14/01
STF julga 'em bloco' e põe fim a
milhares de processos
O Supremo
Tribunal Federal (STF) fez uma alteração pontual em seu
regimento interno e, com apenas três julgamentos,
resolveu 10.316 processos judiciais no ano passado. O
número representa 8,5% do total das ações que
ingressaram no tribunal em 2007 e 6,8% de todos os
processos julgados pelos ministros no ano. Os chamados
julgamentos "em bloco" ou "múltiplos" permitem que o
Supremo resolva de uma forma rápida os inúmeros
processos repetitivos que chegam diariamente aos
gabinetes dos ministros e que atravancam o bom
funcionamento da corte.
A Emenda
Regimental nº 20, de 16 de outubro de 2006, prevê que o
Supremo leve ao pleno uma série de processos idênticos -
até então, em casos repetitivos a tradição era levar a
julgamento no máximo três ou quatro processos idênticos,
número que pode chegar a milhares com a nova regra.
Durante o julgamento, há um limite total de apenas 30
minutos para que os advogados das partes façam a defesa
- até a mudança no regimento, o advogado de cada uma das
ações tinha disponíveis 15 minutos.
Na estréia do
novo sistema, em 9 de fevereiro, foram decididos de uma
só tacada 4.845 processos sobre a disputa em torno do
cálculo do valor da pensão por morte concedida pelo
INSS. Outros dois casos que se beneficiaram do
julgamento em bloco foram as disputas sobre a limitação
dos juros de mora em ações de servidores contra a União
e sobre a exigência de depósito prévio em recursos
fiscais administrativos.
O julgamento de
ações em massa no Supremo, ainda que reconhecido como
uma saída para o excesso de processos na corte, gera
apreensão entre advogados diante do risco de jogar na
vala comum casos com peculiaridades ou aspectos
processuais próprios. Por outro lado, pode ter um
impacto significativo se utilizado, por exemplo, em
disputas tributárias como a do alargamento da base de
cálculo da Cofins, julgado inconstitucional pelo Supremo
em 2005. Como a decisão foi dada em um recurso
extraordinário, só vale para a parte envolvida no
processo julgado - e as demais empresas que questionam o
tema na Justiça precisam aguardar o trânsito em julgado
de suas ações no Supremo para reverter provisões dos
balanços ou levantar depósitos judiciais.
Fonte: Valor Econômico, de
14/01/2008
Advogados alertam para peculiaridades das ações
O julgamento em
massa no Supremo Tribunal Federal (STF), ainda que
reconhecido como uma saída para o excesso de processos
na corte, gera apreensão entre advogados devido ao risco
de se jogar na vala comum casos com peculiaridades ou
aspectos processuais próprios. Um caso notório com este
perfil é uma disputa bilionária da Braskem contra a
Fazenda sobre o uso de créditos de matérias-primas
tributadas à alíquota zero de IPI. Apesar de o pleno do
Supremo já ter definido sua posição sobre o tema no
início de 2007, a empresa mantém a disputa na primeira
turma do tribunal alegando problemas no recurso
apresentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional
(PGFN) - detalhe que pode render à empresa R$ 2
bilhões.
Para o advogado
Marco André Dunley Gomes, do escritório Andrade
Advogados Associados, os processos têm peculiaridades no
caso concreto e o julgamento em bloco pode passar por
cima de situações diferentes. "É um dilema do Supremo:
ele gostaria de julgar em massa, tendo em vista a
quantidade de processos que recebe, mas tem que olhar
caso a caso" diz.
O advogado
Marcos Joaquim Gonçalves Alves, sócio do escritório
Mattos Filho Advogados, diz que o julgamento em bloco
traz riscos quando o tema comporta argumentos
específicos, mas nem sempre isso acontece. "A premissa
do Supremo para fazer o julgamento em bloco é a de que a
apreciação no pleno esgota todo o tema", diz.
Recentemente, o Mattos Filho conseguiu que o pleno do
Supremo admitisse reavaliar um processo sobre o aumento
da alíquota de Cofins de 2% para 3% em 1999 - tema
supostamente encerrado em um julgamento de novembro de
2005. Para o sócio do escritório, quando há algum
problema do tipo, cabe ao advogado comprovar que seu
argumento é diferente, e cabe à assessoria de cada
ministro separar de forma adequada os processos para
saber se os casos são realmente idênticos. "É necessário
ler o processo, e não só o seu cadastro", diz. Em uma
decisão monocrática comum, diz, em geral os assessores
lêem os processos, mas nos julgamentos em bloco o risco
de isto não acontecer é maior.
Já o advogado
Tércio Chiavassa, sócio do Pinheiro Neto Advogados,
acredita que o julgamento em bloco é apenas um
aprofundamento da fórmula de julgamentos repetitivos já
adotada em tribunais regionais federais (TRFs) e no
Superior Tribunal de Justiça (STJ). Desde que ela passou
a ser adotada, a responsabilidade dos advogados
aumentou. "É preciso ficar atento, acompanhar o que
entra em pauta e recorrer quando necessário", diz.
Em outras
circunstâncias, o julgamento em bloco poderia ajudar os
contribuintes nas disputas tributárias. Um exemplo disto
é a disputa em torno do alargamento da base de cálculo
da Cofins, declarada inconstitucional em novembro de
2005 pelo Supremo, mas que desde então está sendo
decidida de forma monocrática nos gabinetes dos
ministros. Enquanto isso, as empresas não podem liberar
provisões de milhões de reais em seus balanços, já que
precisam aguardar o trânsito em julgado de seu processo
específico.
Fonte: Valor Econômico, de
14/01/2008
Fiesp teme mudança tributária em SP
A mudança na
forma de tributação de ICMS (Imposto sobre Circulação de
Mercadorias) que a Secretaria da Fazenda paulista
prepara para alguns setores, na qual o imposto é
recolhido na primeira etapa de fabricação do produto
-isto é, pela indústria-, deve ser feita sem pressa, com
prudência e muita responsabilidade, na opinião de Paulo
Skaf, presidente da Fiesp e do Ciesp.
A partir de
fevereiro, a Fazenda paulista decidiu alterar a forma de
tributação de ICMS de quatro setores (bebidas
alcoólicas, medicamentos, perfumaria e higiene pessoal).
A cobrança do imposto será feita pelo sistema de
substituição tributária, na qual o ICMS é cobrado no
início da cadeia produtiva. A partir de março, outros
nove setores passarão a ser tributados dessa forma
(alimentos, ração animal, limpeza, fonográfico, material
de construção, autopeças, pilhas e baterias, lâmpadas e
papel).
"Não somos
contra o sistema de substituição tributária. Mas é
preciso estudar bem o valor que será tributado o produto
e ter a certeza de que a indústria não vai sofrer
concorrência desleal, já que a forma de tributação de
ICMS será diferenciada da de outros Estados", diz Skaf.
O aumento do IOF
(Imposto sobre Operações Financeiras) e da CSLL
(Contribuição Social sobre Lucro Líquido) não altera a
previsão da indústria para este ano, segundo Skaf. Para
ele, a indústria de transformação tem condições de
crescer entre 5,3% e 5,5% em 2008.
O governo,
porém, na sua avaliação, precisa colaborar. "Precisa
gastar menos e bem, implementar as reformas estruturais,
fazer fluir os investimentos, reduzir mais os juros e
tornar a taxa de câmbio mais favorável às exportações.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista com
Paulo Skaf.
FOLHA - Quais
são as perspectivas para a indústria neste ano,
considerando as medidas do governo para compensar o fim
da CPMF?
PAULO SKAF - O
ano de 2007 começou com a indústria extrativa indo muito
bem e a de transformação rateando. No final do ano
passado, a indústria de transformação se recuperou.
Esperamos para 2007 um crescimento do PIB entre 5,2% e
5,3% e, para a indústria de transformação, de 5,5%. Para
este ano, não haveria razões, até o momento, para
acreditar que possa ser diferente. Ou seja, o país deve
crescer uns 5% e a indústria poderá crescer em torno de
5,3% a 5,5%, em média. Alguns setores podem crescer
mais, como o automobilístico, e outros, menos. E a
indústria paulista estaria em linha com a indústria
brasileira.
FOLHA - Os
empresários sempre reclamam que é difícil crescer no
país por conta das elevadas taxas de juros, dos altos
impostos e da taxa de câmbio desfavorável às
exportações. Mesmo assim, a indústria foi muito bem em
2007, o sr. não acha?
SKAF - Não é que
os empresários reclamam. O fato é que o Brasil teve
crescimento medíocre por 20 anos. E, para o país, é
importante acelerar esse crescimento. E, se ele não
ocorria, não era culpa dos empresários, das indústrias.
Finalmente, quando todo mundo valoriza a necessidade de
ter crescimento, o governo anuncia algumas surpresas,
com medidas para compensar o fim da CPMF.
