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TJ paulista autoriza pagamento antecipado de precatório

por Fernando Porfírio

Fundamentado no princípio constitucional da dignidade humana, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Celso Limongi, determinou, em medida cautelar, o seqüestro de verbas da Fazenda Pública do Estado para o pagamento antecipado do título precatório alimentar a uma pessoa com doença grave. Esta é a 15ª decisão em menos de um ano que fura a fila dos precatórios determinando o pagamento de sentenças judiciais definitivas.

A maior parte dos credores alimentares é formada por pessoas idosas, muitos delas com doenças graves. Os precatórios são dívidas que União, Estado ou Município tem de pagar, por decisão judicial, após a questão ser julgada em definitivo (sem caber mais nenhum recurso). Os pagamentos são feitos em ordem cronológica. Em São Paulo, o tempo de espera é de cerca de 10 anos.

Limongi diz que tomou a decisão com base artigo 1º da Constituição Federal que fala que um dos fundamentos da República é a dignidade da pessoa humana. “São decisões humanitárias”, afirma o presidente do Tribunal de Justiça paulista.

Mas nem sempre o chefe o Judiciário paulista mantém essa posição. No caso dos pedidos de Aparecido dos Santos e Domingos Marques, credores de dívidas alimentares, Limongi negou a liminar, alegando falta de previsão legal.

A defesa dos dois aposentados, que sofrem de doenças graves, entrou com recurso (agravo regimental) contra a decisão do presidente do Tribunal. O Órgão Especial determinou a quebra da ordem cronológica de pagamento e mandou pagar os precatórios.

Limong, alertou sobre a abertura de precedente em casos onde não há previsão específica. Em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que, quando não obedecida à ordem cronológica, o seqüestro de recursos públicos é a medida judicial à disposição do credor.

Do total de recursos analisados até agora, 10 liminares determinavam o seqüestro imediato de verbas públicas para o pagamento de precatórios e outras quatro foram reconsiderações de decisões anteriores que haviam negado o pedido de liminar.

Fonte: Conjur, de 03/09/2007

 


A democratização do acesso à Justiça

CRISTINA GUELFI GONÇALVES

Não faz sentido a Defensoria Pública ter que propor milhares de ações idênticas se há um meio de atuar com uma única ação

HÁ MAIS de duas décadas, a legislação brasileira introduziu no nosso sistema processual a ação civil pública. O Código de Processo Civil, marcado por uma concepção notadamente individualista, já não mais se adequava à dinâmica moderna das relações sociais e não satisfazia à complexidade decorrente de uma sociedade de massa.

A defesa coletiva dos direitos dos cidadãos constituiu um verdadeiro marco no movimento universal do acesso à Justiça, permitindo a racionalização dos esforços voltados à garantia de direitos, vez que o instrumento enfeixa, em um único processo, a pretensão de um conjunto de pessoas, permitindo ao Poder Judiciário decidir questões que envolvam centenas ou milhares de pessoas por meio de apenas uma sentença.

Evita-se, assim, que sejam proferidas decisões contraditórias sobre o mesmo tema e se inibe a reprodução de milhares de processos individuais de idêntico teor, que, de regra, entulham os nossos já sobrecarregados tribunais.

No Brasil, após a implementação do novo mecanismo, o Código de Defesa do Consumidor, aprovado no início dos anos 90, aperfeiçoou a sistemática, dando a todas as entidades públicas que atuam na defesa dos interesses e direitos do consumidor, como Defensoria Pública e Procon, a possibilidade de manejo de tal instrumento, a fim de emprestar maior efetividade ao sistema nacional de proteção concebido naquela importante lei.

Desde então, a Defensoria Pública tem proposto ações civis públicas, visando otimizar a sua atuação de garantir o acesso à Justiça à população carente, o que vem sendo plenamente admitido pelos tribunais brasileiros. No início deste ano, foi sancionada pelo presidente da República a lei nº 11.448, que atribuiu, de forma expressa e ampla, à Defensoria Pública a legitimidade para uso do instrumento.

