário ficou praticamente intacto. Não se alterou quase nada. Foram criados o Superior Tribunal de Justiça, cinco tribunais federais e nada mais. Ficou tal como estava. Não se mexeu na base.

 

ConJur — O que o senhor propunha?

José Afonso da Silva — Na própria minuta que eu apresentei na Afonso Arinos, tinha proposto uma descentralização. O Tribunal de Justiça ficaria um tribunal de cúpula cuidando de coisas muito gerais, os tribunais de segundo grau ficariam nas regiões do estado e cuidariam apenas dos problemas daquela região. O processo não tinha que vir para a capital, por exemplo. No âmbito federal eu propunha a criação de um Tribunal Superior Administrativo para cuidar das causas do poder público, o que aliviaria o Supremo e os tribunais superiores. Isso eu também discuti na reforma do Judiciário.

 

ConJur — Ao mesmo tempo que a Constituição ganhou novos dispositivos por meio de emendas, outros sequer foram regulamentados. O legislador soube lidar com esse texto constitucional?

José Afonso da Silva — Olha, interessante. Todo mundo me faz essa pergunta. O que não percebem é que o que era fundamental foi regulamentado. Temos o Estatuto do Idoso, da infância e do adolescente, normas sobre previdência... Algumas regras até já existiam, então não precisa criar outras. O que não foi regulamentado se resolveu com iniciativa popular, em outros casos o Supremo decidiu. No caso da lei para regulamentar as greves de servidor público, por exemplo, entraram com mandado de injunção para mostrar que havia uma omissão. O Supremo mandou aplicar a lei geral. Quando a falta de regulamentação cria problema para algum grupo, a Constituição deu instrumentos para solucionar, como a iniciativa popular, o mandado de injunção.

 

ConJur — Então o senhor não sente nenhum tipo de aflição?

José Afonso da Silva — Eu não sou daqueles que acham que a Constituição deve se aplicar toda e acabada. Não existe democracia acabada. Democracia é um processo histórico, que se vai realizando com o correr do tempo. Não se tem direitos fundamentais acabados. Nunca se acaba de cumprir os direitos sociais ou qualquer direito fundamental, até porque estão sempre aparecendo novos direitos.

 

ConJur — O senhor pode explicar a classificação dos direitos sociais como normas programáticas? Como isso influenciou a implementação desses direitos?

José Afonso da Silva — A norma programática não é mera intenção, mera crença. Ela tem eficácia. Na concepção que eu sustentei, ela indica os fins do Estado para buscar realizar o bem comum da população. Essa Constituição mudou muito isso. Era uma concepção de uma Constituição que não tinha um tratamento de direitos sociais como a atual, que indica os dispositivos para realizá-los. Se está previsto que o poder público tem de criar essas condições não é mero programa. Eu falo isso porque os conservadores têm uma concepção de chamar de programáticas todas as normas incômodas, que são as que produzem alguma coisa em favor do pobre. Por isso eu tenho usado muito pouco, ou quase não uso mais, a expressão “normas programáticas”. Hoje prefere-se falar em normas dirigentes ou normas de direitos de realização progressiva.

 

ConJur — Então o conceito de norma programática foi entendido de forma errada?

José Afonso da Silva — Essa era a concepção. Todo mundo falava em norma programática como algo que não tinha eficácia, a não ser que viesse uma lei para aplicá-la. Se não viesse não teria efeito, eficácia, não valeria nada. Tratar o direito social como mera ficção é uma forma de desqualificá-lo. Quando eu escrevi, era a Constituição de 1967 que estava em vigor e ainda se falava em norma programática. Naquela ocasião eu repelia a concepção de que elas não eram direitos, que eram meras intenções ou coisa que o valha. Repeli para dizer que elas eram regras, embora de eficácia limitada, mas importantes para a interpretação das demais normas da Constituição e porque indicavam o fim que o Estado deveria alcançar.

 

ConJur — O senhor acha que há algum tipo de subversão do uso da Ação Civil Pública para garantir direitos de particulares?

José Afonso da Silva — Muitas vezes o Ministério Público usa a Ação Civil Pública indevidamente, mas se ele a usa em benefício do direito social, isso é bom. Há situações em que a Justiça determina ao Poder Público que interne determinada pessoa ou forneça determinado remédio. Mas isso é bom. Eu sei que há determinadas correntes que acham que isso não devia ocorrer, mas aquele que está reivindicando precisa desse amparo. Eu acho que tudo que se faz em favor da realização dos direitos fundamentais é bom.

 

ConJur — A Constituição harmoniza as questões sociais com as de mercado?

José Afonso da Silva — A Constituição estabeleceu uma ordem com normas para favorecer uma economia consonante com os direitos sociais. Mas medidas e emendas posteriores retiraram tudo isso. Ficamos com uma ordem econômica tipicamente capitalista e, portanto, em dissonância com os direitos sociais.