FOLHA - O sr.,
que liderou campanha contra a CPMF, já esperava aumento
de tributos para compensá-la, como o que ocorreu com o
IOF e a CSLL?
SKAF - Não.
Conseguimos mostrar que não haveria necessidade de
aumentar impostos com o fim da CPMF. A Constituição
Federal já previa o fim da CPMF em 31 de dezembro de
2007. O governo, com certo atrevimento, colocou por
conta dele no Orçamento de 2008, que enviou ao
Congresso, a previsão de R$ 39 bilhões de CPMF. Só que
isso já estava errado, já que não poderia prever algo
que a Constituição já dizia que não iria existir. Diria
que não havia a menor necessidade de criar imposto ou
aumentar alíquota de IOF. Não precisaria de R$ 10
bilhões de aumento de impostos. Se o governo já
reconhece que pode absorver R$ 30 bilhões, poderia então
absorver também R$ 40 bilhões. Já era previsto para 2008
um aumento de arrecadação de R$ 80 bilhões. Com o fim da
CPMF, que tirou R$ 40 bilhões de arrecadação, ainda
teria R$ 40 bilhões a mais de arrecadação.
FOLHA - O sr.
acha que essas medidas e outras que poderão vir podem
reduzir o consumo e o crescimento da indústria neste
ano?
SKAF - É um
pouco cedo para falar sobre isso. De qualquer forma, é
lógico que quando você onera o crédito, você inibe a
compra a prazo. Ouvi dizer que as medidas foram tomadas
para reduzir o consumo. Não acredito nisso. O objetivo
foi arrecadar mais R$ 10 bilhões.
FOLHA - A
Fazenda paulista quer mudar o sistema de tributação de
alguns setores, como o de bebidas e o de medicamentos,
para evitar a sonegação fiscal. O que a indústria
paulista acha disso?
SKAF - Não somos
contra a substituição tributária [tributação de ICMS no
início da cadeia produtiva], mas existem duas
preocupações. A primeira é que o índice de valor
agregado tem de ser calibrado. Por exemplo, se um setor
tem um valor agregado de X e o Estado considera que é
3X, pode inviabilizar esse setor. A outra preocupação é
que, como a mudança de tributação será feita só em São
Paulo, se não houver forte fiscalização, as indústrias
paulistas podem ter de enfrentar concorrência desleal de
indústrias de fora do Estado que não recolheram todo o
imposto da cadeia de uma vez. Qual a ferramenta
eficiente que o governo vai oferecer para não expor a
indústria paulista a uma competição desleal, uma vez que
a tributação em São Paulo será diferente da de outros
Estados?
FOLHA - As
indústrias dos setores [bebidas, medicamentos,
perfumaria e higiene pessoal] que terão mudança na
tributação em fevereiro já estão preparadas para
recolhimento do imposto da cadeia?
SKAF - Já havia
discussão com esses quatro setores há alguns meses.
Agora, recomendo que, no caso de outros setores, o
governo não deva ter pressa para implantar a nova forma
de tributação. Já combinamos com o governo que vamos ter
um fórum permanente de discussão na Fiesp sobre isso. O
sistema pode ser implantado, mas com prudência e
responsabilidade.
Não existe
necessidade de ser estabelecido com tanta pressa.
FOLHA - Com o
fim da CPMF, o governo adiou planos para a nova política
industrial prevista para este ano. O que acha disso?
SKAF - Ainda bem
que foi adiada. Deixa eu explicar. O que quero dizer é
que política industrial não deve ser feita a portas
fechadas por um governo, deve ser feita com a indústria.
E não houve discussão com a indústria para elaborar uma
política industrial, que tem de ter o envolvimento das
áreas tecnológica e de educação. Você não tem
desenvolvimento industrial se não tiver formação
profissional. Uma política industrial tem de ser para o
país, não para a Fiesp.
FOLHA - Quais
são os desafios para o setor industrial neste ano?
SKAF - O país
precisa fazer as reformas estruturais, as reformas
tributária e trabalhista, e fazer os investimentos em
infra-estrutura fluírem. Olha o grande problema que
temos nos aeroportos. O Brasil precisa se modernizar, se
desburocratizar. O governo precisa cuidar dos seus
gastos, fazer o máximo com o mínimo possível.
Chegamos à
conclusão, depois de elaborar várias propostas, que o
governo precisa primeiro cortar a receita, que vai
obrigar ao corte de gastos. Agora isso tem de ser feito
com responsabilidade. Os juros no país também estão
entre os mais altos do mundo e podem cair ainda mais. O
fim da CPMF já possibilitaria uma redução dos juros para
manter a taxa efetiva. Se o governo mantiver a taxa na
próxima reunião do Copom, significa que aumentou a taxa.
FOLHA - O sr.
tem aspiração política?
SKAF - O dia em
que sair da Fiesp pode ser que eu vá para o meio
empresarial, não sei, mas não penso nisso hoje. Agora, o
futuro não sabemos, vamos deixar para o destino.
Fonte: Folha de S. Paulo, de
14/01/2008
Fazenda de SP diz que não vai rever as novas regras para
o ICMS
Depois do
adiamento da implantação da substituição tributária para
1º de fevereiro, os setores de medicamentos, perfumaria,
higiene pessoal e bebidas alcoólicas começam as reuniões
com a secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo para
definir margens e tentar chegar a um consenso sobre
alguns detalhes. Procurada, a Fazenda diz que, além das
margens, não deve haver alterações substanciais nas
regras já divulgadas.
"Estamos
trabalhando alguns ajustes finos", diz Hélcio Honda,
assessor jurídico da Federação da Indústria do Estado de
São Paulo (Fiesp). A e entidade tem discutido por parte
de alguns segmentos a implantação da nova sistemática de
recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e Serviços (ICMS) junto à Fazenda paulista. Segundo
Honda, entre os detalhes estão o cálculo da aplicação da
substituição tributária nos estoques, nas compras de
outros Estados e também no prazo de recolhimento do
imposto. "A Fazenda quer o pagamento do no terceiro dia
do mês subseqüente à operação. As empresas querem 60
dias", diz.
Outra
preocupação de alguns segmentos é em relação ao prazo de
1º de fevereiro. As entidades que reúnem as indústrias
ficaram de apresentar as pesquisas para a definição da
margens que deverão ser levadas em consideração para o
pagamento do ICMS por substituição tributária. Em alguns
setores, porém, diz Honda, as pesquisas ainda não
ficaram prontas e não se sabe se haverá tempo de
discussão sobre as margens entre a Fazenda e as empresas
até 1º de fevereiro.
Em nota enviada
ao jornal, porém, a Fazenda do Estado de São Paulo
mantém a data prevista de 1º de fevereiro para a
implantação da substituição tributária, "sem
perspectivas de alterações".
Quanto ao
tratamento dos estoques, diz a Fazenda, há previsão para
a publicação de decreto disciplinando a matéria. "Em
síntese, em que pese as diversas solicitações dos
setores econômicos envolvidos, não haverá, a princípio,
alterações substanciais nas regras já veiculadas", diz a
nota. A Fazenda, porém, diz que espera as pesquisas de
preços dos setores para definir novas margens.
A Associação
Brasileira de Bebidas (Abrabe) encomendou estudo à Fipe
e pretende apresentá-lo ao governo entre os dias 20 e
22. O levantamento para a Associação Brasileira da
Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec)
está sendo feito pela FGV e deve ficar pronto na próxima
semana. Os dois setores pretendem provar que as margens
de valor agregado definidas pela Fazenda - 128% no caso
dos vinhos e 125,54% em higiene e cosméticos - não
condizem com a realidade.
Segundo Fabrízio
Fasano, presidente da Abrabe, a maioria dos importadores
de vinho vende diretamente ao consumidor ou trabalha com
distribuidores, cuja margem oscila entre 30% e 35%. "Se
essa margem for mantida, o setor pára de vender", diz.
"Não somos contra a substituição tributária, mas o que
está acontecendo é um aumento de impostos." Segundo
Fasano, os restaurantes e casas noturnas, que têm
realmente margens bem mais altas, não poderiam entrar
nessa conta, porque o modelo de pagamento de ICMS é
diferenciado: não há crédito e pagam 3,2% sobre o
faturamento. Na sua opinião, o Estado do Rio de Janeiro
- que deve aplicar margem máxima de 50% - está sendo
mais coerente. "Ainda é alta, mas mostra que eles estão
estudando o setor antes de implantar a substituição."
A Abihpec fez
uma simulação com cinco empresas, de pequeno e médio
porte. Aplicaram a margem proposta sobre os meses de
outubro, novembro e dezembro de 2007 e chegaram a um
aumento da carga tributária de 67,84% no setor de
higiene e 80,31% em cosméticos. "Tiraram essa margem da
cartola, ela pressupõe que a sonegação do comércio é
enorme", afirma João Carlos Basílio da Silva, presidente
da Abihpec.
