Pensão
da Balança
Os
servidores da Justiça devem lançar, em outubro, seu próprio
fundo de pensão, o Jusprev. Será formado por 19
entidades, entre associações de magistrados e do
Ministério Público. "Em dez anos, será um dos
maiores fundos de pensão do Brasil", diz Maria
Tereza Gomes, da Associação Paranaense do Ministério
Público, idealizadora do Jusprev. Ela avisa que o fundo
não receberá recursos públicos e será mantido com
contribuições dos associados, que pagarão entre R$ 50
e R$ 200. Em SP, a Apamagis (dos magistrados), a Apesp
(dos procuradores) e a Associação Paulista do Ministério
Público aderiram ao Jusprev.
Fonte:
Folha de S. Paulo, de 17/07/2007
Governadores
de Alagoas e São Paulo fecham acordos no setor fazendário
Tatiana
Assumpção
Os
governadores de São Paulo e de Alagoas, José Serra e
Teotônio Vilela Filho, ambos do PSDB, assinaram ontem,
na capital paulista, um convênio que estabelece bases
de cooperação entre os dois estados, para o setor
fazendário, em ações voltadas à pesquisa e à
tecnologia no setor agropecuário, bem como a defesa
sanitária animal e vegetal de São Paulo e do Alagoas.
O
protocolo assinado, que passa a vigorar a partir de
agosto, trata da implantação do mecanismo de substituição
tributária do Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e sobre Prestações de Serviços (ICMS) para operações
com produtos farmacêuticos, soros e vacinas de uso
humano ou veterinário; bebidas quentes (destilados e
vinhos); produtos eletrodomésticos, eletroeletrônicos
e equipamentos de informática; e rações para animais
domésticos.
Os
produtos que integram o acordo são distribuídos e
consumidos em Alagoas e, usualmente são produzidos em São
Paulo. "A substituição tributária é um poderoso
fator anti-sonegação. É quando o ICMS é cobrado na
produção, ao invés de ser cobrado nas diferentes
etapas da comercialização, o que provoca perdas de
receita", explicou Serra, ressaltando que a
arrecadação mediante a substituição é muito mais
eficiente. "De produtos que vão de São Paulo para
Alagoas, o governo do estado vão cobrar a parte que
corresponde a ele e a Alagoas, e faz a transferência de
recursos através das próprias empresas",
completou o governador paulista.
Com
isto, o fisco de Alagoas, ao receber diretamente do
fornecedor paulista o ICMS e as informações fiscais
que seriam devidos pelos seus próprios contribuintes,
terá instrumentos mais efetivos para combater a evasão
fiscal. "Na saída de mercadorias fabricadas em São
Paulo, as empresas paulistas irão recolher,
antecipadamente, o ICMS que corresponde a Alagoas."
A
expectativa de Alagoas com a medida é reduzir a sonegação
de ICMS nos setores econômicos envolvidos nos acordos e
proporcionar um incremento de arrecadação da ordem de
R$ 40 milhões por ano, o equivalente a 3% da receita do
Estado. De acordo com Serra, para São Paulo, a medida não
aumentará a receita, mas "ajuda a organizar melhor
o sistema tributário". "Este acordo vai
permitir uma parceria em outras áreas que, num outro
momento, iremos formalizar", disse o alagoano.
Fonte:
DCI, de 18/07/2007
STF
suspende incorporação de vantagens pessoais de
advogado da União
A
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra
Ellen Gracie, deferiu a liminar requerida na Reclamação
(RCL) 5258, proposta pela União, contra decisão do Juízo
da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Piauí que
integrou ao subsídio recebido pelo advogado da União,
Clemilton da Silva Barros, as vantagens pessoais
nominalmente identificadas (VNPI).
Nos
autos consta que o advogado adquiriu essas vantagens e
adicional por tempo de serviço ao longo de sua vida
funcional no Ministério do Exército e no Tribunal
Regional de Trabalho da 22ª Região. No entanto, o
advogado-geral da União diz que a posse de Barros no
cargo se deu em 09 de outubro de 2006, quando estava em
vigor a Medida Provisória (MP) 305/06 (hoje Lei
11358/06) que instituiu nova política remuneratória
para os integrantes da carreira, com o regime de
remuneração por subsídio e a exclusão dos valores
relativos a décimos, quintos e adicionais por tempo de
serviço das carreiras anteriores.
