11/02
Decisão definitiva garante
quitação de ICMS com precatório alimentar
Um escritório
gaúcho conseguiu pela primeira vez o trânsito em julgado
de um pedido de compensação de ICMS com precatório
alimentar. O processo julgado pela Primeira Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS)
terminou no fim do ano passado, garantindo a uma pequena
indústria de plásticos, a Vulcano Plásticos, pagar seu
ICMS com um precatório do Instituto de Previdência do
Rio Grande do Sul (Ipergs). Mas o pedido só transitou em
julgado, ou seja, não tem mais recursos possíveis,
porque a procuradoria do Estado não conseguiu recorrer
em tempo - o tema ainda não foi definido nem no Supremo
Tribunal Federal (STF) e nem no Superior Tribunal de
Justiça (STJ).
Na decisão, que
deu a vitória à empresa, os desembargadores negaram um
recurso do Estado que tentava evitar a compensação do
precatório. A procuradoria alegou que não existe
previsão legal para esta compensação, e que sua admissão
viola a ordem cronológica dos precatórios, prevista
constitucionalmente. Mas os desembargadores adotaram a
posição defendida pelo contribuintes. Segundo Cláudio
Curi, dono do escritório Curi Créditos Tributários, que
faz corretagem e compensação de precatórios, a posição
favorável à compensação já é majoritária no TJRS.
Um dos
argumentos adotados pela primeira câmara do tribunal em
favor do contribuinte foi a aplicação do artigo 78 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
O artigo autoriza a compensação tributária em caso de
não-pagamento de precatório, mas, segundo o fisco
gaúcho, aplica-se unicamente aos precatórios
não-alimentares. Os desembargadores não viram problema
em estendê-lo aos alimentares. Neste ponto, a decisão é
semelhante à manifestação do ministro do Supremo Eros
Grau, em uma decisão monocrática de agosto de 2007,
aceitando a compensação de um precatório do Ipergs. O
texto de Eros, no entanto, não foi explícito neste
ponto. Atualmente a decisão está pendente do julgamento
de um agravo de instrumento na segunda turma do
Supremo.
Fonte: Valor Econômico, de
11/02/2008
Cresce batalha judicial que ameaça gasoduto
A briga jurídica
que impede a conclusão do gasoduto Campinas-Rio, um dos
projetos da Petrobras incluído no Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC) e orçado em quase R$ 900 milhões,
ganhou mais um capítulo. O advogado José Maurício de
Barcellos, que há três anos questiona nos tribunais
supostas irregularidades no projeto, desenterrou e furou
parte do duto que passa por uma estrada de acesso à sua
propriedade, na zona rural de Resende (RJ).
Barcellos estava
protegido por um alvará judicial do juiz Flávio Pimentel
de Lemos Filho, da 1ª Vara Cível do Fórum de Resende,
que o autorizava a desfazer a obra. Quando soube do
dano, a Petrobras conseguiu decisão da juíza Isabel
Teresa Pinto Coelho, da 2ª Vara Cível de Resende, que
obrigou Barcellos a parar a retroescavadeira usada para
desenterrar o duto, mas o trabalho já havia sido feito.
Nos dias
seguintes, a Petrobras entrou com um pedido de suspeição
do juiz, instrumento utilizado quando se põe em dúvida a
imparcialidade do magistrado. A estatal afirma que agora
"com um juiz imparcial fará uso dos recursos e
requerimentos permitidos e pertinentes ao caso, de forma
a refazer a obra e buscar reparação pelos danos
causados". Com a suspeição de Lemos Filho, o processo
foi remetido à magistrada da 2ª Vara Cível de Resende e
aí foi a vez de Barcellos pedir a suspeição da juíza.
Os novos lances
trazem incerteza quanto ao início da operação do
gasoduto Campinas-Rio, que a estatal esperava concluir
no fim de 2007, com dois anos de atraso em relação ao
cronograma original. O presidente da Petrobras, José
Sergio Gabrielli, disse ao Valor que a empresa já
comprou a fazenda que pertencia a Telma e Arnaldo dos
Santos, vizinhos de Barcellos na localidade de Pirangaí,
em Resende.
