Defensores vão fazer paralisação
Advogados públicos reclamam ao Estado sobre más
condições de trabalho e redução em orçamentos
Rodrigo Pereira
Os
defensores públicos de São Paulo prometem uma grande
paralisação na terça-feira, em protesto contra o governo
estadual pelas más condições de trabalho e pela redução
no valor do orçamento destinado à instituição proposto à
Assembléia Legislativa. Serão mantidos apenas os
serviços essenciais da Defensoria, como o plantão no
Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia
Judiciária (Dipo), nos Fóruns, atendimentos a
flagrantes, medidas cautelares, mandados e pedidos de
liberdade.
O
ato, intitulado Dia em Defesa da Defensoria Pública do
Estado de São Paulo, pretende alertar para “a
possibilidade concreta de interrupção do serviço
público” a partir de janeiro, segundo o presidente da
Associação de Defensores Públicos do Estado de São Paulo
(Apadep), Davi Depiné. Ele explicou que a Defensoria
conta hoje com um quadro de funcionários emprestados de
outras instituições públicas, por um acordo que se
encerra este ano.
“Um
projeto de contratação de funcionários administrativos
tinha de ter sido enviado à Assembléia Legislativa em
julho, mas até agora está nas mãos do governador e não
sabemos quando isso vai se resolver. E sem o apoio não
temos como funcionar”, diz Depiné.
O
orçamento para 2008 é outro ponto de queixa dos
defensores. Eles enviaram proposta de R$ 72 milhões ao
governo estadual, que reduziu o valor para R$ 37 milhões
- R$ 6 milhões a mais do que em 2007. Depiné argumenta
que o valor é inviável, pois o quadro da instituição
saltou de 87 para 400 ao longo deste ano - houve 221
defensores empossados em maio e 92, em setembro.
Em
nota, a Secretaria de Economia e Planejamento do Estado
afirma que propôs orçamento de R$ 353 milhões ao órgão
para 2008, ante R$ 315 milhões previsto para 2007 - e
contesta a alegação do aumento de efetivo. “Os recursos
do Tesouro do Estado para despesa com pessoal serão
praticamente iguais aos deste ano (...) porque o
orçamento para 2007 já contemplava a previsão de um
quadro de 400 profissionais”, diz a nota. “Haverá sobra
na despesa prevista para este ano”, conclui.
Segundo o presidente da Apadep, o valor divulgado pela
secretaria está incorreto, pois inclui o Fundo de Amparo
ao Judiciário (FAJ). “Somaram a verba que vem das custas
extrajudiciais, que não sai do Tesouro. Em tese, o FAJ
serviria para estruturar e manter a Defensoria, mas
desde os anos 90 ela está comprometida com a Ordem dos
Advogados do Brasil”, afirmou Depiné.
É
esse fundo que paga os advogados que atuam em cidades
onde não há Defensoria Pública (90% dos municípios do
Estado). “Em 2007, R$ 290 milhões vão para a OAB; este
ano, são R$ 295 milhões”, estima Depiné. O ato de
terça-feira será iniciado na frente da Praça da Sé, às
11 horas, e prevê uma visita à Secretaria de Justiça e à
Assembléia Legislativa.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 27/10/2007
SP terá câmaras de conciliação
O
governo Estadual, a Prefeitura de São Paulo e entidades
civis vão assinar na segunda-feira um protocolo de
intenções para a criação de câmaras de conciliação
extrajudiciais na capital, com acordos que têm amparo
legal. A celebração do acordo prevê a formação de
mediadores a partir de cursos ministrados por juízes,
promotores de Justiça, economistas, psicólogos e outros
especialistas com experiência em mediação. A primeira
fase do curso, com 80 vagas, vai começar no dia 30 de
novembro, terá três semanas de duração e 80 vagas. A
procuradora Juliana Demarchi explicou que no início do
ano já serão realizadas sessões de conciliação nos
Centros de Integração da Cidadania (CIC) espalhados pela
capital. “Vamos fazer essa experiência piloto na capital
e depois expandir pelo Estado”, disse Juliana. “A idéia
é que a cultura do enfrentamento, do embate, vá sendo
substituída pela do diálogo.”
Fonte: O Estado de S. Paulo, 27/10/2007
Ministro indefere pedido do município de São Paulo
contra seqüestro de verbas para pagamento de precatórios
Liminar requerida pelo município de São Paulo contra decisão do
Tribunal de Justiça do estado (TJ-SP), que determinou o
seqüestro de verbas para o pagamento de precatórios, foi
indeferida. A decisão do ministro Carlos Ayres Britto
ocorreu na análise da Reclamação (RCL 5463) ajuizada no
Supremo Tribunal Federal (STF)
O município paulista alega que o TJ-SP descumpriu decisão do STF ao
determinar o seqüestro de valores que teriam sido
indevidamente atualizados. Para tanto, cita julgamento
em ação direta de inconstitucionalidade que, ao
interpretar dispositivo do regimento interno do tribunal
estadual, firmou o entendimento de que atualizações de
valores de precatórios só podem ser feitas no caso de
erro material ou de inexatidão aritmética no precatório
original.
Nesses casos, a diferença deve ser compensada sem que seja
necessário entrar novamente na fila para pagamento de
precatórios, que obedece a uma ordem cronológica.
Decisão
“Não vislumbro, nesse exame superficial, típico das cautelares, a
fumaça do bom direito (fumus boni juris) do reclamante”,
disse o ministro-relator, ao indeferir a liminar.
Segundo ele, com a promulgação da Constituição Federal
de 1988, o crédito foi parcelado em oito anos, por força
do artigo 33 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias.
Em razão da desatualização do pagamento, Carlos Ayres Britto
afirmou que foi requerida a complementação do saldo
devedor, o que foi deferido e determinado que ocorresse
em 90 dias. “A decisão ora reclamada, a seu turno, teve
origem em pedido de seqüestro de verbas municipais,
tendo em vista a alegada quebra da ordem cronológica de
apresentação dos precatórios”, disse.
Para o ministro, na via estreita da reclamação, não cabe analisar o
mérito da decisão reclamada, mas apenas o eventual
desrespeito à autoridade das decisões do Supremo.
“Assim, no presente caso, basta verificar, nesse
primeiro exame, que os valores referidos no precatório
complementar tratam de mera atualização do precatório
original”, avaliou, ressaltando que documento anexado
aos autos demonstra que “a alteração dos índices se deu
em virtude da substituição operada por força de lei”.
Dessa forma, o ministro entendeu que não está evidenciada afronta
aos julgados do STF nas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade (ADIs) 1098 e 2924. “O pagamento
em noventa dias, no curso do mesmo precatório, é
possível quando se tratar de mera atualização ou
substituição de índices por força de lei, o que parece
ser o caso”, afirmou Ayres Britto.
