O IPT chega a
isentar o Metrô da verificação da estabilidade das
estruturas —segundo o estudo, o Consórcio Via Amarela
era responsável por todos os riscos da construção. À
companhia, cabia apenas o acompanhamento das frentes de
serviço. Ao falar da modalidade empregada na contratação
da obra —o chamado “turn key”, ou chave na mão—, o laudo
atribui à falta de experiência do Metrô o fato de não
ter sido avaliada adequadamente “a possibilidade de ter
uma participação maior no processo do projeto e
construção da obra”.
De acordo com o
documento, a companhia limitou-se a designar técnicos
para verificar se a construção obedecia às
características do projeto contratado. “A posição do
Metrô de São Paulo foi a de que a sua interferência no
desenvolvimento do projeto poderia servir de pretexto
para o CVA [Consórcio Via Amarela] pleitear prazos e
recursos adicionais ou, de outro, para o CVA se eximir
da responsabilidade que contratualmente lhe cabia”,
aponta o laudo.
Pontos estranhos
O instituto
confirma no laudo ter sido contatado pelo governador
José Serra (PSDB) no dia seguinte ao acidente para
investigar as razões do colapso, em reunião com
diretores do Metrô e da Secretaria dos Transportes
Metropolitanos. Mais tarde, em 2 de abril de 2007, um
TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado pelo
Ministério Público com os envolvidos referendou o IPT
para a elaboração do laudo técnico.
Há mais pontos
no laudo que causam estranheza. Um deles, que lista em
ordem hierárquica os “clientes” da obra, põe o Metrô
como co-gestor do projeto e isenta o governo do Estado
de São Paulo e a Secretaria de Transportes
Metropolitanos de participação, porque “não se inserem
no contexto de gestão da obra, pois pode-se considerar
que ambas as participações não apresentam poder de
decisão específico o bastante para ligar-se (sic) de
forma direta às atividades executadas”. O Metrô, ainda
que responsável, “era contratualmente impedido de
observar e acompanhar os aspectos de segurança”.
Especialistas
Para os
especialistas em direito administrativo ouvidos por
Última Instância, que conversaram com a reportagem
analisando os aspectos jurídicos em questão, ao
contrário do que afirma o IPT, em acidentes como esse, o
Poder Público deve responder objetivamente pelo dano,
mesmo que o laudo não aponte as responsabilidades
diretas dos agentes políticos. “Ao descrever as causas,
o IPT pode identificar falhas do projeto na execução e
na qualidade dos materiais. Mas, quanto ao projeto e à
execução, a responsabilidade é do órgão que contratou,
uma responsabilidade objetiva”, pondera Marcio
Cammarosano, advogado especializado em direito
administrativo e professor da PUC-SP (Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo).
Assim como
Cammarosano, Toshio Mukai —professor doutor pela
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e
autor, entre outros, do livro “Licitações e Contratos
Públicos”— e Aristoteles Atheniense —presidente por duas
vezes da OAB-MG (Ordem dos Advogados do Brasil em Minas
Gerais) e vice-presidente da OAB nacional— afirmam que o
Estado só não seria responsabilizado se o acidente
tivesse ocorrido por causas naturais.
Por ironia, o
laudo apresentado anteriormente pelo Consórcio Via
Amarela, realizado pelo consultor independente inglês
Nick Barton, ex-pesquisador do Norwegian Geotechnical
Institute e especialista em túneis em rocha, tem essa
leitura: segundo o documento, uma rocha de 15 mil
toneladas não detectada pelos estudos teria provocado o
aparecimento da cratera. “A responsabilidade [do Estado]
só deixaria de existir em casos de imprevisibilidade. O
Estado assumiu tarefas e a sua responsabilidade é
objetiva”, afirma Atheniense. “A situação de risco foi
provocada em razão da obra”, acrescenta Mukai.
Esses
especialistas têm cuidado ao analisar uma possível
parcialidade do IPT, pois avaliam que o instituto goza
de enorme credibilidade e transcende à esfera da
influência governamental. “Não acredito em laudo sob
encomenda”, diz Cammarosano.
Presidente da
SBDP (Sociedade Brasileira de Direito Público), Carlos
Ari Sundfeld também afasta a hipótese de parcialidade do
IPT, mas vai na contramão dos demais. Para ele, a
responsabilidade é de quem não alertou sobre os riscos
dos aditamentos sugeridos —neste caso, a missão de
verificar as inconformidades seria do consórcio.
Sundfeld diz que a simples aceleração da obra não seria
suficiente para determinar de quem é a culpa. “Há alguma
discussão [sobre a culpabilidade do Metrô], mas é um
exagero. É preciso um técnico para dizer se é possível
assumir um risco. Se assume, assume a responsabilidade.
É a mesma coisa que pedir transplante sem anestesia. Se
o médico fizer, é porque acha que é seguro.”
“Mas o Poder
Público não pode deixar de se incumbir de fiscalizar”,
pondera Cammarosano, para quem qualquer contrato
executado deve ter acompanhamento rígido do Estado. “Há
uma regra: provada a culpa do preposto, provada a culpa
do proponente.”