Assim, a
União sustenta que a decisão reclamada ofende a decisão
do STF no julgamento da ADC-4 que veda aumento do subsídio
pago mensalmente pela União, quando determinado
cautelarmente. É que, “ao contrário do que foi
alegado pelo advogado público federal, está bastante
claro que a demanda não se refere a perda ou a redução
de vencimentos, mas a uma clara pretensão de aumento
salarial”, explica o advogado-geral da União. Ele
alega também ofensa ao artigo 39, parágrafo 4º, da
Constituição Federal e a ocorrência de perigo na
demora de uma decisão de mérito, ante a ausência de
previsão orçamentária para cobrir essa despesa, razão
do pedido liminar.
A
ministra Ellen Gracie deferiu a liminar requerida por
entender que ao mudar da carreira de analista judiciário
para a de advogado da União, Clemilton Barros “aderiu
de forma espontânea a esse novo sistema remuneratório,
que deriva expressamente do artigo 135, da Constituição
da República”. Em juízo preliminar, a ministra
julgou que a decisão da justiça federal no Piauí “não
restabeleceu padrão remuneratório do autor, mas sim
antecipou a concessão de aumento de sua remuneração
no novo cargo de advogado da União, que deve ser, nos
termos de nossa Constituição, remunerado
exclusivamente por subsídio”.
Ao
deferir a liminar, Ellen Gracie considerou as
possibilidades de lesão à economia pública e o efeito
multiplicador, resultantes da decisão da justiça
federal no Piauí, suspendo-a até o julgamento final da
RCL 5258.
Fonte:STF,
de 18/07/2007
Serra
antecipa-se à proposta do governo federal
Cristiane
Agostine
Antes
mesmo de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviar
ao Congresso a proposta de reforma tributária, o
governador paulista, José Serra (PSDB), tenta liderar
um processo de acordos tributários com os Estados,
comandados inclusive por partidos da base governista. O
tucano está fechando parcerias para centralizar em São
Paulo a cobrança do ICMS de produtos produzidos nas fábricas
paulistas e exportados para outras regiões.
Ontem,
Serra assinou acordo com Alagoas, comandado por Teotônio
Vilela Filho, do PSDB. A primeira parceria foi firmada
em abril, com o PMDB de André Puccinelli, no Mato
Grosso do Sul e o próximo acordo será com Eduardo
Campos (PSB), de Pernambuco.
O acordo
estabelece que as empresas paulistas recolham
antecipadamente o ICMS, na saída de mercadorias
fabricadas em São Paulo, a parte que corresponde aos
Estados parceiros. A própria fábrica fará a transferência
dos recursos. Com a medida, Serra ajudará o governo de
seu correligionário, que enfrenta sérios problemas
financeiros: Alagoas deve aumentar a arrecadação em R$
40 milhões por ano, o correspondente a 3% da arrecadação
de ICMS no Estado. Na lista dos setores cuja arrecadação
ficará sob a responsabilidade do governo paulista estão
os farmacêuticos, de bebidas quentes, eletrodomésticos,
eletroeletrônicos, além de ração para animais.
As
parcerias, diz o governo paulista, não trarão recursos
para o caixa de São Paulo. Entretanto, são uma forma
de Serra tentar conquistar parceiros e papel de liderança
na negociação da reforma tributária. "Do ponto
de vista do Estado não traz maior receita, mas ajuda a
organizar melhor o sistema tributário", disse
Serra ontem, ao lado do governador alagoano. O governo
paulista negocia também com outros Estados, além de
Pernambuco. Para Vilela, a medida ajudará no combate à
evasão fiscal dos recursos que Alagoas recebe das
empresas de São Paulo.
