TJ paulista autoriza pagamento antecipado de precatório
por
Fernando Porfírio
Fundamentado no princípio constitucional da dignidade
humana, o presidente do Tribunal de Justiça de São
Paulo, desembargador Celso Limongi, determinou, em
medida cautelar, o seqüestro de verbas da Fazenda
Pública do Estado para o pagamento antecipado do título
precatório alimentar a uma pessoa com doença grave. Esta
é a 15ª decisão em menos de um ano que fura a fila dos
precatórios determinando o pagamento de sentenças
judiciais definitivas.
A
maior parte dos credores alimentares é formada por
pessoas idosas, muitos delas com doenças graves. Os
precatórios são dívidas que União, Estado ou Município
tem de pagar, por decisão judicial, após a questão ser
julgada em definitivo (sem caber mais nenhum recurso).
Os pagamentos são feitos em ordem cronológica. Em São
Paulo, o tempo de espera é de cerca de 10 anos.
Limongi diz que tomou a decisão com base artigo 1º da
Constituição Federal que fala que um dos fundamentos da
República é a dignidade da pessoa humana. “São decisões
humanitárias”, afirma o presidente do Tribunal de
Justiça paulista.
Mas
nem sempre o chefe o Judiciário paulista mantém essa
posição. No caso dos pedidos de Aparecido dos Santos e
Domingos Marques, credores de dívidas alimentares,
Limongi negou a liminar, alegando falta de previsão
legal.
A
defesa dos dois aposentados, que sofrem de doenças
graves, entrou com recurso (agravo regimental) contra a
decisão do presidente do Tribunal. O Órgão Especial
determinou a quebra da ordem cronológica de pagamento e
mandou pagar os precatórios.
Limong, alertou sobre a abertura de precedente em casos
onde não há previsão específica. Em recente decisão, o
Supremo Tribunal Federal reconheceu que, quando não
obedecida à ordem cronológica, o seqüestro de recursos
públicos é a medida judicial à disposição do credor.
Do
total de recursos analisados até agora, 10 liminares
determinavam o seqüestro imediato de verbas públicas
para o pagamento de precatórios e outras quatro foram
reconsiderações de decisões anteriores que haviam negado
o pedido de liminar.
Fonte: Conjur, de 03/09/2007
A democratização do acesso à Justiça
CRISTINA GUELFI GONÇALVES
Não
faz sentido a Defensoria Pública ter que propor milhares
de ações idênticas se há um meio de atuar com uma única
ação
HÁ
MAIS de duas décadas, a legislação brasileira introduziu
no nosso sistema processual a ação civil pública. O
Código de Processo Civil, marcado por uma concepção
notadamente individualista, já não mais se adequava à
dinâmica moderna das relações sociais e não satisfazia à
complexidade decorrente de uma sociedade de massa.
A
defesa coletiva dos direitos dos cidadãos constituiu um
verdadeiro marco no movimento universal do acesso à
Justiça, permitindo a racionalização dos esforços
voltados à garantia de direitos, vez que o instrumento
enfeixa, em um único processo, a pretensão de um
conjunto de pessoas, permitindo ao Poder Judiciário
decidir questões que envolvam centenas ou milhares de
pessoas por meio de apenas uma sentença.
Evita-se, assim, que sejam proferidas decisões
contraditórias sobre o mesmo tema e se inibe a
reprodução de milhares de processos individuais de
idêntico teor, que, de regra, entulham os nossos já
sobrecarregados tribunais.
No
Brasil, após a implementação do novo mecanismo, o Código
de Defesa do Consumidor, aprovado no início dos anos 90,
aperfeiçoou a sistemática, dando a todas as entidades
públicas que atuam na defesa dos interesses e direitos
do consumidor, como Defensoria Pública e Procon, a
possibilidade de manejo de tal instrumento, a fim de
emprestar maior efetividade ao sistema nacional de
proteção concebido naquela importante lei.
Desde
então, a Defensoria Pública tem proposto ações civis
públicas, visando otimizar a sua atuação de garantir o
acesso à Justiça à população carente, o que vem sendo
plenamente admitido pelos tribunais brasileiros. No
início deste ano, foi sancionada pelo presidente da
República a lei nº 11.448, que atribuiu, de forma
expressa e ampla, à Defensoria Pública a legitimidade
para uso do instrumento.
