DECRETO
Nº 51.553, DE 9 DE FEVEREIRO DE 2007
Dá
nova redação aos dispositivos que especifica dos
Decretos nº 47.836, de 27 de maio de 2003, e nº
51.471, de 2 de janeiro de 2007
JOSÉ
SERRA, Governador do Estado de São Paulo, no uso de
suas atribuições legais,
Decreta:
Artigo
1º - O artigo 7º do Decreto nº 47.836, de 27 de maio
de 2003, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Artigo
7º - O Comitê de Qualidade da Gestão Pública é
composto dos seguintes membros:
I
- o Secretário-Chefe da Casa Civil, que é seu
Presidente;
II
- o Secretário de Economia e Planejamento;
III
- o Secretário da Fazenda;
IV
- o Secretário de Gestão Pública;
V
- o Procurador Geral do Estado e como suplente o
Procurador Geral do Estado Adjunto;
VI
- o Secretário Executivo, designado pelo Secretário-Chefe
da Casa Civil.
§
1º - Os membros de que tratam os incisos I a IV deste
artigo terão como suplentes os respectivos Secretários
Adjuntos.
§
2º - Sempre que o Comitê de Qualidade da Gestão Pública
tratar de matéria de interesse específico de órgãos
de uma Secretaria de Estado ou de entidades a ela
vinculadas, poderá o Titular da Pasta ser convidado
para participar da sessão, com direito de voto.
§
3º - Sempre que o Comitê de Qualidade da Gestão Pública
tratar de matéria relativa ao Sistema Integrado de
Telecomunicações Oficiais do Estado, o Chefe da Casa
Militar participará da sessão, com direito de voto.
§
4º - O Comitê de Qualidade da Gestão Pública poderá
convidar para participar de suas sessões, sem direito
de voto, pessoas que, por seus conhecimentos e experiência
profissional, possam contribuir para a discussão das
matérias em exame.”. (NR)
Artigo
2º - Os dispositivos a seguir relacionados do Decreto nº
51.471, de 2 de janeiro de 2007, passam a vigorar com a
seguinte redação:
I
- o § 2º do artigo 1º:
Ҥ
2º - O Governador do Estado poderá, excepcionalmente,
autorizar a realização de concursos, bem como a admissão
ou contratação de pessoal, mediante fundamentada
justificação dos órgãos e das entidades referidas no
“caput” deste artigo e aprovada:
1.
pelo Comitê de Qualidade da Gestão Pública, da Casa
Civil, no caso de órgãos da administração direta e
de autarquias;
2.
pelo Conselho de Defesa dos Capitais do Estado - CODEC,
da Secretaria da Fazenda, no caso de fundações e de
sociedades de economia mista.”; (NR)
II
- o “caput” do artigo 2º:
“Artigo
2º - Os dirigentes das fundações e os dirigentes das
sociedades de economia mista deverão encaminhar, no
prazo de 90 (noventa) dias, diretamente diretamente ao
Conselho de Defesa dos Capitais do Estado - CODEC, da
Secretaria da Fazenda, quadro demonstrativo
contendo:”. (NR)
Artigo
3º - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Palácio
dos Bandeirantes, 9 de fevereiro de 2007
JOSÉ
SERRA
Mauro
Ricardo Machado Costa
Secretário da Fazenda
Francisco
Vidal Luna
Secretário de Economia e Planejamento
Sidney
Beraldo
Secretário de Gestão Pública
Aloysio
Nunes Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado
na Casa Civil, aos 9 de fevereiro de 2007.
Fonte:
D.O.E Executivo I, de 10/02/2007, publicado em Decretos
do Governador
DECRETO Nº 51.557, DE 9 DE FEVEREIRO DE 2007
Transfere
o cargo e as funções-atividades que especifica e dá
providências correlatas
JOSÉ
SERRA, Governador do Estado de São Paulo, no uso de
suas atribuições legais e nos termos dos artigos 54 e
55 da Lei Complementar nº 180, de 12 de maio de 1978,
Decreta:
Artigo
1º - Ficam transferidos o cargo provido e as funções-atividades
preenchidas, constantes do Anexo, que faz parte
integrante deste decreto.
Artigo
2º - Os Secretários de Estado, ficam autorizados a
procederem, mediante apostila, à retificação dos
seguintes elementos informativos constantes do anexo a
que alude o artigo anterior:
I
- nome do servidor;
II
- dados da cédula de identidade;
III
- situação do cargo, ou função-atividade no que se
refere ao seu provimento e preenchimento, mesmo que em
decorrência de alterações ocorridas.
Artigo
3º - As despesas decorrentes da aplicação deste
decreto correrão à conta das dotações próprias
consignadas no orçamento vigente.
Artigo
4º - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Palácio
dos Bandeirantes, 9 de fevereiro de 2007
JOSÉ
SERRA
João
de Almeida Sampaio Filho
Secretário de Agricultura e Abastecimento
João
Sayad
Secretário da Cultura
Mauro
Ricardo Machado Costa
Secretário da Fazenda
Rogério
Pinto Coelho Amato
Secretário Estadual de Assistência e Desenvolvimento
Social
Luiz
Roberto Barradas Barata
Secretário da Saúde
Aloysio
Nunes Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado
na Casa Civil, aos 9 de fevereiro de 2007.