A substituição
tributária já é aplicada em outros setores no Estado,
como combustíveis, automóveis e cerveja, por exemplo.
Nesse sistema, o ICMS é antecipado pela indústria, que
recolhe o imposto devido nas etapas seguintes, até a
venda ao consumidor final. Para viabilizar esse
recolhimento antecipado, os Estados estabelecem as
margens estimadas que devem ser acrescidas ao preço da
indústria para o cálculo do ICMS.
Assim que
estabeleceu as margens que entrariam em vigor a partir
de 1º de fevereiro para os setores de medicamentos,
higiene pessoal, perfumaria e bebidas alcoólicas, houve
reação de alguns segmentos que se queixaram de margens
muito altas. A Fazenda paulista, porém, publicou novo
decreto postergando a aplicação da substituição nos
quatro setores a partir de 1º de fevereiro.
Fonte: Valor Econômico, de
14/01/2008
13/01
1 ano depois, sobreviventes
lembram tragédia do metrô
São Paulo,
sexta-feira, 12 de janeiro de 2007.
O manobrista
Israel Domiciano, 26, deixava mais cedo o trabalho por
causa de um compromisso que protelava havia anos: voltar
à cadeira do dentista. Ele seguia pela rua Capri sem
perceber a presença do promotor de vendas Sebastião
Alves Feitosa Filho, 26, que caminhava de mão dada com a
mulher, Kátia Priscila Nogueira, 20, feliz com a nova
assinatura na carteira de trabalho.
Separado da rua
por um tapume do Consórcio Via Amarela, o motorista José
Arimatéia da Silva, 52, trabalhava com o caminhão nas
obras da linha 4-Amarela do Metrô, em Pinheiros (zona
oeste). Esperava acabar seu turno.
Nenhum dos
quatro se conhecia, mas suas histórias se convergiram às
14h54min06 daquele dia, quando uma cratera se abriu e
engoliu veículos e pessoas. Sete pessoas morreram. Essas
quatro conseguiram escapar, mas por pouco.
Segundos
Mesmo dirigindo
os carros dos funcionários da Editora Abril o dia todo,
Domiciano iria para o dentista de lotação. Quando chegou
à rua Capri, viu o veículo que pretendia tomar subindo
pela rua. "Assoviei, gritei, mas o motorista não ouviu.
Corri atrás, mas ele não parou." O guindaste girando,
ameaçando cair, roubou-lhe a atenção. "Foi Deus. Se ele
pára, ou eles tinham se salvado, ou eu teria caído com
eles no buraco. Foi questão de segundos."
Segundos também
foi o tempo levado pelo casal Sebastião e Kátia para
ultrapassar a aposentada Abigail Rossi de Azevedo, 75,
que também seguia pela rua Capri. "Ela estava na nossa
frente e, como andava bem devagar, passamos por ela.
Saímos da calçada e fomos pelo cantinho da rua", afirmou
ele.
Era a primeira
vez que o casal, morador de Barueri, visitava a região.
Como a sede da empresa fica na rua dos Pinheiros, 870,
não havia outra opção para pegar o trem. "Não escutei
barulho nenhum. Só o chão tremer e aquela fumaça. Só
percebemos que era algo grave quando vimos os
funcionários da obra pulando o tapume. Nós corremos
também", afirmou.
O colega que
daria carona ao motorista José Arimatéia era Francisco
Sabino Torres, 47, o Barnabé. Ambos estavam do lado de
fora de seus caminhões esperando ordem superior para
voltar ao trabalho. A suspensão ocorreu quando surgiu a
suspeita de desabamento. "Ele estava uns cinco metros na
minha frente. Eu não estava perto do buraco: eu caí no
buraco."
José Arimatéia
conseguiu escapar e pensou que o colega teria a mesma
sorte. Barnabé havia ido de carro naquele dia porque
iria trocar seu Corsa por um Celta e não queria entregar
o carro com o tanque cheio. O carro voltou para
Francisco Morato num guincho, já que as chaves estavam
na pochete dele.
Nova chance
Para o
manobrista, evangélico, Deus lhe deu uma nova chance.
"Naquele dia, dez minutos antes, um colega, também
evangélico, me disse: estou sentindo uma coisa estranha.
Eu orei e pedi a Deus que não acontecesse nada de ruim
para mim", disse ele.
A maior
preocupação de Domiciano não era, segundo ele, sua
própria vida. Além de ter dois filhos, sua mulher estava
grávida -assim como a mulher do cobrador da van, Wescley
Adriano da Silva, 22. "Meu filho tem praticamente a
mesma idade do filho dele. Isso foi o que mais me
marcou."
O vendedor
Sebastião, também evangélico, diz considerar-se
agraciado. "Tudo isso foi muito bom porque reuniu ainda
mais a família. Eu estava um pouco afastado, agora
voltei para a igreja", afirmou.
Liliane Cruz
Pereira, 32, conta que o marido, José Arimatéia, nunca
conseguiu mais voltar ao trabalho. Desenvolveu síndrome
do pânico. "Às vezes ele corre pela casa gritando que
não pode dormir porque a terra vai engoli-lo, que vai
morrer soterrado", disse.
Perdeu um filho
de 15 anos cinco meses após o acidente. Com problema no
coração e afastado da empresa, passou a receber pelo
INSS. "Agora, deram alta para ele, mesmo ele estando
doente", afirma ela.
Sem condições de
trabalhar e sem o INSS para ajudar, a família vive das
faxinas que a mulher faz e do dinheiro que parentes
enviam. "O consórcio só paga o medicamento e as
consultas no psiquiatra. Não ajudam em mais nada", disse
ela.
Fonte: Folha de S. Paulo, de
13/01/2008
Para moradores, acordos são "ridículos"
A falta de
amparo por parte do governo estadual e propostas de
acordos consideradas "ridículas" são as principais
reclamações dos parentes das vítimas e moradores ouvidos
pela reportagem da Folha, um ano após a tragédia nas
obras da estação Pinheiros do metrô.
"A nossa família
continua toda desamparada. Cadê o Serra agora? Não
recebemos um telefonema sequer", afirma, em tom
indignado, Marli Aparecida Leite, 40, irmã do motorista
da van morto no acidente.
Ela diz que o
Consórcio Linha Amarela "praticamente forçou um acordo",
aproveitando-se da fragilidade da família. "Do dinheiro
que a minha mãe recebeu de indenização [Marli revela que
foram R$ 70 mil], só conseguimos dar entrada em uma van.
E a gente nem conseguiu transferir o documento ainda."
O representante
do Consórcio Via Amarela, Renato Miranda, diz que o
seguro da obra (estimado em R$ 1,2 bilhão) garantiu o
pagamento das indenizações em menos de 90 dias. Segundo
ele, os parentes das vítimas fatais teriam recebido um
valor muito maior que o apontado pela irmã do motorista.
"Uma indenização por vida [sic] custa de R$ 60 mil a R$
120 mil. As pessoas, nesse caso, receberam pelo valor
máximo", disse, sem detalhar valores.
O comerciante
Silvio Azevedo, 46, no entanto, nega ter recebido o
valor da indenização que o consórcio aponta. Ele, que
perdeu a mãe no desastre, disse que a família nunca
pediu dinheiro ao consórcio. "Posso dizer que [o valor
da indenização] chegou muito longe disso [R$ 120 mil].
Pagaram muito abaixo desse valor."
O Consórcio
Linha Amarela garante que 98% das vítimas já fizeram
acordo sem a necessidade de ir à Justiça. Das 212
pessoas desabrigadas, apenas uma família continua em
hotel.
No total, 55
imóveis tiveram de ser interditados por causa da
cratera. Dez acabaram sendo condenados e outros três
foram demolidos. Desde então, muito mato cresceu, as
ruas da região ficaram ainda mais esburacadas
-principalmente por causa do vaivém de caminhões
pesados- e o comércio ficou às moscas. Só um escritório
de contabilidade e o sobrado de um casal de aposentados
recebem a visita do carteiro.
Além deles, a
família da aposentada Itália de Sousa Pereira, 58,
também tem feito parte do cenário desolador -mais
necessidade do que insistência.
"No dia do
acordo, quem não assinasse teria a diária do hotel
cortada. Eles nos deram até o meio-dia [do dia 18 de
julho] para sair. Eu quase chorei. Fiquei na recepção
durante cinco horas para tentar resolver a dívida de R$
400 que o hotel jogou na minha mão dizendo que a gente
tinha extrapolado o horário", lembra Maysa de Sousa
Pereira, 25, filha da aposentada, que diz ter recebido
uma indenização de R$ 4.000 do Consórcio Linha Amarela,
mas que o dinheiro ficou na mão do proprietário do
imóvel, alugado há 11 anos. Ela se diz insatisfeita com
a indenização. Agora, voltou a ocupar o sobrado na rua
Gilberto Sabino com o irmão, os dois filhos, o marido, o
padrasto e a mãe.