Para o
ex-governador Germano Rigotto, do PMDB, coordenador da
proposta de reforma tributária do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social, a iniciativa do
governador tucano antecipou, em partes, a proposta que
está sendo discutida no plano nacional. "Não
substitui o projeto que vai à votação, porque ainda
é uma iniciativa limitada a alguns poucos setores. Mas
a iniciativa de São Paulo é o que a reforma tributária
busca", analisou. "É o primeiro movimento
concreto de tentativa de mudar a cobrança do ICMS. Com
essas parcerias, São Paulo tenta driblar as deficiências
do sistema tributário ", disse o pemedebista.
A
proposta de reforma tributária do governo federal deve
chegar ao Congresso em setembro. Serra já declarou ser
favorável à proposta do Ministério da Fazenda de
cobrar o ICMS no Estado de destino da produção. Hoje,
o imposto é cobrado no Estado de origem.
Serra
também sinaliza uma aproximação com o PMDB por outra
frente. Em conversa com o senador pemedebista Jarbas
Vasconcelos (PE) na segunda-feira, os dois afinaram como
deve ser a estratégia da oposição na Câmara e no
Senado. Apesar de ser do PMDB - que integra a base de
Lula - Jarbas tem votado seguindo a orientação do PSDB
e DEM, na oposição.
Fonte:
Valor Econômico, de 18/07/2007
Empresas
contestam cobrança de ICMS de consumo de baixa renda
Zínia
Baeta
A Cemig
Distribuição obteve na Justiça de Minas Gerais uma
liminar que suspende a cobrança de aproximadamente R$
80 milhões pelo Governo do Estado. Com a liminar, a
companhia pôde participar de leilões de energia
ocorridos no mês passado. A empresa estava impedida de
participar de operações desta natureza em razão da
discussão tributária travada com o Estado de Minas
Gerais, que cobra uma diferença do ICMS sobre as contas
dos consumidores residenciais de baixa renda - aqueles
cujo consumo mensal está na faixa de 80 Kwh. A disputa
levada à Justiça pela Cemig é comum também a outras
companhias do setor. As empresas CPFL, Elektro e
Bandeirante, por exemplo, também foram ao Judiciário
do Estado de São Paulo questionar o pagamento da
diferença do imposto das contas destes consumidores.
A
advogada que representa a Cemig na ação, Bianca
Delgado, do escritório Décio Freire Advogados, afirma
que os consumidores de baixa renda são beneficiados por
um subsídio previsto em lei federal, cujo objetivo é
reduzir o valor final da conta. O que a Cemig e outras
empresas discutem é a cobrança do ICMS pelos Estados
também sobre o montante da conta que é subsidiado.
Segundo ela, a tese defendida é a de que o imposto deve
incidir somente sobre a parte não subsidiada, sob o
risco de tornar inócua esta política de redução
tarifária.
O
diretor jurídico da Associação Brasileira de
Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Braz
Pesce Russo, diz que o valor do subsídio é arrecadado
dos demais consumidores de energia, a partir de um valor
embutido na tarifa. No caso da discussão tributária, e
a título de exemplificação, ele diz que se uma conta
é de R$ 100,00, com um subsídio de R$ 30,00, o
consumidor pagará somente R$ 70,00. E sobre este valor
deveria incidir o ICMS. Mas, segundo ele, alguns
governos entendem que o imposto deverá recair sobre os
R$ 70,00 e também sobre o subsídio de R$ 30,00.
Russo
afirma que a cobrança desta diferença do imposto começou
a partir de 2004 com a edição do um Convênio nº 79
do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz),
por meio do qual alguns Estados dispensaram as empresas
de pagarem multas e juros sobre a diferença do ICMS
passado - entre maio de 2002 e agosto de 2004. "Até
2004 ninguém recolhida nada", afirma o diretor. De
acordo com Russo, algumas empresas têm questionado a
cobrança e outras têm repassado a diferença para o
consumidor residencial de baixa renda. Há também
Estados que não promovem a cobrança da diferença,
caso de Pernambuco. E outros que cobraram somente a
partir de 2004.
No
entendimento da associação, o subsídio seria uma espécie
de indenização e não ocorreria a venda de mercadoria.