Fonte:
D.O.E Executivo I, de 10/02/2007, publicado em Decretos
do Governador
Resolução PGE - 10, de 9-2-2007
O
Procurador Geral do Estado Considerando o disposto nas
Leis Federais ns. 10.259, de 12 de julho de 2001, e
10.099, de 10 de dezembro de 2000, na Resolução do
Conselho da Justiça Federal n. 258, de 21 de março de
2002, e na Resolução do Tribunal de Justiça n. 199,
de 29 de março de 2005, Resolve
acrescer parágrafos ao artigo 2º da Resolução PGE
196, de 3 de dezembro de 2002, dispondo a respeito do
cumprimento das Obrigações de Pequeno Valor e das hipóteses
em que ocorre fracionamento do montante a ser pago:
Artigo
1º - o artigo 2º da Resolução PGE n. 196, de 3 de
dezembro de 2002, fica acrescido dos seguintes parágrafos:
§
3º - a Coordenadoria de Precatórios e as Unidades da
Área do Contencioso deverão manter registro específico
de entrada e de saída de todos os ofícios relativos às
obrigações de pequeno valor, cuidando as chefias e os
responsáveis respectivos para que sejam rigorosamente
cumpridos os prazos estabelecidos nos parágrafos 1º e
2º deste artigo.
§
4º - Não cumpridos os prazos previstos nos parágrafos
1º
e 2º deste artigo, a Coordenadoria de Precatórios
efetuará os depósitos nos moldes previstos,
comunicando por correio eletrônico à Chefia da unidade
responsável pelo processo, com cópia ao Subprocurador
Geral do Estado – Área do Contencioso, a fim de que
sejam adotadas as providências pertinentes à apuração
do ocorrido.
§
5º - Observadas as disposições próprias de cada
Tribunal, em caso de expedição de ofício de obrigação
de pequeno valor para cada litisconsorte facultativo,
abrangendo a totalidade de seu crédito, as unidades
responsáveis pelo acompanhamento do processo ficam
dispensadas da interposição de recurso.
§
6º - Em caso de acolhimento do pedido de expedição de
ofício de obrigação de pequeno valor, com
fracionamento de crédito do mesmo autor ou de precatório
já expedido, a Unidade responsável pelo processo deverá
interpor os recursos cabíveis contra tal decisão.
Artigo
2º - Esta resolução entrará em vigor na data de sua
publicação.
Fonte:
D.O.E., Executivo I, de 10/02/2007, publicado em
Procuradoria Geral do Estado – Gabinete do
Procurador-Geral
Resolução PGE - 11, de 9-2-2007
Delega
atribuições à Subprocuradora Geral do Estado da Área
da Consultoria
O
Procurador Geral do Estado, resolve:
Artigo
1º - Delegar à Subprocuradora Geral do Estado da Área
da Consultoria a aprovação de pareceres emitidos pela
Procuradoria Administrativa que tratem dos seguintes
temas:
a)
recursos interpostos em processos administrativos
disciplinares dirigidos ao Governador do Estado;
b)
questões jurídicas que já tenham sido objeto de
orientação geral fixada em parecer aprovado pelo
Procurador Geral do Estado.
Artigo
2º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua
publicação.
Fonte:
D.O.E., Executivo I, de 10/02/2007, publicado em
Procuradoria Geral do Estado – Gabinete do
Procurador-Geral
Aposentado de MG quer bloqueio para quitar precatório
O
aposentado José Maria Guimarães entrou com ação no
Supremo Tribunal Federal para garantir o recebimento de
precatório alimentar no valor de R$ 200 mil, devido
pelo Departamento de Estradas e Rodagem de Minhas Gerais
(DER-MG).
O
argumento do aposentado é de que houve quebra na ordem
cronológica do pagamento de precatórios. De acordo com
a ação, o número de seu processo é 67 e venceu no
ano de 2002 sem ter sido pago. No entanto, processos de
número 75, 81, 100 e 101 foram quitados, mesmo se
tratando da mesma natureza.
O
aposentado pede o seqüestro de recursos do DER para
determinar o imediato pagamento da dívida. Alega também
desrespeito a Constituição Federal, já que o artigo
100 determina o pagamento dos precatórios na ordem
cronológica de apresentação, bem como, em caso de
atraso no pagamento, impõe o seqüestro da quantia
necessária à satisfação do débito. O relator da
reclamação é o ministro Gilmar Mendes.
Fonte:
Conjur, de 10/02/2007
Estado deve indenizar shopping por cobrança indevida de
ICMS
O
juiz Ari Ferreira de Queiroz, da 3ª Vara da Fazenda Pública
Estadual de Goiânia, condenou nesta quinta-feira (8/2)
o Estado de Goiás a indenizar o Goiânia Shopping por
ter utilizado, como base de cálculo para cobrança do
ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços),
um contrato estabelecido entre o estabelecimento e a
Celg (Companhia Energética de Goiás), e não a energia
efetivamente consumida. Na sentença, o magistrado
mandou o Estado devolver ao estabelecimento os valores
pagos a mais a título de ICMS.