Reuniões
Em nota, a
Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania informou
que o secretário Luiz Antonio Marrey, por determinação
do governador José Serra, participou de cinco reuniões
com moradores e vítimas. O balanço divulgado pela
secretaria aponta que 118 acordos foram assinados e 237
pessoas foram beneficiadas.
Fonte: Folha de S. Paulo, de
13/01/2008
Taxa judiciária é saída para falta de recursos da
Justiça
O desembargador
Nelson Calandra defende a magistratura não apenas como
um dever de ofício de quem preside a maior entidade de
magistrados do país, mas como um ato de fé na carreira
que abraçou há 26 anos. Ele compara o trabalho do juiz
com o do padeiro que tem a obrigação de fazer o pão de
cada dia de sua clientela. “Nosso dever é colocar na
mesa de cada cidadão o resultado do nosso trabalho que é
distribuir justiça”, diz ele com a certeza de que fala
de um sonho possível.
Com experiência
de militância em entidades da magistratura, o
desembargador encara seu trabalho como se fosse o de um
líder de infantaria num campo de batalha. Na sua
opinião, hoje o juiz é um escravo moderno, cobrado a
cumprir metas e obrigado a proferir a cada mês cerca de
160 sentenças.
Calandra
acredita que a Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis)
deve se fortalecer como braço político do Tribunal de
Justiça. Ele defende uma parceria entre a entidade e a
instituição, na qual o TJ cumpre o papel de administrar
a Justiça paulista, enquanto a Apamagis o de pavimentar
o terreno para a execução dos planos administrativos.
Como um otimista
incorrigível, o novo presidente da Apamagis tem fé de
que os problemas do Judiciário paulista estão perto do
fim. As fraquezas do Judiciário não são derivadas da
falta de talento, acredita, mas da ausência de recursos.
“Se alcançarmos os recursos adequados, com certeza nós
venceremos as dificuldades porque o Judiciário é formado
por excelentes magistrados e servidores”, afirmou
Calandra, em entrevista à revista Consutor Jurídico.
A solução
estaria em sensibilizar o Executivo e o Legislativo a
investirem na Justiça. O instrumento para tirar o
Judiciário da penúria pecuniária seria a criação de um
fundo próprio para cobrir as despesas do Tribunal de
Justiça. Esse fundo seria constituído por três fontes
oficiais de recursos: custas processuais, emolumentos e
taxas judiciais.
Cada uma dessas
receitas tem uma finalidade diferente. A taxa judicial é
responsável pela despesa do Poder Judiciário, ou seja,
pela remuneração dos gastos oriundos da prestação
jurisdicional. As custas são cobradas para cobrir o
custo dos atos processuais. Os emolumentos são
destinados ao custeio das atividades extrajudiciais. É
pago quando o cidadão lavra uma escritura ou registra um
imóvel.
Calandra se mira
no exemplo do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
pioneiro na criação de um fundo próprio para cobrir suas
despesas. A medida, prevista na Reforma do Judiciário,
seria a receita para garantir a independência financeira
do Judiciário paulista, acredita Calandra.
Henrique Nelson
Calandra, de 62 anos, nasceu em Itaquaquecetuba (extremo
leste da Grande São Paulo). Formou-se em 1974 pela PUC
de São Paulo. Ingressou na magistratura em 1981 e
assumiu como juiz substituto na comarca de Pirassununga.
Passou pelos três tribunais de alçada, extintos depois
da emenda da Reforma do Judiciário. Chegou ao Tribunal
de Justiça em janeiro de 2005.
Leia a
entrevista
ConJur — São
Paulo tem solução?
Nelson Calandra
— São Paulo tem solução. Eu acho que São Paulo tem
solução porque os nossos problemas não são derivados de
falta de talento, são derivados de falta de recursos. Se
nós tivermos os recursos adequados, com certeza
venceremos as dificuldades porque temos excelentes
magistrados, excelentes servidores. Se o Poder Executivo
e o Poder Legislativo resolverem investir em justiça,
São Paulo continuará tendo o primeiro lugar como
Judiciário pioneiro em todo o Brasil.
ConJur — E como
se resolve o problema da falta de recursos?
Nelson Calandra
— O Poder Judiciário brasileiro é, pela sua dinâmica,
sua organização, o único dos poderes do Estado que reúne
condições de ser auto-sustentável, na medida em que
existe uma taxa judiciária. Se ela for recolhida, o
Judiciário não precisa pedir nada a ninguém, porque ele
próprio arrecadará o suficiente para a sua manutenção. A
taxa judiciária mede o trabalho que dá o processo, ou
deveria medir esse trabalho. O problema é que há
isenções tributárias a favor das municipalidades e o
Judiciário não arrecada por sua intervenção em diversas
áreas, como por exemplo, na questão de crimes
ambientais.
ConJur — E o que
falta para a cobrança da taxa judiciária?
Nelson Calandra
— Precisa de uma reforma legislativa. Nós apresentamos
junto à Assembléia um esboço de anteprojeto de lei que
visa conceder as taxas para o próprio Judiciário. O
Poder Judiciário do Rio de Janeiro hoje é o que está
mais em dia em todo o Brasil. É aquele que tem dinheiro
para emprestar para o Executivo em razão do modo como
gerencia a taxa judiciária. Há muitos anos defendemos
essa tese de independência financeira para o Poder
Judiciário. O desembargador Thiago Ribas Filho, quando
foi eleito presidente do TJ do Rio, fez duas coisas:
unificou os Tribunais antes da Emenda 45, muito antes, e
dotou o Rio da taxa judiciária.
ConJur — São
Paulo já tem um projeto de lei sobre a matéria?
Nelson Calandra
— Nós elaboramos um projeto na Frente Parlamentar pela
Independência do Poder Judiciário. Cabe agora ao
deputado Rodolfo Costa e Silva apresentar o projeto e
tocar em frente. A modificação legislativa pode dar ao
Tribunal de São Paulo a ferramenta necessária para que
ele tenha independência financeira e pague o que deve
aos seus servidores. Não se justifica um Tribunal de
Justiça cometer a injustiça de dever a magistrados e
servidores por salários de tempo antigo. Há dívidas que
remontam a oito anos por diferenças e descompassos com o
Poder Executivo. Precisamos resgatar essa dívida e
modernizar a estrutura administrativa e operacional.
ConJur — As
deficiências da estrutura física são muito graves?
Nelson Calandra
— A situação é precária. Você anda pelo estado e
encontra inúmeros prédios completamente defasados. Temos
que olhar para o nosso público, entender melhor as
partes que vão ao Tribunal, ter instalações adequadas.
Como é que você recebe testemunha para depor no processo
criminal, todo mundo misturado. Às vezes o acusado senta
ao lado da testemunha no corredor de fórum, em um banco
de madeira, sem o menor conforto, sem a menor
assistência. E disso tudo resulta que a Justiça Penal
muitas vezes exerce um papel menor. Talvez se a Justiça
Penal fosse mais eficaz, se houvesse proteção das nossas
testemunhas, se tratássemos melhor a nossa clientela,
talvez o retrato da sociedade seria diferente. Talvez
teria menos gente no presídio, porque a pena tem que
exercer um caráter intimidativo. Então, quando muita
coisa prescreve, muita coisa não é punida, fica aquele
sentimento de impunidade, de descrédito.
ConJur — A
Apamagis e o Tribunal de Justiça estão sob nova direção
que assume num momento de crise da Justiça de São Paulo.
Qual é o papel da Apamagis nesse contexto?
Nelson Calandra
— A Apamagis completará 55 anos de existência. Toda a
sua vida foi pautada por uma luta para que o Poder
Judiciário seja cada vez mais independente. Ela deve
atuar como braço político do Tribunal de Justiça e cabe
à entidade estar na frente de combate, defendendo
propostas que dêem ao Tribunal os instrumentos
necessários para que ele possa distribuir Justiça de
modo rápido, transparente e eficiente. Nós tivemos
situações bastante complicadas no passado. Apesar do
esforço feito nas administrações dos presidentes Luiz
Tâmbara e Celso Limongi, o quadro pode ser comparado a
uma gota d’água em um oceano de dificuldades. Mas vamos
vencer essas dificuldades e apresentar um serviço
judiciário que seja modelar para São Paulo e para o
país.
ConJur — A
Apamagis deixa, assim, de ser apenas uma representação
sindical e corporativa para se transformar no braço
político do Tribunal. É isso?