Por este motivo, não poderia haver a tributação. Em
termos financeiros, as concessionárias não são
afetadas pela cobrança do ICMS sobre as contas, pois
quem pagará a diferença é o consumidor. No entanto,
Braz entende que esse pagamento retira o subsídio e seu
objetivo social. Além disso, com uma conta maior, o
risco de inadimplência dos consumidores é maior.
As
empresas CPFL, Elektro e Bandeirante, por meio de suas
assessorias de imprensa, informaram que não comentariam
o assunto. Procurada pelo Valor , a Advocacia Geral do
Estado de Minas Gerais também não comentou a disputa
com a Cemig.
Fonte:
Valor Econômico, de 18/07/2007
Empresários
pedem teto para a carga tributária
Mantega
rejeita proposta, que previa limite de 26% de participação
de tributos sobre PIB
Empresários
pediram ontem a criação de instrumento para conter o
avanço da carga tributária. Em reunião do CDES
(Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social), foi
entregue documento que cobra redução do peso dos
impostos e limite de 26% do PIB para a carga. Hoje, o número
é de 34,5%. O ministro Guido Mantega (Fazenda) rejeitou
a idéia.
O
documento divulgado tem 14 propostas. Elaborado pelo
grupo que acompanha a reforma tributária no Conselhão,
o plano segue dois princípios: teto para a carga e
eliminação da cumulatividade dos tributos.
"De
tão elevada, [a carga] tira a competitividade das
empresas brasileiras e estimula a sonegação",
destaca a proposta apresentada ao presidente Lula e ao
ministro. O consultor Antoninho Marmo Trevisan, que
detalhou o documento, diz que o teto deveria ser criado
após a redução do peso dos impostos para patamar
semelhante ao observado em países emergentes. O número
poderia ser entre 22% e 26% do PIB. Em 2006, a carga
ficou em 34,5%.
Trevisan
explica que, com a carga mais baixa e o teto
estabelecido, o governo teria de devolver recursos na
forma de redução de alíquotas toda vez que o
indicador ultrapassar o limite. "Assim como temos
uma trava no gasto, queremos uma trava na receita."
Do CDES,
participam 90 líderes da sociedade civil, entre eles
grandes empresários como Abilio Diniz, do Pão de Açúcar,
Horacio Lafer Piva, da Klabin, e Paulo Skaf, da Fiesp
(Federação das Indústrias do Estado de de São
Paulo).
Minutos
após a apresentação, o ministro da Fazenda descartou
as idéias dos empresários. "A arrecadação tem
subido porque o país cresce mais, há formalização.
Portanto, [o teto] é uma coisa artificial."
Mantega
argumenta que o poder público depende dos recursos
arrecadados para funcionar. Por isso, todo corte deve
ser gradual. "Não podemos, de repente, modificar a
carga. Ela pode até ter vários defeitos, mas
dependemos dela para as ações do governo."
Na
estratégia de cortar impostos gradualmente, Mantega diz
que as decisões serão tomadas "de forma
racional" para ajudar o plano de desenvolvimento
adotado pelo Planalto.
Fonte:
Folha de S. Paulo, de 18/07/2007
Novo
regimento reduz produção no Conselho de Contribuintes
Depois
de ter o regimento interno reformulado, o Conselho de
Contribuintes sofre para se adequar às novas regras,
que trouxeram mais deveres e impuseram restrições à
atuação dos conselheiros que representam os
contribuintes.
Fonte:
Conjur, de 18/07/2007
Advogado
público serve para defender a ordem pública
por
Alexandre Magno Fernandes Moreira
Com a
Constituição de 1988, que instituiu o Estado Democrático
de Direito entre nós, dois órgãos estatais tiveram
sua importância sobejamente reconhecida: o Poder Judiciário
e o Ministério Público. O primeiro tornou-se a instância
por excelência da resolução dos conflitos sociais1.
Mais ainda, foi considerado o fiel da balança no novo
Estado que surgia. Depois de duas décadas de predomínio
quase exclusivo do Poder Executivo, o Judiciário passa
a ser o novo “Poder Moderador”: a “instância
suprema que paira acima das disputas de partidos,
grupos, seitas, idéias e indivíduos” 2.