No
entanto, no dia 20 de agosto, a Conamp (Associação
Nacional dos Membros do Ministério Público) ajuizou uma
ação no Supremo Tribunal Federal buscando a declaração
de inconstitucionalidade dessa nova lei, argumentando
que a possibilidade de a Defensoria Pública propor ação
civil pública afetaria diretamente atribuição do
Ministério Público prevista na Constituição Federal.
O
argumento causa estranheza num momento em que a pauta do
acesso à Justiça parece ter finalmente entrado na agenda
das discussões nacionais.
Primeiro, questiona-se por que apenas a legitimidade da
Defensoria Pública seria capaz de afetar diretamente as
atribuições institucionais do Ministério Público, e não
a de outras entidades que também têm legitimidade pela
lei, como União, Estados, municípios e associações civis
constituídas há pelo menos um ano.
Segundo, não faria sentido que a Defensoria Pública
propusesse centenas ou milhares de ações idênticas,
abarrotando o Judiciário, se existe um meio de atuar em
prol das centenas e milhares de pessoas com uma única
ação, contribuindo para a celeridade da Justiça.
A
democratização dos instrumentos de acesso à Justiça,
antes de dividir, deve ser vista como um fator de soma
na busca de uma sociedade mais livre, justa e solidária,
efetivando dessa forma um dos mais importantes objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil previsto
na Constituição Federal.
A
Defensoria Pública não busca a exclusividade na
propositura da ação civil pública, mas que, isto sim,
essa ação seja um meio para atacar e corrigir as
violações de direitos, em especial de direitos sociais,
sofridas pela população carente.
Como
tem feito a Defensoria Pública do Estado de São Paulo,
por exemplo, quando propôs ação civil pública para
garantir a manutenção da coleta seletiva por meio de
cooperativas de catadores de material reciclável,
buscando a efetividade do Plano Diretor do município de
São Paulo ou, ainda, para garantir que ex-moradores do
edifício São Vito continuassem a receber o
bolsa-aluguel, pois foram tirados de seus apartamentos
sem garantia de realocação em outro imóvel e os
pagamentos seriam cessados.
A
Defensoria Pública pretende desempenhar suas atribuições
com responsabilidade, imbuída do senso de que seus
membros são servidores públicos que devem salvaguardar
os direitos da população pobre brasileira, que
representa significativa parcela da população nacional.
E, por isso, temos certeza da constitucionalidade da
legitimidade conferida à Defensoria para propor ação
civil pública.
--------------------------------------------------------------------------------
CRISTINA GUELFI GONÇALVES , 37, é defensora
pública-geral do Estado de São Paulo e presidente do
Conselho Nacional de Defensores Públicos-Gerais.
Fonte: Folha de S. Paulo, de 03/09/2007
DECRETO Nº 52.121, DE 31 DE AGOSTO DE 2007
Altera o artigo 4º do Decreto nº 52.031, de 3 de agosto
de 2007, que disciplina a aplicação do artigo 4º A da
Lei Complementar nº 857, de 20 de maio de 1999, com a
redação dada pela Lei Complementar nº 989, de 17 de
janeiro de 2006, que dispõe sobre o gozo de
licença-prêmio no âmbito da Administração Direta e
Indireta e de outros Poderes do Estado
JOSÉ
SERRA, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas
atribuições legais e à vista da manifestação da
Secretaria de Gestão Pública, Decreta:
Artigo 1º - O artigo 4º do Decreto nº 52.031, de 3 de
agosto de 2007, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Artigo 4º - O servidor ou militar que optar pela
conversão de 30 (trinta) dias de licença-prêmio, em
pecúnia, deverá apresentar requerimento, no prazo de 3
(três) meses antes do mês de aniversário.
§ 1º
- O órgão de recursos humanos competente deverá instruir
o requerimento com:
1.
informações relativas à publicação do ato de concessão
da licença-prêmio e o período aquisitivo;
2.
declaração de não-fruição de parcela de licença-prêmio
no ano considerado, relativa ao período aquisitivo, nos
termos do artigo 2º deste decreto.