Segundo ele, à alegação do reclamante de que os valores ainda estão
em discussão “se contrapõe o fato de a decisão reclamada
haver excluído a incidência dos juros moratórios e
compensatórios, bem como adotado o índice defendido pelo
município”. Por fim, entendeu que “não há o menor sinal
de que a base de cálculo utilizada para a elaboração da
conta, perante o juízo monocrático, seria diversa da
utilizada pelo Departamento de Precatórios do TJ/SP”.
Fonte: site do STF, de 29/10/2007
Não se deve admitir paralisação na Justiça, diz Toffoli
As greves no setor público devem ter tratamento legal mais rigoroso
do que as de trabalhadores da iniciativa privada porque
no primeiro caso “não se trata de greve do trabalho
contra o capital. É a greve de um setor que presta
serviço ao cidadão”. A opinião é do advogado-geral da
União, José Antonio Toffoli.
Em entrevista ao repórter Frederico Vasconcelos, publicada na Folha
de S.Paulo deste domingo (28/10), o advogado da União
disse que a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre
greve esclareceu alguns critérios importantes, como a
possibilidade de descontar os dias não trabalhados. Na
quinta-feira (25/10), o STF impôs limites às greves no
funcionalismo público ao decidir que enquanto perdurar a
omissão legislativa para a regulamentação da matéria,
valem para o setor as regras definidas para a iniciativa
privada.
Para Toffoli, a decisão do Supremo deve acelerar o envio, do
Executivo para o Congresso, do projeto de lei que
regulará as greves do funcionalismo. O advogado-geral
afirmou também que “em certas áreas, não deveria ser
admitida a greve, como na Justiça, na Educação. Não há
como repor os dias perdidos”.
Leia a entrevista à Folha
Qual será o impacto imediato da decisão do Supremo?
José Antonio Toffoli — Alguns critérios passaram a ficar claros.
Por exemplo, a possibilidade de descontar os dias não
trabalhados, de a Justiça decretar se uma paralisação é
legal ou não e de haver um quórum para a assembléia
decidir a greve.
Essa decisão deve refrear paralisações no serviço público?
Toffoli — Não vai refrear. Vai trazer um novo paradigma. Porque
havia uma situação de total liberdade. Com certeza, vai
reduzir litígios e conflitos.
Isso apressará o envio do projeto do governo ao Congresso?
Toffoli —- O Congresso e o Poder Executivo não podem ficar ausentes
desse debate e terão que acelerar a definição de uma lei
sobre a greve. Até porque a lei do setor privado não
deve ser um paradigma para o setor público. A greve no
setor público deve ter tratamento mais rigoroso, do
ponto de vista da lei.
Não procede, então, a alegação de que o projeto que o governo
encaminhou tem semelhança com a lei de greve do setor
privado?
Toffoli — Ela pega as premissas do setor privado e as torna mais
rigorosas no público. O quórum para aprovar a greve
aumenta e é maior o percentual de servidores para as
necessidades de atendimento público. As condições têm de
ser mais rigorosas, pois no setor público não se trata
de greve do trabalho contra o capital. É a greve de um
setor que presta serviço ao cidadão.
Quais são os pontos mais importantes do projeto do governo?
Toffoli —- O quórum. Uma greve tem de ter legitimidade. A
notificação prévia para iniciar a paralisação. E a
possibilidade do desconto dos dias não trabalhados. Se a
pessoa não trabalhou, tem que arcar com esse ônus. O
mais importante é a possibilidade de contratação
imediata de servidores para substituir os grevistas.
Os sindicatos vão pressionar por mudanças no projeto?
Toffoli —- Até onde sei, a negociação coletiva na administração
pública é a contrapartida que as lideranças sindicais
querem do governo para a regulamentação do direito de
greve.
É possível estabelecer a negociação coletiva no setor público? Isso
não está no projeto.
Toffoli — É possível, mas não no projeto. Existe um tratado
internacional, a Convenção da OIT nº 155. O Executivo
ainda não encaminhou [ao Congresso]. Precisaria o
governo mandar as duas coisas, a lei de greve e um
decreto legislativo.
O senhor citou a necessidade de se evitar o “exercício da greve sem
limites”. Em quais áreas essa situação tem sido mais
preocupante?
Toffoli — Em certas áreas, não deveria ser admitida a greve, como
na Justiça, na Educação. Não há como repor os dias
perdidos. A área da cultura ficou três meses paralisada.
Houve greve na Receita Federal, no Incra, no Ibama.
Houve atrasos em obras essenciais.
O governo vai usar para valer esse instrumento, sabendo-se que o
funcionalismo público é uma categoria muito ligada ao
PT?
Toffoli — O governo Lula não é um governo de servidor público. É um
governo para atender o país e a sociedade.
Evidentemente, o setor público é um segmento
extremamente importante da sociedade. Esperamos que
saibam acatar que toda reivindicação tem que ter regras.
Vários sindicatos compreendem essa necessidade.
Fonte: Conjur, de 28/10/2007
Judiciário ocupa vácuo do Legislativo e do Executivo
Três quartos das leis brasileiras submetidas ao crivo do Supremo
Tribunal Federal em 2006 foram consideradas
inconstitucionais. O número estrondoso — que faz parte
do levantamento do Anuário da Justiça 2007 — comprova o
que é comentado pelos quatro cantos do país: a qualidade
das leis produzidas no Brasil é sofrível.
Para o economista Armando Castellar Pinheiro, a má qualidade da
produção legislativa e da regulamentação do Executivo
são as principais responsáveis pela insegurança jurídica
no país. O Legislativo faz leis ambíguas, o Executivo
muda as regras quando bem entende e o Judiciário fica
com a tarefa de quase escrever a lei.
Um dos poucos pesquisadores que se debruçou seriamente sobre o
impacto da Justiça sobre a Economia, Castellar observa
que assim são criadas as políticas do país: caso a caso.
O Judiciário vai decidindo cada processo que chega às
suas mãos e a soma disso gera o que teria de ser um
planejamento. “O Judiciário tem ocupado o campo de
regulação por falta de trabalho dos outros dois
Poderes.”
No final da década de 1990, o economista mergulhou em uma pesquisa
para saber de que maneira o Judiciário influenciava na
Economia. Descobriu que, se a Justiça fosse célere e
previsível, o país poderia crescer 0,8% a mais por ano.
Mas não há segurança jurídica ou previsibilidade no Brasil. E, sem
isso, não há investidor que não pense duas vezes antes
de se arriscar. Há, isso sim, empresários que usam da
morosidade judicial e da baixa taxa de juros cobrada
pelo Judiciário para fazer da Justiça ferramenta do
planejamento tributário. Sabem que vão perder a causa e
terão de pagar a dívida, mas durante os longos anos de
tramitação do processo, investem o dinheiro e obtém
lucros maiores do que os juros que serão cobrados depois
pela Justiça.
Em entrevista à Consultor Jurídico, Castellar apontou os problemas
da Justiça sob a ótica da Economia e apresentou
possíveis soluções. Veja a entrevista.
ConJur — Qual o impacto do Judiciário sobre a economia?