No entanto, no dia 20 de agosto, a Conamp (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público) ajuizou uma ação no Supremo Tribunal Federal buscando a declaração de inconstitucionalidade dessa nova lei, argumentando que a possibilidade de a Defensoria Pública propor ação civil pública afetaria diretamente atribuição do Ministério Público prevista na Constituição Federal.

O argumento causa estranheza num momento em que a pauta do acesso à Justiça parece ter finalmente entrado na agenda das discussões nacionais.

Primeiro, questiona-se por que apenas a legitimidade da Defensoria Pública seria capaz de afetar diretamente as atribuições institucionais do Ministério Público, e não a de outras entidades que também têm legitimidade pela lei, como União, Estados, municípios e associações civis constituídas há pelo menos um ano.

Segundo, não faria sentido que a Defensoria Pública propusesse centenas ou milhares de ações idênticas, abarrotando o Judiciário, se existe um meio de atuar em prol das centenas e milhares de pessoas com uma única ação, contribuindo para a celeridade da Justiça.

A democratização dos instrumentos de acesso à Justiça, antes de dividir, deve ser vista como um fator de soma na busca de uma sociedade mais livre, justa e solidária, efetivando dessa forma um dos mais importantes objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil previsto na Constituição Federal.

A Defensoria Pública não busca a exclusividade na propositura da ação civil pública, mas que, isto sim, essa ação seja um meio para atacar e corrigir as violações de direitos, em especial de direitos sociais, sofridas pela população carente.

Como tem feito a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, por exemplo, quando propôs ação civil pública para garantir a manutenção da coleta seletiva por meio de cooperativas de catadores de material reciclável, buscando a efetividade do Plano Diretor do município de São Paulo ou, ainda, para garantir que ex-moradores do edifício São Vito continuassem a receber o bolsa-aluguel, pois foram tirados de seus apartamentos sem garantia de realocação em outro imóvel e os pagamentos seriam cessados.

A Defensoria Pública pretende desempenhar suas atribuições com responsabilidade, imbuída do senso de que seus membros são servidores públicos que devem salvaguardar os direitos da população pobre brasileira, que representa significativa parcela da população nacional. E, por isso, temos certeza da constitucionalidade da legitimidade conferida à Defensoria para propor ação civil pública.

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CRISTINA GUELFI GONÇALVES , 37, é defensora pública-geral do Estado de São Paulo e presidente do Conselho Nacional de Defensores Públicos-Gerais.

Fonte: Folha de S. Paulo, de 03/09/2007

 


DECRETO Nº 52.121, DE 31 DE AGOSTO DE 2007

Altera o artigo 4º do Decreto nº 52.031, de 3 de agosto de 2007, que disciplina a aplicação do artigo 4º A da Lei Complementar nº 857, de 20 de maio de 1999, com a redação dada pela Lei Complementar nº 989, de 17 de janeiro de 2006, que dispõe sobre o gozo de licença-prêmio no âmbito da Administração Direta e Indireta e de outros Poderes do Estado

JOSÉ SERRA, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais e à vista da manifestação da Secretaria de Gestão Pública, Decreta:

Artigo 1º - O artigo 4º do Decreto nº 52.031, de 3 de agosto de 2007, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Artigo 4º - O servidor ou militar que optar pela conversão de 30 (trinta) dias de licença-prêmio, em pecúnia, deverá apresentar requerimento, no prazo de 3 (três) meses antes do mês de aniversário.

§ 1º - O órgão de recursos humanos competente deverá instruir o requerimento com:

1. informações relativas à publicação do ato de concessão da licença-prêmio e o período aquisitivo;

2. declaração de não-fruição de parcela de licença-prêmio no ano considerado, relativa ao período aquisitivo, nos termos do artigo 2º deste decreto.

