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Decisão de precatórios pode ressarcir milhões de servidores

Walter de Lana

Recente decisão do ministro Eros Grau, do STF, abre um precedente jurídico histórico para que milhões de servidores públicos de todo o país possam ser ressarcidos dos precatórios alimentares que lhe são devidos pelos estados e municípios na forma de compensação tributária.

O entendimento do ministro Grau, de autorizar uma pequena indústria de móveis do Rio Grande do Sul a usar precatórios alimentares vencidos para pagar o ICMS, pode consolidar a jurisprudência necessária para que a Justiça faça valer, enfim, as ordens judiciais expedidos pelos Tribunais aos poderes públicos.

Geralmente débitos judiciais decorrentes de ações trabalhistas, previdenciárias ou tributárias, os chamados precatórios alimentares não estão sendo pagos pela maioria dos estados e municípios. Em muitos casos, os pagamentos estão atrasados há mais de uma década.

Estima-se que as pendências em todo o Brasil envolvam mais de 700 milhões de servidores. A situação é mais crônica em São Paulo, onde cerca de 500 mil servidores, entre ativos e inativos, estão sem receber os seus créditos há quase 10 anos, no caso dos precatórios devidos pelo estado, e de sete anos, no caso da Prefeitura.

A decisão de Eros Grau é especialmente estratégica porque descortina uma nova forma de aplicação das sentenças judiciais favoravelmente aos credores. Antes, o Supremo somente vinha aceitando compensação tributária ou seqüestro de receitas (mesmo assim nos casos de pequeno valor) para o pagamento de precatórios não-alimentares atrasados, como aqueles decorrentes de desapropriações de imóveis, por exemplo.

Já quanto aos alimentares, o Tribunal estava autorizando o pagamento apenas nos casos excepcionais de doenças graves, para efeito de custear despesas com medicamentos, internações, etc.

A decisão de Eros Grau, ao que cabe recurso à Segunda Turma do STF, caso seja confirmada pela Segunda Turma do Supremo, estará firmando uma jurisprudência que balizará todas as ações semelhantes em curso ou que venham a ser ajuizadas contra o poder público no país. O resultado poderá desencadear um mercado de bilhões de reais para operações de compensação tributária, “impactando fortemente a receita dos estados e municípios devedores”, alerta o advogado Marcelo Reis Lobo, da Comissão de Precatórios da OAB – Secional São Paulo.

A grande expectativa é de que já nos próximos meses o Supremo consolide a decisão final em favor dos credores. Pelo menos essa é a tendência, acredita o advogado Felippo Scolari, presidente do Madeca – Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público.

Scolari informa que em outro processo recente, idêntico ao da pequena indústria gaúcha, o ministro César Peluso, do STF, também decidiu em favor da compensação tributária do credor, o que reforça ainda mais a tese.

Os ventos estão mudando e o Judiciário demonstra hoje uma nova postura em defesa dos direitos dos credores, respondendo aos anseios da sociedade, define Marcelo Lobo.

Ele ressalta outra decisão judicial bastante oportuna sobre o tema, publicada em 14 de setembro no DOESP, em que o próprio presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), desembargador Celso Limongi França, deu ganho de causa a um grupo de cerca de 1.300 servidores públicos da Prefeitura de Santo André (no Grande ABC Paulista), autorizando o seqüestro de verbas do município para o pagamento de precatórios alimentares vencidos.

Lobo explica que no caso, o tribunal acatou o princípio da prioridade que os precatórios alimentares devem ter sobre os não-alimentares, que vinham sendo pagos regiamente pela Prefeitura de Santo André. “O Tribunal acolheu, portanto, a tese do direito à dignidade humana e à sobrevivência consagrada no artigo 100 da Constituição Federal”, assinala Lobo.

A Prefeitura de Santo André, que havia parado de fazer os pagamentos dos precatórios alimentares há mais de 10 anos, foi condenada a pagar em parcelas aos servidores, através de seqüestro do seqüestro de verbas municipais, de cerca de R$ 100 milhões. Também neste caso cabe ainda recurso ao STF.

Os entendimentos, tanto do Supremo como do TJ-SP contemplam, portanto, novas formas de ressarcimento dos credores judiciais, seja através de compensação tributária de impostos como ICMS ou de seqüestro de verbas.

Vale considerar ainda as duas decisões não são as únicas; outros casos, embora isolados, vêm demonstrando a mesma tendência da Justiça em favor da compensação dos credores, salienta Marcelo Lobo.

A maior parte dos precatórios alimentares em atraso é devida a servidores e pensionistas do governo, segmento que ainda não tem uma alternativa clara de ressarcimento.

A compensação tributária, que vem sendo uma alternativa mais freqüente no caso dos precatórios não-alimentares, poderá instaurar no país, portanto, um mercado de negócios que colocará de um lado servidores ativos e inativos com créditos a receber, e de outro empresas interessadas em quitarem suas dívidas com ICMS através da compra de precatórios vencidos.