Armando Castellar Pinheiro — Comecei a estudar esse impacto em
1997, quando não existia nenhum estudo sobre isso.
Depois de fazer pesquisa com centenas de empresas, a
conclusão é de que a taxa de crescimento do PIB seria
0,8% maior se o Judiciário fosse eficiente, o que
significa: previsível, imparcial e célere. Pode parecer
um número pequeno, mas não é se considerarmos um período
longo. Lógico que o Judiciário não é o grande limitador
que impede o Brasil de se transformar
em uma China em termos de crescimento, mas a Justiça
poderia dar uma contribuição importante para o
crescimento mais rápido do país.
ConJur — Mas como o senhor chegou a esse número?
Castellar — Com base em questionários feitos com centenas de
empresas que tinham, pelo menos, 50 empregados. Foram
feitas perguntas diversas para entender como era o
relacionamento das empresas com o Judiciário. A idéia
era descobrir como as empresas reagiriam se o Judiciário
melhorasse: como mudaria a decisão de contratar
mão-de-obra, de produzir, de negociar com o setor
público, de investir em outros estados, de terceirizar
as atividades.
ConJur — Qual foi o principal problema do Judiciário apontado pelos
empresários?
Castellar — A falta de celeridade. No entanto, em algumas áreas do
Direito, como na trabalhista, cerca de um quarto das
empresas considera positiva a lentidão da Justiça.
ConJur — A percepção é a de que a maior parte dos empresários
prefere ter uma decisão rápida, ainda que não seja
favorável?
Castellar — Minha avaliação é a de que depende muito do lado em que
se está. Na área tributária, por exemplo, muitos
empresários usam o Judiciário como instrumento de
planejamento tributário. Na área trabalhista, a lentidão
da Justiça é usada como poder de barganha para forçar o
trabalhador a fazer um acordo. Na área comercial, quando
o Cade barra uma fusão, interessa para as empresas que a
Justiça seja lenta. Enquanto o Judiciário não decide, a
fusão se efetiva. Depois, fica impossível reverter
aquilo.
ConJur — Quando, então, a lentidão prejudica os empresários?
Castellar — A morosidade da Justiça é um problema sério nos casos
de concessões públicas. Lembro-me de um caso que
aconteceu há vários anos. Na concessão da ponte
Rio-Niterói, a empresa que perdeu recorreu à Justiça
para tentar forçar algum tipo de acordo com a empresa
que ganhou. Nesse caso, por exemplo, interessa uma
solução rápida.
ConJur — A arbitragem é uma solução boa para os casos que precisam
de decisão rápida?
Castellar — A arbitragem não é fácil para as empresas. Há três
grandes vantagens: velocidade, sigilo e especialização
do árbitro. Mas é muito cara. Ela só é procurada nos
grandes processos. Não dá para resolver o dia a dia com
arbitragem. Para as empresas, também pesa o fato de que
não há recurso de decisão arbitral. Enfim, a arbitragem
é uma solução muito boa para casos muito grandes, que
envolvem muito dinheiro, assunto muito técnico e
necessidade de sigilo. Não é alternativa para o dia a
dia.
ConJur — Qual é o caminho para que o Judiciário deixe de ser
empecilho para o crescimento do país?
Castellar — O mais importante é a previsibilidade. A maior parte
dos conflitos na sociedade não é resolvida pela Justiça.
A sociedade sabe quais são as regras. Por exemplo, em
uma batida de carro, todos sabem que quem bateu atrás é
quem tem de pagar. Não precisa da Justiça para dizer
isso. Quanto mais previsível for a Justiça, menor será a
necessidade de ela ser acionada.
ConJur — A Justiça no Brasil é previsível?
Castellar — Não. É extremamente imprevisível. O desfecho de um caso
depende do juiz que irá julgá-lo. Já peguei depoimento
de advogados que contam como eles ficam levando e
retirando causas da Justiça até cair na mão de
determinado juiz, onde eles sabem que vão ganhar. Há, às
vezes, diversas decisões diferentes sobre um tema que
supostamente está pacificado.
ConJur — O senhor disse que há empresas que se beneficiam com a
morosidade do Judiciário. Ou seja, elas próprias são uma
barreira para tornar a Justiça célere. Como resolver
isso?
Castellar — Uma das minhas sugestões é cobrar uma taxa de juros de
mora parecida com a Selic. Aí, o Judiciário deixaria de
ser uma boa aplicação financeira. Hoje, recorrer ao
Judiciário é um bom negócio porque o rendimento no
mercado financeiro é muito mais alto do que os juros que
incidem sobre a dívida discutida na Justiça. Chamo isso
de arbitragem financeira. A empresa tem uma dívida, sabe
que vai ter de pagar, mas recorre à Justiça. Aplica o
dinheiro e, quando tem de pagar, terá ganhado um
montante maior do que o valor da dívida com os juros de
mora.
ConJur — Há outra maneira de acabar com essa arbitragem financeira?
Armando Castellar — Há uma movimentação infraconstitucional para
isso. Há a multa para quem age com má-fé na Justiça, por
exemplo. Singapura fez algo que eu considero radical
demais e não defendo. A Suprema Corte de lá decidiu que
o primeiro dia do processo na Justiça era de graça. A
partir do segundo, a parte começa a pagar. A partir daí,
todo mundo passou a ter interesse em fazer o processo
ter uma solução rápida. A atitude é radical, mas o
espírito vale. Outra mudança que ajudaria a desestimular
a arbitragem financeira é as decisões do Supremo
Tribunal Federal valerem para todo mundo. Como muitas
delas não valem, entram na Justiça não com a esperança
de mudar o entendimento do STF, mas para protelar o
pagamento.
ConJur — Judiciário e economia têm tempos diferentes. Um é mais
lento até por questão de segurança, a outra, dinâmica.
Como conciliar isso?
Castellar — Eu me insurjo muito contra esse tempo da Justiça. Não
há nenhuma evidência de que as decisões mais lentas são
as que têm mais qualidade. As decisões demoram porque os
processos ficam na gaveta. Havia processo no Tribunal de
Justiça de São Paulo que demorava cinco anos para ser
distribuído. Isso não tem a ver com segurança jurídica.
O tempo gasto é tempo morto, na gaveta. Não é que o juiz
gasta dias analisando o processo até chegar à melhor
decisão. E esse tempo não é de graça. A parte que tem
razão paga por isso.
ConJur — Ou seja, a lentidão custa caro?
Castellar — Há uma má compreensão do que significa a lentidão. É
errada a idéia de que reclamar da lentidão é puro
capricho da economia, que tem pressa enquanto o Direito
se preocupa com a segurança jurídica. Não é nada disso.
Defende-se a lentidão e a quantidade de recursos
protelatórios com o argumento de que se está
privilegiando um amplo e irrestrito direito de defesa.
Não é verdade. Isso impede a defesa daquele cidadão que
teve seu direito prejudicado.
ConJur — O Judiciário tem ficado cada vez mais importante para a
economia?
Castellar — O Judiciário é mais importante hoje do que há 20 anos.