§ 2º - Caberá à autoridade competente, conforme o caso, decidir sobre o deferimento do pedido, com observância:

1. da necessidade do serviço;
2. da disponibilidade orçamentária e financeira;
3. da assiduidade e da ausência de penas disciplinares, no período de 1 (um) ano imediatamente anterior à data do requerimento do servidor ou militar.”.

(NR)

Artigo 2º - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a 4 de agosto de 2007.

Palácio dos Bandeirantes, 31 de agosto de 2007

JOSÉ SERRA

Sidney Beraldo
Secretário de Gestão Pública

Aloysio Nunes Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil

Publicado na Casa Civil, aos 31 de agosto de 2007.

Fonte: D.O.E. de 01/09/2007, publicado em Decretos do Governador

 


Rodrigo Pinho e Mariz divergem sobre extensão de foro especial

Fausto Macedo

O foro privilegiado é justo e necessário?

Polêmico, porque divide juristas, promotores, advogados e magistrados, o foro privilegiado foi tema de debate no Estado, que colocou frente à frente Rodrigo César Rebello Pinho, procurador-geral de Justiça de São Paulo, e Antonio Claudio Mariz de Oliveira, criminalista com ampla experiência nos tribunais.

“O Ministério Público é contra a ampliação indevida do foro, inclusive para ex-autoridades e ex-ocupantes de cargos públicos, porque é um privilégio que inviabiliza as investigações sobre atos de corrupção e improbidade”(Rodrigo Pinho).

“O foro não é um privilégio, é prerrogativa para algumas funções públicas. Deve existir. Privilégio é algo concedido a alguém em detrimento de outros que estão numa mesma situação jurídica, algo que quebra o princípio da igualdade” (Mariz de Oliveira).

Porque beneficia inclusive deputados, o foro arrastou o processo do mensalão para o Supremo Tribunal Federal (STF). São 40 os réus desse capítulo da história que atormenta o governo Lula. Poucos desse grupo, que a Procuradoria-Geral da República rotulou de organização criminosa, têm direito ao foro, mas o princípio da conexão estendeu o privilégio a todos os demais acusados - empresários, publicitários, banqueiros e até servidores públicos que não ocupam ou não ocupavam funções de mando. O STF levou 5 dias apenas para decidir se abria a ação contra os réus do mensalão. Deverá levar pelo menos 5 anos para concluir o julgamento.

O procurador e o advogado divergem com relação a alguns pontos, mas concordam em outros - ambos se declaram contra a “extensão indiscriminada”, como a que foi promovida pela Assembléia de Minas Gerais, em julho, que estendeu o privilégio a cerca de 1,3 mil autoridades estaduais e municipais, atropelando veto do governador Aécio Neves (PSDB). Pinho e Mariz também avaliam que a morosidade do Judiciário aumenta a sensação de impunidade.

O debate, mediado pelo jornalista Roberto Godoy, do Estado, foi transmitido ao vivo no dia 27 pelo portal www.estadao.com.br, com a participação de internautas, que puderam enviar perguntas.

A seguir, alguns dos principais pontos do debate:

O foro é justo e necessário?

Rodrigo César Rebello Pinho: O Ministério Público defende o foro por prerrogativa de função apenas nas hipóteses previstas na Constituição. Em relação ao presidente da República e aos governadores, por exemplo. Não é razoável que um juiz de primeiro grau possa afastar o presidente de suas funções. Isso cria uma instabilidade. O foro não é uma vantagem pessoal, em razão de uma estirpe, de uma condição pessoal. Ele existe em razão do cargo que, no momento do fato sob investigação, a pessoa exerce. É justo e razoável em relação a certas autoridades. Mas não pode ser ampliado de forma desmedida, para beneficiar até ex-ocupantes de cargos públicos.