Por meio de sua
assessoria de imprensa, o IPT informou que não se
manifesta sobre o caso para nenhum veículo de
comunicação, pois, contratualmente, cabe apenas ao
cliente a divulgação ou não de resultados. O Metrô
informa, em nota publicada em seu site, que tem o
compromisso de “apurar com rigor as causas e
responsabilidades” pelo acidente e que uma equipe
multidisciplinar da companhia que analisa o laudo do IPT
está incumbida de entregar para a Comissão de
Sindicância interna do Metrô os resultados dessa análise
—a previsão é de 45 dias para isso acontecer. À
reportagem, o Metrô disse que a nota que consta em seu
site é suficiente para refletir a posição da companhia.
Fonte: Última Instância, de
17/06/2008
Advogado acredita que STF irá
reverter decisão sobre o amianto
O debate sobre a
proibição ou não do uso controlado do amianto é repleta
de argumentos louváveis de ambas as partes interessadas.
São teses embasadas em estudos científicos e com sólidos
argumentos jurídicos. No meio dessa batalha, estão os
ministros do Supremo Tribunal Federal, que decidirão, no
mérito, se a Lei 12.684/07, do estado de São Paulo, que
proíbe o amianto crisotila, é constitucional.
No dia 4 de
junho, por sete votos a três, os ministros do STF
derrubaram a liminar do ministro Marco Aurélio, que
suspendia os efeitos da lei. Apesar dessa sinalização
dos ministros, que consideraram a questão dos riscos à
saúde em sua decisão, o advogado e ministro aposentado
do Supremo Maurício Corrêa acredita na possibilidade de
mudança na posição do tribunal. Corrêa é advogado da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria
(CNTI), que entrou com a Ação Direta de
Inconstitucionalidade contra a lei paulista.
A liminar foi
derrubada porque os ministros do STF não dispõem de
informações suficientes sobre a questão, acredita
Corrêa. Ele sustenta que os estudos científicos não são
conclusivos sobre a segurança de fibras alternativas.
“Não é adequada a proposta de substituição de um
material amplamente conhecido cientificamente e para o
qual já existem controles de processos e equipamentos de
proteção, por outros que representam pontos de
interrogação”, afirma.
Para o
ex-ministro, o Supremo irá invadir a competência do
Executivo e do Legislativo se declarar constitucional a
lei que proíbe o amianto com base no argumento dos
riscos à saúde. O tribunal, argumenta o advogado, foi
apenas questionado sobre a constitucionalidade formal de
uma lei estadual que entra em conflito com norma
federal. “Não cabe ao Judiciário aferir esse risco à
saúde, não é esse o papel do juiz e do STF.”
Leia entrevista
ConJur — Quais
as conseqüências da decisão do Supremo sobre a lei que
proíbe o amianto em São Paulo?
Maurício Corrêa
— É preciso esclarecer que esse julgamento refere-se
apenas à liminar deferida pelo ministro Marco Aurélio. O
tribunal preferiu não ratificar a decisão monocrática e,
assim, a lei paulista voltou a ter eficácia. A
deliberação é precária. Ela não pode ser considerada
definitiva, o que somente ocorrerá no julgamento de
mérito. Enquanto isso, em São Paulo fica proibido o uso
do amianto crisotila, permanecendo válida a autorização
dada pela Lei Federal 9.055/95 para o resto país. Mesmo
em São Paulo pode haver discussão sobre qual lei
prevalece. Mas isso terá que ser resolvido caso a caso
pelo Judiciário.
ConJur — A
decisão indica a tendência dos ministros de proibir o
amianto. É possível reverter o quadro?
Maurício Corrêa
— Tenho grande esperança. Com a instrução do processo e
a oitiva das partes interessadas, os ministros terão
outra visão do tema e decidirão de maneira diversa. No
caso específico houve um desvio processual que limitou a
informação disponível.
ConJur — Qual
foi esse desvio?
Maurício Corrêa
— A confederação questionou a lei paulista apenas sob a
ótica de sua inconstitucionalidade formal, alegando que
São Paulo estava disciplinando normas já reguladas pela
União. Esta é que detém a preferência normativa segundo
as regras constitucionais de competência concorrente
previstas no artigo 24 da Constituição. No entanto,
provocado pelos interessados na proibição do amianto, o
STF mudou sua análise para questão de mérito. Tangenciou
o objeto da ação e passou a analisar se o amianto
crisotila é ou não prejudicial à saúde. O Supremo
concluiu que os possíveis riscos justificariam a
manutenção da lei paulista. Fez isso sem ouvir o outro
lado. Se as entidades que defendem o amianto soubessem,
a questão seria debatida sob visão diversa. Elas
apresentariam suas razões e demonstrariam que não se
sustentam afirmativas que embasam posições assumidas
pelos juízes.
ConJur — A
mudança de enfoque era previsível?
Maurício Corrêa
— É a primeira vez que isso ocorre no STF. A ADI discute
apenas o seguinte: com a lei federal em vigor, pode um
estado legislar sobre produção e consumo com uma norma
oposta à fixada pela União? A resposta que se esperava
do tribunal era sim ou não. E o mais provável é que
fosse um sim, como indicavam precedentes em casos
análogos e até idênticos. Por exemplo, o caso da lei do
Paraná que queria limitar o uso de sementes transgênicas.
O STF disse que não podia, porque afrontava a lei
federal sobre o tema. Em momento algum se cogitou
debater a constitucionalidade da norma da União, pois
não era objeto da ADI. Não se discutiu na oportunidade
se as sementes transgênicas eram prejudiciais à saúde.