O Ministério
Público, por sua vez, conseguiu que a Constituição
reconhecesse a autonomia tão almejada, desgarrando-o do
Poder Executivo, a ponto de ser considerado por muitos
como um “quarto poder”. Ao órgão ministerial, foi
incumbida exclusivamente a defesa dos direitos sociais e
individuais indisponíveis, não lhe sendo mais possível
defender os interesses do Estado como pessoa jurídica.
Nos processos em que atua, sua função é de “parte
imparcial”, não estando vinculado à defesa de
interesses pessoais ou partidários3, mas apenas à
defesa da ordem jurídica.
E o
advogado público? A Advocacia Pública foi incluída
entre as funções essenciais à Justiça; portanto, no
mesmo patamar constitucional do Ministério Público.
Apesar disso, a realidade tem-se mostrado oposta à
previsão da Carta Magna. O pagamento de subsídios em
patamar bastante inferior à magistratura e ao Ministério
Público e a ausência de independência funcional do
advogado público são fatores que destoam do tratamento
constitucional dado à carreira.
Por
isso, é relevante se refazer a questão fundamental:
qual a finalidade da Advocacia Pública? Em outros
termos, para que serve o advogado público?
A visão
do senso comum
O senso
comum vai responder a essa questão de modo bastante
simplista: ao contrário do Ministério Público e da
Magistratura, a Advocacia é uma instituição
necessariamente parcial. O objetivo do advogado no
processo não seria buscar a verdade, mas defender a
qualquer custo os interesses de seus clientes, mesmo
que, para isso, precise litigar de má-fé. No imaginário
popular, os termos “advogado” e “ladrão” são
encarados freqüentemente como sinônimos4. E os
advogado públicos seriam aquela categoria de “ladrões”
que têm a atribuição de defender os detentores do
poder, mais exatamente, os agentes políticos, cujo
objetivo primordial seria sugar os recursos da sociedade
para serem usados em prol de seus interesses
particulares.
A
Advocacia, portanto, não seria uma instituição
essencial ao funcionamento da justiça, mas, ao contrário,
um entrave a seu regular funcionamento, ao colocar
interesses particulares acima do interesse público5.
Nesses termos, a Advocacia Pública tem a “sórdida”
finalidade de defender o interesse público secundário
(pertinente ao Estado enquanto pessoa jurídica e, de
modo sub-reptício, aos detentores do poder) contra o
interesse público primário (pertinente à sociedade em
geral), este já defendido pelos “arautos da Justiça”,
os membros do Ministério Público.
A
despeito de muitos advogados, privados e públicos,
corresponderem fielmente ao estereótipo consagrado de
defensor a todo custo de quem quer que seja (desde de
que se pague), essa simplificação grotesca não
resiste a uma análise mais acurada.
A
Advocacia
Primeiramente,
é preciso verificar a advocacia como gênero. Os
advogados são regidos no Brasil por dois diplomas básicos:
o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (EOAB) (Lei
8.906, de 4 de julho de 1994) e o Código de Ética e
Disciplina da OAB (CED) (promulgado pelo Conselho
Federal da Ordem em 1 de março de.1995). Nos dois
instrumentos, não se ignora que o direito e a moral não
são esferas diversas, mas, ao contrário, só se pode
ser juridicamente lícito aquilo que também for
moralmente adequado.
O artigo
1° do CED já dispõe que “o exercício da advocacia
exige conduta compatível com os preceitos (...) da
moral individual, social e profissional”. De modo mais
explícito, o artigo 20 dispõe que “o advogado deve
abster-se de patrocinar causa contrária à ética, à
moral...”. A leitura desses dois dispositivos leva a
uma conclusão inexorável: a advocacia está
estritamente vinculada não apenas às normas legais,
mas também às normas éticas e morais da sociedade
como um todo, da profissão e do próprio indivíduo.
A última
espécie de moral é especialmente cara ao advogado, que
pode recusar-se a defender determinada causa se aquele
patrocínio contrariar seus princípios morais. Aqui a
consciência individual deixa de ser serva do pensamento
dominante para se tornar a referência das ações do
indivíduo. O advogado é um livre-pensador, que tem o
direito de exercer seu mister apenas quando compatível
com o que considera correto. Caso contrário, poderá
invocar a objeção de consciência (incompatibilidade
moral entre o profissional e o serviço a ser prestado).