Esta era a
última propriedade que faltava desapropriar para
constituir uma faixa de servidão e concluir a obra. A
compra, segundo fontes de Resende, teria enfurecido o
advogado. Gabrielli diz que a Petrobras vai transformar
a área em uma "zona de proteção ambiental". Ele não
revelou quanto foi pago pela propriedade. Mas o Valor
apurou que a área, com 64 alqueires, custa cerca de R$ 1
milhão. A compra das terras foi fechada antes das novas
medidas judiciais que trazem mais incerteza quanto ao
fim do litígio.
O novo "round"
da disputa acontece em meio às discussões sobre a
necessidade de aumentar o suprimento de gás para o
Estado do Rio e agora parece difícil prever o início da
operação do gasoduto, que permitirá levar gás da Bolívia
diretamente para o Rio e para o Espírito Santo. Na
Petrobras poucos se arriscam a falar em uma nova data.
Um diretor comentou, em tom jocoso, que o gasoduto
"parece ter sido construído em cima de uma caveira de
burro".
É possível que a
disputa judicial entre o advogado e a Petrobras tenha
novos desdobramentos, com mais atrasos no já
desacreditado cronograma da obra. Barcellos não parece
disposto a desistir da briga e a estatal, que contratou
o escritório Siqueira Castro para auxiliá-la, tem
enfrentado dificuldades para responder às manobras
judiciais do advogado, aposentado do serviço geológico
brasileiro, do Ministério de Minas e Energia.
Desde 2005, o
juiz da 1ª Vara Cível de Resende vinha concedendo
decisões favoráveis a Barcellos, inclusive a de 8 de
janeiro de 2008 que permitiu ao advogado, na manhã do
dia seguinte, escavar até alcançar os tubos que passam
pela estradinha de acesso à sua fazenda, que tem 20
alqueires. Barcellos disse que gastou R$ 5 mil para
alugar a retroescavadeira usada para desfazer a obra -
valor que disse ter incluído nos autos do processo para
cobrar da Petrobras.
Não foi a
primeira vez que Barcellos adotou uma medida radical
para tentar bloquear a obra. A Petrobras chegou a fazer
um desvio com mais de um quilômetro para evitar a sua
propriedade, o que teria custado R$ 16 milhões. Mas o
advogado entendeu que a variante ainda cortava uma
estrada de acesso à sede da fazenda e colocou um
automóvel, um Fusca, no local, para barrar a passagem do
gasoduto.
A colocação do
Fusca como bloqueio foi frustrada porque a Petrobras fez
um furo longitudinal - utilizando equipamentos para
perfuração de poços de petróleo - passando debaixo do
local. O carro, junto com faixas de protesto contra a
Petrobras, continua na área. Barcellos não se diz contra
a obra: "A Petrobras tem de cumprir a lei que manda
passar o gasoduto longe da minha terra."
A tese do
advogado, aceita pelo juiz de Resende afastado, foi a de
que a Petrobras pretendia utilizar a faixa de servidão
de um antigo gasoduto, o São Paulo-Rio de Janeiro (Gaspal),
para colocar também o Campinas-Rio. Barcellos verificou
as coordenadas fixadas no decreto expropriatório de 17
de fevereiro de 2004, específico para constituir
servidão de passagem para o Campinas-Rio, e constatou
que o traçado era diferente da faixa do Gaspal. O
decreto de 2004 foi então modificado por outro, de 26 de
junho de 2007, que estabeleceu nova faixa de servidão.
O problema é
que, mesmo após a variante, Barcellos continuou a
insistir que o duto passa nas suas terras, o que a
Petrobras nega. A polêmica poderia ser desfeita com a
realização de uma perícia técnica que chegou a ser
pedida pelo juiz, mas nunca foi realizada em função de
recursos apresentados pelas partes. A última perícia foi
marcada para 28 de janeiro, mas a suspeição do juiz
adiou-a novamente.