Por isso, não era previsível essa mudança de orientação
do Supremo sobre o amianto. Mesmo assim, ele resolveu
debater a constitucionalidade da lei federal, que não é
objeto da ADI. No mínimo, o julgamento deve ser suspenso
para que a Confederação se manifeste sobre o novo viés.
Haveria maior respeito ao devido processo legal e ao
contraditório. Fazendo uma metáfora ao gosto do
presidente Lula: é como se o árbitro resolvesse mudar as
regras no intervalo jogo, mas avisasse só a um dos
times.
ConJur — O que
poderia justificar uma mudança no posicionamento?
Maurício Corrêa
— São aspectos que não ficaram suficientemente
esclarecidos. Um dos argumentos jurídicos deduzidos foi
o de que a Convenção 162 da Organização Internacional do
Trabalho, da qual o Brasil é signatário, permitiria a
proibição do amianto crisotila. A trajetória de
aplicação da convenção foi apresentada de modo
incompleto. Diz o artigo 3º da norma que a legislação
nacional deve prever medidas preventivas dos riscos à
exposição profissional ao amianto. A Lei 9.055/95 e o
Decreto 2.350/97 fazem exatamente isso, e com extremo
rigor. Isso sem falar nas normas coletivas de trabalho,
nas quais patrões e empregados estabelecem os padrões de
controle e segurança mais eficazes que os
internacionais. O mesmo artigo 3º estabelece que a
legislação nacional deverá ser submetida à revisão
periódica por causa do desenvolvimento técnico e
científico.
ConJur — Mas o
governo está discutindo essa questão?
Maurício Corrêa
— O Executivo, que em última análise é responsável pela
saúde da população, criou uma Comissão Interministerial
para estudar o assunto. Composta pelos ministros do
Trabalho, Saúde, Meio Ambiente, Minas e Energia e
Desenvolvimento, a comissão não chegou a um consenso
sobre o banimento do amianto. Certamente porque não há
razão plausível, seja porque o uso controlado do amianto
é seguro, seja porque não existe alternativa inofensiva
à saúde. De todo modo, um relatório foi enviado à Casa
Civil para continuidade dos estudos. Além disso,
tramitam no Congresso mais de uma dezena de projetos
dando novos contornos ao tema. Portanto, está sendo
cumprido o compromisso assumido pelo Brasil de rever
periodicamente a legislação nacional sobre amianto.
ConJur — E a
possibilidade de se substituir o amianto?
Maurício Corrêa
— O artigo 10 da convenção fala ainda que, quando
viáveis do ponto de vista técnico, a legislação nacional
promoverá a substituição do amianto por produtos
alternativos. Mas desde que eles sejam definidos como
inofensivos ou menos perigosos. A avaliação científica
deve ser feita pela autoridade competente, que não é o
STF. Aqui está o perigo na trilha iniciada pelo Supremo,
pois as fibras alternativas não podem ser consideradas
inofensivas. Em 2005, a Organização Mundial da Saúde
reuniu pesquisadores em Lyon, na França. O relatório
decidiu que não há conclusões finais sobre a indicação
científica de uma substância que possa substituir o
amianto sem riscos à saúde. É preciso de mais pesquisas
para afirmações conclusivas. Há relatos de grande
incidência de câncer em trabalhadores das fábricas que
utilizam fibras substitutas como os de fábricas têxteis
de Quebec pesquisadas em 1994. Diante desta situação, os
países signatários da convenção não são compelidos a
aplicar o artigo 10.
ConJur — É
possível dizer que o amianto é inofensivo?
Maurício Corrêa
— Não estamos afirmando isso. A fibra de amianto
crisotila — assim como outras fibras respiráveis — pode
se tornar perigosa se não for utilizada de forma
responsável. Se observados os cuidados previstos em
normas internacionais — no Brasil, elas são mais
rigorosas — o potencial dano à saúde é perfeitamente
eliminável. Não é adequada a proposta de substituição de
um material amplamente conhecido cientificamente e para
o qual já existem controles de processos e equipamentos
de proteção, por outros que representam pontos de
interrogação. Vale trocar o certo pelo duvidoso?
Certamente não. Ninguém, em sã consciência, defenderia o
uso do crisotila se ele não tivesse controle. Diversos
países permitem o uso controlado e seguro do crisotila.
Como exemplo, temos Estados Unidos, Canadá, Rússia,
Emirados Árabes, Índia e Ucrânia. Se é verdade que 42
países já baniram o amianto, outros 150 o utilizam.
Mesmo em países da Europa, que têm norma proibitiva, o
crisotila continua sendo usado para fins específicos,
como a produção de cloro. Isso demonstra que não há a
certeza quanto à lesividade do amianto. São meias
verdades que acabam virando verdades. Os ministros do
STF farão uma ampla reflexão sobre todas essas variáveis
e decidirão a partir de uma gama completa e real de
informações.
ConJur — Há
estudos que mostram os riscos do amianto, enquanto há
outros que informam o contrário. Não existe algo mais
palpável que traria uma decisão mais segura?