Contudo, a compensação tributária mesmo de precatórios alimentares já vem ocorrendo no país, em maior escala no estado do Rio Grande do Sul, especialmente depois que o TJ-RS passou a autorizar a prática, no ano passado, baseado numa decisão do Supremo em um precedente do estado e Rondônia.

Fonte: Diário de Notícias, de 24/10/2007

 



Deputados questionam secretário sobre Relatório de Gestão Fiscal do governo

Os membros da Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa tomaram ciência, nesta terça-feira, 23/10, quanto a dados do Relatório de Gestão Fiscal do governo correspondente ao 2º quadrimestre de 2007. Com o objetivo de demonstrar e avaliar o cumprimento das metas fiscais, encerradas em agosto deste ano, o documento apresenta as ações implementadas pelo Estado com o objetivo de ampliar a receita orçamentária e reduzir as despesas, bem como as medidas previstas, mas pendentes de implantação, e os desafios para o próximo quadrimestre. Segundo o secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Machado Costa, o esforço foi no sentido de gerar recursos para investimentos e espaços orçamentários para a melhoria de competitividade do Estado de São Paulo.

Para o deputado Jonas Donizette (PSB), os dados revelam “a cara do governo José Serra”, referindo-se ao crescimento da arrecadação sem a elevação do percentual de tributos. “A realidade atual não admite se pensar em orçamento sem levar em conta o controle de despesas”, avaliou o deputado, elogiando as medidas anunciadas pelo secretário como a regra do pregão eletrônico, com a qual o governo registrou uma economia de gastos da ordem de R$ 58 milhões e a redução de despesas com cargos em comissão, responsável por uma economia de R$ 77,7 milhões.

Já o deputado Mário Reali (PT) estranha que a boa política de arrecadação do Estado não signifique aumento da carga tributária. O montante de investimentos liquidados – 23,8% até agosto (menos de ¼ da previsão) – também foi objeto de questionamento do parlamentar. De acordo com o secretário, o crescimento registrado no 2º quadrimestre indica a superação dos investimentos feitos em 2006. Machado Costa exemplificou que 70% dos recursos são arrecadados pelo governo federal; de 20% a 25% pelos Estados e 5% pelo município. “O bolo de arrecadação do governo federal tem crescido consideravelmente”, ponderou. O secretário esclareceu a Reali que há previsão de excesso de arrecadação no montante de R$ 4 bilhões até o final do exercício (até hoje 70% do previsto no orçamento já foi arrecadado e 93,8% das despesas já foram pagas). O deputado indagou por que as despesas estão aquém do previsto e as operações de crédito foram reduzidas, perguntando: “a hora certa seria o segundo ano do governo Serra?”

Nossa Caixa

A respeito do Banco Nossa Caixa, Cido Sério (PT) desabafou: “Não estou vendo um único movimento do governo para fortalecer o banco”. Isso, segundo o deputado, tira a confiança do investidor. Os deputados Davi Zaia (PPS), Mário Reali e Marcos Martins (PT) também manifestaram preocupação quanto à situação do banco. Para Zaia, ao adquirir as contas do funcionalismo, o banco ganhou um diferencial que garantiria sua recuperação ao longo do tempo, mas a questão da proposta da retirada dos depósitos judiciais seria um agravante.

Segundo o secretário, ninguém quer enfraquecer a Nossa Caixa. O ativo pertence ao Estado e não ao banco, e o primeiro pode dispor deste ativo da forma que julgar mais adequada. O contrato que garante a exclusividade quanto à administração da folha de pagamento dos servidores reverte-se em ativo do banco. “A fidelização poderá recuperar os investimentos”, avalia. Segundo Machado Costa, a intenção do governo é transformar a Nossa Caixa em uma agência de fomento do Estado, que funcione como agente no processo de convênios com os municípios. “São inúmeras as ações para fortalecer a Nossa Caixa”, afirmou.

Constaram do relatório, entre as medidas para ampliar a receita orçamentária, o Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) dos débitos do ICMS, que teve uma dívida bruta negociada no montante de R$ 9,6 bilhões; a implantação da Nota Fiscal Paulista; além de operações de combate à fraude e à sonegação.

A elevação de 10% da arrecadação foi elogiada pelo deputado Vitor Sapienza (PPS). Questionado pelo deputado, o secretário informou que o Confaz está discutindo estabelecer uma alíquota mínima de 12% do ICMS a ser cobrado pelos Estados. Segundo Machado Costa, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul adotam alíquota de 3% para o querosene de aviação – por exemplo –, estimulando a guerra fiscal. Vitor Sapienza e Jonas Donizette perguntaram ao secretário sobre o problema dos precatórios devidos pelo Estado.

Machado Costa informou que o Senado federal deverá votar uma mudança na legislação que prevê o desmembramento das ações para que o beneficiário das ações conjuntas possam concorrer de forma mais justa. Segundo o secretário, os grandes precatórios impedem o pagamento a pequenos credores. A idéia é quebrar a ordem cronológica, privilegiando o pequeno credor e o idoso.