 

ConJur — Em questão tributária, o senhor acha que o pacto federativo precisa ser revisto?

José Afonso da Silva — Isso é um problema histórico. Não tem muito o que mudar. O sistema tributário poderia ser mais bem distribuído. Tem que se distribuir mais os encargos, descentralizá-los. O que se pode fazer é descentralizar a prestação de serviços, com maior participação dos estados e municípios na receita da União. A legislação ordinária pode resolver isso. A crítica que em geral se faz ao sistema tributário se prende ao percentual da carga fiscal em relação ao PIB: 36%, 38% etc. Nunca aborda a questão da justiça fiscal. O sistema é injusto, sobrecarrega mais os trabalhadores e a classe média do que os ricos, sobretudo porque fundado nos tributos indiretos.

 

ConJur — O senhor acha que a sociedade está pronta para outras formas de participação direta?

José Afonso da Silva — Pronta ela sempre esteve, só que nunca deram esse poder para ela. Muitas das leis importantes, como a Lei da Ficha Limpa, têm sido elaboradas por iniciativa popular. Um outro exemplo é da lei para aumentar o percentual de financiamento à saúde, em tramitação no Congresso. É de iniciativa popular. Os mecanismos existem. Tem só que pôr em prática. Quem não gosta muito disso são os parlamentares. A iniciativa popular é importante, o referendo também, mais do que o plebiscito.

 

ConJur — Por quê?

José Afonso da Silva — Plebiscito sempre foi um instituto muito usado pelos governos autoritários para se manter no poder, para obter vantagens. Mas como ele está sob o controle do Congresso Nacional, pode ser usado. A Constituinte pôs na vontade do Congresso o poder de convocar plebiscito. Foi tirado o arbítrio do Executivo, para evitar sua utilização indevida.

 

ConJur — Por que o Supremo não se tornou uma corte exclusivamente constitucional?

José Afonso da Silva — Primeiro porque uma corte constitucional não pode ser composta de membros vitalícios. Na Constituinte se tentou fazer com mandato, mas não se conseguiu. Houve pressão do Supremo. Ele atuou no sentido de manter praticamente como estava. Ele é um tribunal que ainda tem que julgar a inconstitucionalidade pelo critério difuso. Isso não é próprio de uma corte constitucional, que também não tem de julgar processo criminal.

 

ConJur — Sua ideia de se criar um tribunal para dividir competência com o Supremo se traduziu com a criação do STJ. Hoje ambos estão sobrecarregados. Sabem separar uma questão federal de uma constitucional?

José Afonso — Em geral sabem. Ao defenderem seus clientes, os advogados usam de tudo quanto é meio para levar o processo lá para cima. É também um problema processual, cujas questões precisam ser mais bem disciplinadas. O Poder Público, por exemplo, recorre muito. Por isso eu proponho um tribunal administrativo.

 

ConJur — O senhor acha que tem excesso de instâncias recursais?

José Afonso — Eu acho que há muito recurso, não instâncias recursais. Muitos recursos poderiam ser eliminados.

 

ConJur — E a prerrogativa de foro?

José Afonso — Isso já é da tradição do país. Eu não acho que haja prejuízo. Mas poderia ser no STJ em vez de ser no Supremo, que não tem que ficar julgando crime.

 

ConJur — O direito de defesa perdeu espaço ou está ameaçado?

José Afonso — Eu acho que não é um problema preocupante.Talvez haja um pouco de interferência com o direito de defesa o instituto da delação premiada. Isso pode ter complicações porque é um acordo do Ministério Público homologado pelo juiz sem participação da defesa.

 

ConJur — Imaginava que o Supremo teria esse protagonismo? Acha que ele está muito exposto?

José Afonso da Silva — Esse é o único tribunal no mundo que fica realmente exposto. Tem até uma televisão que fica focalizando tudo. Isso tem a vantagem da transparência, mas os ministros ficam querendo se mostrar, nessa coisa de vaidade... É um caminho sem volta. Ninguém supunha que fosse haver uma televisão no Supremo, mas como a Câmara e o Senado têm... Nas casas legislativas é até justificável, porque são representantes do povo.

 

ConJur — Como o senhor avalia a composição atual do Supremo?

José Afonso da Silva — Não vou fazer apreciação individual de ministro. Acho que toda vida o Supremo teve ministros excelentes e ministros ruins. No geral está bem. Você tem ministros que não deveriam estar lá, como sempre teve. Quem sabe melhora.

 

ConJur — O Supremo julga mais por princípios ou por política?

José Afonso da Silva — O Supremo Tribunal Federal, como todo tribunal constitucional, tem uma dimensão política. Isso é inequívoco. A Constituição também tem um conteúdo político muito grande. Por isso, o tribunal não pode ser puramente técnico. Do contrário, ele não entende a Constituição.