§ 2º
- Caberá à autoridade competente, conforme o caso,
decidir sobre o deferimento do pedido, com observância:
1. da
necessidade do serviço;
2. da disponibilidade orçamentária e financeira;
3. da assiduidade e da ausência de penas disciplinares,
no período de 1 (um) ano imediatamente anterior à data
do requerimento do servidor ou militar.”.
(NR)
Artigo 2º - Este decreto entra em vigor na data de sua
publicação, retroagindo seus efeitos a 4 de agosto de
2007.
Palácio dos Bandeirantes, 31 de agosto de 2007
JOSÉ
SERRA
Sidney Beraldo
Secretário de Gestão Pública
Aloysio Nunes Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil
Publicado na Casa Civil, aos 31 de agosto de 2007.
Fonte: D.O.E. de 01/09/2007, publicado em Decretos do
Governador
Rodrigo Pinho e Mariz divergem sobre extensão de foro
especial
Fausto Macedo
O
foro privilegiado é justo e necessário?
Polêmico, porque divide juristas, promotores, advogados
e magistrados, o foro privilegiado foi tema de debate no
Estado, que colocou frente à frente Rodrigo César
Rebello Pinho, procurador-geral de Justiça de São Paulo,
e Antonio Claudio Mariz de Oliveira, criminalista com
ampla experiência nos tribunais.
“O
Ministério Público é contra a ampliação indevida do
foro, inclusive para ex-autoridades e ex-ocupantes de
cargos públicos, porque é um privilégio que inviabiliza
as investigações sobre atos de corrupção e
improbidade”(Rodrigo Pinho).
“O
foro não é um privilégio, é prerrogativa para algumas
funções públicas. Deve existir. Privilégio é algo
concedido a alguém em detrimento de outros que estão
numa mesma situação jurídica, algo que quebra o
princípio da igualdade” (Mariz de Oliveira).
Porque beneficia inclusive deputados, o foro arrastou o
processo do mensalão para o Supremo Tribunal Federal
(STF). São 40 os réus desse capítulo da história que
atormenta o governo Lula. Poucos desse grupo, que a
Procuradoria-Geral da República rotulou de organização
criminosa, têm direito ao foro, mas o princípio da
conexão estendeu o privilégio a todos os demais acusados
- empresários, publicitários, banqueiros e até
servidores públicos que não ocupam ou não ocupavam
funções de mando. O STF levou 5 dias apenas para decidir
se abria a ação contra os réus do mensalão. Deverá levar
pelo menos 5 anos para concluir o julgamento.
O
procurador e o advogado divergem com relação a alguns
pontos, mas concordam em outros - ambos se declaram
contra a “extensão indiscriminada”, como a que foi
promovida pela Assembléia de Minas Gerais, em julho, que
estendeu o privilégio a cerca de 1,3 mil autoridades
estaduais e municipais, atropelando veto do governador
Aécio Neves (PSDB). Pinho e Mariz também avaliam que a
morosidade do Judiciário aumenta a sensação de
impunidade.
O
debate, mediado pelo jornalista Roberto Godoy, do
Estado, foi transmitido ao vivo no dia 27 pelo portal
www.estadao.com.br, com a participação de internautas,
que puderam enviar perguntas.
A
seguir, alguns dos principais pontos do debate:
O
foro é justo e necessário?
Rodrigo César Rebello Pinho: O Ministério Público
defende o foro por prerrogativa de função apenas nas
hipóteses previstas na Constituição. Em relação ao
presidente da República e aos governadores, por exemplo.
Não é razoável que um juiz de primeiro grau possa
afastar o presidente de suas funções. Isso cria uma
instabilidade. O foro não é uma vantagem pessoal, em
razão de uma estirpe, de uma condição pessoal. Ele
existe em razão do cargo que, no momento do fato sob
investigação, a pessoa exerce. É justo e razoável em
relação a certas autoridades. Mas não pode ser ampliado
de forma desmedida, para beneficiar até ex-ocupantes de
cargos públicos.