Ele se tornou importante a partir do processo de
redemocratização do país. Antes, tudo era decidido nos
gabinetes do Executivo, e não na Justiça. O processo de
privatização foi importante por isso. Como dar crédito
para uma empresa pública se não há garantia de que ela
vai pagar? Daí a necessidade de privatizar para poder
ter garantia. Hoje, os juízes precisam compreender o
quão importantes são para a economia.
ConJur — E os juízes têm consciência dessa importância?
Castellar — Eu acho que não percebem corretamente. Nas escolas de
Direito é passado um conhecimento imperfeito do quão
importante o Judiciário é para a economia. A maior prova
disso é o pouco caso com a lentidão e essa idéia de que
a segurança jurídica não tem preço. Ela tem preço sim e
é um preço caro.
ConJur — A maior parcela da responsabilidade de o Brasil não
crescer como poderia pode ser atribuída a qual dos três
poderes?
Castellar — Há duas questões que impedem o crescimento: a bagunça
fiscal e a insegurança jurídica. A segurança jurídica
não é só responsabilidade do Judiciário. Envolve o
Executivo, que muda as regras com uma facilidade muito
grande e sacrifica a segurança por motivos políticos.
Como fazer um investimento para ter retorno em dez anos
se não dá para saber como estarão os impostos até lá? O
Legislativo também é responsável pelo vácuo regulatório
grande que existe no Brasil. Tudo isso faz com que o
Judiciário substitua tanto Legislativo como o Executivo.
Ou seja, o Judiciário tem ocupado o campo da regulação
por falta de trabalho dos outros dois poderes. As
decisões no Judiciário são tomadas caso a caso, não
obedecem a uma política pública. Aí, cresce a
insegurança jurídica. A política pública fica muito
fragmentada porque se torna a soma de decisões judiciais
independentes no lugar de um planejamento consciente.
ConJur — É possível calcular quanto o país perde com a paralisação
de obras de infra-estrutura por decisões judiciais?
Castellar — Não tenho esses números, mas certamente eles são
grandes. As obras de infra-estrutura têm repercussões
ambientais importantes e não há leis claras tratando
desses impactos. O Congresso Nacional hoje é muito
fragmentado. Por isso, acabam sendo aprovadas leis
ambíguas que agradam a todos. Com a produção legislativa
de péssima qualidade, o juiz tem de decidir o conteúdo
da lei e não apenas se a lei está sendo respeitada ou
não. Em uma sociedade organizada, esse não deveria ser o
papel do juiz, já que ele não está preparado para isso
porque não tem a visão do todo.
ConJur — A sociedade deveria cobrar mais qualidade na elaboração
das leis, então.
Castellar — A nossa sociedade não gosta de direitos de propriedade
bem protegidos. Gosta dessa maneira mais fluída em que
há margem para respeitar e margem para desrespeitar. Não
existe um clamor social pela proteção dos direitos de
propriedade, por uma lei mais rigorosa. A sociedade não
percebeu ainda que tudo isso tem um custo e afeta o
desempenho da economia. Esse é o trabalho difícil: fazer
a sociedade entender o papel da segurança jurídica nos
investimentos.
ConJur — Para o empresário, a morosidade da Justiça é agravada
quando ele está lidando com o setor público. Aí, não
basta ganhar no Judiciário, ele tem de esperar o poder
público pagar o precatório. Isso influencia nos
negócios, não?
Castellar — Eu não fiz nenhum levantamento sobre isso, mas acredito
que sim. As PPPs não decolaram em parte porque não há
uma garantia de poder executar o acordo caso o governo
não cumpra a sua parte.
ConJur — Uma decisão do Cade questionada na Justiça leva anos para
ser colocada
em prática. Quando chega o momento de valer, ela já
perdeu sua eficácia. Por exemplo, o Cade proíbe uma
fusão. No entanto, as empresas recorrem à Justiça e,
enquanto isso, executam a fusão. Depois, não dá mais
para voltar atrás.
Castellar — Nestes casos, acho que o ônus da prova deveria ser
revertido. Ou seja, se há uma decisão colegiada, seja do
Cade ou de uma agência reguladora, ela deveria valer até
o trânsito em julgado de um eventual processo no
Judiciário. Se o Cade barra uma fusão, ela deveria ficar
impedida de acontecer até uma decisão final da Justiça.
ConJur — Mas aí a questão do tempo prejudicaria as empresas porque
uma fusão barrada hoje pode não ser mais viável daqui a
cinco anos.
Castellar — Mas aí a empresa teria interesse em fazer o processo
andar rápido. Ela vai ajudar a Justiça a ser rápida, e
não desejar a demora.
ConJur — Se a maior parte das decisões do Cade acabam na Justiça,
para que existir o Cade?
Castellar — O Cade foi criado devido à necessidade de resolver
questões que exigem um conhecimento específico muito
grande. As decisões do Cade podem ser questionadas na
Justiça, mas precisam ser colocadas em prática enquanto
a Justiça não decide. Senão, o Cade acaba virando só uma
instância zero e tudo fica ainda mais lento. O Cade é um
tribunal administrativo que tem todas as razões para
estar isento. Por isso, o Judiciário tem de confiar nas
suas decisões.
ConJur — A ampliação da atuação do Cade é uma maneira de diminuir o
número de processos na Justiça?
Castellar — Não acredito que seja esse o caminho. A razão de
existir do Cade é ser um tribunal especializado. Por
isso, não acho que deveria se abrir para outros temas
também. Acho que os Juizados Especiais têm um potencial
grande para aliviar o Judiciário. Há cerca de um ano, vi
um levantamento do Supremo que diz que 60% das causas
dos Juizados são previdenciárias. Ou seja, são processos
muito iguais. Ou seja, se houvesse uma decisão que
valesse para todo mundo, a carga de trabalho poderia ser
reduzida em 60%. Isso também torna a Justiça previsível.
As pessoas sabem como a causa vai ser decidida e deixam
de recorrer ao Judiciário.
ConJur — O senhor está trabalhando em outra pesquisa?
Castellar — Não. Mas ainda quero fazer uma pesquisa sobre o papel
do Judiciário na regulação. A influência disso em áreas
como saúde e ambiental.
Fonte: Conjur, de 28/10/2007
São Paulo não consegue suspender seqüestro de verbas
O município de São Paulo não conseguiu suspender a decisão que
determinou o seqüestro de verbas para o pagamento de
precatórios. O pedido de liminar contra a decisão do
Tribunal de Justiça paulista foi negado pelo ministro
Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal.
O município paulista alegou que o TJ-SP descumpriu decisão do STF
ao determinar o seqüestro de valores que teriam sido
indevidamente atualizados. Para tanto, citou julgamento
em Ação Direta de Inconstitucionalidade que, ao
interpretar dispositivo do regimento interno do tribunal
estadual, firmou o entendimento de que atualizações de
valores de precatórios só podem ser feitas no caso de
erro material ou de inexatidão aritmética no precatório
original.