Antonio Claudio Mariz de Oliveira: O termo correto não é foro privilegiado, é foro por prerrogativa de função. Algumas situações específicas justificam o foro, isso não afronta a igualdade. É preciso deixar claro que quem detém o foro não vai ser julgado por um órgão de fora do Judiciário. Não se trata de um tribunal especial para julgar presidente, governador, procurador-geral. São órgãos da estrutura do Poder Judiciário, compostos de juízes que têm as mesmas garantias e obrigações de todos os juízes. O acusado será julgado por alguém investido das funções de julgador. Algumas autoridades podem e devem ser julgadas de forma diferenciada porque exercem funções especiais, com características especiais. Não posso entender que um presidente de tribunal possa ser julgado por um juiz de primeira instância, recém-ingresso na magistratura, inexperiente.

O que mais preocupa com relação ao foro no momento?

Pinho: A extensão indiscriminada do foro. É o limite que devemos estabelecer, até onde é razoável o foro por prerrogativa. Entendo que em relação a chefe de Poder, aquele que ocupa cargo específico, até para possibilitar uma isenção maior do julgamento, para esses devemos fazer a distinção do que é privilégio e do que é foro por prerrogativa. Em Minas Gerais, a Assembléia aprovou uma lei que dá foro para 1,3 mil pessoas. Essa lei não tem previsão constitucional. Eram 4 ou 5 autoridades com foro, pulou para mais de mil. Querem estender o foro por legislação estadual. Isso esvazia o conteúdo da norma. Pelo foro busca-se impunidade. A conseqüência é a maior morosidade do Judiciário, que alimenta a impunidade e, em muitos casos, leva à prescrição de crimes. O exemplo de Minas é ruim, porque estende de forma abusiva o foro e concentra poderes nas mãos do procurador-geral. Devemos admitir o foro para quem tem grande poder de decisão.

Mariz: Em relação a Minas também sou absolutamente contra a ampliação do foro. Compreendo a preocupação com a prescrição, mas lembro que também as varas e os juízos singulares estão com suas pautas sobrecarregadas. Se os tribunais estão sobrecarregados, os juízes da primeira instância também estão. O juiz tem acúmulo de serviço muito grande.

O foro contribui ainda mais para a morosidade?

Pinho: Nossos tribunais já não têm condições de julgar o grande número de recursos. Logo, não terão como instruir tantas ações se o foro for estendido dessa forma, inclusive para os casos de improbidade. Devemos limitar o foro somente para aqueles citados na Constituição, para situações em que a autoridade está no exercício do cargo. É justamente o exercício que justifica o foro.

Mariz: O foro por prerrogativa é do Direito brasileiro. Acho que essa discussão envereda por alguns segmentos interessados na desmoralização do Judiciário, na diminuição da sua credibilidade. O Judiciário tem suas mazelas, que precisam ser corrigidas. Mas é preciso reconhecer o lado bom do Judiciário, porque do contrário vamos caminhar para uma situação muito perigosa. O foro não é pró-corrupção. Essa imagem é errada, porque estão enlameando os membros dos tribunais competentes. Os desembargadores e os ministros são homens de bem. Não fazem parte de um tribunal de exceção. Os ministros são piores que juízes de primeiro grau? Estão colocando uma pecha de que eles são adeptos da impunidade, e isso não é verdade. Há mais morosidade sim, mas dizer que há impunidade não é correto. É ruim porque desmoraliza o Judiciário.

Os prefeitos devem ter foro?

Pinho: Não. Na área criminal, a lentidão é evidente nos casos que envolvem prefeitos. Os promotores e os juízes que estão muito próximos do fato têm melhores condições de apreciar uma denúncia e investigá-la. O bom promotor e o bom juiz têm experiência suficiente para evitar que sejam transformados em instrumentos de utilização política, sobretudo em época de eleição. Isso realmente pode ocorrer, faz parte da democracia. É por isso que o juiz e o promotor têm que estar atentos. Mas tem uma boa notícia: o Tribunal de Justiça de São Paulo estuda a criação de uma câmara especializada para cuidar exclusivamente de ações relativas a prefeitos. O presidente do TJ (desembargador Celso Limongi) encaminhou proposta ao Órgão Especial.

