Reforma
será focada na demanda
Fernando
Teixeira
Ainda em
2002, antes de assumir o Ministério da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos procurou o colega Joaquim Falcão para
discutir a reforma do Judiciário. Jurista, diretor da
Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e
estudioso da reforma, Falcão já tinha uma idéia mais
ou menos definida de como ela deveria ocorrer. Primeiro,
o governo deveria criar uma "secretaria da reforma
do Judiciário" e selecionar projetos de lei já em
tramitação no Congresso Nacional, ao invés de impor
uma proposta nova. A reforma também deveria ser
suprapartidária e envolver os três poderes em um pacto
para viabilizar sua tramitação e evitar pressões
corporativas.
O
resultado hoje é bem conhecido: foi a fórmula posta em
prática pelo Ministério da Justiça e que resultou na
aprovação da Emenda Constitucional nº 45, a reforma
de maior sucesso promovida pelo governo Lula - 13 anos
após o início de sua tramitação na Câmara dos
Deputados. Hoje conselheiro do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) indicado pelo Senado Federal, Joaquim
Falcão já enxerga uma nova fase para a reforma do
Judiciário. Para ele, trata-se de uma simples equação
de mercado: o equilíbrio entre oferta e demanda. Em
outras palavras, o problema não é apenas tornar a
Justiça mais eficiente, mas reduzir a demanda por serviços
judiciais, ou seja, o número de ações.
Valor: A
reforma do Judiciário foi promovida, o CNJ está em
pleno funcionamento e a reforma processual foi em boa
parte concluída. E agora, para onde vai a reforma?
Joaquim
Falcão: O Judiciário é um sistema em que há mais
demanda do que oferta, ou seja, entram mais conflitos do
que saem sentenças. A lentidão é exatamente o excesso
de demanda diante da pouca oferta. A demanda se perde no
sistema, demora muito e não sai em um tempo de pacificação
social ou de pacificação econômica. Então, para
pensar a reforma, você tem que pensar como atuar no
lado da demanda e como atuar no lado da oferta. Atuar do
lado da oferta significa ser mais eficiente, ágil e
transparente. É uma eficiência gerencial do sistema.
Valor: É
esse o foco da reforma até agora...
Falcão: Não
necessariamente, mas é o foco principal. Mas, por mais
eficiente que seja a Justiça, a demanda vai crescer
sempre muito mais. A reforma precisa frear o aumento da
demanda. Então esse próximo ano vai ser fundamental
para que este equilíbrio seja refeito. O Judiciário e
a sociedade estão se conscientizando a atuar nas duas
pontas.
Valor: Então
a reforma vai migrar para a demanda?
Falcão: Não
vai migrar, mas agora o foco deve estar nas duas pontas.
Alguns sintomas apareceram em 2006 e vão crescer em
2007. O Movimento Nacional pela Conciliação é um
deles: 52 tribunais participaram, 79 mil audiências
foram previstas e 83 mil foram feitas. A importância do
movimento, que é um fato novo, é que a administração
da Justiça deixa de ser do Estado e das corporações.
É um movimento de mobilização social, que incluiu
psicólogos, juízes e professores. Ou seja, se até
agora a questão da Justiça era uma questão do
Congresso, nos últimos dois anos mostrou que é também
do Executivo e do Legislativo, e agora se espalha para
ser uma questão social.
Fonte:
Valor Econômico, de 06/02/2007
Súmula vinculante influirá em previsão orçamentária
Valor:
Isso significa que o Judiciário se tornou democrático?
Falcão: A
sociedade está se sentindo responsável e o problema
chegou a tal ponto que não deve ser deixado apenas nas
mãos do Estado. Outro exemplo: a ministra Ellen Gracie
(presidente do Supremo Tribunal Federal) gosta de um
projeto do CNJ que é a inserção social do preso, e
que começa com um banco de dados da população carcerária
do país. A ministra está buscando o apoio de quem? Da
Associação Comercial do Rio de Janeiro e da Federação
das Indústrias de São Paulo e do Rio Grande do Sul. Há
um fato novo e que as pessoas ainda não estão se dando
conta: o problema da Justiça deixou de ser de um poder
ou dos três poderes e passou a ser da sociedade.