Quando o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou a pedra
fundamental do gasoduto há quatro anos, a Petrobras
informava que ele era "o primeiro passo na consolidação
de uma rede básica de transporte de gás destinada a
interligar as regiões Sudeste, Nordeste, Centro e Sul do
País". Interligaria ainda o Gasoduto Bolívia Brasil à
malha interna do país.
O Campinas-Rio
foi inicialmente projetado para ter 448 quilômetros de
extensão, mas no final ficará com cerca de 500
quilômetros. O duto tem capacidade para transportar 8,6
milhões de metros cúbicos de gás por dia, ligando a
refinaria do Planalto (Replan), em Paulínia (SP), ao
terminal de Japeri (RJ).
Fonte: Valor Econômico, de
11/02/2008
AGU, 15 anos
EM 15 anos de
defesa judicial dos interesses do Brasil e de prestação
de consultoria ao Poder Executivo, a AGU
(Advocacia-Geral da União) pavimentou o caminho rumo à
consolidação de seu papel de órgão essencial à Justiça e
de instituição de Estado, previsto na Constituição
Federal e na lei complementar nº 73, de 11 de fevereiro
de 1993.
Depois de uma
década e meia, a AGU se firma perante a sociedade e os
três Poderes como instituição de excelência, capaz de
oferecer segurança jurídica aos atos de governo e
garantir a execução de políticas públicas de educação,
saúde e desenvolvimento, por exemplo.
O PAC (Plano de
Aceleração do Crescimento) não enfrentou maiores
obstáculos judiciais em 2007 por causa da previdente
criação de uma força tarefa na AGU. Foi esse grupo que
manteve, na Justiça, a execução das obras da
hidrelétrica de Estreito, no Maranhão, o leilão da
hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira, e o
leilão para a concessão de uso de sete trechos de
rodovias federais.
Graças ao
empenho de 8.000 advogados públicos e servidores
administrativos, a AGU evitou em 2007 que ações no
Supremo Tribunal Federal retirassem R$ 30 bilhões dos
cofres públicos. Outros R$ 13 bilhões em impostos
inscritos na dívida ativa também foram recuperados. Esse
contencioso, no entanto, tende a reduzir com a atuação
preventiva de advogados da União, procuradores federais
e da Fazenda Nacional na administração direta do
governo, em autarquias e fundações.
No ano passado,
a Advocacia-Geral da União ampliou a estrutura das
câmaras de conciliação e arbitragem, auxiliando o
governo a solucionar 25 conflitos internos que envolviam
valores próximos de R$ 1 bilhão.
Mas ainda é
recente o uso desse mecanismo no Executivo. No Superior
Tribunal de Justiça, há 400 litígios entre órgãos do
governo federal. É preciso criar a cultura do diálogo
interno para que o Poder Judiciário seja árbitro somente
na exceção. Com esse intuito, a AGU criou um colégio de
consultores para uniformizar as interpretações e os
procedimentos dos órgãos jurídicos do Poder Executivo
federal.
Nos últimos
cinco anos, não se criaram planos econômicos nem medidas
jurídicas arriscadas. Essa atitude responsável promoveu
a pacificação do governo na área jurídica. A era dos
grandes "esqueletos" -ações judiciais de dezenas de
bilhões de reais que ameaçam a estabilidade das contas
públicas- chegou ao fim. Os que ainda restam do passado
são administrados pela atuação dos advogados da União.
Pendências
históricas foram solucionadas no âmbito da AGU. Depois
de 15 anos de espera, os servidores demitidos no Plano
Collor por motivações políticas dispõem agora de parecer
jurídico que permitirá aplicar com segurança a Lei de
Anistia. Está em fase de conclusão um parecer definitivo
sobre a regulamentação e a demarcação de terras
remanescentes de quilombos. Prevista há 20 anos pela
Constituição, a regulamentação da greve no serviço
público já teve seu anteprojeto encaminhado para a Casa
Civil.