Mariz: Sou a favor. Com relação aos prefeitos, a prerrogativa cria blindagem para impedir influências políticas. Um problema muito sério é o da politização da Justiça, especialmente nas comarcas do interior do Brasil, onde tanto o juiz como o promotor ficam sujeitos a influências e pressões. Isso é real. Na apuração dos crimes de maior repercussão, muitas vezes juiz e promotor ficam subjetivamente comprometidos emocionalmente com o fato. São seres humanos. Podem não se imiscuir, mas sentirão toda aquela repercussão que está batendo à sua porta.

Não é o momento de uma revitalização dos tribunais?

Pinho: Cada ministro do STF julga 10 mil feitos/ano. Eles julgam por pilha. Em outros países as altas cortes julgam 300 a 400 casos por ano. Aqui, a decisão judicial de primeiro grau não tem efeito tão forte, tudo vai parar em Brasília. A Justiça local não é tão valorizada, é preciso uma reforma.

Mariz: O problema atinge a Justiça como um todo. São muitos os problemas, informatização insuficiente, má condição de trabalho, escassez de funcionários e outros fatores que levam o Judiciário a não dar a resposta no tempo desejado.

Fonte: O Estado de S. Paulo, de 01/09/2007

 


Legislação brasileira cria processo “bumerangue”, diz presidente do TRF-3

Roseli Ribeiro

Juíza federal desde 1987, Marli Ferreira assumiu a presidência do TRF-3 (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região com planos de modernizar a Corte e tornar mais ágil a tramitação dos processos.

Formada em direito pela PUC-SP em 1971, durante 17 anos atuou como procuradora do município de São Paulo. Chegou ao TRF-3, que abrange São Paulo e Mato Grosso do Sul, em 1995. Antes de assumir a presidência, foi corregedora-geral.

Para ela, a legislação processual brasileira é extremamente ineficiente. E um dos principais motivos para a morosidade da Justiça. "Nossa legislação torna o processo um verdadeiro bumerangue. Quando o juiz pensa que o processo terminou, ele volta. Em alguns casos, a impressão é que nunca terminam".

Ela garante que todos os membros da Corte presidida por ela envolvidos na operação Themis da Polícia Federal responderão a processos disciplinares perante o Órgão Especial do TRF-3. "O Superior Tribunal de Justiça está trabalhando na parte criminal. Nós trabalharemos na parte administrativa" (na operação, que apura o suposto envolvimento de juízes na venda de sentenças a favor de proprietários de bingos, foram realizadas buscas e apreensões nos gabinetes dos desembargadores, Alda Basto, Roberto Haddad e Nery da Costa Júnior).

Ardorosa defensora da tele-conferência, conta que o TRF-3 está investindo em tecnologia para continuar usando esse tipo de sistema em interrogatórios e oitivas de testemunhas. E espera que o STF (Supremo Tribunal Federal) reconsidere a decisão contrária ao uso da tele-conferência.

Leia abaixo os melhores momentos da entrevista concedida com exclusividade à reportagem de Última Instância.

Última Instância - Quais suas prioridades para melhorar o desempenho do TRF-3?

Marli Ferreira - Quero que até o final do ano os gabinetes estejam quase zerados. Em média, sobem 32 mil recursos por mês para serem distribuídos aos gabinetes. Quero diminuir o acervo existente e espero que cada gabinete tenha apenas os distribuídos em 2007.

Criamos um Plano Diretor para reestruturar o tribunal administrativamente. Colocamos metas para todos os servidores. Estamos informatizando as comunicações com os outros órgãos públicos. Investimos muito em informática e montamos um sistema de vídeo-conferência, com equipamentos em todas as sedes de regiões administrativas da primeira instância ligando o tribunal. Criamos também turmas de conciliação em primeira e segunda instância, turmas recursais suplementares de juízes para julgarem o acervo antigo de processos. Há um esforço muito grande para informatizar tudo que for possível. O nosso sistema de pagamento de precatórios, por exemplo, já é totalmente eletrônico.