Antonio Claudio Mariz de Oliveira: O termo correto não é
foro privilegiado, é foro por prerrogativa de função.
Algumas situações específicas justificam o foro, isso
não afronta a igualdade. É preciso deixar claro que quem
detém o foro não vai ser julgado por um órgão de fora do
Judiciário. Não se trata de um tribunal especial para
julgar presidente, governador, procurador-geral. São
órgãos da estrutura do Poder Judiciário, compostos de
juízes que têm as mesmas garantias e obrigações de todos
os juízes. O acusado será julgado por alguém investido
das funções de julgador. Algumas autoridades podem e
devem ser julgadas de forma diferenciada porque exercem
funções especiais, com características especiais. Não
posso entender que um presidente de tribunal possa ser
julgado por um juiz de primeira instância,
recém-ingresso na magistratura, inexperiente.
O que
mais preocupa com relação ao foro no momento?
Pinho: A extensão indiscriminada do foro. É o limite que
devemos estabelecer, até onde é razoável o foro por
prerrogativa. Entendo que em relação a chefe de Poder,
aquele que ocupa cargo específico, até para possibilitar
uma isenção maior do julgamento, para esses devemos
fazer a distinção do que é privilégio e do que é foro
por prerrogativa. Em Minas Gerais, a Assembléia aprovou
uma lei que dá foro para 1,3 mil pessoas. Essa lei não
tem previsão constitucional. Eram 4 ou 5 autoridades com
foro, pulou para mais de mil. Querem estender o foro por
legislação estadual. Isso esvazia o conteúdo da norma.
Pelo foro busca-se impunidade. A conseqüência é a maior
morosidade do Judiciário, que alimenta a impunidade e,
em muitos casos, leva à prescrição de crimes. O exemplo
de Minas é ruim, porque estende de forma abusiva o foro
e concentra poderes nas mãos do procurador-geral.
Devemos admitir o foro para quem tem grande poder de
decisão.
Mariz:
Em relação a Minas também sou absolutamente contra a
ampliação do foro. Compreendo a preocupação com a
prescrição, mas lembro que também as varas e os juízos
singulares estão com suas pautas sobrecarregadas. Se os
tribunais estão sobrecarregados, os juízes da primeira
instância também estão. O juiz tem acúmulo de serviço
muito grande.
O
foro contribui ainda mais para a morosidade?
Pinho: Nossos tribunais já não têm condições de julgar o
grande número de recursos. Logo, não terão como instruir
tantas ações se o foro for estendido dessa forma,
inclusive para os casos de improbidade. Devemos limitar
o foro somente para aqueles citados na Constituição,
para situações em que a autoridade está no exercício do
cargo. É justamente o exercício que justifica o foro.
Mariz:
O foro por prerrogativa é do Direito brasileiro. Acho
que essa discussão envereda por alguns segmentos
interessados na desmoralização do Judiciário, na
diminuição da sua credibilidade. O Judiciário tem suas
mazelas, que precisam ser corrigidas. Mas é preciso
reconhecer o lado bom do Judiciário, porque do contrário
vamos caminhar para uma situação muito perigosa. O foro
não é pró-corrupção. Essa imagem é errada, porque estão
enlameando os membros dos tribunais competentes. Os
desembargadores e os ministros são homens de bem. Não
fazem parte de um tribunal de exceção. Os ministros são
piores que juízes de primeiro grau? Estão colocando uma
pecha de que eles são adeptos da impunidade, e isso não
é verdade. Há mais morosidade sim, mas dizer que há
impunidade não é correto. É ruim porque desmoraliza o
Judiciário.
Os
prefeitos devem ter foro?
Pinho: Não. Na área criminal, a lentidão é evidente nos
casos que envolvem prefeitos. Os promotores e os juízes
que estão muito próximos do fato têm melhores condições
de apreciar uma denúncia e investigá-la. O bom promotor
e o bom juiz têm experiência suficiente para evitar que
sejam transformados em instrumentos de utilização
política, sobretudo em época de eleição. Isso realmente
pode ocorrer, faz parte da democracia. É por isso que o
juiz e o promotor têm que estar atentos. Mas tem uma boa
notícia: o Tribunal de Justiça de São Paulo estuda a
criação de uma câmara especializada para cuidar
exclusivamente de ações relativas a prefeitos. O
presidente do TJ (desembargador Celso Limongi)
encaminhou proposta ao Órgão Especial.