A recuperação de
verbas desviadas em razão de atos de improbidade,
corrupção e fraude ganhou um setor específico na AGU. O
Departamento de Patrimônio Público e Probidade
Administrativa atua de maneira proativa na proposição de
ações judiciais. Numa parceria com a Controladoria-Geral
da União, advogados públicos acompanham a fiscalização
de municípios e Estados que utilizam recursos federais.
A AGU também
estreitou as relações com o Tribunal de Contas da União
para melhor atuar na execução das multas e das
penalidades aplicadas pelo TCU a malversadores de verbas
públicas. Ao defender os interesses do Brasil, a AGU
atua em defesa do cidadão brasileiro, que contribui com
seus impostos para pagar os salários dos servidores e,
também por isso, é o grande cliente da instituição.
O futuro da AGU
e a sua adequação às transformações que ocorrem na
sociedade brasileira dependem da participação da
sociedade civil no controle da prestação e da qualidade
dos serviços públicos. Ainda há muito que fazer:
conquistar autonomia financeira, melhorar os rendimentos
dos servidores do órgão, aprovar a nova lei orgânica,
construir uma sede própria e, principalmente, abrir a
instituição às demandas da população, para aproximar
cada vez mais os cidadãos da advocacia pública, com a
criação de uma lei de responsabilidade do Estado, e
consolidar a AGU como órgão sistêmico de Estado, atuante
e independente junto aos três Poderes.
JOSÉ ANTONIO
DIAS TOFFOLI, 40, é o advogado-geral da União.
Fonte: Folha de S. Paulo, seção
Tendências e Debates, de 11/02/2008
10/02
Primeira instância virou indústria
de recursos, afirma ex-procurador
O excesso de
recursos judiciais contribui para a demora em resoluções
de litígios e, principalmente, corrobora para a
constante falta de credibilidade que permeia as decisões
de primeira instância.
Essa é uma das
considerações do advogado Oscar Vilhena Vieira, 41 anos,
que possui mestrado em ciência política, pós-doutorado
em Direitos Humanos pelo Centre for Brazilian Studies
(Oxford University) e que atualmente é professor da
escola de direito de São Paulo da Fundação Getúlio
Vargas e diretor-executivo da Conectas Direitos Humanos.
Ex-procurador do Estado de São Paulo, Vilhena afirma, em
entrevista ao Última Instância, que os juízes dos
Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais
estão desmotivados.
Última Instância
— O sr já mencionou que as decisões envolvendo o direito
tributário e administrativo proferidas pelo TJ-SP
(Tribunal de Justiça de São Paulo) são irrelevantes.
Isso não representa uma desmotivação para ingressar com
uma ação na Justiça?
Oscar Vilhena
Vieira — Todo advogado já tem as contra-razões, os
recursos cabíveis para apresentar, independente da
postura do juiz, se favorável ou não. Não só no TJ-SP,
como nos Tribunais Regionais Federais, isso se
transformou numa indústria de recursos. Aquele que deve,
seja União, Estado ou mesmo as empresas, quando
derrotado, não tem tanto problema. Isso porque existe o
recurso especial extraordinário. Vai ‘subir’ e aquela
decisão dos tribunais se torna simplesmente uma etapa de
uma luta que vai chegar ao Supremo Tribunal Federal e ao
Superior Tribunal de Justiça. Muitas vezes são matérias
que já foram decididas inúmeras vezes e, com isso, se
ganha tempo para pagar. Por exemplo: quando é uma
empresa devedora que está discutindo um tópico
específico do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS), ela sabe que vai pagar, mas vai demorar
uns nove anos até o STF decidir. E quando o Estado é uma
das partes que eventualmente tem um tributo
inconstitucional, ainda assim continua cobrando porque
essa discussão irá ao Supremo e vai demorar muito.
Última Instância
— Podemos dizer que é um círculo vicioso?