O
respeito ao foro íntimo do advogado, ou seja, àquilo
que ele considera correto, só pode ocorrer em um
ambiente em que seja garantida sua liberdade, o que é
previsto expressamente pelo artigo 7°, I, do EOAB. Essa
liberdade é tão fundamental ao advogado que o Estatuto
a garante mesmo àquele que esteja empregado. Aliás, o
artigo 18 do EOAB é contundente ao determinar que “a
relação de emprego (...) não retira a isenção técnica
nem reduz a independência profissional inerentes à
advocacia”. Portanto, não existe poder hierárquico
do empregador sobre o advogado empregado no tocante às
suas manifestações, que devem estar sempre protegidas
de quaisquer desmandos.
O
advogado público, além de expressamente regido pelo
EOAB (art. 3°, § 1°), também deve obedecer, no âmbito
federal, às disposições da Lei 8.112, de 11 de
dezembro de 1990 (Estatuto dos Servidores Públicos
Federais), nos termos do art. 27 da Lei Complementar 73,
de 10 de fevereiro de 19936.
A situação
do advogado público
Torna-se
necessário verificar se os dispositivos citados
aplicam-se também aos advogados públicos federais ou
se o regime jurídico do servidor público da União
veta a independência funcional a esses profissionais.
Primeiramente,
é relevante perceber que a administração pública tem
seus princípios expressamente previstos na Constituição
Federal (art. 37, caput), quais sejam: legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Dentre eles, releva o princípio da legalidade, segundo
o qual os agentes públicos só podem fazer aquilo que
esteja expressamente previsto em lei. Nesse sentido, é
o magistério de Pietro (2003, p. 67):
“Este
princípio, juntamente com o controle da administração
pública pelo Poder Judiciário, nasceu com o Estado de
Direito e constitui uma das principais garantias de
respeito aos direitos individuais. Isto porque a lei, ao
mesmo tempo em que os define, estabelece os limites da
atuação administrativa que tenha por objetivo a restrição
ao exercício de tais direitos em benefício da
coletividade.”
Ora, a
legalidade dos atos administrativos deve ser verificada
exatamente por aqueles profissionais qualificados para o
mister: os advogados públicos. Essa verificação é
exatamente o controle interno dos atos administrativos,
previsto expressamente pela Constituição (art. 74).
Antes, durante ou mesmo depois da expedição desses
atos, é indispensável que o advogado público
verifique sua legalidade7. Para o efetivo exercício do
controle interno, é indispensável que exista independência
do profissional que o realize, sob pena de se tornar
suscetível a pressões políticas em sentido contrário
ao prescrito no ordenamento jurídico.
Não se
pode desconhecer que um dos poderes inerentes à
administração pública é o poder hierárquico,
segundo o qual os ocupantes de cargos de hierarquia
inferior devem obediência àqueles que ocupam cargos de
hierarquia superior. A gravidade da hierarquia é tanta
que um dos deveres dos servidores públicos é
“cumprir as ordens superiores, exceto quando
manifestamente ilegais” (Lei 8.112/90, art. 116, IV),
cujo descumprimento implica sanção de advertência
(art. 129).
Porém,
o poder hierárquico deve ser interpretado
sistematicamente, verificando-se a compatibilidade do
exercício desse poder com a natureza da função do
advogado público. A resposta claramente é negativa,
como se depreende da doutrina de Pietro (2003, p.
92-93):
“Pode
haver distribuição de competências dentro da organização
administrativa, excluindo-se da relação hierárquica
com relação a determinadas atividades. É o que
acontece, por exemplo, nos órgãos consultivos que,
embora incluídos na hierarquia administrativa para fins
disciplinares, por exemplo, fogem à relação hierárquica
no que diz respeito a suas funções. Trata-se de
determinadas atividades que, por sua própria natureza,
são incompatíveis com uma determinação de
comportamento por parte do superior hierárquico.”