O deputado Jorge Caruso (PMDB) lembrou a aprovação pela Assembléia de projeto que reduziu de 25% para 12% a alíquota do ICMS sobre o álcool e perguntou se a medida propiciou aumento da receita com combustíveis. De acordo com o secretário, a migração do proprietário do veículo a gasolina para o veículo flex ou a álcool, o aumento da produção da cana-de açúcar e a redução do preço do combustível, frustaram a expectativa de incremento na arrecadação e propiciaram uma perda de R$ 1 milhão para o Estado.

A reunião foi presidida pelo deputado Bruno Covas (PSDB) e contou ainda com a presença dos deputados Waldir Agnello (PTB), Gilmaci Santos (PR), Samuel Moreira e Antonio Carlos, ambos do PSDB. 

Fonte: Alesp, de 24/10/2007

 


Procuradores apresentam legislação sobre queima da palha da cana-de-açúcar

Os procuradores da Assembléia Legislativa Alexandre Issa Kimura e Alexsandra Kátia Dallaverde participaram da reunião da comissão parlamentar de inquérito sobre a queima da palha da cana-de-açúcar, realizada nesta terça-feira, 23/10, no plenário Dom Pedro I. A CPI, presidida pelo deputado Rafael Silva (PDT), foi instaurada para reavaliar os prazos para a eliminação gradativa dessa técnica agrícola no Estado. “Fizemos uma apuração sobre a legislação e jurisprudência acerca do tema e já posso antecipar que é bastante confuso o entendimento da matéria”, afirma Kimura.

No resultado dos estudos apresentados pela dupla, verificou-se que os três entes federativos legislam sobre o assunto com enfoques diferentes. A União, por meio do Decreto Regulamentar 2661, especifica a possibilidade da queima da palha da cana-de-açúcar nos termos do Código Florestal. A norma estadual permite a atividade e, nos municípios, a legislação é variável.

Segundo o procurador, sobre as ações públicas que chegaram até o Tribunal de Justiça de São Paulo envolvendo a problemática, há decisões divergentes. Ele citou um caso ocorrido em Ribeirão Preto, onde a legislação proíbe a queima da palha. Numa votação apertada, de 13 votos a 12, o TJ entendeu que a lei daquele município era inconstitucional. No entanto, em outra ação, o tribunal inverteu o juízo e admitiu que o município de Limeira poderia legislar sobre o tema.

Fernando Capez (PSDB) definiu a questão como polêmica e disse que a apuração desta CPI pode contribuir para mudar o entendimento do tribunal. Houve ainda consenso entre os demais parlamentares de que a queima da palha compromete negativamente aspectos socioambientais e consiste em ação criminosa. “Nós temos a obrigação, conhecendo os efeitos danosos, de propor o fim imediato das queimadas”, ressaltou Cido Sério (PT). Ele defende o modelo de corte mecanizado da cana, pois é mais eficiente do que o manual. “Além disso, a palha poderia ser usada como energia, preservando o ambiente e a vida”, sugere.

Uebe Rezeck (PMDB) apontou como contraproducente a prática da queima da palha e identificou problemas sociais advindos dessa prática. Ele informou que 70% da mão-de-obra utilizada pelos usineiros é nordestina e enfatizou as más condições de vida a que é submetido esse contingente de trabalhadores. “As usinas que queimam a palha devem ser punidas”, concluiu.

Também compareceram à reunião os deputados Davi Zaia (PPS), Célia Leão (PSDB), Rafael Silva (PDT) e Otoniel Lima (PTB). 

Fonte: Alesp, de 23/10/2007

 


ANAPE interporá ADIn contra previsão mineira de escolha do PGE

Esta semana a ANAPE interporá ADIn em face da possibilidade de recrutamento amplo para o cargo de Procurador Geral de MG (o nome AGE é inconstitucional). Ademais, a entidade impugnará as normas que permitem que vários cargos de direção da Procuradoria sejam preenchidos por comissionados, como ocorre na caso das Procuradorias Regionais.

O assunto foi decidido em Assembléia da Classe.

Chamamos a atenção que a questão é institucional e a ANAPE tem o maior respeito pelos atuais ocupantes dos cargos em MG, que são pessoas competentes e reconhecidas, fato este comprovado no exercício de altas funções públicas, ao contrário do que ocorre em outro Estado, onde estão presentes péssimos profissionais e recrutados de forma duvidosa por um Governo que todo dia é denunciado na imprensa por atos de corrupção.

Fonte: Associação Nacional dos Procuradores do Estado

 



ANAPE interpõe ADI em defesa de Procurador Geral de Carreira em MG

Prezados colegas Procuradores,

A data de hoje é um marco fundamental em nossa Carreira. Há anos estamos discutindo a viabilidade de interpormos ADIs contra legislações que prevêem que o PGE não seja Procurador concursado. Sempre fomos preteridos no STF, isto nos exigia cautela.