Valor: Do
ponto de vista da administração judiciária, o maior
demandante sempre foi o poder público. O que fazer?
Falcão: Há
outros movimentos para diminuir a demanda do Judiciário.
Um deles é a súmula vinculante. O que eu não sei é
se o governo fez previsões orçamentárias, porque ele
vai ter que levar a sério a súmula vinculante, que em
muitas questões vai implicar em ônus de alguns bilhões.
A súmula vinculante não é um instrumento jurídico,
é um item orçamentário. O governo não vai mais poder
financiar seu caixa protelando ações judiciais com a
individualização das demandas. A lentidão da Justiça
vai deixar de subsidiar o fluxo de caixa do Tesouro. A
lentidão é um dos subsídios invisíveis ao caixa, não
somente por causa dos recursos, mas porque as ações são
individualizadas, ou no máximo em grupos. É uma
perspectiva liberal radical que não se pratica mais em
nenhum país capitalista do mundo, pois todos eles têm
o seu "class action". A disputa deixará de
ser também um subsídio para as empresas,
principalmente aquelas que lidam com um grande número
de consumidores, como as de telefonia, energia, bancos
etc. Há uma pesquisa do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro que mostrou que 16 empresas eram responsáveis
por 80% das questões que iam aos juizados especiais do
Rio. Então, a revolução da súmula não é uma revolução
jurídica, é uma revolução que pode afetar as relações
entre Estado e contribuintes/pensionistas e entre
empresas e consumidores.
Valor: A súmula
vinculante substitui a idéia que se fazia de que é
necessário fazer pressão sobre o Executivo para ele
desistir de litigar?
Falcão: Aí
você tem uma terceira via de redução da demanda. O
Poder Executivo, seja através da Advocacia-Geral da União
(AGU), seja através das estatais, tem que mudar a política
de que tem que recorrer em tudo. Por exemplo, a Caixa
Econômica Federal estimo que gaste R$ 1 bilhão ao ano
para manter seu departamento jurídico, com mais de um
milhão de ações. Ela está começando a ver que esta
política não pode continuar. Existe pressões sobre a
AGU para que ela instrua os advogados e as procuradorias
de que não pode mais ajuizar tantas ações. O grande
fato político em 2007 será uma pressão de diminuição
da demanda. Os responsáveis pelo aumento da demanda -
primeiro o Estado e depois as grandes empresas - vão
ter que criar mecanismos com uma outra lógica econômica.
Valor: Uma
das idéias da reforma era tentar onerar os recursos...
Falcão:
Isso já foi feito em um das leis da reforma
infraconstitucional. Mas quando você onera, significa
que a demanda já entrou no sistema, e o importante é
você evitar que ela entre no sistema. E isso, para
ocorrer, depende de um movimento cultural. Se você
desobstrui o Judiciário de questões que poderiam não
estar lá, você acelera a solução das questões que
estavam lá. Uma medida positiva seria se o governo
fizer um planejamento judicial, como as empresas fazem,
porque a súmula vai implicar em desembolsos de caixa
expressivos a partir dessas decisões que o Supremo pode
tomar.
Valor:
Controlar a demanda garantiria maior segurança jurídica?
Falcão: A
insegurança jurídica, tão cara aos empresários, tem
sido focada como resultado da insegurança da jurisprudência.
Mas o mais grave é a insegurança administrativa. A
lentidão causa mais insegurança jurídica do que uma
ou outra decisão divergente. Daí porque a eficiência
é essencial, é uma insegurança jurídica maior do que
qualquer outra coisa.
Valor:
Maior do que a mudança na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) ou Supremo?