 

ConJur — O senhor vê ativismo judicial?

José Afonso da Silva — Nem toda criatividade via interpretação é ativismo judicial. A partir de regras muito gerais, se constrói um instituto. Você tem ativismo judicial distorcido, desde que se faça coisa que não está prevista na Constituição. Quando um ministro, por exemplo, dá uma medida liminar para não se seguir a tramitação de um veto, isso é um abuso, porque não cabe ao Judiciário interferir na tramitação de vetos, por exemplo.

 

ConJur — Se a solução encontrada pelo julgador está amparada na Constituição, não pode ser considerada ativismo?

José Afonso da Silva — Se está amparada na Constituição, não. Por exemplo: chamaram de ativismo aquela decisão do TSE, que foi mantida pelo Supremo, a respeito da fidelidade partidária. Decidiu-se que os votos pertencem ao partido e não ao parlamentar e, portanto, se ele sai do partido, perde o mandato. De fato, a interpretação foi razoável, porque no sistema de representação proporcional, os votos são realmente do partido.

 

ConJur — O que senhor acha das súmulas vinculantes e da repercussão geral?

José Afonso da Silva — A súmula vinculante tem um problema delicado: ela cria uma forma de precedente que impede a interpretação dos juízes de primeira instância. Os juízes que estão mais próximos dos fatos é que contribuem para a evolução da jurisprudência e do Direito. A Súmula Vinculante tolhe isso. Por isso que eu digo que é preciso fazer mudanças como, por exemplo, a criação de outros tribunais para neles serem redistribuídas atribuição do Supremo, para que ele não fique arranjando empecilhos para o processo não chegar lá. O mesmo vale para a Repercussão Geral.

 

ConJur — A Ordem dos Advogados do Brasil tem a mesma relevância política de 25 anos atrás?

José Afonso da Silva — Durante o regime autoritário ela atuou com uma visão democrática. Hoje ela tem a mesma visão. Só que hoje estamos em uma democracia e não precisa ter aquele confronto. Por isso a OAB não precisa desempenhar o mesmo papel daquela época. Hoje ela atua em outros campos, como nas ações diretas de inconstitucionalidade, por exemplo. Já depois da Constituição ela teve um papel fundamental no impeachment do Collor. Toda vez que aparece um problema dessa natureza, ela atua. Sua importância continua sendo a mesma de sempre.

 

ConJur — Como o senhor avalia o Ministério Público?

José Afonso da Silva — O Ministério Público recebeu pela Constituição de 1988 uma institucionalização muito importante. Ele tem se servido disso e às vezes com certo abuso. Por exemplo: ele não tem poderes de investigação criminal, mas ele exerce esse poder. Mas o papel do Ministério Público hoje é de alta importância para a defesa de direitos importantes, como os direitos difusos, do meio ambiente. Se não fosse a atuação do Ministério Público, essa defesa seria muito menos desenvolvida.

 

ConJur — A Defensoria Pública poderia estar mais consolidada?

José Afonso da Silva — A Defensoria Pública não é nova. Já havia duas ou três antes da Constituição. Mas foi com a Constituição que ela realmente se estabeleceu. Como toda instituição, ela tem de se organizar, criar suas bases. Acho até que ela está querendo assumir coisas que não devia, como a defesa de direitos difusos, por exemplo. Ela foi criada para a defesa dos direitos dos necessitados.

 

ConJur — O senhor é um dos juristas mais citados no Supremo. O que acha disso?

José Afonso da Silva — Eu poderia lhe responder com aquele dito “falem de mim, ainda que falem mal”, mas não é o que eu penso [risos]. Eu me sinto muito honrado com a utilização do meu nome como jurista. É claro que nem todos concordam comigo, o que é normal, assim como eu não concordo com todos. O direito é uma ciência interpretativa e essa interpretação depende de muitos fatores subjetivos e objetivos. É muito normal que alguém discorde. Meu filho [Virgílio Afonso da Silva, livre-docente em Direito Constitucional na USP] discorda de mim, mas eu não tenho que achar ruim por isso. A ciência jurídica se faz exatamente nessa dialética dos contrários.

 

ConJur — O senhor se incomoda quando desvirtuam sua tese?

José Afonso da Silva — Isso não é muito frequente, mas acontece. Eu não tenho o que fazer ou ficar debatendo com as pessoas. Se eu tiver a oportunidade de escrever alguma coisa, eu digo: “olha, o senhor utilizou indevidamente do meu ponto de vista”. Isso eu já fiz em algumas oportunidades.

 

Fonte: Conjur, de 13/10/2013

 

 

 

Comunicado do Centro de Estudos

 

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Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I, seção PGE, de 12/10/2013

 
 
 
 

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