De
acordo com o Tribunal de Justiça de Goiás, na ação
de repetição de indébito, o shopping afirmou que, em
razão de suas atividades, e para evitar a paralisação
das lojas que atuam em seu interior em caso de queda de
energia nos horários de pico, firmou um contrato
especial com a Celg. Pelo contrato, todo mês uma
quantidade fixa de energia lhe é disponibilizada, que
nem sempre é consumida.
De
acordo com o shopping trata-se de uma espécie de
"reserva técnica", expressa em quilowatts e
denominada demanda. Mesmo que a demanda não seja
consumida em sua totalidade, o shopping paga o valor do
contrato.
O
estabelecimento argumentou que, nas faturas de cobrança
emitidas pela Celg para os grandes consumidores, são
discriminados dois valores distintos, um referente ao
consumo e outro à demanda. Entretanto, o ICMS deve ter
por base de cálculo o valor da energia efetivamente
consumida, considerando cobrança indevida a diferença
que incide sobre a demanda, como vinha sendo feito.
Ao
contestar a ação, o Estado invocou a cláusula oitava
do contrato especial de fornecimento firmado entre o
shopping e a Celg, o qual prevê a obrigatoriedade do
consumidor pagar ao fornecedor o valor da demanda
contratada, mesmo que não a utilize inteiramente.
Na
sentença, Ari Queiroz ponderou que a cláusula oitava
do contrato é uma imposição da Aneel (Agência
Nacional de Energia Elétrica) e que lesa o grande
consumidor, que se vê obrigado a pagar pelo que não
consome e, ainda, suportar a incidência do ICMS sobre
esse montante.
Para
fundamentar sua posição, o magistrado citou jurisprudência
sob o entendimento de que o ICMS deve incidir sobre o
valor da energia elétrica efetivamente consumida,
"isto é, a que for entregue ao consumidor, a que
tenha saído da linha de transmissão e entrado no
estabelecimento da empresa".
Última
Instância, de 10/02/2007
Carta precatória demora 13 meses para ser cumprida no
RS
A
demora no cumprimento de carta precatória por parte do
Juizado Especial Cível Adjunto da comarca de
Cachoeirinha (RS) resultou em processo no CNJ (Conselho
Nacional de Justiça). O autor da ação reclamava pela
demora de 13 meses no cumprimento de uma carta precatória.
O
corregedor nacional de Justiça, ministro Antônio de Pádua
Ribeiro, determinou ao Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul a adoção de providências para resolver
o problema.
Em
ofício encaminhado ao ministro, o corregedor-geral de
Justiça do TJ-RS, desembargador Jorge Luís Dall´Agnol,
confirmou que realmente houve atraso em relação ao
cumprimento da carta precatória —fato reconhecido
pela própria magistrada que preside o Juizado.
Por
essa razão, foi expedido ato administrativo para evitar
que fatos como esses voltem a ocorrer. Além disso,
providências serão adotadas a fim de que haja o
correto controle dos prazos para cumprimento dos
mandados e cartas pelos oficiais de Justiça.
O
tribunal informou ainda que a carta foi devolvida e
ressaltou dificuldades estruturais enfrentadas pelos
Juizados Especiais Cíveis Adjuntos, que não possuem
estrutura própria para funcionarem.
A
situação ensejou, segundo o juiz-corregedor local,
Ricardo Pippi Schmidt, o envio de projeto de lei para a
Assembléia Legislativa para a criação de cartório e
servidores próprios para atendimento a 13 juizados na
região, onde o ingresso supera os 1.200 pedidos ao ano.
"A
Corregedoria Nacional sempre tenta resolver os problemas
por meio das corregedorias locais. E, em geral, são
encontradas excelentes soluções, como neste caso, sem
que seja necessário o caso ir a julgamento no plenário
do CNJ", disse o ministro Antônio de Pádua
Ribeiro.
Fonte:
Última Instância, de 10/02/2007
Substituição tributária e o julgamento da Adin
2.777/8 no STF
Marcelo
da Silva Prado
Tenho
procurado neste espaço sempre oferecer a minha opinião
acerca de temas atuais e tenho tentado evitar assuntos
meramente tributários (porque milito nessa área do
direito e preciso oxigenar o meu pensamento para além
das suas fronteiras), pois acredito que não sejam
primeiramente interessantes às pessoas que não
trabalham na área e também por que tenho encontrado
diversos outros assuntos nessas mais de dez colunas que
já escrevi para Ultima Instância.
Faço
essa ressalva apenas para afirmar que a escolha do tema
desta coluna merece a atenção do leitor e da
comunidade jurídica, pois acredito que pode estar se
desenhando uma derrota terrível e absolutamente injusta
contra o contribuinte brasileiro.
Na
Adin 2.777/8, com julgamento em curso no STF, se
questiona a constitucionalidade das legislações de São
Paulo e de Pernambuco que permitem a restituição do
ICMS nas operações sujeitas à substituição tributária.
Para
os leitores não familiarizados com a matéria, a
substituição tributária é o regime pelo qual uma
terceira pessoa, sem ser contribuinte da operação em
questão, é, por lei, investida na condição de
sujeito passivo da obrigação tributária e passa a ser
obrigada a satisfazê-la.