Nelson Calandra
— Na verdade, uma entidade de classe como a Apamagis
trabalha em duas vertentes: o lado corporativo e o lado
político-administrativo. O primeiro não pode ser
esquecido, porque os magistrados e magistradas são de
carne e osso, têm suas necessidades elementares que
precisam ser atendidas. Há muitos espaços em que ocorre
um desencontro entre planos administrativos traçados
pelo Tribunal e aquilo que vai nortear as ações em
primeiro grau. Uma coisa é você fazer um plano de
trabalho maravilhoso desenvolvido por uma entidade de
administração como a Fundação Getúlio Vargas, e outra
coisa é você ter uma base concreta onde esses planos
serão aplicados, onde o juiz tem dificuldade com falta
de servidores, falta de recursos materiais. Então nós
precisamos olhar para isso também. Nós temos que ver a
situação daqueles que constituem a infantaria dentro do
Judiciário, aqueles que estão realmente no campo de
batalha.
ConJur — Mas
deixar para trás o trabalho da FGV não é um retrocesso?
Nelson Calandra
— A Fundação Getúlio Vargas tem expertise de matéria
administrativa, não precisamente em relação à
administração pública. Foi positiva a experiência na
iniciativa privada para dar um choque de modernidade, de
práticas inovadoras. Mas, muitas vezes quem desenha
essas práticas inovadoras não considera as dificuldades
que nós temos. Nós magistrados enfrentamos dificuldade
de nos adaptar a determinadas práticas, porque estamos
acostumados a viver em um mundo de papel, e hoje o mundo
não é mais de papel. O mundo de trabalho, o mundo
operacional da magistratura transita dentro da
informática, com recursos que até então eram
desconhecidos. Eu olho para o Poder Judiciário cartorial
cheio de papéis e carimbos e eu vejo que esse sistema
está no fim. Isto acabou. Daqui para frente nós teremos
um Judiciário informatizado, onde os processos vão
transitar por meio eletrônico e o juiz terá que ter uma
velocidade muito maior de decisão. A modernidade
reclama, primeiro, instrumentos eletrônicos de decisão,
efetividade da norma jurídica. O único contrato que o
povo brasileiro não pode rescindir é a Constituição
Federal. Então nós temos que aprender a respeitar a
Constituição, a respeitar as leis, a tratar as causas
com grande objetividade. O brasileiro tem mania de
querer dar jeito para tudo. Tem coisas que não tem
jeito, o jeito é cumprir a lei.
ConJur — Como é
que fica o juiz? A gente sabe que se no Tribunal existem
todos esses problemas, na primeira instância eles podem
ser ainda maiores.
Nelson Calandra
— Eu costumo dizer que a aplicação da jurisdição penal
requer mais do que qualquer coisa um gesto de heroísmo
por parte dos juízes e juízas. As condições materiais
são péssimas, nós temos funcionários devotados, mas nos
falta aquele suporte necessário, base física correta,
local para trabalhar. Nós fizemos a opção pelo Juizado
Especial, mas nos falta estrutura. O juiz trabalhava na
sua Vara durante o dia, à noite fazia Juizado, e uma vez
por semana colégio recursal. Então o juiz ficava
extremamente sobrecarregado. Agora criamos os cargos do
Juizado Especial, criamos cargo de auxiliar, mas, com
todos os cargos criados, ainda assim é insuficiente pelo
volume de trabalho que nós temos.
ConJur — Por
quê?
Nelson Calandra
— Porque o modo como se trabalha, o volume de papel que
nós manuseamos e tudo isso faz com que o processo
demore. Então o juiz trabalha no limite da suas forças.
É um volume de trabalho desumano. Raro é o magistrado
que, pela carga de trabalho que tem, não seja obrigado a
trabalhar aos sábados e domingos. Você tem uma
estatística para cumprir, você tem metas. Hoje um
magistrado não pode dar menos de 120, 160 sentenças de
mérito não repetitivas por mês. Em um tribunal nós
andamos também mais ou menos com a mesma meta, com um
diferencial, que nós temos ainda votos de revisão e
votos de terceiro juiz. Portanto os nossos 120 são 120
vezes três, que você tem que estar lendo o que o outro
vai decidir, ouvir, pedir vista, falar e votar.
ConJur — O
senhor acha que precisaria de uma administração
profissional no Tribunal?
Nelson Calandra
— Eu conheço bem esse assunto, porque militei na União
Internacional de Magistrados e conheci a experiência de
diversos países. No meu ponto de vista, nós não podemos
separar a alta administração da decisão. Eu me lembro
que na Venezuela havia pena de morte e o presidente da
Suprema Corte dizia assim: “Eu posso condenar o réu à
morte, mas não posso comprar café para servir para você,
porque eu tenho que pedir para o Conselho Superior da
Magistratura que é quem administra as contas autorização
para comprar um quilo de café”.
ConJur — Mas não
é justamente por isso que deveria haver juízes para
julgar e administradores para administrar o Tribunal?
Nelson Calan dra
— A administração superior tem que ser exercida de fato
pelo Tribunal, com o concurso de técnicos
especializados. Administrar é mais uma parcela do poder.
Tem muito juiz que diz que o juiz não sabe administrar.
Mas quando ocupa a presidência do Tribunal, o juiz não
pode se restringir exclusivamente à função de julgar.
Senão ele dá margem para que se crie um poder paralelo
onde aquilo que é preconcebido para ser um poder do
Estado acaba subjugado por aqueles que vão exercer a
administração. A administração é instrumento para o
exercício do poder. As deliberações têm que partir
daqueles que têm a incumbência de exercer o poder. Os
que foram encarregados pelo Estado de exercer o poder
não podem delegar deliberações em matéria de
administração de forma plena para pessoas que não são
magistrados.
ConJur — Em
outras palavras, o senhor não abre mão do poder pleno do
magistrado administrar.
Nelson Calandra
— Pleno. Porque nós somos responsáveis. Se amanhã alguma
coisa sair errado, o presidente do Tribunal é quem
responde com a sua própria liberdade, com seu próprio
nome. Então, na medida em que ele delega as coisas e vai
espraiando essa delegação e deixa de exercer o controle
político dessa atividade de administrar, ele acaba
extremamente fragilizado e provoca fissuras em um poder
de Estado que deve ser exercido com autonomia, com
independência.
ConJur — O que é
a Apamagis?
Nelson Calandra
— A Associação Paulista de Magistrados é uma entidade
que procurou ao longo dos anos se firmar como entidade
de classe, sem descuidar da parte assistencial aos
magistrados e aos seus familiares. Nós temos hoje 2.800
associados aproximadamente.
ConJur — Num
universo de quantos magistrados do estado?
Nelson Calandra
— De cerca de três mil, se contar ativos e inativos. Nós
temos mais de duzentos magistrados fora da Apamagis. Na
última gestão, batemos todos os recordes de adesão
quanto aos juízes novos, mais de 90 % dos novos juízes
ingressaram na entidade. Hoje a Apamagis tem um
patrimônio de mais de R$ 40 milhões. Tudo isso foi
construído ao longo dos anos, o que dá a ela lastro
financeiro para as suas operações.
ConJur — Em
termos institucionais o que incomoda hoje a
magistratura?
Nelson Calandra
— Uma coisa que incomodou, por exemplo, foi a tentativa
de construção de um Código de Ética para juízes. Porque
essa atividade tem que vir através do Estatuto da
Magistratura pelo Supremo Tribunal Federal. Cabe ao
Supremo Tribunal Federal, e não ao CNJ, dispor sobre o
Estatuto da Magistratura. Há coisas que acabam vindo
através de uma atividade do CNJ, que de algum modo,
extravasa a sua competência constitucional e invade a
competência do Supremo Tribunal Federal. Os magistrados
às vezes se sentem incomodados com essa intervenção,
porque, por qualquer banalidade as pessoas recorrem ao
CNJ. A prova é que São Paulo é campeão de reclamações
junto ao Conselho, porque se difundiu entre todos a
cultura de que qualquer insatisfação com o Judiciário
tem que ser revista pelo CNJ, quando este tem uma
atividade de controle administrativo e não uma atividade
jurisdicional.
ConJur — Ou
seja, o CNJ estaria usurpando o papel da Corregedoria?
Nelson Calandra
— De algum modo sim. O que deveria ir ao CNJ é aquilo
que fica sem resposta ao nível de Corregedoria. Diante
de qualquer situação banal, a pessoa vai ao CNJ e toca o
juiz responder à Corregedoria para o CNJ. E nós já temos
uma carga monstruosa de trabalho. Cada um de nós escreve
por mês o equivalente a um livro de 700 páginas, na
média. E além de tudo isso, ainda ter que prestar
informações ao CNJ, à Corregedoria Geral de Justiça,
muitas vezes a políticos, porque as pessoas também vão
reclamar nas Assembléias, nas Câmaras Federais, para cá
para lá. A gente também recebe ofícios pedindo
esclarecimentos. Nós nunca deixamos de esclarecer. Mas à
custa de uma sobrecarga imensa de trabalho. E gastando
recursos que deveriam ser destinados a melhorar o
próprio processo.