Maurício Corrêa
— Por trás desse tema há uma enorme batalha comercial,
na qual interesses econômicos contrapostos apresentam-se
evidentes. De um lado está o mercado de fibrocimento de
amianto e, de outro, o das fibras alternativas. Até as
pesquisas científicas merecem análise cuidadosa, pois
podem estar a serviço de um grupo. Mas está em andamento
um amplo estudo no Brasil que pode emprestar aos
ministros o embasamento técnico seguro. Trata-se da
pesquisa intitulada Exposição ambiental ao asbesto:
avaliação do risco e efeitos na saúde. Ela foi feita por
quatro universidades brasileiras (USP, Unifesp, Unicamp
e UFG) e duas canadenses (McGill e British Columbia). O
trabalho visa subsidiar o governo sobre o assunto.
Busca-se a consolidação do conhecimento científico sobre
o tema, segundo a realidade brasileira. A pesquisa dará
ao governo, Congresso e ministros do Supremo um
instrumento científico real e isento, fundamental para a
tomada de decisão. Com o choque de estudos
contraditórios, não é razoável que o Brasil se precipite
e assuma o risco desnecessário de acolher um ou outro.
ConJur — Quais
são as conseqüências no caso da proibição definitiva do
amianto?
Maurício Corrêa
— Na remota hipótese de isso ocorrer, a conseqüência
imediata será econômica, com o fechamento de fábricas,
em especial as de telhas e caixas d’água. Haverá redução
de empregos, diminuição na arrecadação de impostos e o
fechamento da terceira maior mina do mundo em Minaçu
(GO). O estado também terá que indenizar os donos dos
direitos de exploração da reserva. Também me preocupam
os desdobramentos dessa decisão em médio prazo. O
Supremo atuará como legislador positivo usurpando
atribuição do Legislativo. Certamente será instado a
proibir de imediato o consumo de cigarro,
inquestionavelmente cancerígeno. Assim como as
atividades de trabalho que envolvam benzeno, formol,
chumbo e outras mais perigosas que o amianto crisotila.
Passaríamos a viver um estado de insegurança jurídica
insustentável, provocando toda espécie de riscos
imponderáveis na atividade econômica. Não cabe ao
Judiciário aferir esse risco à saúde, não é esse o papel
do juiz e do STF. Cabe às autoridades executivas e aos
representantes do povo, que com o auxílio dos
cientistas, dar a palavra final. O Congresso é o foro
adequado para decidir esse tema.
Fonte: Conjur, de 17/06/2008
Cai prazo de cobranças do INSS
Uma das disputas
tributárias mais importantes que já passaram pelo
Supremo Tribunal Federal (STF) acaba de ser julgada em
caráter definitivo e com a vitória dos contribuintes. O
processo questionava o prazo de dez anos de que o INSS
dispunha para impetrar ações judiciais com o objetivo de
cobrar contribuições previdenciárias devidas ao órgão.
Esse prazo foi
fixado em 1991 pela Lei 8.212 - a Lei Orgânica da
Seguridade Social. As empresas recorreram à Justiça
alegando que o prazo de prescrição ou "decadência"
concedido ao INSS deveria ser de cinco anos, como ocorre
com os demais tributos. Também argumentavam que regras
gerais sobre tributos só podem ser estabelecidas por lei
complementar, uma vez que o Código Tributário Nacional (CTN)
fixa o prazo de decadência em cinco anos. A
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) alegou que
o prazo de dez anos para cobrança de contribuições
previdenciárias não é regra geral, mas específica,
criada para facilitar a arrecadação do órgão.
O STF rejeitou
esse argumento e decidiu que o prazo de cinco anos
previsto pelo CTN é válido para a cobrança de todos os
impostos, inclusive para as contribuições
previdenciárias. O Supremo não só manteve a
interpretação das instâncias inferiores da Justiça, que
vinham declarando inconstitucional o artigo da Lei
Orgânica da Seguridade Social que prevê o prazo de dez
anos, como decidiu transformar sua decisão em súmula
vinculante. Atualmente, tramitam nas diferentes
instâncias do Judiciário 300 mil ações de cobrança da
dívida ativa previdenciária, no valor total de R$ 150
bilhões.
Para se ter
idéia da importância dessa decisão, com ela o INSS deixa
de ter fundamento legal para cobrar cerca de R$ 95
bilhões. Compõem esse total R$ 12 bilhões já cobrados
indevidamente das empresas e que o INSS teria de
devolver, R$ 21 bilhões em contribuições que estão sendo
cobradas por via administrativa, R$ 20 bilhões de
contribuições parceladas e R$ 42 bilhões inscritos na
dívida ativa.
Para evitar que
a decisão do STF tivesse um impacto devastador e
imediato sobre as contas públicas, após o julgamento do
mérito da questão a PGFN pediu ao Supremo a aplicação da
chamada "modulação dos efeitos da decisão". Esse
instrumento jurídico permite a não-retroatividade do
entendimento da Corte. No caso, tornaria válidos todos
os atos praticados durante a vigência da regra dos dez
anos de prescrição para a cobrança de contribuições
previdenciárias devidas e, com isso, o INSS não teria de
devolver as contribuições já pagas.
A "modulação" é
uma importante inovação na legislação processual. Por
meio dela a Justiça fixa uma data a partir da qual as
decisões judiciais passam a ter efeito, evitando-se com
isso os riscos de incerteza jurídica e tensão
institucional que as mudanças de jurisprudência podem
causar. O mecanismo foi utilizado pela primeira vez em
2004, quando o STF, ao julgar uma ação interposta pelo
Ministério Público de São Paulo contra o município de
Mira Estrela, limitou o número de vereadores da cidade,
mas decidiu aplicar a regra só a partir da legislatura
seguinte. Desde então, a "modulação" foi aplicada quatro
vezes.