Esse
regime facilita sobremaneira o trabalho da fiscalização
(na medida em que reduz o número de contribuintes a
serem verificados, deixando apenas os grandes sobre a
mira dos agentes fiscais) e efetivamente ajuda a reduzir
a sonegação.
Existem
dois tipos de substituição tributária para frente e
para trás: na substituição tributária para trás
liberam-se do pagamento do tributo às operações
anteriores e se escolhe o último da cadeia (via de
regra, o maior) para recolher o imposto de todas as
operações anteriores, exemplo disso é o que acontece
com as operações com sucata. Os sucateiros têm o
pagamento do ICMS diferido (postergado) quedando a
obrigação do recolhimento do imposto às usinas siderúrgicas
que são o destino final dessa mercadoria.
A
mais comum é a substituição tributária para frente,
que consiste em obrigar alguém a pagar (o substituto
tributário), não apenas o imposto atinente à operação
por ele praticada, mas, também, o relativo à operação
seguinte, presumindo-se, primeiramente, a ocorrência da
operação seguinte, e segundo presumindo-se também o
“quantum debeatur” da mesma.
Melhor
explicando, o ICMS antecipadamente retido e recolhido
pelo substituto é calculado sobre uma base de cálculo
presumida, normalmente a tabela de preços sugerida, mas
que muitas vezes em razão da própria dinâmica do
concorrido mercado brasileiro (v.g. carros novos), acaba
ocorrendo por valores inferiores aos previstos na
tabela.
Nesses
casos obviamente houve uma tributação a maior, ou
seja, a operação seguinte ocorreu por um preço
inferior ao valor da tabela (que é usada como base de cálculo
para o ICMS). Tem-se assim que o fato gerador presumido
não ocorreu na sua inteireza, sucedendo um pagamento a
maior do ICMS, gerado a partir da diferença entre o
valor recolhido e o efetivamente devido.
O
que se questiona atualmente é se em ocorrendo diferenças
de valor na operação seguinte, se a restituição é
devida ao contribuinte substituído ou não.
Ao
nosso ver a substituição tributária enquanto regime
de tributação somente pode ser considerado como
constitucional se ocorrer efetivamente a restituição
do imposto sobre o fato gerador presumido que não se
realizar, aliás, essa é a única interpretação possível,
ao meu ver, do artigo 150, parágrafo 7º da Constituição
Federal:
“Artigo
150. parágrafo 7º A lei poderá atribuir a sujeito
passivo de obrigação tributária a condição de
responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição,
cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente,
assegurada a imediata e preferencial restituição da
quantia paga, caso não se realize o fato gerador
presumido”.
O
valor pago indevidamente ou a maior a título de imposto
caracteriza um confisco tributário, e também, ofensa
à tipicidade tributária, na medida em que recai sobre
um fato gerador que não ocorreu, ensejando assim a sua
imediata e preferencial restituição, por força do
comando constitucional. Isso para não falar do princípio
da capacidade contributiva...
Deve-se
colocar tinta na expressão “caso não se realize o
fato gerador presumido” presente na parte final do
artigo 150, parágrafo 7º da CF. Não existe fato
gerador ocorrido pela metade, ou ele ocorre por inteiro
ou ele não se realizou, conforme a presunção da norma
tributária.
Um
exemplo numérico ilustrará o problema: o veículo X é
vendido segundo a tabela sugerida da montadora por R$ 32
mil, e esse é o valor base da operação para fins de
ICMS no Estado de São Paulo, ocorre que a concessionária
resolve oferecer um desconto e vende o veículo por R$
29 mil, ou seja, a base de cálculo nessa operação
caso não houvesse o regime de substituição tributária
seria de R$ 29 mil e não de R$ 32 mil, mas como a venda
de veículos é sujeita a esse regime, pagou-se ICMS
sobre R$ 3.000 que não foram efetivamente faturados
pela concessionária.
O
concessionário teria ou não direito a reaver o ICMS
recolhido sobre a parte da operação que não ocorreu?
Não tenho dúvidas em afirmar que sim, caso contrário
estaríamos tributando um fato sem a ocorrência do
evento no mundo fático, algo absolutamente
inconstitucional no direito brasileiro.
Os
votos contrários no Supremo Tribunal Federal (ministros
Nelson Jobim, Eros Grau, Elen Gracie, Sepúlveda
Pertence e Gilmar Mendes) sustentam que apenas os fatos
geradores que simplesmente não vierem a ocorrer
(totalmente) nas operações seguintes é que têm
direito à restituição, e que a ocorrência parcial
(por valor menor do que o previsto) não tem direito à
devolução.
Caso
prevaleça essa posição, Estados como São Paulo e
Pernambuco podem ser obrigados a negar a restituição
de ICMS sobre os valores exigidos a maior sobre o regime
da substituição, gerando um custo adicional nos
descontos dados pelos setores mais competitivos da
economia. Equivalendo a pagar imposto sobre valores que
não recebem dos seus clientes!
Importante
destacar que as legislações estaduais desses dois
Estados asseguram essa restituição e a declaração de
inconstitucionalidade desse procedimento gerará uma
verdadeira bagunça nos setores da economia sujeitos à
substituição.