Todavia, no momento, acreditamos que não há mais como adiar a discussão, principalmente animados pelo julgamento da ADI de SP já noticiada, onde a maioria do STF mostrou simpatia com a tese que é da essência do cargo de Procurador Geral seu preenchimento por integrantes da Carreira; entendimento capitaneado pelo valoroso ministro Marco Aurélio.

Sabemos dos riscos e das forças ocultas que atuarão (aliás, que mal governante que quer uma controle efetivo de legalidade, principalmente de seus contratos de licitação, fonte de corrupção e locupletamento fácil), mas sabemos que "a luta aos fracos abate, aos fortes, aos bravos só faz exaltar", parafraseando Gonçalves Dias, em a Canção dos Tamoios.

Na oportunidade, pedimos aos colegas de todo o Brasil que nos auxilie nos casos de existência de legislações que firam nossas prerrogativas. O FUTURO É AGORA!

Não nos iludamos, pois no Congresso recentemente já vimos que há forças se manifestando contra nosso tratamento constitucional, mas somos quase cinco mil advogados, nossa capacidade de reação, se for organizada e respaldada por uma ANAPE forte, é quase imbatível. Mas, repetimos novamente, temos que fortalecer nossas Associações de Classe, pois sem as mesmas não temos nenhuma chance.

ALEA JACTA EST! Já atravessamos o Rubicão...agora teremos que chegar à Roma...

Fonte: Associação Nacional dos Procuradores do Estado

 


Benefício econômico representa alívio financeiro

Paulo Ricardo Gois Teixeira

Os credores da Fazenda Pública vêm recebendo anualmente um décimo de seus créditos decorrentes de precatórios pendentes de liquidação em dezembro de 2000 ou referentes a ações judiciais promovidas até 31 de dezembro de 1999 nos termos do artigo 78 do ADCT da Constituição Federal, introduzido no ordenamento jurídico por força da Emenda Constitucional 30/00.

Ocorre que após o início do pagamento de tais precatórios (dezembro 2001) entrou em vigor o novel Código Civil (janeiro de 2003), que trouxe uma série de invocações legislativas, dentre elas a dobra da taxa dos juros legais devidos em decorrência da mora, fruto de qualquer inadimplemento, sendo a regra válida também para a administração pública devedora.

Passou a lei a prever, assim, que a partir de então, quando não houvesse convenção em contrário, a taxa de juros devida (juros legais) será de 1% ao mês, conclusão esta atingida em cotejo com a regra inserta no artigo 161, § 1º do Código Tributário Nacional.

As sentenças judiciais que resultaram na expedição dos precatórios anteriores à vigência do novo Código Civil, no entanto, condenaram a Fazenda Pública no pagamento dos juros moratórios, fixando expressamente o percentual de 6% ao ano ou simplesmente fazendo menção aos “juros legais”, que correspondiam àquela mesma taxa, tendo sido com base nela elaborados os cálculos do quantum devido pela administração em cada caso.

Nesta esteira, todos os pagamentos do décimo constitucional efetuados a partir do ano de 2003 continuaram levando em consideração a taxa de juros à base de 0,5% ao mês, ignorando por completo as entidades devedoras o novo regramento civil que estabelece a dobra dos chamados juros legais, devendo a nova taxa de juros incidir sobre todos os pagamentos das parcelas dos referidos precatórios, consubstanciando-se o Código Civil de 2002 como verdadeiro divisor de águas.

Ou seja, até dezembro de 2002, a taxa de juros a ser computada nos débitos fazendários deve ser de 0,5% ao mês, passando a ser de 1% (um por cento) ao mês a partir de janeiro de 2003, quando entrou em vigor o novo Código Civil, devendo os cálculos ser refeitos desde então.

E assim deve ser porque o fato gerador do direito a juros moratórios não é a existência da ação e nem a condenação judicial (que simplesmente o reconheceu), e sim a demora no cumprimento da obrigação. Tratando-se de fato gerador que se desdobra no tempo, produzindo efeitos também após a prolação da sentença, a definição da taxa legal dos juros fica sujeita ao princípio de direito intertemporal segundo o qual tempus regit actum.

Não é sob outro fundamento que o Superior Tribunal de Justiça definiu que “os juros incidentes sobre a mora ocorrida no período anterior à vigência do novo Código Civil são devidos nos termos do Código Civil de 1926 e os relativos ao período posterior, regem-se pelas normas supervenientes.”

A conclusão pacificada no seio do Superior Tribunal de Justiça não poderia mesmo ser diversa, diante da norma esculpida pelo artigo 2.035 do Código Civil, pela qual:

A validade dos negócios e demais atos jurídicos (e a sentença judicial evidentemente é um ato jurídico), constituídos antes da entrada em vigor deste Código (o que é o caso das sentenças prolatadas antes de janeiro de 2003), obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no artigo 2.045, mas os seus efeitos (e a mora é um efeito da sentença não cumprida pelo devedor), produzidos após a vigência deste Código (como é o caso dos juros decorrentes da mora renovada mês a mês), aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes (ou pela sentença) determinada forma de execução.