Falcão:
Isso é assim no mundo inteiro, faz parte do jogo. A
Suprema Corte americana muda de opinião sobre a pena de
morte a cada três, cinco anos. A questão não é o
Judiciário mudar de opinião, mas que sejam previsíveis
as regras em que ele mude de opinião e que isso ocorra
em um prazo razoável. (FT)
Fonte:
Valor Econômico, de 06/02/2007
Renan
diz que não entrará na discussão sobre salários dos
três Poderes
Por
entender que Legislativo, Executivo e Judiciário devem
conviver com respeito, harmonia e independência, o
presidente do Senado, Renan Calheiros, negou-se a
discutir o comentário do presidente do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), Marco Aurélio Mello, a
respeito dos vencimentos pagos aos integrantes dessas
instituições. Numa entrevista, em São Paulo, Marco
Aurélio disse que trocaria seu vencimento pelo dos
parlamentares, alegando que estes recebem mais
vantagens.
"Há
um prenúncio aí de crise?", indagou uma repórter,
logo que o presidente do Senado chegou, na manhã desta
terça-feira (6), ao Congresso. "Muito pelo contrário",
respondeu Renan, observando não desejar ferir a
harmonia que deve existir entre os Poderes da República
numa democracia.
-
Exatamente para evitar que isso descambe para uma crise,
é muito importante que tenhamos equilíbrio e bom senso
e não deixemos que isso descambe para um
desentendimento entre Poderes. Até em respeito ao
principio da separação dos Poderes, não vou discutir
isso. Existem várias demandas, mas eu não vou
priorizar essa discussão. Essa não é uma discussão
prioritária para a sociedade. E será pior se ela
descambar para a separação dos Poderes. Temos que
respeitar o principio de manter os Poderes separados.
Temos que nos guiar pelo principio da separação. A
democracia e a Constituição exigem isso.
Fonte:
Agência Senado, de 6/02/2007
STF não é competente para julgar ação popular contra
subsídios pagos a magistrados paulistas
A
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra
Ellen Gracie, determinou o arquivamento (negou
seguimento) da Ação Originária (AO) 1430, proposta
pelo advogado L.N. contra o pagamento de salários,
acima do teto constitucional, a 1208 magistrados
paulistas.
O autor da
ação alegou ofensa ao inciso XI, artigo 37, da
Constituição, pelo estado de São Paulo e outros órgãos
estaduais responsáveis pelo pagamento dos magistrados.
L.N. afirma que a norma prevê o limite máximo de
remuneração dos magistrados estaduais, inclusive
membros do Ministério Público (MP), procuradores e
defensores públicos.
Para o
autor da AC, se o STF concedeu liminar para suspender os
efeitos da Resolução nº 15 do CNMP que alterava o
teto remuneratório constitucional, “pacífico que no
caso da presente ação, a prosperar a lógica, por
similitude, deveria também o presidente do TJ-SP ter
determinado a imediata suspensão de pagamentos de
vencimentos a magistrados paulistas, aposentados e
pensionistas que estejam percebendo remuneração que
ultrapasse os 90,25% dos subsídios pagos aos ministros
do STF”.
A
presidente do STF negou seguimento ao pedido ao observar
que “o STF jamais admitiu a própria competência para
processar e julgar, originariamente, ação popular”,
já que no artigo 102, inciso I da Constituição não
consta a atribuição da Corte para a apreciação de ações
populares. Essa análise cabe às instâncias judiciais
locais de primeiro grau, de acordo com jurisprudência
firmada pelo Supremo.
O exame do
pedido de liminar ficou prejudicado em decorrência do
arquivamento da ação.
Fonte:
STF, de 05/02/2007
Estudo revela que juízes brasileiros tendem a favorecer
parte mais forte
Um estudo
realizado em 2006 por dois pesquisadores da Faculdade de
Direito do Largo São Francisco (USP) revela que o
resultado de julgamento realizado no Brasil pode variar
conforme a parte envolvida no processo. Brisa Lopes de
Mello Ferrão e Ivan César Ribeiro, responsáveis pelo
estudo apresentado na Faculdade de Berkley (Califórnia,
EUA), analisaram 1.019 acórdãos judiciais e
constataram “um franco e consistente favorecimento da
parte mais forte”.