Por
fim, uma ironia, o artigo 150, parágrafo 7º
encontra-se situado no Capítulo das Limitações ao
Poder de Tributar e foi ali colocado pelo legislador
constituinte derivado (Emenda Constitucional nº 3/93)
junto as demais garantias constitucionais do
contribuinte, e caso seja interpretado diferentemente do
que sustentei se revelará a antítese de todos os
demais princípios constitucionais tributários.
Esse
é o caso posto para julgamento no Supremo Tribunal e
que está com um apertadíssimo placar de 5 a 5 e que
dependerá do voto do último Ministro a votar (ministro
Carlos Britto) para definir a questão nessa Corte. Com
a palavra o eminente ministro.
Fonte:
Última Instância, de 12/02/2007
Liminar garante uso de crédito de ICMS
Marta
Watanabe
Uma
empresa do setor de mineração conseguiu a primeira
liminar que lhe garante o uso de créditos do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
pago na compra de produtos de uso e consumo. A decisão
do juiz Ronaldo Frigini, da 1ª Vara da Fazenda Pública
do Estado de São Paulo, permite que a empresa use os créditos
de mercadorias adquiridas desde 1º de janeiro até 13
de março deste ano. O material de uso e consumo é
aquele que não se agrega ao produto final, como combustível
para máquinas, lixas e energia elétrica, além de
material de escritório.
O
uso de créditos do imposto estava inicialmente
garantido para as empresas a partir de 1º de janeiro.
Uma nova lei complementar, sancionada em dezembro, porém,
adiou o direito das empresas para 2011. Os Estados
chegaram a alegar que a concessão do crédito iria
causar perda de arrecadação total de R$ 1,4 bilhão
mensais.
Hoje,
porém, a mudança nas normas do ICMS, dizem os
tributaristas, deve seguir não só o princípio da
anterioridade anual como também a chamada noventena. Ou
seja, as normas de cobrança só valem após um período
mínimo de 90 dias após a edição da alteração. Ou
seja, por esse raciocínio, para valer a partir de 1º
de janeiro, a lei que adia o direito de uso do crédito
do ICMS pago na compra de produtos de uso e consumo
precisaria ter sido publicada até fim de setembro. A
Lei Complementar nº 122/06, porém, foi editada somente
em 12 de dezembro.
Os
Estados alegam que, como se trata apenas de uma prorrogação
de prazo, a nova lei não precisaria seguir a noventena.
Eles argumentam que o Supremo Tribunal Federal (STF) já
teria decidido nesse sentido em julgamento de ação que
questionou a prorrogação da cobrança da Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Os
tributaristas alegam que a questão do ICMS, porém, é
diferente. O caso da CPMF, segundo o advogado Nelson
Monteiro, do Monteiro, Neves e Fleury Advogados, escritório
que obteve a liminar, determinava a prorrogação de uma
cobrança já existente enquanto na questão do ICMS a
legislação tratou de um direito que teria início a
partir de 1º janeiro. Paralelamente ao questionamento
judicial, os tributaristas ainda estão orientando as
empresas a concentrar, quando possível, a compra de
material de uso e consumo para o início do ano, para
aproveitar melhor os efeitos de uma discussão judicial
com decisão favorável a elas.
Na
decisão dada à empresa química, o juiz Ronaldo
Frigini diz que a nova lei complementar não instituiu
um novo tributo, mas ele considerou que a vedação à
tomada de créditos resultou em "aumento disfarçado"
do imposto, o que submeteria a nova legislação à
anterioridade de 90 dias.
Não
é a primeira vez que a noventena é aplicada ao ICMS.
Ela tem sido usada também como argumento para
questionar o aumento de ICMS de 17% para 18% que o
Estado de São Paulo institui todo fim de ano. No ano
passado, por exemplo, o aumento só aconteceu em lei
publicada no fim de dezembro, o que tem levado as
empresas a argumentar que os 18% só valerão 90 dias após
a edição da lei e não a partir de 1º de janeiro,
como defende o Estado.
Fonte:
Valor Econômico, de 12/02/2007
Fazenda publica novas regras de ICMS
Zínia
Baeta
A
Secretaria da Fazenda de São Paulo publicou na
sexta-feira mais dois comunicados da Coordenadoria da
Administração Tributária (CAT) que têm por objetivo
esclarecer os efeitos do Decreto nº 51.520, que revogou
inúmeros benefícios fiscais de contribuintes do
Estado. Ao todo, já são quatro normas
"esclarecedoras" publicadas pela Fazenda. Os
comunicados CAT de números 6 e 7 tratam,
respectivamente, de créditos referentes ao ativo
permanente das empresas e de descontos oferecidos em
relação a multas.
O
consultor tributário da ASPR Consultoria Empresarial,
Douglas Campanini, explica que o ativo imobilizado das
empresas gera créditos de ICMS, que podem ser usados ao
longo de 48 meses. Quando há a transferência desse
ativo para uma filial ou matriz, por exemplo, a empresa
pode ficar com aquilo que já creditou e os créditos
restantes ficam para o estabelecimento para o qual houve
a transferência do ativo. Esta previsão está na Lei nº
6.374, de 1998, que trata do ICMS. Segundo Douglas, porém,
o Decreto nº 51.520 havia revogado a possibilidade.