Não resta dúvida, portanto, que o não pagamento dos débitos judiciais da Fazenda Pública decorrentes de sentenças prolatadas antes de janeiro de 2003 devem ser acrescidos de juros legais computados à base de 1% ao mês a partir da vigência do novo Código Civil, incidindo tal regra mesmo em relação àquelas sentenças que expressamente cominaram a incidência de juros à base de 6% ao ano.

Isso porque os juros, como se viu, não são devidos por força da sentença em si, mas em decorrência da mora e o são sempre, quando não convencionados, na taxa prevista em lei. São os chamados juros legais. Assim, pouco importa se há na sentença fixação dos juros ou não e, em havendo, se em percentual ou sob a genérica denominação de “juros legais”, que é o que a lei impõe. Tanto faz esteja na sentença expresso o percentual que à época a lei determinava ou que se tenha constado a expressão “juros legais”, posto que sinônimas e equivalentes, considerando-se tudo o quanto até aqui se expôs.

Nem mesmo eventual alegação de coisa julgada seria suficiente a espancar a modificação da taxa de juros expressamente aplicada pela sentença, já que “a coisa julgada é suscetível de um processo de integração, decorrente de situação superveniente, a que deve o juiz atender, tendo em vista a natureza continuativa da relação jurídica decidida” (RTFR 160/59), sendo certo que “não impede que lei nova passe a reger diferentemente os fatos ocorridos a partir de sua vigência” (neste sentido RTJ 89/344, RSTJ 60/367, RTJ 117/516, 117/1.000. RSTJ 81/162, entre outros).

Concluímos, assim, que os credores da Fazenda Pública nestas circunstâncias, em quaisquer de suas esferas, têm direito a cobrar imediatamente do ente devedor, mesmo que já expedido o precatório correspondente e mesmo que já tenha ele sido total ou parcialmente pago, a diferença dos juros moratórios devidos desde janeiro de 2003 até a presente data, o que, evidentemente, representa sensível aumento do crédito executado.

O benefício econômico conquistado pode, em muitos casos, representar consistente alívio financeiro para as empresas credoras da administração pública, especialmente por sofrerem por tantos anos com o descaso da inadimplência estatal, sendo interessante observar que não há qualquer conseqüência negativa ao credor em caso de eventual pleito frustrado.

Fonte: Consultor Jurídico, de 24/10/2007

 


Promotores querem disputar direção do MP paulista

Fernando Porfírio

Como no Judiciário paulista, o Ministério Público de São Paulo vive um clima de rebelião das “bases”. Um movimento de promotores de Justiça que tem como ninho o Fórum da Barra Funda deflagrou a rebelião contra a cúpula e partiu para uma verdadeira cruzada pela democracia interna da instituição. Os ataques têm como alvo o monopólio do poder pelos procuradores de Justiça. Os promotores querem o direito de disputar os cargos de direção da instituição, hoje reservados, por força de lei, àqueles que estão no topo da carreira.

Os promotores, no nível inicial da carreira, votam, mas não podem ser candidatos a procurador-geral nem a membro do Conselho Superior do Ministério Público. As chamadas “bases” também não escolhem nem podem concorrer aos cargos de corregedor-geral e do Órgão Especial do Colégio de Procuradores. No MP paulista, os procuradores de Justiça são apenas 202 enquanto os promotores ultrapassam 1,8 mil.

“É a luta de Davi contra Golias”, afirma um promotor que pediu para não ser identificado. “Queremos a garantia e o respeito aos princípios democrático e republicano”, acrescentou. “De que adianta falar em democracia se não conseguimos nem sequer praticá-la internamente?”, questionou o promotor.

“A plutocracia está agitada e sabe que pela primeira vez, em décadas, estamos ameaçando de verdade os nichos bem protegidos dos partidos dominantes. Pela primeira vez na História do MP, a independência institucional parece mais próxima do nunca”, afirmou o promotor de Justiça Roberto Tardelli. Ele classifica o poder dos procuradores de “coronelismo pós-moderno”.

A luta já pulou da retórica para o campo institucional. Os promotores prometem bater à porta do Judiciário. A minuta de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei Orgânica do MP paulista já está pronta para dar entrada no Tribunal de Justiça. O advogado Luiz Carlos Galvão de Barros, procurador aposentado, foi contratado especialmente para entrar com a ADI.

O fundamento da ação será o de que a Lei Orgânica fere a Constituição Estadual que estabelece, no artigo 94, que pode ocupar o cargo de procurador-geral todos os integrantes da carreira. A Lei Complementar nº 734 (Lei Orgânica Estadual do Ministério Público de São Paulo) foi além e estabeleceu que para os cargos da administração superior só podem concorrer os procuradores de Justiça.

Os promotores contam com uma outra arma poderosa. Suas idéias são repercutidas pelo “Blog do Promotor”, canal de comunicação com penetração na comunidade jurídica e entre formadores de opinião. O Blog já lançou uma campanha para que os atuais candidatos a procurador-geral de Justiça se comprometam a encaminhar à Assembléia Legislativa projeto de lei para reformar a lei Orgânica do Ministério Público paulista. Dois dos quatro candidatos já firmaram compromisso público com a idéia.