A pesquisa
veio à público a partir da coluna do jornalista Elio
Gaspari, veiculada neste domingo (4/2) pelos jornais O
Globo e Folha de S.Paulo. Última Instância acessou o
teor do estudo, um paper com 13 folhas em português,
postado no Berkeley Program in Law & Economics, por
meio do link http://repositories.cdlib.org/bple/alacde/26
“Constata-se
de forma significante que uma parte mais forte que tenha
uma cláusula contratual a seu favor tem 45% a mais de
chance de ver o contrato mantido, se comparado a uma
parte mais fraca que também tenha uma cláusula
contratual a seu favor”, revela o estudo. “Essa
parte mais forte terá uma chance maior de ver o
contrato que lhe é favorável afastado apenas quando
existirem mais normas cogentes [normas jurídicas que não
podem ser derrogadas pelas partes] (ou seja, em áreas
como a trabalhista, ambiental e previdenciária),
entretanto essa redução da probabilidade de preservação
do contrato será bem mais modesta (em torno de 15%).”
O objetivo
dos pesquisadores foi o de testar de forma empírica a
teoria de que os magistrados brasileiros tendem a
favorecer a parte mais fraca em um processo como forma
de realizar justiça social. Esse “viés pró-devedor”
criaria a chamada insegurança jurídica, prejudicando
em última análise o crescimento econômico, por meio
da atração de investimentos.
A teoria
advém de um texto de 2003 de autoria de Pérsio Arida,
Edmar Bacha e André Lara Resende, intitulado: “Crédito,
Interesse e Incerteza Jurisdicional: Conjecturas sobre o
Caso do Brasil”. Dois outros trabalhos reforçariam a
teoria, um coordenado por Bolivar Lamounier e outro por
Armando Castelar Pinheiro, ambos de 2002.
No
entanto, o estudo de Brisa e Ribeiro revelam justamente
o contrário. “A hipótese, de acordo com nossa
proposição, carece de fundamentos microeconômicos”,
dizem os pesquisadores. “Mesmo o argumento tradicional
desses teóricos, de que a venda de veículos por alienação
fiduciária teria uma taxa de juros menor em função da
certeza jurisdicional, carece de comprovação empírica.”
Na prática,
a teoria é outra...
Lamounier
realizou uma pesquisa de opinião com magistrados para
saber como eles decidem em casos em que devem escolher
entre manter os contratos ou “praticar justiça
social”. Em seu trabalho, Pinheiro buscou medir a
politização das decisões judiciais, a partir da opinião
de 741 magistrados sobre duas posições extremas:
manter estritamente o contrato ou afastar o contrato
para fazer justiça social. Os dois estudos revelaram um
posicionamento entre os juízes pró-devedor, ou a favor
da justiça social.
Na prática,
os resultados colhidos por Brisa e Ribeiro apontam no
sentido inverso. Após a realização de um teste empírico,
o estudo confronta as duas hipóteses —pró-devedor ou
não— analisando o resultado da regressão com 181 acórdãos
selecionados —ao invés de trabalhar com dados de
pesquisa de opinião entre os juízes. Em cada acórdão,
foi observado se foram mantidas as cláusulas
contratuais e qual parte do processo foi favorecida.
Os
pesquisadores utilizaram ainda um modelo de regressão
chamado modelo de probabilidade probit, que mostra as
modificações nas probabilidades de o contrato ser
mantido, a partir do aumento das variáveis envolvidas.
“Não
existe favorecimento voluntário à parte em desvantagem
na relação, assim como o juiz não exorbita em suas
atribuições, protegendo estas partes além do
disciplinado em lei”, afirmam os pesquisadores no
estudo. “O favorecimento dos economicamente
privilegiados não se dá através da intervenção
direta, mas sim de uma neutralidade que ignora as
maiores chances de defesa que o litigante organizacional
naturalmente tem a seu favor.”
Quando o
processo em questão refere-se às áreas tidas como
fundamentais para a “segurança jurídica” —ou
seja, as mais ligadas à economia—, aumenta o
percentual de respeito ao contrato nas decisões
judiciais. A manutenção desse tipo de contrato, em
geral, acaba favorecendo a parte mais forte nessa relação.