Fonte: Conjur, de 13/01/2008
A Justiça e a crise prisional
Uma decisão
singular de um juiz da Vara de Execuções Criminais de
Tupã, pequena cidade do oeste do Estado, a 534
quilômetros da capital, impondo critérios bastante
rígidos para que os estabelecimentos penais da região
possam receber novos presos, confirma a dramática
dimensão da crise do sistema prisional do Estado de São
Paulo e do País. Proferida no dia 4 de janeiro, a
sentença vale para as Penitenciárias de Lucélia,
Pacaembu e Junqueirópolis e para o Centro de Progressão
Penitenciária de Pacaembu.
Nela o juiz
determina que a partir de agora esses quatro
estabelecimentos penais não mais poderão receber presos
que não morem na região da Alta Paulista. Segundo o juiz
Gerdinaldo Quichaba Costa, essas penitenciárias somente
poderão acolher presos que residam num raio de 200
quilômetros. Com essa decisão o juiz proíbe as quatro
penitenciárias, já superlotadas, de receberem presos
acima de sua capacidade de lotação.
E, reconhecendo
a impossibilidade de se cumprir imediatamente sua
decisão, acrescenta na sentença que "todos os
cidadãos-presos que excederem o limite, mas que já se
encontram na unidade prisional, poderão permanecer nela,
até que, paulatinamente, se alcance o limite. Depois
disso, as celas só poderão exceder a capacidade em 8%".
As quatro unidades penais têm cerca de 3,1 mil vagas,
mas abrigam mais de 5,5 mil presos. "Os presos são
jogados dentro das celas como objetos", diz o juiz
Gerdinaldo Costa na sentença, após descrever as
condições degradantes a que são submetidos.
Segundo ele, as
medidas que tomou são previstas pela Lei de Execução
Penal e têm por objetivo acabar com a violação dos
direitos humanos da população carcerária e "abrir o
debate sobre a regionalização dos presídios". Costa
alega que muitos presos das penitenciárias da região da
Alta Paulista são de famílias pobres da Grande São
Paulo, que não dispõem de condições financeiras para
visitá-los semanalmente, o que prejudica os trabalhos de
reeducação e de ressocialização. "É uma viagem de até 9
horas, que custa caro e a família - companheira, esposa,
pais, filhos e irmãos - não pode bancar. Isso gera a
crueldade da pena, na medida em que o cidadão-preso fica
(...) concretamente impedido de receber a visitação com
a freqüência devida. Essa distância acaba gerando uma
pena de banimento", acrescenta o juiz Gerdinaldo Costa
em seu despacho.
Sua sentença foi
elogiada pelo Ministério Público Estadual, pela
Defensoria Pública do Estado e pelo conselho seccional
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Contudo, como
era de esperar, o governo estadual anunciou que irá
recorrer ao Tribunal de Justiça, sob a alegação de que,
se os estabelecimentos penais da Alta Paulista não
puderem receber mais presos enquanto não forem
construídas novas unidades prisionais na região, os
juízes das varas de Execuções das cidades que a integram
não poderão julgar réus acusados de crimes violentos,
como homicídio, latrocínio, seqüestro ou estupro.
Além disso, há
no governo quem reclame de excesso de rigidez do juiz da
Vara de Execuções de Tupã. Segundo as autoridades
carcerárias, se por um lado a obrigatoriedade de colocar
presos em penitenciárias nas regiões em que vivem ajuda
o trabalho de reeducação e ressocialização, por outro
impede a Secretaria de Administração Penitenciária de
distribuir os integrantes de uma quadrilha pelos
diversos estabelecimentos penais, seja para evitar que
continuem comandando seus "negócios" a partir das celas,
seja para coibir a formação de facções criminosas. Uma
das estratégias para desarticular o Primeiro Comando da
Capital (PCC) foi colocar seus líderes em diferentes
prisões distantes de suas áreas de atuação.
Com um déficit
de mais de 40 mil vagas e várias unidades comportando o
triplo de sua capacidade de lotação, a já dramática
crise do sistema prisional estadual se agrava todos os
dias. O governo já anunciou planos para a construção de
novas prisões, mas a construção leva tempo e a
magistratura alega, com razão, que não tem para onde
mandar os réus que condena. O mérito da sentença do juiz
de Tupã, que dificilmente será confirmada em instância
superior, é o de refrescar a memória do governo estadual
sobre a urgência de uma solução para o problema.
Fonte: Estado de S. Paulo, seção
Opinião, de 13/01/2008
12/01/2008
LEI Nº 12.799, DE 11 DE JANEIRO DE
2008
Dispõe sobre o
Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de órgãos
e entidades estaduais - CADIN ESTADUAL, e dá outras
providências O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO:
Faço saber que a
Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte
lei:
Artigo 1º - Fica
criado o Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados
de órgãos e entidades estaduais - CADIN ESTADUAL, nos
termos desta lei.
Parágrafo único
- O CADIN ESTADUAL visa criar um cadastro único,
possibilitando à Administração acompanhar o beneficiário
de crédito do setor público que se encontra na situação
simultânea de favorecido e inadimplente.
Artigo 2º - O
CADIN ESTADUAL conterá relação das pessoas físicas e
jurídicas que:
I - sejam
responsáveis por obrigações pecuniárias vencidas e não
pagas, em relação a órgãos e entidades da Administração
direta e indireta, incluídas as empresas controladas
pelo Estado;
II - não tenham
prestado contas exigíveis em razão de disposição legal,
cláusula de convênio, acordo ou contrato, ou que as
tenham tido como rejeitadas.
Artigo 3º - A
inclusão no CADIN ESTADUAL far-seá 75 (setenta e cinco)
dias após comunicação expressa ao devedor da existência
do débito passível de registro, pelas seguintes
autoridades:
I - Secretário
de Estado, no caso de inadimplência diretamente
relacionada à Pasta;
II - Dirigente
máximo, no caso de inadimplência relacionada à
respectiva autarquia ou fundação;
III - Diretor
Presidente, no caso de inadimplência relacionada à
respectiva empresa.
§ 1º - A
atribuição prevista no “caput” deste artigo poderá ser
delegada a servidor ou empregado que mantenha vínculo
com a Secretaria, autarquia, fundação ou empresa,
mediante ato publicado no Diário Oficial do Estado.
§ 2º - A
comunicação ao devedor será feita por via postal ou
telegráfica, no endereço indicado no instrumento que deu
origem ao débito, considerando-se entregue 15 (quinze)
dias após a data da expedição.
§ 3º -
Comprovada a regularização da pendência que deu causa à
inclusão, o órgão ou entidade responsável pelo registro
procederá, no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis, à
respectiva baixa.
§ 4º - A
inclusão no CADIN ESTADUAL, sem a expedição da
comunicação de que trata o § 2º, ou a falta de baixa do
registro, nas condições e no prazo previstos no § 3º,
sujeitará o responsável às penalidades previstas na
legislação vigente.
§ 5º - Vetado.
Artigo 4º - O
CADIN ESTADUAL conterá as seguintes informações:
I - nome e
número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa
Jurídica - CNPJ ou no Cadastro de Pessoas Físicas - CPF
do responsável pelas obrigações de que trata o artigo 2º
desta lei;
II - data da
inclusão;
III - nome e
número de inscrição no CNPJ, endereço e telefone do
credor ou do órgão responsável pela inclusão.
Artigo 5º - Os
órgãos e entidades da Administração direta e indireta
manterão registros detalhados das pendências incluídas
no CADIN ESTADUAL, devendo facultar irrestrito exame
pelos devedores aos próprios dados, nos termos do
regulamento.
Artigo 6º - É
obrigatória consulta prévia ao CADIN ESTADUAL, pelos
órgãos e entidades da Administração direta e indireta,
para:
I - celebração
de convênios, acordos, ajustes ou contratos que envolvam
o desembolso, a qualquer título, de recursos
financeiros;
II - repasses de
valores de convênios ou pagamentos referentes a
contratos;
III - concessão
de auxílios e subvenções;
IV - concessão
de incentivos fiscais e financeiros.
§ 1º - A
existência de registro no CADIN ESTADUAL constituirá
impedimento à realização dos atos a que se referem os
incisos I a IV deste artigo.
§ 2º - O
disposto neste artigo não se aplica à concessão de
auxílios a Municípios atingidos por calamidade pública
reconhecida pelo Governo do Estado e às transferências
voluntárias de que trata o § 3º do artigo 25 da Lei
Complementar federal nº 101, de 4 de maio de 2000.
Artigo 7º - A
inexistência de registro no CADIN ESTADUAL não configura
reconhecimento de regularidade de situação, nem dispensa
a apresentação dos documentos exigidos em lei, decreto e
demais atos normativos.
Artigo 8º - O
registro do devedor no CADIN ESTADUAL ficará suspenso na
hipótese de suspensão da exigibilidade da pendência
objeto do registro, nos termos da lei.
§ 1º - A
suspensão do registro não acarreta a exclusão do CADIN
ESTADUAL.