Há aqueles que defendem uma posição intermediária: que os promotores de Justiça sejam eleitos para os colegiados superiores como vogais (com direito a voz, mas sem direito de votar). Ou seja, enquanto não houver mudança na legislação, os promotores poderiam ser eleitos para participar dos órgãos da administração superior (Conselho e Órgão Especial), mas sem poder votar.

Na semana passada, em reunião no fórum Mário Guimarães, na Barra Funda, o grupo de promotores aprovou a redação de um documento onde pleiteiam o direito de concorrer ao cargo de chefe da instituição. A cada dois anos, o Ministério Público elege o procurador-geral. Ele é nomeado pelo governador, que escolhe o nome de uma lista tríplice eleita pela classe.

São Paulo é um dos sete estados da federação que impede que promotores concorram ao cargo de procurador-geral. Em pelo menos um Estado, Alagoas, o chefe do Ministério Público Estadual é um promotor de Justiça de carreira. Naquele Estado, o promotor de Justiça Coaracy José Oliveira da Fonseca, promotor da terceira entrância, está em seu segundo mandato.

Promotores e procuradores possuem as mesmas prerrogativas e vedações. A diferença está apenas na área de atuação. Promotores exercem suas funções perante o primeiro grau da Justiça. Os procuradores atuam nos tribunais.

O movimento de rebelião enfrenta dura resistência do Órgão Especial, que abriga 40 procuradores - 20 mais antigos da instituição e 20 eleitos pelo Colégio de Procuradores. Agora, os promotores ganharam o apoio da Associação Paulista do Ministério Público.

Os promotores argumentam que o modelo em vigor não oferece oportunidade de renovação na cúpula do Ministério Público, que é o guardião da democracia e fiscal da lei, segundo a Constituição. Eles sustentam que tal situação compromete a independência da entidade.

Na carta, os promotores “clamam por imediata igualdade”. Segundo eles, “já não há o que justifique” que apenas procuradores possam ocupar o máximo cargo. “É inegável que os promotores têm hoje plena visão da instituição e claras idéias do que há de ser feito para que as atribuições sejam implementadas no contexto social, político e econômico de São Paulo”.

Fonte: Consultor Jurídico, de 24/10/2007
 

 


Promotor é denunciado por homicídio culposo em São Paulo

A denúncia contra o promotor de justiça Wagner Juarez Grossi foi distribuída ao desembargador Debatin Cardoso, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. O promotor foi denunciado por triplo homicídio culposo (sem intenção de matar). Grossi atropelou e matou com sua caminhonete três pessoas que estavam numa motocicleta, no último dia 7, na altura do km 45,9 da rodovia Eliezer Montenegro Magalhães (SP-463), em Araçatuba.

Agora, o promotor deverá apresentar defesa prévia e depois a denúncia será apreciada pelo Órgão Especial. No caso da denúncia ser recebida pelo colegiado, o promotor de justiça vai responder a processo criminal. No entanto, sua pena não será superior a quatro anos e Grossi deverá ter direito a uma pena alternativa de prestação de serviço à comunidade.

O chefe do Ministério Público paulista, Rodrigo Pinho, afastou o promotor de justiça de suas funções pelo prazo de 60 dias. Mas Wagner Juarez Grossi continuará recebendo o salário em torno de R$ 20 mil.

De acordo com o procurador-geral de Justiça, Grossi estava embriagado na noite do acidente. Segundo a denúncia, o promotor dirigia sua caminhonete pela rodovia no sentido Tietê-Araçatuba, em velocidade excessiva. Ainda de acordo com o chefe do Ministério Público, a rodovia apresenta traçado reto e plano, com pista simples com duas mãos de direção, separadas por traçado no solo. Também de acordo com a acusação, havia lombadas no local para redução de velocidade e que estavam sinalizadas.

O entendimento da Procuradoria-Geral de Justiça é o de que por causa do excesso de velocidade e da diminuição de atenção e de reflexos provocados pela embriaguez, o promotor de justiça passou com a caminhonete por uma dessas lombadas sem freiar. “Essa mesma redução de reflexos e de atenção, somada à velocidade incompatível que Wagner imprimia a seu veículo, levaram o denunciado, logo após passar pela lombada, a invadir a pista á sua esquerda, passando a trafegar na contramão de direção”, afirmou Rodrigo Pinho.

Logo depois a caminhonete chocou-se com a motocicleta onde estava o casal e uma criança de sete anos. A moto foi arrastada por cerca de 30 metros. A violência da batida provocou a morte dos três. A moto era conduzida pelo metalúrgico Alessandro da Silva Santos que transportava ainda sua namorada, Alessandra e o filho dela, Adriel .