Nesses casos, a diferença deve ser compensada sem que seja
necessário entrar novamente na fila para pagamento de
precatórios, que obedece a uma ordem cronológica.
O ministro Ayres Britto não concedeu a liminar por considerar que
não ter ficado evidente “a fumaça do bom direito (fumus
boni juris) do reclamante”. Segundo ele, com a
promulgação da Constituição Federal de 1988, o crédito
foi parcelado em oito anos, por força do artigo 33 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Em
razão da desatualização do pagamento, foi requerida a
complementação do saldo devedor, o que foi deferido e
determinado que ocorresse em 90 dias. “A decisão ora
reclamada, a seu turno, teve origem em pedido de
seqüestro de verbas municipais, tendo em vista a alegada
quebra da ordem cronológica de apresentação dos
precatórios”, disse.
Para o ministro, na Reclamação, não cabe analisar o mérito da
decisão reclamada, mas apenas o eventual desrespeito à
autoridade das decisões do Supremo. “Assim, no presente
caso, basta verificar, nesse primeiro exame, que os
valores referidos no precatório complementar tratam de
mera atualização do precatório original”, avaliou. Ele
ressaltou que o documento anexado aos autos demonstra
que “a alteração dos índices se deu em virtude da
substituição operada por força de lei”.
Dessa forma, o ministro entendeu que não está evidenciada afronta
aos julgados do STF nas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade 1.098 e 2.924. “O pagamento em
noventa dias, no curso do mesmo precatório, é possível
quando se tratar de mera atualização ou substituição de
índices por força de lei, o que parece ser o caso”,
afirmou Ayres Britto.
Segundo ele, a alegação de que os valores ainda estão em discussão
“se contrapõe o fato de a decisão reclamada haver
excluído a incidência dos juros moratórios e
compensatórios, bem como adotado o índice defendido pelo
município”. Por fim, entendeu que “não há o menor sinal
de que a base de cálculo utilizada para a elaboração da
conta, perante o juízo monocrático, seria diversa da
utilizada pelo Departamento de Precatórios do TJ-SP”.
Fonte: Conjur, de 28/10/2007
Serra entra na briga contra emenda Dornelles
Insatisfeito com a versão aprovada pela Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado (CAE) para o projeto da nova lei de
licitações, o governo estadual de São Paulo decidiu
aliar-se ao relator, senador Eduardo Suplicy (PT-SP), na
briga contra a exigência de fase de pré-qualificação nas
licitações de obras e serviços de engenharia. A pedido
do governador José Serra (PSDB), a bancada tucana no
Senado vai se reunir com técnicos enviados pelo governo
do Estado, esta semana. Segundo Suplicy, o objetivo do
governador é convencer os parlamentares a derrubar,
durante a votação em plenário, a emenda que introduziu a
exigência.
"O governo de São Paulo alertou-nos que, do jeito que ficou , será
muito bom para os empresários e muito ruim para o
erário. Então, vamos entrar nisso, na tentativa de
alterar o texto, em defesa do dinheiro público",
confirma o senador Arthur Virgílio (AM), líder do PSDB
no Senado. A emenda em questão foi aprovada pela CAE,
contra o voto do relator, por proposta do senador
Francisco Dornelles (PP-RJ), que, por sua vez, atendeu a
um apelo do empresariado do setor de construção. A
obrigatoriedade de comprovação prévia de qualificação
técnica e econômica por parte de todos os licitantes é
polêmica porque compromete a inversão de fases nas
licitações de obras. A possibilidade de fazer primeiro a
etapa de seleção de propostas e preços, para só depois
checar a qualificação do vencedor, era justamente um dos
principais objetivos do projeto original, encaminhado
pelo governo federal, com apoio de diversos governos
estaduais, em janeiro.
Para virar lei, o projeto ainda precisa ser submetido ao plenário
do Senado e, depois, voltar à Câmara dos Deputados. A
emenda de Dornelles teve amplo apoio na CAE. Por isso,
para evitar que a derrota do relator se repita em
plenário, o presidente da CAE, senador Aloizio
Mercadante (PT-SP), um dos poucos que foi contra a
proposta de Dornelles na comissão, tenta construir um
acordo em torno de uma solução capaz de conciliar
preocupações do empresariado com o interesse dos
gestores públicos.
Mercadante propõe substituir a exigência de qualificação prévia
específica para cada licitação pela exigência de
inscrição num cadastro de fornecedores de obras e
serviços. Cada ente da Federação (União, Estado ou
município) poderia ter o seu. Respeitada a
compatibilidade entre o tipo de empresa e o tipo de obra
ou serviço a ser contratado (se construção de prédios,
se pavimentação de estrada, se conserto de elevadores,
por exemplo), o licitante em dia com o cadastro estaria
automaticamente pré-qualificado para todas as licitações
em que se adotasse a inversão de fases e também para os
pregões. Espécie de leilão ao contrário, em que os
licitantes vão reduzindo suas propostas de preço, o
pregão é uma modalidade de licitação em que já existe
inversão de fases, já que qualificação é comprovada no
final do processo, depois de conhecida a proposta de
menor preço. Por isso, a emenda Dornelles muda uma das
principais características dos pregões, já adotado para
obras por diversos orgãos públicos, inclusive o Tribunal
de Contas da União.
Mercadante considera a emenda de Dornelles "danosa ao interesse
público", porque propicia demora nos processos
licitatórios. É na fase de pré-qualificação, diz, que as
empresas costumam recorrer a liminares judiciais para
tirar concorrentes da disputa. O cadastro, argumenta,
fará com que brigas judiciais sejam resolvidas antes,
não se repetindo a cada licitação. Ao mesmo tempo, diz
ainda, atende à grande preocupação dos empresários que é
a de evitar o ingresso de concorrentes aventureiros, que
entrem nas disputas com preço baixo demais e depois não
cumpram o contrato com o poder público. Quando o
contrato não é cumprido, mesmo retomada, a obra acaba
saindo mais cara, reconhece o senador.
O presidente da CAE tentou construir o acordo em torno do cadastro
ainda na comissão. Mas houve resistência do próprio
relator. Suplicy concordou com a exigência de cadastro
só para licitações superiores a R$ 3,4 milhões, onde o
pregão é opcional. Naquelas até R$ 3,4 milhões, para as
quais o pregão é obrigatório, ele rejeitou a idéia. O
relator entende que qualquer coisa que restrinja a
participação de empresas facilita o conluio entre
concorrentes (combinação de preços) e o superfaturamento
de obras. Na sua opinião, é bom que empresas possam
entrar na última hora nos processos licitatórios. Se o
universo de concorrentes não é previamente definido,
fica mais difícil algumas empresas pressionarem outras a
entrar num conluio para combinar resultados e dividir
obras, com preço superfaturado.