Última Instância - A senhora falou em vídeo-conferência, mas o STF recentemente rejeitou o uso do equipamento. E agora?

Marli Ferreira Instalamos em São Paulo a tele-audiência, que é usada na área criminal. Com ela, você não corre o risco de um resgate de preso na estrada. E economiza com o transporte. O sistema da tele-audiência garante todo o contraditório, a ampla defesa, a segurança das testemunhas. Estou cansada de ouvir a testemunha dizer; ‘se ele for eu não vou depor’. Ou seja, não se consegue saber a verdade, se o réu estiver na sala. A testemunha tem medo porque vivemos em um estado de terrorismo, ameaçador. A lei do mais forte prevalece. A tele-audiência dá absoluta privacidade para o procurador, para o defensor e para o preso. Inclusive, se ele não quiser falar no telefone privativo, pode usar uma cabine. É uma tecnologia de ponta, todos os países estão adotando. O olho no olho pode ser através da tela, não precisa ser presencial. A decisão do STF foi dada em um processo específico. Espero que os ministros reconsiderem essa posição.

Última Instância – Quais as principais dificuldades dos magistrados brasileiros?

Marli Ferreira A primeira é o excesso de trabalho. Nenhum outro país do mundo tem esse volume de ações. A segunda dificuldade é que temos um sistema recursal perverso. Uma legislação processual civil e penal extremamente ineficiente. Uma lei que torna o processo um verdadeiro bumerangue. Quando o juiz pensa que o processo terminou, ele volta. Em alguns, se tem a impressão que nunca terminam. É desalentador. E a terceira dificuldade é a falta de estrutura interna do Judiciário. Não temos servidores em número suficiente, um prédio adequado, equipamentos. O mesmo acontece com outras instituições ligadas à Justiça Federal como, por exemplo, a Procuradoria da Fazenda Nacional, a Advocacia Geral da União, a Polícia Federal.

Outro aspecto são os advogados despreparados que atuam na Justiça. A grande maioria é de profissionais bons, sérios, bem preparados. Mas a abundância de cursos jurídicos, sem a mínima estruturação técnica e educacional leva esse país à bancarrota em termos judiciários e jurídicos. Há advogados que mal sabem falar o português, advogam mal, dão trabalho para o juiz. Temos que praticamente interpretar o que eles pedem.

Última Instância – Como fazer com que a sociedade volte a acreditar na Justiça?

Marli Ferreira Não existe crise de credibilidade no Judiciário. O que há é uma certa fragilidade social diante dos problemas que têm envolvido alguns poucos membros do Judiciário. E diante das respostas do Judiciário, que se baseia nos fatos e aplica a lei. Antes, a Justiça punia sem divulgar. Agora, pune com manifestação externa, para que a sociedade saiba que não existe espírito corporativista.

O Judiciário é controlado por todo mundo, pela imprensa. A senhora está aqui, é um controle que está exercendo, importantíssimo porque é um controle previsto no princípio do Estado Democrático de Direito. A imprensa livre é tudo o que nós precisamos para poder conter os desvios de conduta e situações que colocam em risco a própria sociedade. O Judiciário é ainda controlado pelos advogados, que podem representar na corregedoria, no próprio tribunal e nos superiores. Temos o Conselho Nacional de Justiça, as corregedorias nacional, a corregedoria federal. Somos hipercontrolados, não um poder que corre solto.

Última Instância - Como a senhora avalia o impacto de escândalos envolvendo desembargadores federais? Isso repercute de que maneira no cotidiano da Justiça Federal?