"Em tese a empresa teria que estornar os créditos
aproveitados antes da transferência", diz. O
Comunicado CAT nº 6 deixa claro que não há
necessidade de devolução.
Já
o comunicado CAT nº 7 esclarece que as reduções dos
valores das multas, também previstas na lei do ICMS,
continuam a valer. O Decreto nº 51.520 também havia
revogado tais descontos. Segundo Campanini, as empresas
que pagam uma multa até 30 dias após a autuação têm
direito a um desconto de 50%. Se recolher a multa após
a defesa na primeira instância administrativa, julgada
improcedente, o contribuinte terá 35% de desconto sobre
o valor se o pagamento ocorrer também após 30 dias do
julgamento.
Fonte:
Valor Econômico, de 12/02/2007
Governo do RS sofre bloqueios de conta para custear
medicamentos
Fernando
Teixeira
O
governo do Rio Grande do Sul está vivendo uma nova fase
da disputa judicial pelo fornecimento de remédios não-disponibilizados
pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Estado acumula 20
mil ações envolvendo medicamentos e a despesa com as
ordens judiciais saltou de R$ 11 milhões em 2005 para
R$ 30 milhões no ano passado. Esse valor já
corresponde a 25% do orçamento total da Secretaria de
Saúde com o fornecimento de medicamentos. Essa, no
entanto, não é a pior parte do problema para o Estado:
dois terços das ordens judiciais já ocorrem por meio
de bloqueio de dinheiro na conta única do Estado.
As
ordens judiciais de bloqueio passaram de R$ 9 milhões
em 2005 para R$ 22 milhões em 2006, enquanto o
fornecimento direto de medicamentos somou R$ 8 milhões
em 2006. As decisões ainda são uma peculiaridade gaúcha,
mas podem chegar a outros Estados, já que o bloqueio de
conta foi mantido em várias decisões do Superior
Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o governo gaúcho,
os bloqueios desorganizam as finanças públicas e ainda
podem abrir margem a fraudes.
A
Procuradoria Geral do Estado (PGE) montou um grupo
especial para contestar as liminares e acabou
encontrando casos suspeitos, denunciados ao Ministério
Público. Segundo sua coordenadora, a procuradora
Marlise Fischer Gehrers, em um dos casos investigados
depois da formação do grupo descobriu-se que um
"doente" preferiu, ao invés de comprar o
medicamento, trocar de carro diante do dinheiro na mão.
Outro paciente conseguiu bloquear algumas dezenas de
milhares de reais do governo gaúcho, foi para a Europa
e nunca mais voltou. Houve ainda um grupo que recebia
comissão das farmácias que forneciam os medicamentos
obtidos judicialmente.
De
acordo com o coordenador da assessoria jurídica da
Secretaria da Saúde, Bruno Naldorf, são comuns casos
de pacientes que retiram medicamentos e voltam ao juiz
alegando que ele não foi fornecido. Alguns tratamentos
financiados judicialmente ultrapassam o valor de R$ 100
mil. No caso dos tratamentos oncológicos o valor médio
é de R$ 30 mil.
Diante
da jurisprudência consolidada nos tribunais superiores
autorizando o fornecimento de medicamentos, previstos ou
não na lista regular do SUS, o governo gaúcho se
conforma em coibir os abusos e tentar evitar o bloqueio
em dinheiro. O grupo especial da PGE utiliza médicos da
Secretaria de Saúde para contestar as receitas médicas
levadas à Justiça, tentando apontar medicamentos
substitutos e convencer os juízes a levar em conta a
relação custo/benefício antes de expedir uma ordem
judicial.
Para
reduzir os bloqueios, a saída foi licitar, em 2005, uma
distribuidora privada apenas para entregar os remédios
em tempo hábil diante de ordens judiciais de
fornecimento. De acordo com Bruno Naldorf, as ordens
exigem o fornecimento do medicamento em 72 horas, mas
uma compra da secretaria passa por um processo licitatório
que leva pelo menos 40 dias. Apesar disso, ultrapassadas
as 72 horas, o juiz autoriza o bloqueio. As ordens
continuaram porque mesmo a distribuidora não consegue
cumprir o prazo, já que há um procedimento
administrativo interno mínimo a ser cumprido. Alguns juízes
também preferem bloquear o dinheiro de uma vez, por ser
mais rápido - o Estado sempre têm saldo em sua conta
única, no Banrisul, que em geral tem agência nos fóruns.
Segundo
a procuradora Marlise Fischer, o bloqueio ainda é uma
característica gaúcha da disputa em torno do
fornecimento de medicamentos fora da lista do SUS, mas
causou preocupação quando levado ao colégio de
procuradores gerais dos Estados. Isso porque as ordens
judiciais de fornecimento de remédios são corriqueiras
em todo o país, embora adotem outras formas de coerção
do poder público, como a imposição de multas. No Rio
de Janeiro, são proferidas semanalmente ordens de prisão
contra o Secretário de Saúde por descumprimento de
decisões judiciais. Em São Paulo, a PGE elaborou em
2005 um projeto de lei para tentar regulamentar a questão.