Mercadante discorda que o cadastro, que seria público e fiscalizado
pela sociedade, favoreça conluio. Como valeria para
todas as licitações de um mesmo tipo de obra e como nem
todas as cadastradas necessariamente entrariam em todas
as disputas, não seria possível às empresas saber com
exatidão o universo de concorrentes. Mercadante
argumenta ainda que impedir as empreiteiras de conhecer
previamente a lista exata de licitantes não
necessariamente evita conluio. Segundo o senador, a
experiência internacional mostra que, independente
disso, o risco de combinação existe sempre que há menos
de sete empresas na disputa.
Mesmo que Mercadante consiga convencer Suplicy a aceitar o
cadastro, há dúvida se sua proposta teria apoio do resto
da base parlamentar governista. O líder do governo,
Romero Jucá (PMDB-RR), votou a favor da emenda de
Dornelles na CAE. Ele assegura, no entanto, que "o
governo não tem posição fechada em relação à votação em
plenário". Tudo vai depender da discussão. Jucá acha
razoável a preocupação dos empresários de evitar que
empresas aventureiras entrem em licitações com preços
inexeqüíveis, na esperança de obter um aditivo
contratual, no momento em que a obra estiver ameaçada de
paralisação.
O líder governista argumenta que, uma vez conhecido o preço, fica
muito difícil para o gestor público desqualificar uma
empresa, se ela não comprovar qualificação. "A sociedade
não vai aceitar. O Ministério Público vai querer atuar e
nenhuma obra (em que isso aconteça) vai andar. Vai
emperrar tudo", alerta. O líder do PMDB no Senado,
senador Valdir Raupp (RO), pensa da mesma forma. Ele
está certo de de que a maioria do PMDB vai querer manter
a emenda de Dornelles no projeto.
Na avaliação de Suplicy, porém, o problema das licitações no Brasil
não tem sido preços muito baixos e sim muito altos, o
que pode ser um sinal de existência de conluio. A última
fiscalização feita pelo Tribunal de Contas da União, por
exemplo, encontrou indício de superfaturamento em 52 de
um total de 231 obras fiscalizadas.
Fonte: Valor Econômico, de 29/10/2007
STJ reavalia ICMS sobre contratos de energia elétrica
As secretarias de Fazenda estaduais estimam um aumento de
arrecadação de cerca de 12% no ICMS sobre a energia
elétrica caso o Superior Tribunal de Justiça (STJ)
altere sua posição sobre a demanda contratada. O caso
trata da incidência do imposto sobre contratos de
grandes consumidores de energia e tinha jurisprudência
firmada em favor dos contribuintes na corte superior
desde 2000. Mas no início deste mês a segunda turma do
STJ deu maioria de três votos a dois em favor do fisco e
o caso começou a ser novamente julgado na primeira
seção, que reavaliará da posição da casa sobre o tema.
Na seção o caso começou a ser julgado na semana passada em um
processo da Celulose Nipo Brasileira (Cenibra), com um
voto em favor da posição tradicional do STJ, do ministro
João Otávio de Noronha, mas teve um pedido de vista do
ministro Teori Zavascki. Os novos resultados se devem a
uma atuação conjunta das procuradorias estaduais, que
montaram uma estratégia comum de acompanhamento do caso
e contratação de pareceres e conseguiram reverter o
quadro.
De acordo com o procurador-geral de Pernambuco, Francisco Tadeu de
Alencar, a estimativa no Estado é de que uma reversão no
entendimento garantiria R$ 7 milhões de arrecadação
mensal de ICMS, de R$ 60 milhões arrecadados pelo Estado
das distribuidoras de energia - uma parcela de 11,5% do
tributado das contas de energia elétrica. No total da
arrecadação do Estado, o resultado seria de 3%. Presente
no julgamento do processo do Estado de Minas Gerais na
quarta-feira passada no STJ - assim como procuradores
regionais de outros Estados, como Rio de Janeiro e São
Paulo - o procurador diz que o caso é de grande
interesse, pois Pernambuco tem casos também já
distribuídos no tribunal.
Em São Paulo, a estimativa da secretaria de finanças é
de que o impacto da disputa no Estado é de R$ 533
milhões ao ano - 12,2% do que é arrecadado das
distribuidoras de energia, que, por sua vez, responde
por 9% da arrecadação do Estado. Um levantamento
encontrou 33 processos sobre o assunto, com 14 decisões
favoráveis à tese das empresas na primeira instância. De
acordo com o procurador-chefe da procuradoria fiscal do
Estado, Clayton Eduardo Prado, devido à notória
morosidade do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP),
ainda não há decisões de segunda instância sobre o tema
no Estado. Mas a procuradoria acompanha o caso para
garantir um desfecho favorável quando o tema chegar ao
tribunal.
Segundo Prado, a disputa se origina de uma regra da Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prevendo a cobrança
de uma tarifa "binômia" dos grandes consumidores. Neste
modelo, há uma parte da conta que trata da demanda e
outra da potência. A potência, no caso, é uma previsão
de consumo máximo das empresas previsto nos horários de
pico, pelo que há um preço fixado contratualmente. As
empresas alegam que este contrato, ainda que cobrado
pelas operadoras, não trata de uma quantidade de energia
que foi contratada mas não foi efetivamente consumida
pelas empresas - que não necessariamente chegam ao pico
de consumo. Já o fisco alega que essa disponibilização
de energia, como potência máxima, é, em si, uma forma de
consumo, e portanto pode ser tributada.
Fonte: Valor Econômico, de 29/10/2007
4 em cada 5 cidades com mais de 100 mil habitantes
praticam guerra fiscal
Levantamento do IBGE também mostra que prática aumenta
conforme os municípios ficam mais populosos
Wilson Tosta, RIO
Quase
quatro em cada cinco cidades brasileiras com mais de 100
mil habitantes pratica guerra fiscal, com concessão de
benefícios e renúncia tributária, para atrair indústrias
e gerar empregos, revela a pesquisa Perfil dos
Municípios Brasileiros, Gestão Pública 2006 (Munic),
divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). O levantamento mostra que a prática
também atinge mais de 40% dos pequenos municípios e se
expande conforme ficam mais populosos. Enquanto 42,2%
das cidades com até 5 mil habitantes incentiva
investimentos, essa proporção chega a 85,7%, entre as
que têm mais de 500 mil moradores. No total dos 5.564
municípios do País, pelo menos um em cada dois usa
mecanismos de guerra fiscal.
“Encontramos um número razoável de municípios que deram
incentivos e receberam algum empreendimento com base
neles”, disse Vânia Pacheco, gerente da pesquisa. O ano
de 2006 foi o primeiro em que o IBGE mediu esse aspecto
na administração pública municipal.
Ceder
terrenos (44,8% dos casos) ou doá-los (43,7%) são os
benefícios mais comuns, segundo o levantamento. Em
seguida, vêm as isenções do Imposto Sobre Serviços
(27,7%), do Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana
(27,1%, parcial, e 26,2%, total) e de taxas (26,4%).