Testemunhas disseram que o promotor desceu do veículo sem saber o que tinha acontecido, com uma lata de cerveja na mão. Na caminhonete Ranger havia mais latas e uma garrafa de cerveja, que foram apreendidas. Um policial rodoviário que chegou ao local três minutos depois do acidente disse que Grossi estava "visivelmente embriagado, com odor etílico e fala mansa".

Levado ao plantão policial, o promotor se recusou a fornecer sangue para o exame de dosagem alcoólica, obrigando o delegado Paulo de Tarso de Almeida Prado a convocar um médico para fazer um exame clínico. O médico Maurílio Albertino de Castro, constatou, por volta das 22 horas, que o promotor estava em estado de "embriaguez moderada". O acidente aconteceu às 20h40.

Grossi foi enquadrado no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro, que pune o motorista por homicídio culposo e por dirigir embriagado. Ele não pôde ser autuado em flagrante porque, pela Lei Orgânica do Ministério Público, o representante da instituição envolvido em acidente ou alvo de investigação só pode ser preso em flagrante por ordem judicial ou por crime inafiançável.

Fonte: Consultor Jurídico, de 24/10/2007

 


Desembargador paulista acusa PGR de parcialidade

Lilian Matsura

A guerra em que se transformou a disputa pela direção do Tribunal de Justiça de São Paulo ganhou mais munição nesta terça-feira (23/10). O desembargador Ivan Sartori acusou o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, de receber apenas uma das partes interessadas na causa antes de propor a Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Regimento Interno da Corte paulista.

O Supremo Tribunal Federal foi chamado a decidir quem pode disputar a direção do TJ paulista: se os 25 membros do Órgão Especial do tribunal, como manda o Regimento Interno, ou se apenas os desembargadores mais antigos, como prevê a Lei Orgânica da Magistratura (Loman).

Em seu blog, Sartori afirma que o procurador-geral só consultou a ala que defende a aplicação da Loman, encabeçada pelo desembargador Luiz Tâmbara. “O procurador-geral abriu espaço em sua agenda para o desembargador Luiz Tâmbara, dele recebendo todo o material ao aparelhamento da ação. Assim não agiu, porém, em relação à ala contrária.” O desembargador afirma ainda que tentou agendar reunião com Antonio Fernando por telefone e e-mail. “Em vão. Passado quase um mês, a ADI já estava ajuizada”, critica.

Procurado pela revista Consultor Jurídico, o procurador-geral da República não pôde falar sobre o caso porque está em Portugal. A assessoria de imprensa da PGR informou que a ação foi proposta respeitando as determinações previstas na Constituição Federal. Observou também que não é necessário ouvir todos os interessados em determinada causa para propor uma ADI.

Decisão suprema

No Supremo, a decisão sobre a norma que deve prevalecer está nas mãos do ministro Ricardo Lewandowski, que já foi membro do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Na segunda-feira (22/10), como ele não estava em Brasília, a liminar caiu nas mãos de Celso de Mello, que não viu urgência suficiente na causa para analisá-la no lugar do relator natural da matéria. Lewandowski pode apreciar o pedido de liminar ainda nesta terça-feira (23/10).

Na ADI, o procurador-geral da República defende que ao aumentar o número de magistrados em condições de serem votados para dirigir o tribunal, o Regimento Interno e a Resolução 395/07 do TJ paulista violaram o artigo 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. O Regimento Interno do tribunal permite a todos os membros do Órgão Especial concorrer aos cargos de direção, independentemente do tempo de tribunal.

O chefe do Ministério Público Federal lança mão de recente decisão do Supremo, que julgou inconstitucional parte do Regimento Interno do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul), para defender sua tese. O voto condutor do ministro Cezar Peluso determina que são inconstitucionais as normas do regimento interno do tribunal que tratam do universo dos magistrados elegíveis para os órgãos de direção. O acórdão foi publicado na edição do Diário da Justiça de 15 de julho deste ano.

A eleição no TJ paulista está marcada para 5 de dezembro. O vencedor dirigirá o tribunal no biênio 2008-2009. Para presidente, cinco candidatos disputam o cargo: Caio Canguçu de Almeida, Gilberto Passos de Freitas, Ivan Sartori, Luiz Carlos Ribeiro dos Santos e Vallim Bellocchi.

Para vice-presidente são quatro: Denser de Sá, Jarbas Mazzoni, Maurício Ferreira Leite e Renato Nalini. De olho no cargo de corregedor-geral são mais quatro: Alceu Penteado Navarro, Munhoz Soares, Oscarlino Moeller e Ruy Camilo. As candidaturas de Vallim Bellocchi, Denser de Sá, Jarbas Mazzoni, Munhoz Soares e Ruy Camilo se apresentaram de última hora.

A ação apresentada por Antonio Fernando Souza foi provocada por representação encaminhada à Procuradoria-Geral da República pelo desembargador Luiz Tâmbara, com o apoio dos colegas Ruy Camilo, Munhoz Soares, Roberto Stucchi, Walter Guilherme e Jarbas Mazzoni.