No julgamento do
caso do INSS, a Corte acolheu parcialmente o pedido da
PGFN, ficando no meio-termo entre a posição da União e a
posição das empresas. Em resumo, a Corte dispensou o
INSS de devolver aos contribuintes os R$ 12 bilhões já
recolhidos com base no prazo declarado inconstitucional,
mas obrigou o órgão a renunciar a R$ 83 bilhões em
contribuições que ainda estão em fase de cobrança
administrativa ou judicial.
A decisão
agradou às duas partes. "O mais danoso para o Fisco
seria ter de devolver o que já foi recolhido", diz o
procurador-adjunto da Fazenda Nacional, Fabrício Soller.
Os advogados ficaram satisfeitos não só por causa da
vitória no mérito, que reduziu o prazo de prescrição de
dez para cinco anos, no âmbito do INSS, mas também
porque seus clientes poderão recuperar parte dos valores
que estão sendo discutidos em via administrativa.
A decisão do STF
mostra que as inovações processuais advindas com a
reforma do Judiciário estão produzindo resultados
positivos, descongestionando os tribunais e dando às
pessoas e empresas a indispensável segurança jurídica.
Fonte: Estado de S. Paulo, de
16/06/2008
Aumento para INSS vai a plenário
A emenda de
autoria do senador Paulo Paim (PT-RS) determinando que
os benefícios previdenciários tenham o mesmo índice de
reajuste do salário mínimo avança na Câmara. A votação
do texto, em comissão especial na semana passada, corria
risco de ser anulada por erro processual. Análise
técnica, porém, diz que a votação foi correta. Assim,
após análise do parecer dos técnicos pelo presidente da
Câmara, Arlindo Chinaglia, o texto vai a plenário.
Os governistas
estão numa saia-justa. Por causa do forte impacto da
medida sobre as contas públicas, eles têm de trabalhar
para impedir a votação. Porém, não querem ficar na
posição impopular de ser contra os aposentados, ainda
mais em ano eleitoral. Por isso, buscam um meio-termo:
querem engavetar o projeto e propor nova regra de
correção das aposentadorias maiores que o mínimo. Se não
for possível paralisar a votação, o projeto seguirá para
o plenário e, caso aprovado, para sanção do presidente
Lula. Para evitar um rombo nas contas públicas, ele será
forçado a vetá-lo. Os governistas querem evitar esse
desgaste político.
"Defendo que
haja correção para as aposentadorias maior que a
correção da inflação, como é hoje. Estamos trabalhando
nisso", disse o deputado Gilmar Machado (PT-MG). Segundo
ele, há dificuldade para aprovação da emenda do senador
Paim porque o impacto seria grande nos gastos da
Previdência. Uma das hipóteses é estender para os
pagamentos de até três salários mínimos a correção pelo
índice de inflação mais o crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB), previsto para os benefícios equivalentes a
um mínimo. "Acima desse valor, seria um reajuste
escalonado", disse Machado.
O governo quer
ganhar tempo para negociar uma proposta e a aprovação da
emenda de Paim surpreendeu os aliados. Ontem, depois de
uma reunião da base, os líderes aliados evitavam tratar
do assunto. "O PT não tem posição. A gente vem
defendendo um aumento mais substancial acima do piso",
limitou-se a dizer o líder do PT, deputado Maurício
Rands (PE).
"As coisas mais
polêmicas vamos deixar para agosto. Estamos tentando
fazer uma pauta de convergência, vamos deixar a questão
das aposentadorias para depois", afirmou o líder do PP,
Mário Negromonte (BA).
A comissão
especial, presidida por Júlio Delgado (PSB), aprovou a
emenda na quarta-feira, aproveitando o espaço de duas
sessões extraordinárias que discutia a criação da CSS.
Quando perceberam, governistas tentaram anular a reunião
com reclamação a Chinaglia, o que motivou a análise da
votação pela secretaria da Mesa.
Fonte: Estado de S. Paulo, de
18/06/2008
Serristas barram investigação
sobre Alstom
A base aliada do
governo José Serra (PSDB) na Assembléia Legislativa de
São Paulo frustrou ontem nova tentativa da oposição de
usar a CPI da Eletropaulo para investigar suspeitas de
corrupção em contratos assinados entre a empresa e a
Alstom, antes da privatização da companhia, em 1998.
Em maioria na
CPI, os governistas rejeitaram todos os requerimentos
apresentados pela oposição, que pretendia convocar para
depor ex-diretores da Eletropaulo e obter cópias de
contratos e relação de pagamentos feitos pelo Estado à
Alstom e suas subsidiárias.
A CPI foi criada
para apurar a privatização da Eletropaulo. Porém, com os
indícios de corrupção levantados por promotores suíços,
a oposição tentou levar o caso para a comissão.
Com o fim
próximo da comissão, cujo prazo de esgota no dia 30, a
oposição praticamente desistiu de investigar a Alstom
via CPI. Na semana passada, aliados já haviam obstruído
a investigação, o que contrariou uma orientação pública
de Serra, de que todas as suspeitas deveriam ser
apuradas.
Ontem, a CPI
ouviu David Zylbersztajn, secretário de Energia do
Estado e presidente do conselho de administração da
Eletropaulo durante o período em que foram negociados
contratos com a Alstom colocados sob suspeita por
investigadores suíços.