“Nas áreas
apontadas como problemáticas por Pinheiro (2002) e
Arida et al (2005), nomeadamente as de crédito e juros
bancários e relações comerciais, aponta um
crescimento da probabilidade de manutenção do contrato
de 39% para 45%, quando são isolados os efeitos da edição
de normas cogentes”, diz o estudo.
Fonte:
Última Instância, de 06/02/2007
ICMS incidente sobre demanda contratada de fornecimento
de energia elétrica
Bruno de
Almeida Rocha
Para não
correrem o risco de eventual interrupção do exercício
de suas atividades, frente à insuficiência no
fornecimento de energia elétrica, diversas empresas no
Brasil celebram junto às empresas concessionárias de
distribuição e fornecimento de energia elétrica,
contratos, dos quais se colocam à disposição dessas,
uma quantidade de energia elétrica mensal determinada
(demanda reservada ou contratada).
Entretanto,
findo o mês, verifica-se que a quantia de energia elétrica
contratada sequer chega a ser integralmente consumida.
Mesmo assim, as concessionárias, por força do
estabelecido na legislação estadual, destacam o ICMS,
nas faturas de energia elétrica, sobre o valor
contratado, independentemente do efetivo consumo.
Conseqüentemente,
as empresas acabam por recolher, indevidamente, o ICMS
sobre parcela de energia elétrica que não foi
efetivamente consumida.
Ocorre que
a legislação tributária do Brasil1 determina que o
fato gerador do ICMS advém apenas com a transferência
da titularidade da mercadoria, ou seja, com a entrega
definitiva do bem ao seu destinatário final.
No caso em
apreço, a transferência de titularidade se dá tão
somente com a saída da energia elétrica da linha de
transmissão para o estabelecimento da empresa
consumidora.
A
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem
pacificando esse entendimento, reconhecendo o direito
dos contribuintes de não se sujeitarem à incidência
do ICMS sobre a demanda contratada ou reservada de
energia elétrica, justamente por nesses casos não
ocorrer o fato gerador do imposto estadual.
Importante
frizar que, de acordo com as decisões do Superior
Tribunal de Justiça proferidas sobre o tema, a medida
judicial deve ser proposta em desfavor somente do Estado
responsável pela exigência do ICMS, e não em face das
empresas concessionárias, que tão somente se
responsabilizam pelo repasse dos valores obtidos aos
cofres públicos.
Por
conseguinte, resta claro a existência de embasamentos
para que as empresas ingressem com medida judicial em
face dos Estados visando à suspensão da exigência do
ICMS sobre a demanda contratada, bem como a restituição
dos valores adimplidos indevidamente a esse título, sob
o argumento de que, nessa hipótese, não ocorre o fato
gerador do tributo.
Fonte:
Última Instância, de 06/02/2006
STF editará súmulas vinculantes em dois meses
por Lilian
Matsuura
Em dois
meses não devem mais ser abertos processos criminais
por sonegação fiscal sem que o lançamento definitivo
do débito tenha sido confirmado na esfera
administrativa. De acordo com o ministro Cezar Peluso, o
tema será pacificado em uma das primeiras súmulas
vinculantes que serão editadas pelo Supremo Tribunal
Federal.
Com a Súmula,
a proposição desse tipo de ação deve ser vetada logo
na primeira instância. As que já existem devem ser
extintas. Ao todo, seis ou sete súmulas estão sendo
editadas pelos ministros que compõem a comissão de
jurisprudência da corte — o próprio Peluso, Joaquim
Barbosa e Marco Aurélio.
Peluso diz
que elas estão praticamente prontas. Serão enviadas ao
procurador-geral da República e depois devolvidas para
análise do plenário do STF. No mínimo, oito ministros
devem aprová-las, em sessão pública, para que entrem
em vigor. As outras matérias que serão sumuladas não
foram reveladas. Mas sabe-se que a permissão de
progressão de regime para condenados por crimes
hediondos é uma delas.