O presidente do TJ paulista, desembargador Celso Limongi, afirma que os dispositivos da Loman referentes à eleição dos tribunais “ferem o princípio republicano e cerceiam a alternância no poder”. No caso de se aplicar o critério de antiguidade para escolher os candidatos, diz Limongi, “será uma perda de tempo 360 desembargadores saírem de casa para votar. Neste caso, bastaria o mais antigo assinar o requerimento e o termo de posse”.

No Supremo e nos tribunais superiores, a escolha da direção é pelo critério de antiguidade. E neste caso não é inadequado. Como o número de membros é pequeno, a maior parte deles chega à direção da Corte. Já no caso de um tribunal como o de Justiça de São Paulo, que conta com mais de 360 desembargadores, o critério aparentemente mais justo é o da eleição entre os membros do Órgão Especial. Não a escolha dos mais antigos.

Fonte: Consultor Jurídico, de 23/10/2007
 

 


A lei fiscal em perigo

O governo federal prepara um projeto de lei que poderá afrouxar, perigosamente, a disciplina financeira do setor público, permitindo maior endividamento de Estados e municípios que já descumprem a Lei de Responsabilidade Fiscal. Pela regra em vigor, prefeitos e governadores são proibidos de tomar novos empréstimos, se as despesas com pessoal estiverem acima dos limites legais. Pelo projeto em estudo, essa proibição só valerá se os gastos acima do teto forem do Executivo e não de qualquer outro Poder - como se o mesmo Tesouro não custeasse também o Judiciário, o Legislativo e o Ministério Público, tratado na lei fiscal como um Poder da República.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, sancionada em maio de 2000, limita em 60% da receita corrente líquida os gastos com pessoal de Estados e municípios e em 50% os da administração federal. Há um teto específico para cada Poder. Nos Estados, 49% para o Executivo, 6% para o Judiciário, 3% para o Legislativo e 2% para o Ministério Público. No caso dos municípios, 54% para o Executivo e 6% para o Legislativo. No nível federal, os valores máximos são 40,9% para o Executivo, 6% para o Judiciário, 2,5% para o Legislativo e 0,6% para o Ministério Público.

Cada chefe de Poder é responsável, legalmente, pela observância do limite financeiro em sua área de atuação. A Lei 10.028/2000 estabelece multas para quem ultrapassar os tetos indicados na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas até hoje foram abertos poucos processos pelos Tribunais de Contas (órgãos vinculados ao Legislativo) e nenhuma punição foi aplicada. A gestão fiscal no Brasil pode ter melhorado com essa legislação, mas ainda funciona precariamente. Na prática, tudo se passa como se a disciplina fiscal fosse obrigação apenas do Executivo.

O governo federal planeja propor, com o novo projeto, formas de garantir o enquadramento de todos os Poderes - e não apenas do Executivo - nas normas fiscais em vigor há sete anos. No fundo, a idéia é fazer pegar integralmente uma legislação que não pegou, ou que pegou apenas de forma parcial. A noção de que há no Brasil duas classes de leis - as que pegam e as que não pegam - foi formulada há 40 anos e forneceu material para muitos lances de humor. O período militar estava no começo. Esgotou-se, um novo regime foi implantado, o Brasil mudou em muitos aspectos, política, social e economicamente, mas a noção continua verdadeira.

O mais grave, no caso da gestão financeira, é que o próprio setor público desmoraliza as leis em vigor, limitando a sua aplicação ao Executivo e isentando de seu cumprimento os demais Poderes. Se isso for corrigido, o País ganhará.

Mas o resto do projeto é essencialmente um equívoco. A solução correta não é permitir o endividamento dos governos, se a violação dos limites de gastos com pessoal ocorrer fora do Executivo. Ao contrário do que sustentou o secretário do Tesouro, Arno Augustin, numa entrevista ao jornal Valor, essa regra, se adotada, resultará num afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal. O Tesouro é um só, em cada nível de governo, e o excesso de gastos não deixa de existir quando ocorre por culpa do Legislativo, do Judiciário ou do Ministério Público e não do Executivo. As conseqüências econômicas da indisciplina financeira, que justificaram a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, manifestam-se da mesma forma, seja qual for o órgão responsável pela irregularidade.

É preciso, portanto, agir para que as leis fiscais sejam plenamente eficazes. Isso ocorrerá somente quando todos os Poderes tiverem de assumir de forma completa e inequívoca a responsabilidade pela boa gestão das contas públicas. O resto é subterfúgio e só contribuirá para abrir mais uma brecha na disciplina financeira. A aproximação das eleições municipais do próximo ano torna recomendável uma cautela ainda maior no tratamento do assunto, para não se criar mais espaço para a gastança.

Se a indisciplina de algum Poder impede Estados e municípios de contratar novos financiamentos para obras importantes, é preciso que isso fique bem claro para a opinião pública e que os desvios sejam reprimidos. Qualquer estratégia de acomodação é inconveniente e é justo recebê-la, nas atuais circunstâncias, com muita reserva e até com desconfiança.

Fonte: O Estado de S. Paulo, de 24/10/2007