Mariz:
Sou a favor. Com relação aos prefeitos, a prerrogativa
cria blindagem para impedir influências políticas. Um
problema muito sério é o da politização da Justiça,
especialmente nas comarcas do interior do Brasil, onde
tanto o juiz como o promotor ficam sujeitos a
influências e pressões. Isso é real. Na apuração dos
crimes de maior repercussão, muitas vezes juiz e
promotor ficam subjetivamente comprometidos
emocionalmente com o fato. São seres humanos. Podem não
se imiscuir, mas sentirão toda aquela repercussão que
está batendo à sua porta.
Não é
o momento de uma revitalização dos tribunais?
Pinho: Cada ministro do STF julga 10 mil feitos/ano.
Eles julgam por pilha. Em outros países as altas cortes
julgam 300 a 400 casos por ano. Aqui, a decisão judicial
de primeiro grau não tem efeito tão forte, tudo vai
parar
em Brasília. A Justiça local não é tão valorizada, é preciso uma reforma.
Mariz:
O problema atinge a Justiça como um todo. São muitos os
problemas, informatização insuficiente, má condição de
trabalho, escassez de funcionários e outros fatores que
levam o Judiciário a não dar a resposta no tempo
desejado.
Fonte: O Estado de S. Paulo, de 01/09/2007
Legislação brasileira cria processo “bumerangue”, diz
presidente do TRF-3
Roseli Ribeiro
Juíza
federal desde 1987, Marli Ferreira assumiu a presidência
do TRF-3 (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região com
planos de modernizar a Corte e tornar mais ágil a
tramitação dos processos.
Formada em direito pela PUC-SP em 1971, durante 17 anos
atuou como procuradora do município de São Paulo. Chegou
ao TRF-3, que abrange São Paulo e Mato Grosso do Sul, em
1995. Antes de assumir a presidência, foi
corregedora-geral.
Para
ela, a legislação processual brasileira é extremamente
ineficiente. E um dos principais motivos para a
morosidade da Justiça. "Nossa legislação torna o
processo um verdadeiro bumerangue. Quando o juiz pensa
que o processo terminou, ele volta. Em alguns casos, a
impressão é que nunca terminam".
Ela
garante que todos os membros da Corte presidida por ela
envolvidos na operação Themis da Polícia Federal
responderão a processos disciplinares perante o Órgão
Especial do TRF-3. "O Superior Tribunal de Justiça está
trabalhando na parte criminal. Nós trabalharemos na
parte administrativa" (na operação, que apura o suposto
envolvimento de juízes na venda de sentenças a favor de
proprietários de bingos, foram realizadas buscas e
apreensões nos gabinetes dos desembargadores, Alda
Basto, Roberto Haddad e Nery da Costa Júnior).
Ardorosa defensora da tele-conferência, conta que o
TRF-3 está investindo em tecnologia para continuar
usando esse tipo de sistema em interrogatórios e oitivas
de testemunhas. E espera que o STF (Supremo Tribunal
Federal) reconsidere a decisão contrária ao uso da
tele-conferência.
Leia
abaixo os melhores momentos da entrevista concedida com
exclusividade à reportagem de Última Instância.
Última Instância - Quais suas prioridades para melhorar
o desempenho do TRF-3?
Marli
Ferreira - Quero que até o final do ano os gabinetes
estejam quase zerados. Em média, sobem 32 mil recursos
por mês para serem distribuídos aos gabinetes. Quero
diminuir o acervo existente e espero que cada gabinete
tenha apenas os distribuídos em 2007.