Ressalte-se
que o advogado público deve obedecer à hierarquia da
entidade em que atua, mas apenas em questões puramente
administrativas, como escala de férias, distribuição
de processos e fixação de horários. Essa hierarquia
desaparece quando se trata do conteúdo das manifestações
do advogado público, que tem a liberdade de expressão
garantida como qualquer advogado. Assim, a chefia tem a
prerrogativa de distribuir os processos que considerar
mais pertinentes a cada subordinado, mas não pode, de
maneira alguma, determinar qual a peça a ser feita em
determinado caso e nem os argumentos jurídicos a serem
utilizados nessa petição. É possível, inclusive, que
não seja feita peça nenhuma, de acordo com um juízo
de legalidade e mesmo de efetividade da medida. Nesses
casos, porém, torna-se indispensável a motivação da
negativa de ajuizamento da petição, nos termos do
artigo 50, I, da Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
Portanto,
o advogado público conta com verdadeira independência
funcional, que, a despeito de não estar prevista
expressamente na Constituição Federal, pode ser
inferida a partir de seus dispositivos, como o princípio
da legalidade e a exigência de controle interno da
administração pública. Trata-se de um verdadeiro
princípio constitucional implícito8 que regula não só
a atividade dos advogados públicos, mas também toda a
administração pública, que deve obediência aos
ditames do Estado Democrático de Direito.
Porém,
a independência funcional do advogado público não é
a finalidade de seu trabalho, mas apenas o instrumento
que possibilita atingir seu objetivo, que é o mesmo de
qualquer agente público: satisfazer o interesse público
primário, ou seja, o bem geral da coletividade, que, no
Estado Democrático de Direito, é efetivado na observância
do ordenamento jurídico.
E se o
chamado “interesse público secundário”, que diz
respeito ao Estado enquanto pessoa jurídica, contrariar
o verdadeiro interesse público, que diz respeito a toda
a coletividade? Os advogados públicos só terão uma opção:
atender ao interesse público primário, impedindo que o
Direito seja violado pelos detentores do poder,
realizando o controle preventivo de legalidade ou, se
consumado o ato ilícito, deve sugerir sua anulação e
mesmo, se for o caso, denunciar o responsável ao Ministério
Público por crime contra a administração pública (Código
Penal, art. 312 a 327) ou por ato de improbidade
administrativa (Lei 8.429, de 2 de junho de 1992).
Então,
para que serve mesmo o advogado público? Não é apenas
a defesa das entidades estatais, que é secundária e só
poderá ocorrer se essas agirem de acordo com a lei.
Antes disso, sua finalidade precípua é simplesmente a
defesa da ordem jurídica9.
Notas de
rodapé
1 - Um
dos grandes fenômenos sociológicos brasileiros das últimas
décadas é exatamente a jurisdicionalização das
lides. Muitos consideram que somente o Poder Judiciário
tem legitimidade para resolver os litígios. Um dos
efeitos dessa ideologia é o gigantesco número de
processos em trâmite.
2 -
CARVALHO, Olavo de. O Partido Imperial. O Globo, 13 de
março de 2004. Não por acaso, Edson Vidigal, Ministro
do Superior Tribunal de Justiça, declarou na abertura
dos trabalhos do Poder Judiciário em 2006, que “o
Supremo, sendo o guardião da Constituição, não pode
recusar a sua função de poder moderador da República”
(in http://www.stj.gov.br/webstj/Noticias/detalhes_noticias.asp?seq_noticia=16340.
Acessado em 7.4.2007).
3 - A
imparcialidade ministerial é uma qualidade nem sempre
alcançada. Nesse sentido: “Consideradas as investidas
contra autoridades do governo federal, de 180 Ações de
Improbidade Administrativa ajuizadas entre 1994 e 2007,
cerca de 95% tiveram como alvo integrantes do primeiro
ou segundo escalão do governo Fernando Henrique
Cardoso.” (in http://conjur.estadao.com.br/static/text/53417,1.
Acessado em 7.4.2007).