A idéia é tentar compartilhar o prejuízo com a União
- em tese responsável por tratamentos mais complexos -
e dar mais credibilidade à lista de medicamentos
garantidos normalmente pelo SUS.
Fonte:
Valor Econômico, de 12/02/2007
A hora e a vez
JOAQUIM
FALCÃO
SE
DEPENDER do senador César Borges, do PFL-BA, em 2007 o
Congresso Nacional resolverá o problema dos precatórios.
Será criada nova legislação para que os governos
paguem suas dívidas fruto de decisões judiciais.
Existem hoje 16 propostas de emenda constitucional sobre
o tema no Congresso. Algumas com mais de dez anos de
tramitação.
A
situação chega a um limite. Estima-se que os governos
devam hoje a empresários, pensionistas, contribuintes e
outros um valor superior a R$ 63 bilhões. Dívidas
vencidas e não pagas. Parecem dizer aos credores:
"Devo, não nego, pago quando puder, mas, como não
posso, não pago". Será que os governos realmente
não têm dinheiro para pagar os precatórios?
No
fundo, têm dinheiro, sim. Vejam só. A imensa maioria
das discussões sobre precatórios sublinha apenas o
aspecto jurídico: como executar esse título judicial?
Aí, a discussão doutrinária e jurisprudencial é sem
fim. Esbarra na sempre impossível intervenção federal
nos Estados, dos Estados nos municípios e no seqüestro
de verbas -únicos meios aptos a fazer com que o credor
receba o que lhe é devido. Como são medidas política
e judicialmente difíceis pela própria jurisprudência
do STF, o credor fica sem o seu direito. A justiça não
é feita.
Se
analisarmos, porém, o precatório do ponto de vista orçamentário,
a nudez crua da verdade aparece -diria Eça de Queiroz.
No fundo, o não-pagamento dos precatórios é escolha
política. Questão de prioridade orçamentária. Ante
recursos que, sabemos, serão sempre escassos, os
governos preferem gastar com outras despesas, umas mais,
outras menos justificáveis. Pagam-se juros, aumenta-se
pessoal, fazem-se obras, gasta-se com propaganda oficial
-e por aí vamos.
Ou
seja, a ordem de gastar do ministro da Fazenda, do
governador ou de seu secretário da Fazenda prevalece
sobre a ordem de pagar dada pelo Judiciário. Nada mais
claro e simples. Não é problema de recurso, mas de
prioridade. As conseqüências são gravíssimas e cada
vez mais perceptíveis.
O
não-pagamento acarreta insegurança democrática. Torna
o Judiciário não Poder independente, como manda a
Constituição, mas, de fato, Poder dependente da
escolha do secretário da Fazenda do dia. Pior. Perante
a população, que não distingue quem é o responsável
tecnicamente pelo não-pagamento, quem sai prejudicada
é a imagem do Judiciário. Sua legitimidade democrática.
Para a opinião pública, o Judiciário não foi
efetivo. Poder sem poder. Reformar o Judiciário é também
reformar o sistema de precatórios.
Mudar
a legislação. Romper com uma cultura jurídica que
imuniza o Estado diante de suas responsabilidades para
com o cidadão. De resto, qual legitimidade tem um Poder
Executivo para exigir (com razão) a reforma do Judiciário
se ele próprio não cumpre suas obrigações judiciais?
O
não-pagamento acarreta também insegurança econômica.
Não foi por menos que o influente Council of the
Americas, em recentíssimos estudos e debates sobre o
Estado de Direito na América Latina, tem apontado o não-pagamento
pelo Estado de suas obrigações como um dos principais
fatores de insegurança jurídica para investidores
estrangeiros.
Em
audiência pública realizada pelo Senado sobre o
projeto de emenda constitucional nº 12/2006, de autoria
de Renan Calheiros, sob a inspiração de Nelson Jobim,
o ministro Gilmar Mendes se mostrou favorável à mudança.
Pelo projeto, se os governos comprometessem uma ínfima
parcela do Orçamento para cumprir as decisões do
Judiciário, essa dívida estaria zerada em cerca de
cinco anos.
Aliás,
para o experimentado Everardo Maciel, nem de emenda
constitucional precisaria para resolver o problema.
Bastaria um conjunto de lei complementar e leis ordinárias
federais, estaduais e municipais, com base no artigo 170
do Código Tributário Nacional.
O
importante é que o Senado e a Câmara decidam.
Dificultar a decisão legislativa resultará em fato
simples: os governos continuarão não cumprindo suas
obrigações constitucionais. O que não é bom nem para
a democracia, nem para o desenvolvimento econômico,
nem, sobretudo, para a consolidação do Estado de
Direito no Brasil.
A
convergência em torno da necessidade de uma decisão do
Congresso deve se sobrepor às eventuais divergências,
ainda que razoáveis, sobre um ou outro aspecto do
projeto. O impasse favorece o devedor. Nesse novo
Legislativo, o país precisa conhecer com precisão qual
o montante dessa dívida. Afinal, como pergunta o próprio
Everardo, existe crédito mais líquido e certo contra a
Fazenda Pública do que um precatório? --------------------------------------------------------------------------------
JOAQUIM FALCÃO , 63, mestre em direito pela
Universidade Harvard (EUA) e doutor em educação pela
Universidade de Genebra (Suíça), professor de direito
constitucional e diretor da Escola de Direito da FGV-RJ,
é membro do Conselho Nacional de Justiça.