Criamos um Plano Diretor para reestruturar o tribunal
administrativamente. Colocamos metas para todos os
servidores. Estamos informatizando as comunicações com
os outros órgãos públicos. Investimos muito em
informática e montamos um sistema de vídeo-conferência,
com equipamentos em todas as sedes de regiões
administrativas da primeira instância ligando o
tribunal. Criamos também turmas de conciliação em
primeira e segunda instância, turmas recursais
suplementares de juízes para julgarem o acervo antigo de
processos. Há um esforço muito grande para informatizar
tudo que for possível. O nosso sistema de pagamento de
precatórios, por exemplo, já é totalmente eletrônico.
Última Instância - A senhora falou em vídeo-conferência,
mas o STF recentemente rejeitou o uso do equipamento. E
agora?
Marli
Ferreira Instalamos em São Paulo a tele-audiência, que é
usada na área criminal. Com ela, você não corre o risco
de um resgate de preso na estrada. E economiza com o
transporte. O sistema da tele-audiência garante todo o
contraditório, a ampla defesa, a segurança das
testemunhas. Estou cansada de ouvir a testemunha dizer;
‘se ele for eu não vou depor’. Ou seja, não se consegue
saber a verdade, se o réu estiver na sala. A testemunha
tem medo porque vivemos em um estado de terrorismo,
ameaçador. A lei do mais forte prevalece. A
tele-audiência dá absoluta privacidade para o
procurador, para o defensor e para o preso. Inclusive,
se ele não quiser falar no telefone privativo, pode usar
uma cabine. É uma tecnologia de ponta, todos os países
estão adotando. O olho no olho pode ser através da tela,
não precisa ser presencial. A decisão do STF foi dada em
um processo específico. Espero que os ministros
reconsiderem essa posição.
Última Instância – Quais as principais dificuldades dos
magistrados brasileiros?
Marli
Ferreira A primeira é o excesso de trabalho. Nenhum
outro país do mundo tem esse volume de ações. A segunda
dificuldade é que temos um sistema recursal perverso.
Uma legislação processual civil e penal extremamente
ineficiente. Uma lei que torna o processo um verdadeiro
bumerangue. Quando o juiz pensa que o processo terminou,
ele volta. Em alguns, se tem a impressão que nunca
terminam. É desalentador. E a terceira dificuldade é a
falta de estrutura interna do Judiciário. Não temos
servidores em número suficiente, um prédio adequado,
equipamentos. O mesmo acontece com outras instituições
ligadas à Justiça Federal como, por exemplo, a
Procuradoria da Fazenda Nacional, a Advocacia Geral da
União, a Polícia Federal.
Outro
aspecto são os advogados despreparados que atuam na
Justiça. A grande maioria é de profissionais bons,
sérios, bem preparados. Mas a abundância de cursos
jurídicos, sem a mínima estruturação técnica e
educacional leva esse país à bancarrota em termos
judiciários e jurídicos. Há advogados que mal sabem
falar o português, advogam mal, dão trabalho para o
juiz. Temos que praticamente interpretar o que eles
pedem.
Última Instância – Como fazer com que a sociedade volte
a acreditar na Justiça?
Marli
Ferreira Não existe crise de credibilidade no
Judiciário. O que há é uma certa fragilidade social
diante dos problemas que têm envolvido alguns poucos
membros do Judiciário. E diante das respostas do
Judiciário, que se baseia nos fatos e aplica a lei.
Antes, a Justiça punia sem divulgar. Agora, pune com
manifestação externa, para que a sociedade saiba que não
existe espírito corporativista.
O
Judiciário é controlado por todo mundo, pela imprensa. A
senhora está aqui, é um controle que está exercendo,
importantíssimo porque é um controle previsto no
princípio do Estado Democrático de Direito. A imprensa
livre é tudo o que nós precisamos para poder conter os
desvios de conduta e situações que colocam em risco a
própria sociedade. O Judiciário é ainda controlado pelos
advogados, que podem representar na corregedoria, no
próprio tribunal e nos superiores. Temos o Conselho
Nacional de Justiça, as corregedorias nacional, a
corregedoria federal. Somos hipercontrolados, não um
poder que corre solto.
Última Instância - Como a senhora avalia o impacto de
escândalos envolvendo desembargadores federais? Isso
repercute de que maneira no cotidiano da Justiça
Federal?