§ 2º - Enquanto
perdurar a suspensão, não se aplica o impedimento
previsto no § 1º do artigo 6º desta lei.
Artigo 9º - A
inclusão ou exclusão de pendências no CADIN ESTADUAL,
sem a observância das formalidades ou das hipóteses
previstas nesta lei, sujeitará o responsável às
penalidades estabelecidas na legislação pertinente.
Parágrafo único
- Será excluído do CADIN ESTADUAL o devedor que parcelar
e cumprir as obrigações assumidas em acordo firmado com
o Governo do Estado de São Paulo.
Artigo 10 - A
Secretaria da Fazenda será o órgão gestor do CADIN
ESTADUAL, podendo expedir normas complementares para a
fiel execução desta lei.
Parágrafo único
- O Departamento de Controle e Avaliação - DCA, da
Secretaria da Fazenda, fiscalizará os procedimentos de
inclusão e exclusão dos registros no CADIN ESTADUAL.
Artigo 11 -
Ficam cancelados os débitos cujo valor originário, sem
qualquer atualização ou acréscimo, desde que vencidos
até 30 de julho de 2007, não inscritos na Dívida Ativa,
seja igual ou inferior a 50 (cinqüenta) Unidades Fiscais
do Estado de São Paulo - UFESPs, relativos a:
I - imposto
sobre transmissão “causa mortis”, anterior à Lei nº
10.705, de 28 de dezembro de 2000;
II - taxa sobre doação, anterior à Lei nº 10.705, de 28
de dezembro de 2000;
III - taxa de qualquer espécie e origem;
IV - multa administrativa de natureza não tributária de
qualquer origem;
V - multas pessoais ou contratuais, de qualquer espécie
ou origem;
VI - reposição de vencimentos de servidores de qualquer
categoria funcional;
VII - ressarcimento ou restituição de qualquer espécie
ou origem;
VIII - custas judiciais e despesas processuais;
IX - multas impostas em processos criminais.
Parágrafo único
- As providências destinadas ao cancelamento dos débitos
identificados no “caput” serão adotadas pelas
secretarias e órgãos de origem dos débitos.
Artigo 12 - As
despesas decorrentes da execução desta lei correrão à
conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas
se necessário.
Artigo 13 - O
Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 60
(sessenta dias), contados da data de sua publicação.
Artigo 14 - Esta
lei entra em vigor na data de sua publicação.
Palácio dos
Bandeirantes, 11 de janeiro de 2008
Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I,
seção Lei, de 12/01/2008
VETO PARCIAL AO PROJETO DELEI Nº 392/2007
São Paulo, 11 de
janeiro de 2008A-nº 002/2007
Senhor
Presidente
Tenho a honra de
levar ao conhecimento de Vossa Excelência, para os
devidos fins, que, nos termos do artigo 28, § 1º,
combinado com o artigo 47, inciso IV, da Constituição do
Estado, resolvo vetar, parcialmente, o Projeto de lei nº
392, de 2007, aprovado por essa nobre Assembléia,
conforme Autógrafo nº 27.398.
De minha
iniciativa, a propositura cria o Cadastro Informativo
dos Créditos não Quitados de órgãos e entidades
estaduais - CADIN ESTADUAL, e dá providências
correlatas.
Não obstante os
elevados desígnios dos legisladores dessa Casa,
dirigidos ao aprimoramento da proposta original, vejo-me
compelido a fazer recair o veto sobre o § 5° do artigo
3°, pelas razões a seguir enunciadas.
Cabe assinalar,
inicialmente, que as modificações introduzidas no
projeto pelos nobres membros desse Parlamento, na quase
totalidade, foram acolhidas, significando isto o
reconhecimento do valor e da pertinência contidos em
cada qual delas, frutos da deliberação legislativa.
Exceção única a
esse quadro revela-se o sobredito § 5° do artigo 3°,
conforme argumentação técnica, oferecida pela Secretaria
da Fazenda, que aponta a sua impropriedade. Com efeito,
a concessão permanente do prazo de 365 dias para a
inclusão das Prefeituras Municipais no CADIN contraria o
princípio e a finalidade que nortearam a criação do
cadastro, destinado a ser um eficaz instrumento de
recuperação de créditos.
É certo que as
Prefeituras, em face da novidade do CADIN ESTADUAL,
devam merecer tratamento diferenciado que propicie a sua
adequação às regras do cadastro; isto, porém, no seu
primeiro estágio, de forma excepcional, e não
permanentemente, como pretendido no dispositivo
refutado.
Por
conseqüência, anoto a disposição de encaminhar a essa
Assembléia projeto de lei objetivando conceder o prazo
de um ano para a inclusão das Prefeituras no cadastro, a
contar, entretanto, da vigência da Lei,
transitoriamente, atendendo-se, pois, ao propósito do
cadastro e ao interesse das Prefeituras.
Assim,
considerada a intempestividade do questionado parágrafo,
faz-se necessária a sua elisão do texto aprovado, de
sorte a impossibilitar minha anuência, neste ponto.
Expostos os
motivos que fundamentam a impugnação parcial que oponho
ao Projeto de lei nº 392, de 2007, e fazendo-os
publicar, nos termos do artigo 28, § 3°, da Constituição
do Estado, devolvo o assunto ao reexame dessa ilustre
Assembléia, reiterando a Vossa Excelência os protestos
de minha alta consideração.
José Serra
GOVERNADOR DO
ESTADO
A Sua Excelência
o Senhor Deputado Vaz de Lima, Presidente da Assembléia
Legislativa do Estado.
Publicada na
Assessoria Técnico-Legislativa, aos 11 de janeiro de
2008.
Decretos
DECRETO Nº
52.620,
DE 11 DE JANEIRO
DE 2008
Dispõe sobre a
oficialização da 1ª
Conferência
Estadual de Políticas Públicas de Juventude e dá
providências correlatas JOSÉ SERRA, Governador do Estado
de São Paulo, no uso de suas atribuições legais,
Decreta:
Artigo 1º - Fica
oficializada a 1ª Conferência Estadual de Políticas
Públicas de Juventude nos termos do processo
estabelecido pelo Decreto federal de 5 de setembro de
2007, que convoca a 1ª Conferência Nacional de Políticas
Públicas de Juventude e do artigo 5º § 2º da Portaria nº
48, de 13 de setembro de 2007, da Secretaria Geral da
Presidência da República.
Artigo 2º - A
Comissão Organizadora Estadual instituída pela
Secretaria de Relações Institucionais em 19 de outubro
de 2007, com o apoio da Unidade de Programas para a
Juventude da referida Pasta, fica incumbida da
coordenação e organização da conferência de que trata o
artigo 1º deste decreto.
Artigo 3º - Este
decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Palácio dos
Bandeirantes, 11 de janeiro de 2008
JOSÉ SERRA
José Henrique
Reis Lobo
Secretário de Relações Institucionais
Aloysio Nunes
Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado na
Casa Civil, aos 11 de janeiro de 2008.
Fonte: D.O.E, Caderno Executivo I,
seção Lei, de 12/01/2008
Só mãe de uma vítima ainda cobra indenização
Há exatamente um
ano do maior acidente da história do Metrô de São Paulo,
a cratera de 87 metros de diâmetro aberta no canteiro de
obras da futura Estação Pinheiros da Linha 4 é a imagem
de uma ferida que não fechou para dezenas de famílias
que perderam casas e parentes. "Quero que os culpados
sejam punidos", diz Elenilda dos Santos, de 43 anos, mãe
do cobrador Wescley Adriano dos Santos, de 22, uma das
sete vítimas da tragédia.
Elenilda foi a
única parente de vítima que preferiu processar o Estado
a aceitar um acordo com o Consórcio Via Amarela. "Não há
preço que pague a morte do meu filho." Segundo o
consórcio, 98% dos afetados já foram indenizados, num
total de 118 acordos, que beneficiaram 237 pessoas. Além
de Wescley, morreram na tragédia o motorista da van
Reinaldo Aparecido Leite, o motorista da obra Francisco
Sabino Torres, a advogada Valéria Marmit, a aposentada
Abigail Rossi de Azevedo, o agente ambiental Márcio
Alambert e o office-boy Cícero Augustinho da Silva.
Para lidar com a
dor, Elenilda desabafa no site Orkut: "Filho, estarás
sempre vivo no meu coração". Depois da perda, teve
diagnosticadas hipertensão e depressão. Hoje mora em
Natal (RN). No aniversário do filho, 7 de agosto, abriu
um supermercado que batizou de WA. Deixou em São Paulo a
nora Thays, de 21 anos, e o neto Kauã, de 10 meses.
Quando houve o
acidente, a mulher de Wescley estava grávida de 7 meses.
Mesmo com uma barriga enorme, não arredou pé do local do
acidente. "Quando engravidei não sabia se conseguiria
ser mãe. No final, tive de fazer o papel de pai e mãe",
conta Thays.