Outros incentivos são concedidos por 27,5%. Apenas 6,7%
(187) das cidades que dispõem de benefícios para atrair
empreendimentos estão na Região Norte. No Nordeste são
22% (606), no Sudeste, 29,4% (810), no Centro-Oeste,
9,51% (262), e no Sul - região campeã -, 32,2% (889). Em
Santa Catarina, 235 dos 293 (80,2%) concedem incentivos;
no Paraná, 74,68% (298 em 399); no Rio Grande do Sul,
71,77% (356 das 496).
PAULISTAS
Em
São Paulo, 395 (61,24%) dos 645 municípios deram
incentivos para atrair empresas e investimentos em 2006.
Ceder terrenos foi o benefício mais comum, registrado em
175 (27,13%) das localidades. No Rio, a proporção de
cidades engajadas na guerra fiscal foi maior: 61 de 92
municípios concedem algum tipo de incentivo para atrair
empresas. A prática, aparentemente, vem crescendo nos
últimos anos em todo o País.
“Tive
muitas dificuldades com a guerra fiscal”, relatou ao
Estado Antônio Francisco Netto, atual presidente do
Departamento de Trânsito do Rio (Detran-RJ), que, quando
prefeito de Volta Redonda, de 1997 a 2004, enfrentou
problemas pela falta de espaço físico na cidade para
atrair empresas. “Volta Redonda tem poucas áreas
disponíveis. Nossa política foi mostrar aos empresários
a qualidade de vida que poderiam ter e dar a seus
funcionários.” Ele disse que conseguiu atrair
investimentos de serviços, entre elas três shopping
centers, mas reconheceu que os incentivos eram modestos
diante de municípios vizinhos, como Porto Real e
Resende, cujos “terrenos planos” citou como importantes.
O
estudo do IBGE também constatou que 1.203 (21,62%) das
cidades tinham distritos industriais, às vezes mais de
um. Já havia 1.490 áreas desse tipo implantadas, e 399
em fase de implantação.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 27/10/2007
'Principal coisa que o STF fez foi dizer que todo o
serviço público é essencial'
Ministro acha que decisão ajuda negociações entre
governo e sindicatos sobre o projeto que regulamenta as
greves de servidores
Lu
Aiko Otta, BRASÍLIA
A
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que autoriza o
desconto dos dias parados nas greves do serviço público
pode tirar do impasse as negociações entre governo e
centrais sindicais sobre o projeto de lei que
regulamenta a greve no caso dos servidores. A avaliação
foi feita pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo,
em entrevista ao Estado.
Ele
acha que o Judiciário tocou num ponto fundamental, que é
estabelecer limites para as greves, acabando com o que o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou ironicamente
de “férias”. Na sua avaliação, o desconto dos dias
parados resolve 90% das paralisações.
Para
Bernardo, outro ponto fundamental da decisão do Supremo
foi determinar que todos os serviços públicos são
essenciais. Ou seja, em nenhuma hipótese um órgão pode
ficar totalmente parado. Os principais trechos da
entrevista:
O que
o senhor achou da decisão do Supremo?
Embora tenha o aspecto negativo de ter sido algo
decidido para cobrir uma lacuna, uma omissão nossa, por
não termos até hoje regulamentado a greve do
funcionalismo, acho muito bom, pelo fato de que vamos
passar a ter uma regra. Isso é muito positivo.
O
senhor tocou num ponto, que é a chamada judicialização -
a Justiça, na prática, regulamentando questões no lugar
do Legislativo. O que o senhor acha disso?
Pelo
que o Supremo fez na questão da fidelidade partidária e
outros temas, já esperávamos algo a respeito das greves
do funcionalismo. O comportamento dos ministros tem sido
ocupar lacunas por decisões, mesmo que sejam
provisórias, que eliminem o vácuo.
O
governo fez um anteprojeto de lei para regular a Lei de
Greve, que está há tempos em discussão com as centrais
sindicais. Onde a discussão está emperrada?
Às
vezes as pessoas não entendem por que estamos discutindo
tanto com as centrais. Mas a verdade é que o tema não
tem trânsito fácil no Congresso Nacional. Se mandarmos o
projeto por mandar e acharmos que os deputados vão
votar, é um engano. Há 19 anos que o tema está lá para
ser regulamentado e não foi até agora. De fato, temos
sentido grande resistência dos sindicatos e de alguns
parlamentares. Acho que agora (com a decisão do STF)
mudou completamente o quadro. Agora não podemos mais
dizer que não tem limite. Talvez isso também sirva para
mudar o ânimo do pessoal para negociar.
Mas
há algum ponto específico de resistência dos sindicatos?
Os
sindicatos têm dificuldade de avançar nisso. Cheguei a
dizer, em algumas reuniões, que achava que eles não
queriam negociar. Eles dizem que não, mas acho que têm
dificuldade. De fato, a situação até ontem (anteontem)
era cômoda: não tem limite. Agora mudou a situação. Se
conseguirmos nos colocar de acordo e aprovar no
Congresso uma nova lei para o serviço público, ótimo. Se
não, paciência.
O
anteprojeto que o governo elaborou é muito duro?
É
verdade. Mas podemos negociar. Se caminharmos para uma
versão mais aceitável para os sindicatos, e que nós
também achemos boa, fazemos acordo. E aí vamos juntos
mobilizar o Congresso. Essa é que seria a estratégia
boa.
E se
a negociação não prosperar?
Passamos 19 anos sem uma lei regulamentando. Se demorar
mais 19 anos, pelo menos nesse período vamos ter uma lei
para aplicar.
O
senhor tem uma perspectiva de quando o projeto de lei
será enviado para o Congresso?
Se os
sindicatos quiserem discutir, temos condições de em 15
dias mandar.
O que
é fundamental no anteprojeto do governo?
Se eu
tivesse uma lei com um único artigo para a questão da
greve, ele seria: se tiver greve, desconta os dias
parados. Pronto, está resolvido o problema em 90% dos
casos. Mas a principal coisa que o STF fez foi dizer que
todo o serviço público é de caráter essencial, quer
dizer, não pode paralisar completamente em nenhum lugar.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 27/10/2007
82,4% das leis dos Estados são inconstitucionais
Só neste ano, Supremo derrubou 36 projetos aprovados pelas
Assembléias Legislativas
Felipe Recondo, BRASÍLIA
Neste exato momento, algum brasileiro, em algum lugar do País, está
cumprindo ao menos uma lei que não deveria ter entrado
em vigor, por ser inconstitucional. Ele pode estar
submetido à cobrança de taxa indevida ou sendo
prejudicado com serviços públicos ruins pela contratação
de apadrinhados políticos sem concurso público. A culpa
por isso é, na maior parte das vezes, de deputados
estaduais, eleitos justamente para fazer leis e
respeitar a Constituição.
Apenas neste ano, 36 leis aprovadas nos Estados foram consideradas
inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Os casos vão desde aumento para servidores públicos,
atribuição exclusiva do Executivo, até casos sui generis,
como uma lei aprovada em Rondônia para permitir que
motoristas e porteiros da Secretaria de Segurança
Pública trabalhassem como agentes de polícia.