Oscar Vilhena
Vieira — Fui procurador durante 11 anos e sempre vi isso
acontecer. Tinham temas de ICMS em que éramos derrotados
no TJ e eu já tinha petição pronta de recurso especial
extraordinário. E eu mandava. Tinham câmaras que quando
as ações caiam lá eu sabia que seria vitorioso. Então o
advogado Leo Krakowiak, que atuava na mesma época, tinha
sempre a mesma petição. E eu já respondia minhas
contra-razões preparadas para responder às argumentações
do Krakowiak. E o mundo girava. O juiz imprime a mesma
sentença, o TJ tem a mesma decisão, os advogados
apresentam as mesmas razões. Isso é um negócio
assustador... A irracionalidade do sistema.
Última Instância
— Mas a rotina processual não tira a credibilidade do
sistema?
Oscar Vilhena
Vieira — O fato de o juiz de primeira instância decidir
e ainda assim a questão subir para o STF ou STJ dá ao
magistrado uma certa irrelevância nestes temas, mostra
que é irrelevante. E, ao não ser importante, isso
desmotiva demais o juiz porque ele sabe que está dando
uma decisão que não vai perdurar. Acho que esse é um
problema central que amesquinha os tribunais regionais.
Por isso que é muito importante a argüição de
repercussão geral, porque, na medida em que o Supremo
deixar subir automaticamente todos os recursos
extraordinários — e quando não sobe a gente agrava (com
a peça agravo de instrumento) —, o que vai prevalecer
são as decisões dos TJs e dos TRFs. Isso fará com que
esses órgãos se transformem em mais poderosos, que
tenham mais relevância jurídica, que as decisões deles
tenham mais esperança de sobreviver. A tendência é que
isso valorize os tribunais e reduza o trabalho do
Supremo, que pode, com a súmula vinculante, ordenar a
ação dos tribunais.
Última Instância
— A súmula vinculante é uma ferramenta importante?
Oscar Vilhena
Vieira — Sim, mas ela tem que ser usada com sabedoria.
Se o Supremo começar a tomar decisões com súmulas
vinculantes em matérias perigosas, ele pode asfixiar o
Judiciário. Agora, se continuar parcimoniosamente, pegar
matérias cansadas de ter decisões numa só direção, isso
limpa a pauta. É capaz de resolver 800 mil processos
utilizando uma súmula. É a junção de dois instrumentos
que vai fazer com que a pauta do Supremo fique mais
aliviada e dar aos tribunais intermediários (TJs e TRFs)
certa importância, porque as decisões deles serão as
últimas. Quando o STF estiver desconfortável com as
decisões em primeira instância, ele vai permitir a
subida do recurso extraordinário. É como se o Supremo
tivesse colocado a mão na torneira. Hoje a torneira está
toda aberta e eles ficam enxugando água. Agora podem
fechar. Mas, ao verem que, por exemplo, o TJ do Rio
Grande do Sul está dando uma série de decisões que estão
recorrendo bastante e se o teor não for do agrado do STF
abre-se a torneira, recebe-se o recurso ordinário e
muda-se a decisão de primeira instância. De certa forma,
coloca ele alinhado com o Supremo.
Última Instância
— Existe alguma forma de mudar essa organização
judiciária?
Oscar Vilhena
Vieira — A bola de neve que acontece respeita
interesses, em especial, da administração pública,
federal e estadual. Isso é permitido porque não é
interessante que a resolução do processo seja próxima,
pois quanto mais tempo demora mais tarde paga-se. Apesar
disso, não acho que seja necessária mudança da estrutura
institucional. O que precisa é calibrar esses
instrumentos para que haja uma maior autoridade do STF
sobre os outros tribunais e uma maior autoridade dos
tribunais quando também dão suas decisões definitivas.
Última Instância
— Existe algum país que mantém uma organização
judiciária correta?