Fonte:
Folha de S. Paulo, de 12/02/2007
Fome e sede de justiça
CEZAR
BRITTO
SE
NECESSÁRIO fosse nomear a carência-síntese da
sociedade brasileira, não hesitaria em apontá-la numa
única palavra: justiça. Todas as demais mazelas da
vida brasileira -exclusão social, analfabetismo, violência
urbana, impunidade, descrédito das instituições e
infinitas outras- derivam dessa insuficiência.
Não
é problema que tenha surgido neste ou no governo
anterior -ou mesmo em algum especificamente. É herança
cultural que remonta aos primórdios da formação
nacional.
Somos
um país em que, no dizer de Alceu de Amoroso Lima, o
Estado precedeu a nação. Antes mesmo de termos
sociedade, já tínhamos Estado e respectivas (e múltiplas)
regulações. Nossa primeira organização geopolítica,
na seqüência do descobrimento, foram as capitanias
hereditárias, onde a vontade do donatário-governante
se sobrepunha à lei.
E
delas não nos desvinculamos culturalmente, o que
certamente inspirou o desejo irônico do poeta Manuel
Bandeira de mudar-se para uma Pasárgada imaginária,
onde, por ser amigo do rei, teria "a mulher que
quero, na cama que escolherei".
Ser
amigo do rei, nesse universo distorcido de valores, é a
aspiração máxima da cidadania pelo avesso, dando
ensejo a que prosperem práticas como nepotismo, tráfico
de influência, fisiologismo político e impunidade. O
rei -o governante, o caudilho, o coronel, o chefe político-
substitui a lei e o Judiciário.
Essa
é a herança colonial contra a qual se batem os homens
de bem deste país, felizmente encontráveis em todas as
instituições e partidos. A OAB, cuja presidência
assumi no dia 1º de fevereiro, forjou sua tradição na
luta contra tais aberrações culturais.
Cidadania
ativa é o antídoto. Pressupõe, no entanto, um país
que pratique a justiça, que viva sob sua égide. Não
sem razão, em meu discurso de posse, sustentei que nós,
os integrantes da cena judiciária -advogados,
magistrados e membros do Ministério Público-,
precisamos nos submeter a drástica e imediata autocrítica
e corrigir procedimentos.
Sabemos
que nenhum de nós é isoladamente responsável pela
crise de justiça. Mas não podemos negar que é nossa a
missão constitucional de fazer da justiça um alimento
consumido por todos. Somos os encarregados da
punibilidade dos que desviam verbas públicas, dos que
se apropriam dos sonhos de igualdade, dos que se
alimentam da fome alheia, dos que abusam do poder econômico,
dos que fazem tráfico de influência, dos que viciam a
vontade das urnas, dos que zombam do próprio Judiciário.
Consola-me
saber, porém, que, unidos, podemos melhorar
substantivamente a qualidade da prestação
jurisdicional no país, reduzindo a carência-síntese
do Brasil -e, com ela, o mal-estar geral da nação. Só
assim, tornando a Justiça um bem real e efetivo,
estaremos em consonância com o estabelecido no artigo 1º
da Constituição, que diz que a bandeira da República
Federativa do Brasil está fincada no Estado democrático
de Direito. Sem Justiça, direito é letra morta, mera
manifestação de intenções.
E
aí me refiro à Justiça em seu sentido mais palatável:
o Poder Judiciário e as políticas públicas de inserção
social. Não basta conceder um direito no papel. É
preciso levá-lo à prática.
Materializar
a justiça social é sinônimo de mobilizar a sociedade
por meio da cidadania ativa. Caso contrário,
continuaremos a aumentar a descrença no Judiciário e a
colecionar leis que não pegam. Agir em busca da justiça
é, portanto, palavra de ordem.
Eis
porque a OAB intensificará cada vez mais sua participação
nos órgãos governamentais e da sociedade civil que
definam políticas públicas. Um bom exemplo acaba de
ser servido. No dia seguinte à minha posse, tive reunião
de trabalho com o ministro da Educação, Fernando
Haddad. Acertamos retirar do cardápio da cidadania o
estragado prato da mercantilização do ensino jurídico.
O
aprendizado da justiça tem nos bancos acadêmicos um
forte aliado. Bacharéis malformados resultam no que
temos: de um lado, os beneficiários de um ensino de boa
qualidade, do outro, uma desesperada multidão frustrada
pela não-concretização do sonho de ascensão social
pelo saber.
Há
muito o que fazer para que o Brasil melhore. Mas, se
fizermos nossa parte, poderemos atacar o mal pela raiz.
A fome maior que temos é a de justiça. E a sede que
sentimos exige ser saciada pela ousadia da ação. Fome
e sede de justiça, carências que podem fazer parte do
passado brasileiro.
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CEZAR BRITTO , 45, é presidente nacional da OAB (Ordem
dos Advogados do Brasil).
Fonte:
Folha de S. Paulo, de 11/02/2007