Zylbersztajn só
foi depor, na condição de testemunha, porque havia sido
convocado ainda no ano passado, antes das suspeitas
envolvendo a Alstom. Na CPI, ele negou que tivesse algum
poder de decisão sobre contratos e só se irritou no
final, durante entrevista.
O ex-secretário,
hoje dono de uma empresa prestadora de serviços na área
energética, encerrou a entrevista ao ser questionado se
conhecia o empresário Romeu Pinto Júnior, apontado como
o dono da "offshore" MCA Uruguay, que teria recebido
recursos da Alstom para pagar propinas a políticos.
A sessão, porém,
ficou boa parte do tempo restrita a um bate-boca entre o
presidente da CPI, José Mentor (PT), e o relator, João
Caramez (PSDB), sobre a prerrogativa da comissão de
entrar no caso Alstom, já que foi criada com outra
finalidade.
"Há uma
blindagem para evitar que se atinja o governo de São
Paulo, o Serra e principalmente o [ex-governador
Geraldo] Alckmin", disse Enio Tatto (PT), irritado com a
rejeição dos requerimentos.
Em resposta, o
tucano Caramez afirmou: "Não adianta querer justificar o
injustificável. Todos [os requerimentos] fogem do objeto
da CPI".
Fonte: Folha de S. Paulo, de
18/06/2008
Farmácias catarinenses podem
vender outros produtos
A Drogaria e
Farmácia Catarinense, de Jaraguá do Sul (SC), pode
comercializar produtos que não são drogas e
medicamentos. O entendimento é da 3ª Câmara de Direito
Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
A empresa entrou
com a ação porque a Vigilância Sanitária da cidade negou
o alvará. O desembargador Luiz Cézar Medeiros, relator
do caso, embasou a decisão na Lei 9.069/95, que trata do
Plano Real, para comprovar a legalidade da vendas desses
produtos por lojas de conveniência e drogarias.
Segundo o
contrato social da empresa, ela pertence a esta
categoria e cumpre as exigências legais, mantendo os
produtos considerados não correlatos separados dos
medicamentos. Para Medeiros, não há motivo para negar os
alvarás já que a atividade da drogaria é plenamente
legal.
Questão no
Supremo
Nesta semana, o
governador de São Paulo, José Serra (PSDB), recorreu ao
Supremo Tribunal Federal para tentar impedir que
farmácias e drogarias vendam produtos que não sejam
remédios. A ação questiona a Lei Estadual 12.623/07, que
permite a venda de filmes fotográficos, pilhas,
cosméticos.
A Lei Federal
5.991/73 estabelece os conceitos de farmácia e drogaria
e delimitou sua atividade comercial. Elas detêm a
exclusividade na comercialização de drogas e
medicamentos. Em contrapartida, não podem comercializar
produtos de outra natureza, argumenta Serra.
Fonte: Conjur, de 18/06/2008
STF já julgou o mérito de cinco
temas com repercussão geral
Desde o dia 30
de abril de 2008, quando o Plenário do Supremo Tribunal
Federal (STF) julgou pela primeira vez um Recurso
Extraordinário (RE) submetido ao filtro da repercussão
geral, cinco temas relevantes já foram decididos pela
Corte, em sede de Recurso Extraordinário. A importância
dos temas decididos definitivamente pelo Supremo, nos
recursos extraordinários, fica comprovada na edição das
últimas súmulas vinculantes, uma vez que as matérias
discutidas nos processos foram sumuladas.
O dispositivo da
repercussão geral, criado em 2004 pela Emenda
Constitucional 45, possibilita que o Supremo deixe de
apreciar recursos extraordinários que não tenham maiores
implicações para o conjunto da sociedade. É um filtro
que permite ao STF julgar somente os recursos que
possuam relevância social, econômica, política ou
jurídica. Ao mesmo tempo, determina que as demais
instâncias judiciárias sigam o entendimento da Suprema
Corte, evitando o encaminhamento de milhares de
processos idênticos ao STF.
Adicional de
insalubridade e salário mínimo
No julgamento do
Recurso Extraordinário 565714 o Plenário decidiu negar
provimento ao recurso por entender que a vinculação do
adicional de insalubridade ao salário mínimo ofende a
Constituição Federal, mas a alteração da base de cálculo
por via de interpretação jurídica não é possível. Este
foi o primeiro RE em que foi reconhecida a repercussão
geral. A ação, proposta na primeira instância por
policiais militares paulistas, pretendia que o estado
passasse a usar, como base de cálculo do adicional por
insalubridade, o total dos vencimentos recebidos pelos
servidores, e não o salário mínimo, como determinava a
Lei Complementar 432/85, de São Paulo.
Portanto, a
Súmula Vinculante repetiu a conclusão do julgamento do
RE, isto é, mantendo o salário mínimo como indexador e
base de cálculo do adicional de insalubridade até a
edição de nova lei.