Oscar Vilhena
Vieira — Cada país encontra os seus caminhos ou não. O
Brasil, se comparado à grande maioria dos paises da
América Latina, tem um Judiciário melhor equipado. Isso
porque as pessoas chegam lá por concurso. Na grande
maioria dos países são indicações, nomeações do
presidente da República, do ministro da Justiça. Aqui é
mais independente e isso é um ponto positivo. O ponto
negativo foi o excesso de burocratização, falta uma
capacidade gerencial do sistema. Entregamos aos juízes,
e eles não têm competência técnico-administrativa. O
grande problema é a cartorização, ou seja, um processo
extremamente formalizado, burocratizado com papéis e
grande número de recursos e isso foi esclerosando o
Judiciário.
Fonte: site Última Instância, de
10/02/2008
Transparência no cartão
O ATUAL episódio
dos cartões corporativos coloca em destaque questão da
mais alta relevância que não despertou, ainda, a devida
atenção da sociedade brasileira. Trata-se do acesso à
informação, direito fundamental estabelecido no Brasil
apenas com a edição da Constituição de 1988: "todos têm
direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral
(...), ressalvadas aquelas cujo sigilo seja
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado"
(artigo 5º, XXXIII).
Mesmo em outros
países, o direito de acesso à informação é tema recente.
O Brasil ressente-se da ausência de uma efetiva
normatização desse direito. O problema maior, todavia, é
a falta de cultura da sociedade quanto ao direito de
acesso às informações públicas e ao dever dos agentes
públicos de fornecê-las.
O direito de
acesso à informação, aliado ao princípio da publicidade
no ambiente da administração pública (artigo 37,
"caput", da Constituição), impõe ao agente público a
observância da cláusula da máxima informação, preceito
próprio das democracias. Isso rompe com a cultura do
segredo governamental, que era a nossa praxe durante o
regime ditatorial de triste memória.
Nesse novo
paradigma jurídico, os dados, registros e informações,
especialmente os relativos à execução do Orçamento, não
pertencem ao Estado, mas aos cidadãos, que são os
titulares do poder. Dessa forma, assegura-se a
transparência necessária da gestão pública, para fins de
materialização da democracia participativa, no que se
refere à fiscalização por parte da sociedade. Inibe-se a
corrupção, ao ampliar sobremaneira a possibilidade de
fiscalização.
Além do dever de
atender aos pedidos de informação, o agente público tem
o dever de franquear o acesso ao banco de dados
eletrônicos dos órgãos públicos, dotado de ferramenta de
pesquisa de conteúdos que possibilite o pleno, rápido,
eficiente e simplificado acesso aos documentos e às
informações, principalmente no que diz respeito aos
gastos públicos.
O site Portal
Transparência da CGU (Controladoria Geral da União), de
acesso público, que possibilitou o conhecimento da farra
do cartão corporativo, revela a importância desse dever
do agente público e a necessidade de sua ampliação e
disseminação entre todos os órgãos públicos.
O preocupante é
que, devido à repercussão do episódio, o governo
determinou a retirada do mencionado site dos dados
referentes às despesas com alimentação em nome da
Presidência da República, sob o argumento de que isso se
daria para preservar a segurança do Estado.
É fato que o
direito de acesso à informação, de acordo com a norma
constitucional, sofre restrição se e quando o sigilo for
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
É evidente,
porém, que o administrador não pode, ao seu bel-prazer,
fazer essa classificação para, assim, sonegar informação
à sociedade quanto a determinados atos, especialmente
quando se trata de despesa feita por meio de cartão
corporativo, instrumento hábil para facilitar a
realização de pequenas despesas que não exigem
licitação, mas que, como os fatos recentes ensinam,
incentiva a sua utilização para gastos inadmissíveis com
o dinheiro público.
Compras em "free
shops", supermercados, vinícolas etc., obviamente, não
são informações que comprometem a segurança da sociedade
ou do Estado. Espera-se que o Parlamento investigue os
fatos e, mais ainda, que legisle sobre a matéria.
O projeto de lei
219/03, que regulamenta o direito de acesso à
informação, está pronto para votação no plenário da
Câmara dos Deputados.