Kauã ainda não
fala, mas já identifica a foto do pai. "Ele pega o
porta-retrato e fica dando beijo. Eu já expliquei que o
Wescley mora no céu." Ao contrário de Elenilda, Thays
fechou acordo com o Via Amarela. Comprou uma casa em
Taboão da Serra. Kauã tem pensão de R$ 600 e direito a
plano de saúde.
VIZINHANÇA
Os 212 vizinhos
da obra também foram afetados. A Prefeitura interditou
94 imóveis - 7 já foram demolidos e 14 estão condenados.
A maioria fica na Rua Capri, que deve ser reconstruída
quando o canteiro for liberado pelo Ministério Público,
após o fim da coleta de material para investigação. A
previsão é de que o trabalho termine até 19 de março.
Causas do
desastre permanecem sob investigação
Um ano depois,
as causas do desabamento na Estação Pinheiros do Metrô
ainda são desconhecidas. O Instituto de Pesquisas
Tecnológicas (IPT) concluiu que houve uma instabilidade
no terreno, que vinha sendo detectada desde dias antes
do desabamento. Para o Ministério Público, pode ter
havido negligência do Consórcio Via Amarela. O laudo
sobre as causa do desabamento deve sair em abril, depois
de o canteiro de obras da estação ser liberado, em 19 de
março.
Fonte: Estado de S. Paulo, de
12/01/2008
Seis PMs são indiciados por morte e tortura de garoto
A Polícia Civil
de Bauru (343 km de SP) indiciou sob acusação de
homicídio doloso, tortura e abuso de autoridade seis
policiais militares pela morte do adolescente Carlos
Rodrigues Júnior, 15, no final do ano passado.
O garoto morreu
após levar choques. Foi pedida a prisão preventiva dos
seis PMs -a Justiça tem oito dias para definir se acata
ou não. Segundo inquérito, os suspeitos desferiram os
choques com o plugue de um fio desencapado. Os 15
choques deixaram 30 marcas, devido aos pólos negativo e
positivo.
Para o delegado
seccional de Bauru, Doniseti José Pinezzi, "testes no
IML apontaram que, para produzir lesões, o plugue tem de
ficar de 30 a 40 segundos na pele".
Para o
delegado-assistente da seccional de Bauru, Marcelo
Haddad, a tortura era para a confissão do garoto,
acusado de roubo.
Em depoimento,
os PMs mudaram a versão de que nenhum deles havia
presenciado a tortura. O cabo Gerson Gonzaga da Silva e
os soldados Maurício Augusto Delasta e Juliano Arcangelo
Bonini dizem que o tenente Roger Marcel Soares e o
soldado Emerson Ferreira foram os responsáveis pelos
choques -os dois acusam o cabo e os dois soldados. O
soldado Ricardo Ottaviani ficou do lado de fora do
quarto onde o garoto foi torturado.
O advogado de
defesa de Delasta, Ottaviani, Bonini e Gonzaga confirma
a versão. O advogado de Soares e Ferreira não foi
encontrado para falar sobre o assunto.
Fonte: Folha de S. Paulo, de
12/01/2008
Justiça é coisa séria
Passados 20 anos
da Constituição cidadã e após três anos da Emenda
Constitucional 45, de 2004, que reformou o Judiciário,
se existem avanços, muita coisa resta por ser feita.
A tônica da
reforma foi a aceleração dos julgamentos. O tempo da
Justiça não se compadece com o ritmo da sociedade
contemporânea. Ocorre que a preocupação com a presteza
na decisão judicial ainda se encontra atada a uma velha
concepção. Acredita-se que a única fórmula de proferir
mais decisões é mediante a criação de novos cargos de
juízes.
Não há dúvida
que sentenciar é a missão do juiz. Ele existe para isso.
Mas o constituinte sinalizou alternativas que ainda não
foram inteiramente implementadas. De algumas delas nem
sequer se cogitou. É a cultura infensa à ousadia, fóbica
à inovação, aferrada a velhos e superados parâmetros.
Mera leitura dos
preceitos constitucionais incluídos pelo reformador do
Judiciário é suficiente para a constatação de que outras
providências podem ser adotadas sem ônus e sem o
agigantamento da máquina. Prevê-se, por exemplo, que os
servidores receberão delegação para a prática de atos de
administração e atos de mero expediente, sem caráter
decisório. O que se fez para dotar o funcionalismo de
maior iniciativa e, conseqüentemente, de maior
responsabilidade?
Desde 1988
consta da Carta da República a possibilidade de criação
de Juizados Especiais providos por juízes togados ou
togados e leigos. As causas confiadas a tais unidades
judiciais reclamam procedimento oral e sumaríssimo,
permitidos a transação e o julgamento de recursos por
turmas de juízes de primeiro grau.
Onde foi que se
aproveitou o juiz leigo para auxiliar a desafogar a
Justiça? As turmas de primeiro grau, encarregadas do
julgamento em segundo, são as do local onde se julgou.
Na mão contrária da direção, a criação de grandes
colegiados, centralizados na capital. Espécie de
ressurreição dos extintos Tribunais de Alçada.
Também o juiz de
paz, desde 1988, poderia exercer atribuições
conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de
outras previstas na legislação. Por que não se aproveita
esse profissional para auxiliar na distribuição do justo
concreto?
Outro importante
dispositivo posto à disposição das Justiças estaduais
pelo constituinte derivado é o de funcionamento
descentralizado do Tribunal de Justiça. As Câmaras
Regionais são previstas na Constituição, desde dezembro
de 2004, como forma de assegurar o pleno acesso do
jurisdicionado à Justiça em todas as fases do processo.
Não é concebível
que se invoque inviabilidade de implementação desse
preceito, a pretexto da dificuldade na instalação de
tais Câmaras Regionais. Pense-se em São Paulo, por
exemplo. Um Tribunal de Justiça, com 360
desembargadores, não teria dificuldade alguma em fazer
funcionar Câmaras Regionais nos diversos pólos de
desenvolvimento situados no interior ou no litoral.
Salutar o julgamento de recursos nas regiões de São José
do Rio Preto, São José dos Campos, Santos e Ribeirão
Preto, dentre outras. A descentralização é racional,
inibe a remessa física dos autos para apreciação na
capital e reduz tempo, dispêndio e a grande concentração
até mesmo de trânsito no centro da conturbada
metrópole.
O constituinte
ainda previu a criação de Varas especializadas para
dirimir conflitos fundiários, competentes para questões
agrárias e com a presença do juiz no local do litígio.
Todos os Estados brasileiros têm conflitos fundiários.
Não é conveniente que se cumpra o preceito, para atenuar
a tensão no campo?
Todas essas
iniciativas não dependem senão da vontade política dos
detentores dos cargos de direção dos tribunais. Em lugar
de procurar conferir uma fisionomia renovada à missão de
outorgar a jurisdição, parece preponderar a velha
tendência da criação de unidades convencionais. As
gestões bienais não permitem o desenvolvimento de um
projeto ou o estabelecimento de metas. O resultado é que
se investe na multiplicação de novas Varas e comarcas,
com instalação apressada de unidades que depois
necessitarão de estruturas materiais e funcionais.
A criação
indiscriminada de novas unidades pode atender a vários
objetivos. Presume-se a boa intenção de quem alimenta a
utopia de contar com um juiz em cada esquina. Mas se
esquece que o custeio é muito mais dispendioso do que a
mera criação e instalação, com aposição de placas, e a
realização de festividades tão ao gosto do
provincianismo colonial. Cada unidade nova representa um
ônus e a depauperação da máquina, que está subordinada
aos limites da responsabilidade fiscal.
Seria utópico
aguardar uma correção de rumos. Coragem para extinguir
os foros distritais de capacidade ociosa, com recondução
do magistrado e funcionários à sede da comarca e
atendimento periódico itinerante, quando for o caso.
Fortalecimento das técnicas de gestão para tornar a
prestação jurisdicional mais rápida e racional.
Motivação do funcionalismo para a multiplicação de sua
capacidade de trabalho, não para a profusão de cargos já
contaminados pelo desestímulo.
Os tribunais são
órgãos políticos e, como tais, devem exercer sua missão
na democracia brasileira. Dialogar com o Executivo,
grande cliente da Justiça, para reduzir o número de
lides temerárias e de teimosia na reiteração das teses
vencidas. Adotar tecnologia esperta e seguir o exemplo
das empresas que, para sobreviverem à competição na lex
mercatoria, tiveram de se reciclar e ressurgiram
renovadas e eficientes.
Justiça é coisa
séria demais para permanecer sempre a mesma, se a
sociedade é dinâmica e a cada dia mostra uma exigência
diversa.
José Renato
Nalini: é desembargador do Tribunal de Justiça de São
Paulo, autor de Ética Geral e Profissional e Revolução
das Togas
Fonte: Estado de S. Paulo, seção
Opinião, de 12/01/2008