Marli Ferreira - Não tenho como avaliar o impacto na opinião pública. Há uma fragilidade muito grande da instituição quando isso acontece. Ficamos expostos por algo completamente descompassado e inadmissível para as nossas atividades.

Não compactuamos com isso e estamos vigilantes em relação a esses desvios de conduta. Espero que nunca mais isso ocorra dentro do TRF-3. Os desvios que ocorreram serão investigados e apurados. Se houver culpa, os responsáveis serão punidos de forma exemplar, dentro da lei. Há um procedimento que recebi do STJ há poucos dias e estou analisando para levar ao Órgão Especial e abrir processo disciplinar administrativo. O STJ apura a parte criminal. Nós, a administrativa.

Última Instância - Como a sra. analisa a atuação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça)?

Marli Ferreira - O Conselho surgiu com caráter organizacional e administrativo. É composto por juízes e pelos mais variados representantes da sociedade exatamente para cuidar de situações em que possa haver um certo desvio dos atos do Judiciário ou dos magistrados. O CNJ está buscando a sua própria identidade. Tem acertado mais do que errado.

Última Instância – E qual sua opinião sobre as súmulas vinculantes?

Marli Ferreira - Sou favorável. Ela não vem para a engessar a Justiça. Sempre existiu certo vínculo entre as decisões de um tribunal em relação aos juízes a ele submetidos. São os precedentes. A súmula vinculante tem que ser usada em situações especialíssimas, respeitar a hipótese que foi formadora da súmula. O perigo é usar a súmula para situações que não são idênticas. Fora isso, acho que ela vai desafogar os tribunais.

Última Instância - As mulheres, por sua própria natureza, são melhores juízes do que os homens?

Marli Ferreira - Essa pergunta é perversa. Não acho que sejam melhores ou piores. Depende da natureza de cada um, da formação. Eles são mais imediatistas. Elas, mais sensíveis. O jurista italiano Piero Calamandrei dizia que a palavra sentença tem a mesma raiz semântica de sentimento. Evidentemente, acho que a mulher tem mais sensibilidade para o julgamento. Mas um bom juiz não se faz pelo sexo. Um bom juiz é aquele que sabe o que pode e o que não pode. O que deve e o que não deve.

Última Instância - A sra. não acha que está na hora de acabar com o foro privilegiado? Ele existe em outros países?

Marli Ferreira O foro privilegiado existe na história desde o século V, sempre existiu. A maioria dos países concede algum tipo de privilégio em decorrência do ofício de algumas pessoas. E no Brasil, isso vem desde o tempo do Império.

O foro privilegiado na verdade é o anti-privilégio. É uma criação jurídica que tira do acusado a possibilidade de recorrer a uma outra via. Por exemplo, os 40 acusados do mensalão estão sendo julgados pelo Supremo e não terão direito a mais nenhum recurso.

Última Instância - Com relação ao caso da desembargadora Cecília Marcondes, e o processo da Anac sobre a liberação da pista de Congonhas, qual a sua avaliação sobre o que aconteceu?

Marli Ferreira - O juiz de primeiro grau deu uma decisão e houve um recurso para o Tribunal, cuja relatoria coube à desembargadora Cecília Marcondes. Antes de decidir, ela ouviu a Anac e a Infraero.

A diretora da Anac esteve aqui acompanhada de outros membros da agência apresentando documentos sobre a segurança na pista. O juiz de primeiro grau, com base nos elementos fornecidos pelo Ministério Público Federal, fixou certas barreiras para pouso de aviões acima de determinado peso na pista principal.

A desembargadora, à vista do documento, entendeu que não havia razão para manter a restrição na pista. A Infraero e a Anac alegaram que havia plena segurança, não havia porque interditar o aeroporto mais importante de São Paulo. A juíza acreditou na seriedade e na veracidade dos documentos. Depois, na CPI, disseram que o documento não era para valer, que se tratava apenas de um documento interno.

Fonte: Última Instância, de 03/08/2007