Conquanto mereça
alguns reparos, que ainda podem ser feitos, o referido
projeto de lei representa sensível avanço em relação ao
tema e tem o mérito de colocar parâmetros para as
restrições ao exercício desse direito fundamental. Que o
episódio contribua para difundir a cultura do acesso à
informação, ampliando-a, e não para restringi-la, como
infelizmente quer o governo.
FERNANDO
MATTOS, 34, mestre em direito público pela Uerj
(Universidade do Estado do Rio de Janeiro), é
vice-presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais
do Brasil) na 2ª Região e juiz federal em Vitória (ES).
Fonte: Folha de S. Paulo, seção
"Tendências e Debates", de 10/02/2008
O balanço da Justiça
O último balanço
das atividades de todas as instâncias e braços do
Judiciário revela que os crônicos problemas de
morosidade e congestionamento dos tribunais ainda estão
longe de ser resolvidos, apesar das importantes
alterações aprovadas pelo Legislativo para modernizar a
legislação processual civil, reduzindo o número de
recursos e agilizando com isso a tramitação das ações.
Divulgado pelo
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o balanço mostra
que, dos mais de 48 milhões de processos que se
acumularam em 2006 na primeira instância da Justiça
Federal, da Justiça do Trabalho e das Justiças
estaduais, apenas 11,3 milhões foram julgados de forma
definitiva naquele ano. O restante continuou aguardando
sentença ou subiu para as instâncias superiores em grau
de recurso. O maior número de recursos foi registrado
nos Tribunais Regionais do Trabalho e o menor, nos
Tribunais de Justiça.
Com 29.591.773
casos pendentes de julgamento e 10.438.729 novos
processos protocolados em 2006, as Justiças estaduais
continuaram sendo as mais congestionadas do Poder
Judiciário, tendo julgado de forma definitiva 8.036.319
casos. Com 2.786.315 reclamações aguardando julgamento,
2.953.084 novos casos protocolados e 2.768.965 processos
decididos em caráter definitivo, a Justiça do Trabalho
foi a que registrou menor congestionamento. O balanço
também mostrou que os juízes trabalhistas estão julgando
os processos com maior rapidez, mas a execução das
sentenças continua muito lenta.
Este é o quarto
balanço feito pelo CNJ desde 2004. Os dados estatísticos
são decisivos para o planejamento estratégico do Poder
Judiciário. Eles permitem detectar problemas e elaborar
diagnósticos, ajudando a melhorar a gestão
administrativa e financeira dos tribunais. E também
servem para informar sobre a necessidade de novos
concursos para a magistratura e as regiões que, em
decorrência do aumento da litigiosidade, precisam de
mais varas.
O balanço do CNJ
mostra que a União continua sendo o grande cliente da
Justiça Federal. Em 2006, o poder público ingressou com
4.014.771 processos contra cidadãos e empresas e foi
acionado em outros 2.240.726 processos. O levantamento
também mostra o sucesso alcançado pelos Juizados
Especiais. Mantidos pela Justiça Federal e pelas
Justiças estaduais, atuando com base no rito sumário,
julgando causas de baixo valor e com a execução imediata
da sentença, eles receberam um total de 5 milhões de
processos, em 2006, e julgaram 5,01 milhões de casos,
entre novas ações e ações pendentes. Esta foi a primeira
vez que os Juizados Especiais Cíveis e Criminais
concluíram mais processos do que os que foram recebidos.
O balanço do CNJ
detectou ainda um fato novo, que surpreendeu os meios
forenses: a tendência de queda no número de novas ações,
principalmente na primeira instância da Justiça Federal.
Em outras palavras, a partir de 2006 cidadãos, empresas
e o poder público estariam litigando menos.
A queda da
litigiosidade se deve, em parte, ao fim das pendências
em torno de antigos pacotes econômicos, quando cidadãos
e empresas recorreram contra a União, reivindicando
correção de ativos financeiros, pleiteando ressarcimento
de prejuízos decorrentes de manipulação de índices de
inflação ou questionando a legalidade de determinados
tributos; e, em parte, ao que se pode chamar de
maturidade da Constituição de 88. Ao criar novos
direitos, a Carta provocou dúvidas quanto ao seu
alcance, o que resultou numa enxurrada de processos
judiciais. Com a jurisprudência firmada nas questões
mais polêmicas pelos tribunais superiores, a queda do
número de ações relativas aos direitos criados há duas
décadas era uma questão de tempo.