Súmula
Vinculante n º 4
“Salvo os casos
previstos na Constituição Federal, o salário mínimo não
pode ser usado como indexador de base de cálculo de
vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser
substituído por decisão judicial”
Serviço militar
e remuneração abaixo do salário mínimo
Ao julgar o
Recurso Extraordinário (RE) 570177, o STF reconheceu a
repercussão geral do tema e entendeu que é
constitucional o pagamento de valor inferior ao salário
mínimo para os jovens que prestam serviço militar
obrigatório. O RE foi interposto por um recruta contra a
União e alegava que o pagamento de valor inferior ao
mínimo violava o disposto nos artigos 1º, incisos III e
IV; 5º, caput; e 7º, incisos IV e VII, da Constituição
Federal. Os ministros entenderam que os militares se
submetem a um regime jurídico próprio que não se
configura com os servidores públicos civis.
Súmula
Vinculante nº 6
“Não viola a
Constituição o estabelecimento de remuneração inferior
ao salário mínimo para as praças prestadoras de serviço
militar inicial”
Contribuição
social - prazo para recolhimento
No julgamento
dos REs 556664, 559882, 559943 e 560626, os ministros do
STF decidiram, por unanimidade, declarar a
inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei
8.212/1991, por entender que apenas lei complementar
pode dispor sobre normas gerais em matéria tributária –
como prescrição e decadência, incluídas aí as
contribuições sociais. No julgamento desses recursos o
Plenário decidiu declarar a inconstitucionalidade de
normas que fixavam prazos diferentes de prescrição e
decadência de contribuições sociais, assim, a União não
pode cobrar, em nenhuma hipótese, fora dos prazos
previstos no CTN para todos os tributos. Já os
contribuintes que não pagaram, não precisam pagar mais.
Quanto aos contribuintes que pagaram, há modulação de
efeitos diferenciando duas hipóteses: a) Quem pagou no
prazo estendido, mas impugnou antes do julgamento de
11/06/08: pode receber a devolução (efeitos ex tunc da
decisão de inconstitucionalidade, ou seja, passam a
valer desde a edição da lei); b) Quem pagou no prazo
estendido e não impugnou até 11/06/2008: não tem direito
de receber a devolução (efeitos ex nunc da decisão de
inconstitucionalidade, isto é, os efeitos valem a partir
da decisão).
Daqui para
frente todo contribuinte que no futuro pagar fora do
prazo pode pedir a devolução por pagamento indevido.
Súmula
Vinculante nº 8
“São
inconstitucionais os parágrafo único do artigo 5º do
Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei
8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de
crédito tributário”
Agilidade no
julgamento da repercussão geral
No julgamento
dos REs 580108 e 582650, a maioria dos ministros aplicou
uma questão de ordem levantada pela ministra Ellen
Gracie, na qual ficou entendido que a repercussão geral
será reconhecida pelo Plenário da Corte a recursos
extraordinários que discutem matérias já pacificadas
pelo STF, sem que esses processos tenham de ser
distribuídos para um relator.
Assim, os
recursos extraordinários que versem sobre matérias já
julgadas pelo STF serão enviados para a Presidência do
STF, que levará a questão ao Plenário antes da
distribuição do processo. Caberá aos ministros, no
julgamento colegiado, aplicar a jurisprudência da Corte;
rediscutir a matéria ou; simplesmente, determinar o
seguimento normal do recurso, caso se identifique que a
questão não foi ainda discutida pelo Plenário.
Reserva de
Plenário - Declaração de Inconstitucionalidade
O RE 580108
trata do dispositivo constitucional que dispõe sobre a
reserva de plenário. Nela se determina que, somente pelo
voto da maioria absoluta de seus integrantes, os
tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de lei
ou ato normativo do poder público.
A edição de
súmula vinculante sobre este tema encontra-se em análise
pela Corte.
Aplicação do
antigo limite de juros a 12% ao ano
Já o julgamento
do RE 582650 resultou na Súmula Vinculante nº 7, na qual
ficou decidido que o parágrafo 3º do artigo 192 da
Constituição Federal, um dispositivo que já foi revogado
e que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha
sua aplicabilidade condicionada à edição de lei
complementar. Ou seja, determina que esse dispositivo da
Constituição não era auto-aplicável. A partir da data de
sua publicação no Diário de Justiça, a nova súmula
vinculante passará a ser aplicada a todos os processos
que versem sobre essa questão.
Súmula
Vinculante nº 7
“A norma do
parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição, revogada
pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa
de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade
condicionada à edição de lei complementar”
Fonte: site do STF, de 18/06/2008
STF julga uso de interrogatório
por videoconferência
O plenário do
Supremo Tribunal Federal vai definir a
constitucionalidade da utilização do interrogatório por
videoconferência. Na quinta-feira (19/6), os ministros
podem julgar pedido de Habeas Corpus que requer a
nulidade de interrogatório feito com base na lei
paulista que disciplina a tomada de depoimentos à
distância. A decisão vale para o caso concreto, mas pode
abrir precedentes. Em agosto do ano passado, os
ministros Cezar Peluso, Eros Grau, Celso de Mello e
Gilmar Mendes já se manifestaram contra o instrumento
por falta de previsão legal.
A Defensoria
Pública de São Paulo quer reformar a decisão da 5ª Turma
do Superior Tribunal de Justiça, que rejeitou Habeas
Corpus para Fábio Firmino dos Santos. O argumento de
nulidade do interrogatório pelo sistema de
videoconferência não convenceu os ministros. Agora,
direcionado ao Supremo, o pedido tem o mesmo argumento.