No ano passado, a Câmara Legislativa do Distrito Federal foi a
recordista em leis inconstitucionais. Das 11 leis
questionadas no STF, 9 afrontavam a Constituição. Neste
ano, duas leis do DF já foram derrubadas. Outras 447
foram julgadas inconstitucionais pelo Tribunal de
Justiça do Distrito Federal desde 2003. Neste ano, já
são 107.
Em todo o Brasil, incluindo a União, foram consideradas
inconstitucionais no ano passado 127 leis (ver tabela).
Além do DF, Paraná, Rio Grande do Sul e Espírito Santo
encabeçam a lista dos Estados com mais leis irregulares.
Só Acre, Amazonas e Goiás não tiveram leis derrubadas
pelo STF. Do total de normas estaduais questionadas no
ano passado, 82,4% não tinham o respaldo da
Constituição.
DEMORA
Por essa tradição das Assembléias, era de se esperar que os
julgamentos fossem rápidos e as normas, rapidamente
derrubadas. Mas ocorre o contrário, em função do acúmulo
de ações. No ano passado, foram 194; neste ano, 138. Na
pauta desta semana do STF, dos 18 processos que serão
analisados, 13 são desse gênero.
“Com esse excesso de trabalho, às vezes demoramos dois, três anos
para conseguir julgar uma ação”, afirma o ministro do
STF Ricardo Lewandowski.
Enquanto não é julgada, a lei fica em vigor. É o exemplo de um
artigo da constituição estadual do Paraná que vincula o
reajuste dos salários de juízes aos vencimentos de
promotores. A Procuradoria-Geral da República e a
Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) consideram a
lei inconstitucional e ajuizaram ação em 1994, mas ela
ainda não foi julgada.
Os ministros se deparam com outra dificuldade: definir a partir de
quando a lei será considerada nula. Se decidem que ela
nunca valeu, todos os efeitos produzidos devem ser
anulados. Mas isso é impraticável quando se trata de uma
lei que, por exemplo, institui uma taxa - já que o
governo teria de devolver todo o dinheiro arrecadado.
Outra solução é decidir que a lei deixa de produzir efeitos na data
do julgamento. No caso da contratação irregular de
servidores sem concurso, por exemplo, todos deveriam ser
demitidos. Se isso ocorrer, porém, o serviço pode ficar
comprometido. Por isso, os ministros terão de instituir
um prazo de transição para a demissão em massa.
Caso similar foi julgado na semana passada. O STF considerou
inconstitucional a efetivação de 120 servidores na
Defensoria Pública de Minas. Se todos fossem demitidos
de imediato, o serviço seria paralisado. Até chegar a
uma alternativa, os ministros discutiram e chegaram a
bater boca em três sessões.
RAZÕES
STF, juristas e parlamentares apontam três razões para o problema.
A primeira é a ignorância - a maioria dos deputados não
conhece todos os artigos da Constituição. Mas isso,
admitem os deputados, não é desculpa para os erros,
porque todo parlamentar pode contratar assessores
jurídicos ou acionar a consultoria da Assembléia.
A segunda razão seria a tentativa de alguns deputados de extrapolar
suas competências. “Alguns usam esse instrumento
essencial, que é a lei, como instrumento eleitoreiro.
Isso é negativo”, afirma o deputado Chico Leite (PT-DF),
promotor e vice-presidente da Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) da Câmara Legislativa do DF. Isso
explicaria por que deputados apresentam projetos para
aumentar o salário de várias categorias do
funcionalismo, atribuição exclusiva do Executivo.
Há uma terceira razão, aponta Lewandowski: a legislação que define
as competências da União, de Estados e municípios é
complicada e muitas vezes provoca divergência até mesmo
no STF. “Trata-se de um sistema de distribuição de
competência entre os entes federados altamente complexo,
em que muitas vezes as competências se superpõem. Nem
sempre fica claro onde começa a competência de um e
termina as dos outros.”
Essa definição de competências esvaziou os poderes de Estados e
municípios, centralizando o poder na União. “Os
deputados não têm espaço para nada”, reclama Chico
Leite. De fato, a disputa por competências é responsável
pela maioria das contestações no STF. Das leis julgadas
neste ano, mais da metade foi derrubada por invadir a
competência alheia.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 28/10/2007
'Tenho a impressão de que há um certo descaso'
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes diz, em
entrevista ao Estado, que algumas Assembléias
Legislativas apostam que ninguém perceberá a
inconstitucionalidade de uma lei aprovada e, por isso,
insistem em aprová-las. “Tenho a impressão de que há,
talvez, um certo descaso, uma aposta pragmática no
resultado e um certo voluntarismo”, critica. Ele não
acredita em ignorância sobre a jurisprudência e lembra
que, em muitos casos, o próprio governador veta a lei
aprovada
em seu Estado. A seguir, a entrevista:
O senhor, que acabou de lançar um livro sobre Direito
Constitucional, encontra alguma razão para tantas leis
inconstitucionais nas Assembléias?
Eu tenho a impressão de que há, talvez, um certo descaso, uma
aposta pragmática no resultado e um certo voluntarismo
dessas Assembléias Legislativas. Parece haver uma aposta
na idéia de que não haverá a impugnação, e a lei ficará
intacta. Mas o próprio sistema constitucional permite
essa ampla impugnação. Muitas vezes é o próprio
governador que o faz. Não raro, o governador veta a lei
com o fundamento de inconstitucionalidade, invocando a
jurisprudência do Supremo, e a Assembléia derruba o
veto, insistindo numa tese sabidamente inconstitucional.
Será que os deputados não conhecem bem a Constituição?
Eu não suponho que seja ignorância diante dessa jurisprudência
pacífica do STF. Aqui ou acolá podemos ter uma situação,
vamos chamar assim, que se insira numa zona cinzenta.
Mas, em geral, são aqueles casos que o ministro
Sepúlveda Pertence costumava chamar de “chapada
inconstitucionalidade”. E veja que as Assembléias são
dotadas de boas assessorias jurídicas, ou é de se supor
que tenham condições de oferecer cargos para pessoas de
conhecimento jurídico adequado.
Esse fenômeno, essa profusão de leis inconstitucionais, já existia
ou antes era diferente?
O fato é que a Constituição de 1988 mudou a página, porque ou era a
parte interessada que argüia a inconstitucionalidade ou
era o procurador-geral da República. Agora, sob a
Constituição de 88, são múltiplos os legitimados. Então
há uma grande probabilidade que a matéria seja submetida
ao Supremo numa ação direta.
Então essa quantidade de ações aumentou?
Claro que aumentou. Mas é interessante que esses atores políticos
aos quais estamos nos referindo (Assembléias) não
atualizaram seu calendário pós-88.
Alguns representantes da OAB foram à Câmara Legislativa de Brasília
para dar uma aula de Constituição.
Não há explicação para isso, considerando a qualidade dos quadros
aqui existentes, as boas faculdades, os bons
professores.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 28/10/2007