Segundo o
balanço do CNJ, os casos que agora começam a inundar a
Justiça dizem respeito aos chamados “litígios de massa”,
envolvendo grandes empresas, bancos e concessionárias de
telefone e energia. O desafio do Judiciário é se
preparar para enfrentar esses casos que, por serem
disciplinados pelo Código de Defesa do Consumidor, devem
abarrotar as Justiças estaduais.
Fonte: Estado de S. Paulo, seção
Opinião, de 10/02/2008
Estados e municípios têm reforço de caixa de 15%
A receita dos
maiores Estados e municípios do País cresceu cerca de
15,6% no ano passado, três vezes mais que a inflação, de
acordo com os relatórios de execução orçamentária
apresentado pelos governos estaduais e pelas prefeituras
até o dia 31 de janeiro.
O destaque nos
Estados foi o Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores (IPVA), enquanto nos municípios foi o
Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), por
coincidência ou não, dois setores da economia que
cresceram muito no ano passado.
O levantamento
feito pelo Estado tomou por base os relatórios fiscais
enviados ao Tesouro Nacional por nove Estados e nove
capitais e inclui tanto tributos próprios quanto
transferências da União. Entre as receitas próprias, a
que mais cresceu foi a do ITBI, que subiu 28,2% em média
no ano passado, ultrapassando os R$ 3 bilhões em todo o
País.
Na capital
paulista, por exemplo, o ITBI cresceu de R$ 425 milhões
em 2006 para R$ 545 milhões em 2007, exatamente os
mesmos 28,2% verificados na média das demais cidades
analisadas. Em Salvador, entretanto, o crescimento da
receita desse imposto chegou a 48,6% e em Campo Grande,
a 75%.
"A economia
começou a andar e os municípios estão cada vez se
capacitando mais para arrecadar", observa o presidente
da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo
Ziulkoski.
O Imposto Sobre
Serviços (ISS), por exemplo, é hoje a "menina-dos-olhos"
dos prefeitos. Há vários anos vem crescendo bem acima da
inflação e em 2007 não foi diferente, tendo aumentado
15,8% nas nove capitais pesquisadas. Nesse grupo, os
maiores crescimentos de 2007 foram verificados em Campo
Grande (27,6%) e Belo Horizonte (21,6%).
O fenômeno, diz
Ziulkoski, se explica pela ampliação da lista de
serviços tributados pelo ISS em 2004, que incorporou o
setor bancário, de informática e os pedágios nas
rodovias. Aos poucos, as prefeituras estão se adequando
à nova legislação e começam a cobrar imposto de quem
nunca cobraram antes.
DÚVIDAS
Nos Estados, a
expansão do IPVA chegou a 17,5% em 2007, com destaque
para o desempenho do Espírito Santo (31%) e de São Paulo
(20,5%). O ICMS, entretanto, que é o carro-chefe da
arrecadação dos Estados e tem incidência direta sobre o
consumo de todos os produtos da economia, aumentou
apenas 10,3% nas regiões analisadas.
Os piores
desempenhos do ICMS foram registrados no Rio Grande do
Sul (2,5%), onde as alíquotas sobre combustíveis e
telefones foi reduzida no início de 2007, e no Rio
(6,8%).
De acordo com o
economista José Roberto Afonso, a menor expansão do ICMS
em comparação com a de impostos federais, como o IPI
(20%), coloca dúvidas sobre o argumento do governo de
que a carga tributária está sendo impulsionada pelo
crescimento econômico. "Menos a economia como um todo e
mais fatores específicos explicam o aumento da carga em
2007", diz Afonso.
Fonte: Estado de S. Paulo, de
10/02/2008