4 - No
anedotário popular, as piadas de advogados
costumeiramente relacionam a profissão com
desonestidade. Aproveito para narrar um acontecimento de
minha adolescência em Patrocínio (MG): depois de falar
a minha mãe que eu não seria médico como ela sonhava,
ouvi o apelo: “Faça qualquer outra coisa meu filho,
mas não Direito, porque advogado é tudo ladrão!”.
5 - Essa
concepção é tão arraigada que se tornou necessária
a criação do Instituto de Defesa do Direito de Defesa
(IDDD) para demonstrar à sociedade a indispensabilidade
do direito à ampla defesa.
6 - A
classificação dos advogados públicos entre os
servidores públicos é bastante duvidosa, pois sua
topografia constitucional (função essencial à Justiça)
é semelhante à do Ministério Público, que é
composto por agentes políticos. Além disso, a
Constituição prevê em seu art. 135 que os membros da
Advocacia Geral da União serão remunerados por subsídio,
retribuição pecuniária típica de agentes políticos.
Nesse sentido, veja-se o excelente artigo publicado na
Revista da Procuradoria Geral do Estado do Acre: A
Advocacia Pública no Estado Democrático de Direito.
Reflexões jurídicas acerca dessa instituição
essencial à Justiça. Disponível em http://www.pge.ac.gov.br/biblioteca/revista/revista3/Advocacia%20Publica.pdf.
Acessado em 9.4.2007.
7 - Por
isso mesmo, a atuação do advogado público não pode
restringir-se aos departamentos jurídicos das entidades
estatais, “torres de marfim” em que se ignora a
atividade realizada no restante da entidade. O advogado
público torna-se necessário em todos os departamentos
de cada entidade exatamente para evitar a edição de
atos administrativos contrários à lei.
8 - Os
princípios constitucionais implícitos são
pacificamente reconhecidos pela doutrina. Nesse sentido:
“Os grandes princípios de um sistema jurídico são
normalmente enunciados em algum texto de direito
positivo. Não obstante, (...) tem-se, aqui, como fora
de dúvida que esses bens sociais supremos existem fora
e acima da letra expressa das normas legais, e nelas não
se esgotam, até porque não têm caráter absoluto e
estão em permanente mutação.” (Barroso, 1999, p.
149).
9 - Em
termos substanciais, não há diferença entre a
atividade exercida pelo membro da Advocacia Pública e
pelo membro do Ministério Público. A ambos cabe
defender a ordem jurídica. A diferença reside apenas
no modo em que essa defesa é realizada. Não é à toa
que até a Constituição de 1988, as duas instituições
exerciam basicamente as mesmas funções. Além disso, a
atividade ministerial tem o mesmo caráter daquela
exercida pelo Poder Executivo, já que o objetivo desse
poder é exatamente executar a lei de ofício.
Referências
bibliogra´ficas
-
BARROSO, Luiz Roberto. Interpretação e aplicação da
Constituição. São Paulo: Saraiva, 1999.
-
CARVALHO, Olavo de. O Partido Imperial. O Globo, 13 de
março de 2004.
-
CASTRO, Caterine Vasconcelos de; ARAÚJO, Francisca
Rosileide de Oliveira; TRINDADE, Luciano José. A
Advocacia Pública no Estado Democrático de Direito.
Reflexões jurídicas acerca dessa instituição
essencial à Justiça. Disponível em http://www.pge.ac.gov.br/biblioteca/revista/revista3/Advocacia%20Publica.pdf.
Acessado em 9.4.2007.
- CHAER,
Márcio. Acionistas do PT. Ações do MPF têm governo
FHC como alvo. Disponível em http://conjur.estadao.com.br/static/text/53417,1.
Acessado em 7.4.2007.
-
PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo.
São Paulo: Saraiva, 2003
-
VIDIGAL, Edson. Disponível em http://www.stj.gov.br/webstj/Noticias/detalhes_noticias.asp?seq_noticia=16340.
Acessado em 7.4.2007.
Sobre o
autor
Alexandre
Magno Fernandes Moreira: é procurador do Banco Central
em Brasília e professor de Direito Penal e Direito
Processual Penal na Universidade Paulista. É também
editor do site http:// www.alexandremagno.com.
Fonte:
Conjur, de 18/07/2007