Segundo a defesa, o interrogatório por videoconferência
não equivale ao interrogatório ao vivo que garante a
“autêntica comunicação” entre juiz e investigado. Ainda
de acordo com a Defensoria Pública, a presença física do
réu no interrogatório também está garantida pelo Pacto
de São José da Costa Rica.
De acordo com o
artigo 1º da Lei Estadual 11.819/05, questionada no HC,
“nos procedimentos judiciais destinados ao
interrogatório e à audiência de presos, poderão ser
utilizados aparelhos de videoconferência, com o objetivo
de tornar mais célere o trâmite processual, observadas
as garantias constitucionais”.
O advogado
criminalista Alberto Zacarias Toron disse ao site
Consultor Jurídico que a lei paulista “é
inconstitucional porque a matéria só pode ser objeto de
regulação por meio de lei federal”. Para o advogado, o
sistema pode ser utilizado apenas se houver concordância
da defesa.
O advogado e
professor de Direito Penal da USP Pierpaolo Cruz Bottini
considera que o interrogatório dessa forma fere os
princípios do Direito Processual Penal. “A presença
física do interrogando, quando réu preso, é fundamental
e indispensável”, afirma. Bottini lembra que o
interrogatório é um ato de defesa e que pode ser
cerceado, pelo fato de o réu estar distante do juiz. “Há
uma certa dificuldade de produção de provas. A
videoconferência também impõe dificuldade se o réu
quiser relatar algo de sua condição de preso ou algum
problema vivido dentro do cárcere”, destaca. Ele defende
o uso da videoconferência somente para testemunhas. “É
um meio válido para ouvir alguém no exterior, por
exemplo.”
Miguel Pachá,
sócio do Tostes e Asssociados Advogados e desembargador
aposentado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
também defende a utilização da videoconferência só na
oitiva de testemunhas.
O criminalista
David Rechulski também ressalta que a presença física do
acusado é de fundamental importância para que o juiz
possa perceber a sinceridade, a dissimulação e o
nervosismo, por exemplo, diante das perguntas
formuladas. “Essas impressões são realmente importantes
e não deixam de compor parte do mecanismo de formação do
livre convencimento do julgador, que juntamente com os
demais elementos de prova existentes nos autos, ajudará
na sua convicção para absolver ou condenar o acusado”,
afirma o advogado.
Garantias
fundamentais
Em agosto do ano
passado, a 2ª Turma do STF anulou o processo contra um
condenado a mais de 14 anos de prisão por extorsão
mediante seqüestro e roubo a partir do interrogatório. O
relator do caso (HC 88.914), ministro Cezar Peluso,
entendeu que o interrogatório por videoconferência viola
os princípios constitucionais do devido processo legal e
da ampla defesa.
Segundo Cezar
Peluso, “a adoção da videoconferência leva à perda de
substância do próprio fundamento do processo penal” e
torna a atividade judiciária “mecânica e insensível”. O
ministro frisou que o interrogatório é o momento em que
o acusado exerce seu direito de autodefesa. Peluso
esclareceu que países como Itália, França e Espanha
utilizam a videoconferência, mas com previsão legal e só
em circunstâncias limitadas e por meio de decisão
devidamente fundamentada
No Brasil, ainda
não há lei que regulamente o interrogatório por
videoconferência. “E, suposto a houvesse, a decisão de
fazê-lo não poderia deixar de ser suficientemente
motivada, com demonstração plena da sua excepcional
necessidade no caso concreto”, afirmou o ministro.
Os argumentos em
favor da videoconferência, que traria maior celeridade,
redução de custos e segurança aos procedimentos
judiciais, foram descartados pelo ministro. “Não posso
deixar de advertir que, quando a política criminal é
promovida à custa de redução das garantias individuais,
se condena ao fracasso mais retumbante.”
O ministro Celso
de Mello acompanhou o entendimento do relator. Para o
decano do STF, o direito de presença real do acusado
durante o interrogatório e em outros atos da instrução
processual tem de ser preservado pelo Poder Judiciário.
O ministro Eros Grau também seguiu o voto de Cezar
Peluso. Gilmar Mendes afirmou, na ocasião, que só o fato
de não haver lei que autorize videoconferência já revela
a ilegalidade do procedimento.
Em julho de
2007, em decisão monocrática, a ministra Ellen Gracie
entendeu que a videoconferência não ofende suas
garantias constitucionais. Isso mostra que a matéria
ainda não é pacífica na Corte.
No STJ
O Superior
Tribunal de Justiça concedeu, pelo menos, duas decisões
contra o interrogatório por videoconferência. Na decisão
mais recente, a desembargadora convocada no STJ e
relatora da matéria, Jane Silva, defendeu que é por meio
do interrogatório com a presença física do juiz e do réu
que poderão ser extraídas as minuciosas impressões
necessárias para o julgamento do caso.
É também
pessoalmente que se pode observar se o réu está em
perfeitas condições físicas e mentais, segundo ela. Jane
Silva concluiu que o interrogatório deve ser feito
sempre na presença do juiz e do réu para satisfazer o
princípio do contraditório e da ampla defesa, como prevê
a Constituição Federal.
Na ocasião, a
desembargadora afirmou que não se trata de desvalorizar
o papel do desenvolvimento tecnológico no processo, como
dizem os defensores do interrogatório online. Para Jane
Silva, para a realização do interrogatório, não é
possível preterir a presença de juiz e acusado frente a
frente.
HC 92.590
Fonte: Conjur, de 17/06/2008