“Os
crimes tributários, que dependem de apuração do
imposto, não se tipificam antes do lançamento
definitivo do imposto. O Supremo está cansado de
decidir desse jeito e, no entanto, todos os dias há
pedidos de Habeas Corpus”, reclama o ministro. Peluso
falou sobre o uso e a importância da Súmula Vinculante
e da repercussão geral aos advogados durante palestra
promovida pela Associação dos Advogados de São Paulo,
na segunda-feira (5/2).
“Os
mecanismos são importantes para resolver uma crise
social gravíssima. O Supremo não tem condições de
julgar mais nada. Não é possível a corte mais
importante do país não tenha nem tempo para decidir as
questões mais relevantes do país”, desabafa.
Peluso
contou quais são os requisitos para a escolha de uma
matéria que merece ser alvo de Súmula Vinculante.
Primeiro, questões que já têm jurisprudência na
corte e que continuam chegando em massa ao Supremo.
Esses processos são considerados inúteis pelo
ministro, já que são sempre decididas do mesmo modo e
“sobrecarregam todos os ministros”.
Além
desse requisito, Peluso aponta matérias em que haja
controvérsia entre órgãos judiciais. Todas elas devem
implicar grande número de causas com relevância jurídica,
econômica e social. O ministro explica que as súmulas
com efeito vinculante podem ser editadas por iniciativa
dos integrantes do STF ou por provocação. E aponta a
legitimidade dos tribunais para pedir a edição de uma
Súmula, diante do seu interesse direto na questão.
Por ter
caráter administrativo, não será possível recorrer
da edição da Súmula. “Não podemos burocratizar”,
explica Cezar Peluso. A Súmula Vinculante tem efeito
imediato sobre todos os órgãos judiciais e órgãos da
administração pública direta e indireta. Quando uma Súmula
for descumprida, ao invés de entrar com um recurso, o
advogado tem a possibilidade de contestar a decisão com
uma Reclamação direto no STF. “Há um risco de inflação
processual”, alerta o ministro. O Supremo não vai
julgar novamente a causa. A decisão administrativa ou
judicial será anulada para que a orientação seja
seguida.
Para o
doutrinador Arnoldo Wald, a Súmula Vinculante
representa uma revolução no Direito brasileiro. “Os
recursos em matéria tributária, monetária e
administrativa representam um percentual importante dos
mais de 100 mil recursos distribuídos anualmente ao
STF. Em cerca de dois anos, o STF deve reduzir em mais
de 50% o número de recursos distribuídos com a
instituição da súmula vinculante e da repercussão
geral. Assim, a duração dos processos será menor e
haverá aumento da segurança jurídica.”
Repercussão
Geral
Nas
palavras de Cezar Peluso, a Repercussão Geral “é o
mecanismo mais importante para restabelecer o papel do
Supremo Tribunal Federal”. Isso porque os ministros
poderão escolher as questões que podem ser julgadas na
Corte. Entre as que não devem ser julgadas, a briga de
vizinhos por causa do barulho do cachorro e a contestação
de norma que ninguém discute, apenas o autor do
recurso. A Repercussão Geral atinge processos penais,
além dos cíveis.
Como
discernir entre o que tem relevância e o que não tem?
Da mesma forma que o juiz decide o valor de uma causa
por danos morais, o chamado “juízo prudencial”,
responde o ministro. “A Repercussão Geral exige um
dado adicional à questão constitucional. Tem de haver
uma relevância na questão baseada em conceitos como a
vida”.
Mas o
ministro ressalta que o recorrente deverá demonstrar a
repercussão da causa. Se o advogado não deixar claro a
repercussão, o tribunal não tem obrigatoriedade de
reconhecer o recurso, diz Peluso. “Nesses casos,
mostrem logo para não haver dúvidas e enganos.”
Os dois
mecanismos foram aprovados pelo presidente da República,
Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 19 de dezembro,
quando sancionou as Leis 11.417/06 (Lei da Súmula
Vinculante) e 11.418/06 (Lei da Repercussão Geral).
Fonte:
Conjur, de 06/02/2006