Marli
Ferreira - Não tenho como avaliar o impacto na opinião
pública. Há uma fragilidade muito grande da instituição
quando isso acontece. Ficamos expostos por algo
completamente descompassado e inadmissível para as
nossas atividades.
Não
compactuamos com isso e estamos vigilantes em relação a
esses desvios de conduta. Espero que nunca mais isso
ocorra dentro do TRF-3. Os desvios que ocorreram serão
investigados e apurados. Se houver culpa, os
responsáveis serão punidos de forma exemplar, dentro da
lei. Há um procedimento que recebi do STJ há poucos dias
e estou analisando para levar ao Órgão Especial e abrir
processo disciplinar administrativo. O STJ apura a parte
criminal. Nós, a administrativa.
Última Instância - Como a sra. analisa a atuação do CNJ
(Conselho Nacional de Justiça)?
Marli
Ferreira - O Conselho surgiu com caráter organizacional
e administrativo. É composto por juízes e pelos mais
variados representantes da sociedade exatamente para
cuidar de situações em que possa haver um certo desvio
dos atos do Judiciário ou dos magistrados. O CNJ está
buscando a sua própria identidade. Tem acertado mais do
que errado.
Última Instância – E qual sua opinião sobre as súmulas
vinculantes?
Marli
Ferreira - Sou favorável. Ela não vem para a engessar a
Justiça. Sempre existiu certo vínculo entre as decisões
de um tribunal em relação aos juízes a ele submetidos.
São os precedentes. A súmula vinculante tem que ser
usada em situações especialíssimas, respeitar a hipótese
que foi formadora da súmula. O perigo é usar a súmula
para situações que não são idênticas. Fora isso, acho
que ela vai desafogar os tribunais.
Última Instância - As mulheres, por sua própria
natureza, são melhores juízes do que os homens?
Marli
Ferreira - Essa pergunta é perversa. Não acho que sejam
melhores ou piores. Depende da natureza de cada um, da
formação. Eles são mais imediatistas. Elas, mais
sensíveis. O jurista italiano Piero Calamandrei dizia
que a palavra sentença tem a mesma raiz semântica de
sentimento. Evidentemente, acho que a mulher tem mais
sensibilidade para o julgamento. Mas um bom juiz não se
faz pelo sexo. Um bom juiz é aquele que sabe o que pode
e o que não pode. O que deve e o que não deve.
Última Instância - A sra. não acha que está na hora de
acabar com o foro privilegiado? Ele existe em outros
países?
Marli
Ferreira O foro privilegiado existe na história desde o
século V, sempre existiu. A maioria dos países concede
algum tipo de privilégio em decorrência do ofício de
algumas pessoas. E no Brasil, isso vem desde o tempo do
Império.
O
foro privilegiado na verdade é o anti-privilégio. É uma
criação jurídica que tira do acusado a possibilidade de
recorrer a uma outra via. Por exemplo, os 40 acusados do
mensalão estão sendo julgados pelo Supremo e não terão
direito a mais nenhum recurso.
Última Instância - Com relação ao caso da desembargadora
Cecília Marcondes, e o processo da Anac sobre a
liberação da pista de Congonhas, qual a sua avaliação
sobre o que aconteceu?
Marli
Ferreira - O juiz de primeiro grau deu uma decisão e
houve um recurso para o Tribunal, cuja relatoria coube à
desembargadora Cecília Marcondes. Antes de decidir, ela
ouviu a Anac e a Infraero.
A
diretora da Anac esteve aqui acompanhada de outros
membros da agência apresentando documentos sobre a
segurança na pista. O juiz de primeiro grau, com base
nos elementos fornecidos pelo Ministério Público
Federal, fixou certas barreiras para pouso de aviões
acima de determinado peso na pista principal.
A
desembargadora, à vista do documento, entendeu que não
havia razão para manter a restrição na pista. A Infraero
e a Anac alegaram que havia plena segurança, não havia
porque interditar o aeroporto mais importante de São
Paulo. A juíza acreditou na seriedade e na veracidade
dos documentos. Depois, na CPI, disseram que o documento
não era para valer, que se tratava apenas de um
documento interno.
Fonte: Última Instância, de 03/08/2007